REVISÃO DA CONSTITUIÇÃO: ALGUMAS SUGESTÕES

REVISÃO DA CONSTITUIÇÃO: ALGUMAS SUGESTÕES

Alfredo Handem

O debate e as iniciativas a volta da revisão nossa Constituição não são recentes. Cada vez que as crises políticas e institucionais se agudizam mais são as opiniões a volta da pertinência ou não do nosso regime político. E o mais interessante, é constatar, uma constante teimosia, da nossa classe política, em querer sempre deitar as culpas para a cima das leis, da Constituição, como se elas (as leis) sozinhas decidissem maltratar as nossas instituições e os relacionamentos entre os cidadãos dentro da sociedade. Eu sou daqueles que acredita, que o problema não está na Constituição, mas sim no comportamento das pessoas, ou melhor no comportamento daquelas pessoas que são chamadas legitimamente a darem corpo aos textos jurídicos.

Provavelmente, a nossa Constituição tem “algumas zonas opacas” que precisam ser clarificadas ou melhoradas, nomeadamente no que toca a força (ou excesso de poder atribuído) do Presidente no relacionamento com Governo (podendo assistir ou dirigir as reuniões do Conselho de Ministros quando assim o entender, demitir o governo face a incapacidade deste em gerir crises sociais e políticas que afetam grandemente a vida das populações, entre outros).

Porém, e, independentemente de quem tem a legitimidade de chamar para si o protagonismo de iniciar um processo de revisão da Constituição, gostaria de chamar a atenção para certos aspetos que julgo serem importantes.

1. A começar pela criação e composição da comissão. Não sei de onde veio a ideia de que a feitura da Constituição, ou sua revisão, é uma propriedade exclusiva de juristas ou indivíduos formados em direito. Não está em causa, a competência ou idoneidade intelectual das personalidades que integram a Comissão, longe disso. A Constituição é um conjunto de princípios ou normas fundamentais de acordo com os quais um Estado é regido. O papel dos juristas é dar corpo aos anseios, expetativas e desejos das populações, transformando as suas preocupações em textos jurídicos, eles decidem sobre a forma e não sobre os conteúdos dos textos jurídicos. Por isso qualquer iniciativa desta recente comissão só poderá ter legitimidade se o processo que leve a proposta de revisão seja precedido de uma ampla consulta popular, onde os guineenses (desde o agricultor, passando por comerciante, estudante, professor, desportista, vendedor, enfermeiro, sociólogo, jornalista, médico, engenheiro, empreendedor, etc, etc) possam de forma inclusiva participar com a sua opinião sobre o conteúdo da Constituição. A Comissão devia no mínimo ser interdisciplinar e heterogéneo em termos de especialização e expertise técnico. Nesta perspetiva, sugiro que um trabalho de casa seja previamente definido, de forma a que, em cada momento e em cada fase do processo, as pessoas que serão consultadas saibam do que se trata, e recomendo que não seja apenas para perguntar sobre que tipo de regime político gostariam que vigorasse na Guiné-Bissau, pois isso seria induzir os cidadãos ao erro e a opinarem sobre algo que apenas favoreça a vontade de personalidade A ou B, ou a interesses particulares de algum grupo. A constituição da República não pode ser um instrumento que satisfaça a vontade de minorias.

2. Em relação ao regime político em vigor no nosso país. O fato de estarmos rodeados de países (no quadro da CEDEAO) onde vigora o presidencialismo faz com que qualquer conflito político-institucional seja visto (por essa Comunidade) apenas do ponto de vista da eficacidade da nossa Constituição. É bom não perder de perspetiva que há um debate muito intenso nas diásporas do Senegal e Costa de Marfim exatamente sobre o aquilo que se chama o “check and balance” das suas instituições, muitos senegaleses e costa marfinenses acham que falta um maior equilíbrio de poder nos seus países, consideram mesmo que há demasiado poder concentrado nas mãos do presidente da República fato que explica, em parte, tantos desmandos e conflitos internos. Ora se eles que conhecem e vivem a situação (o de um regime presidencialista), o contestam, e acham que o regime em vigor dos seus respetivos países devia ir a consulta popular para o povo fazer a melhor escolha, então fica o aviso! Em geral, o que acho é que devemos tentar evitar a arrogância do poder, a legitimidade constitucional, muitas vezes, leva a repressão ou recalcamento das minorias.

3. Não inventar a roda. Já houve no passado, várias iniciativas de revisão da Constituição, e para a qual também haviam sido criadas comissões para conduzirem o processo. Seria importante que a atual comissão possa ir revisitar todo o trabalho produzido anteriormente e capitalizar tudo o que de positivo tenha saído de várias consultas realizadas a volta da melhoria da nossa Constituição, acho que teríamos muito mais a ganhar adotando uma atitude humilde (a retórica socratesiana “…só sei que nada sei”, é um bom ensinamento, apenas nos leva a reconhecer o valor e o conhecimento dos outros).

4. Temos agora uma excelente oportunidade para que, em vez de nos concentramos apenas na revisão do regime político, procurarmos democratizar os textos da Constituição trazendo-os mais perto dos cidadãos e dos seus interesses e anseios. Por exemplo, o regime jurídico das cooperativas, das organizações da sociedade civil, e outras formas de organização de cidadãos que contribuem para a implementação das políticas públicas em complementaridade às ações do governo, deviam ser bem revistos e melhor enquadrados na (nova) Constituição. As questões das pensões, segurança social, a velhice, os lares dos idosos, a economia informal que contribui enormemente para a luta contra a pobreza e para o consumo interno, são questões pertinentes que deviam ser analisadas e tomadas em conta.

5. Por fim, por mais pressa que possamos ter, não creio que seja este o momento oportuno para conduzir um processo de revisão da constituição. As nossas populações já têm preocupações e dificuldades acrescentadas às suas vidas devido a crise sanitária e ao afastamento social e geográfico a que são obrigadas em consequência. Poder-se-ia fixar um timing, por exemplo até ao fim do ano, que a Comissão entregue um produto final construído a partir de uma base legitima, inclusiva e participativa (consulta popular).

Alfredo Handem – 15.05.2020

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA PERANTE A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA PERANTE A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA 

O Primeiro passo de um Presidente da República da Guiné-Bissau, preparado ou impreparado para o exercício das suas funções, é procurar conhecer a Constituição e as Leis da República da Guiné-Bissau; procurar conhecer, identificar e assimilar a essência da Organização Política do Estado; os Princípios que fundamentam a Constituição e as Leis da República por um lado e, por outro, o Estado de Direito Democrático que define e caracteriza o “contrato político, social e jurídico” no qual assenta o Estado!

Conhecendo e respeitando a Constituição e as Leis da República da Guiné-Bissau, qualquer Presidente da República da Guiné-Bissau sabe que não é da sua competência: NENHUMA/QUALQUER, iniciativa visando a Revisão Constitucional.

Não sabendo…

A iniciativa primeira de “revisão constitucional” que um Presidente da República pode pretender implementar, é precisamente sobre os seus conhecimentos em matéria de constitucionalidade e legalidade!

Aí, estará no seu direito de contratar quem bem entender para lhe administrar esses conhecimentos…

Como sempre disse: O MEU PARTIDO É A GUINÉ-BISSAU!

Quero para mim a Guiné-Bissau que desejo para todos os meus irmãos Guineenses!

Positiva e construtivamente, vamos continuar a trabalhar!

Didinho 13.05.2020

DIDINHO – ANÁLISE POLÍTICA 12.05.2020

DIDINHO – ANÁLISE POLÍTICA 12.05.2020

Hoje vamos analisar dois assuntos recentes relacionados com a Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, e no próximo trabalho, analisaremos outros dois assuntos, sendo um deles sobre a constitucionalidade e a legalidade do “estado de emergência”  e o outro, sobre a Revisão Constitucional na Guiné-Bissau face ao Decreto-presidencial 014/2020 de 11.05.2020.

O primeiro assunto tem a ver com a recente denúncia de uma alegada invasão da Sede da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau por forças da Guarda Nacional e da Polícia de Intervenção Rápida, feita através de uma Nota Informativa do Gabinete do Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, José Carlos Rodrigues da Fonseca, com data de 07.05.2020 e assinada pelo próprio.

Havendo uma invasão do Parlamento por forças policiais ou outras, o acto deve ser condenado e repudiado, e dele, apurar-se as razões e imputar responsabilidades, com as devidas consequências inerentes.

O Presidente da República, ao abrigo do número 1 do Artigo 62º da Constituição da República da Guiné-Bissau “é o Chefe do Estado, símbolo da unidade, garante da independência nacional e da Constituição e Comandante Supremo das Forças Armadas.”

Assim sendo, espera-se do Presidente da República pronunciamentos e acções concretas em prol do respeito e da garantia pela Constituição e pelas Leis da República, já que é uma das suas competências constitucionais.

DO REGIMENTO DA ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR DA GUINÉ-BISSAU – Lei N.º 1/2010 de 25 de Janeiro

ARTIGO 3.º

Inviolabilidade

1. A sede da Assembleia Nacional Popular é inviolável.

2. O Governo põe à disposição da Assembleia Nacional Popular os meios necessários para garantir a tranquilidade e segurança da sede.

ARTIGO 4.º

Instalações

As instalações da Assembleia Nacional Popular, ou em que se encontrem serviços administrativos ou técnicos de si dependentes, devem dispor de dispositivos de segurança permanente, previstos no artigo anterior, directamente ligados ao presidente da Assembleia Nacional Popular.

Não poderíamos deixar igualmente, de manifestar a nossa estranheza pelo facto de, a Nota Informativa que denunciou a alegada invasão da Assembleia Nacional Popular, ter sido emitida pelo Gabinete do Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular e assinada pelo próprio, quando o Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular pertence à estrutura Administrativa, no âmbito dos Serviços da ANP e não, à Estrutura Política que define a Assembleia Nacional Popular como um Órgão de Soberania do Estado.

O Secretário-Geral da ANP tem competências específicas, apenas enquanto membro da Estrutura Administrativa da ANP, competências essas que não lhe permitem imiscuir-se em abordagens e posicionamentos de cunho político-institucional da Assembleia Nacional Popular.

Não substitui em nenhuma instância o Presidente da Assembleia Nacional Popular e, por assim dizer, não representa o Parlamento da Guiné-Bissau, bem como, não pertence ao Gabinete de Assessoria de Imprensa do Presidente da Assembleia Nacional Popular.

Não seria da competência do Presidente da Assembleia Nacional Popular, pessoalmente, ou através do seu Gabinete de Assessoria de Imprensa, denunciar a violação da sede da Assembleia Nacional Popular, mesmo que alertado pelo Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular?

Em 2017 perante alegadas ameaças de invasão da Assembleia Nacional Popular, o Gabinete de Assessoria de Imprensa do Presidente da Assembleia Nacional Popular emitiu um Comunicado de Imprensa sobre o assunto, cujas cópias aqui reproduzimos, para melhor sustentação da nossa crítica relativamente ao posicionamento recente do Secretário-Geral da ANP.

Que se tirem ilações desta usurpação de competências, pois que, não encontramos nenhuma relação entre as competências estabelecidas para a função de Secretário-Geral da ANP, com a de assessoria política, jurídica ou, de comunicação, do Presidente da ANP e da própria Assembleia Nacional Popular, enquanto Órgão de Soberania.

O segundo assunto da nossa análise tem a ver com o Comunicado de Imprensa em nome de uma alegada MAIORIA PARLAMENTAR, emitido com a data de 06.05.2020 e que tem, em nosso entender, uma provável relação de causa/efeito com a alegada invasão da Assembleia Nacional Popular por forças policiais guineenses na madrugada do dia 07.05.2020.

O Comunicado de Imprensa que agora analisamos, ainda que tenha a data de 06.05.2020, só foi dado a conhecer publicamente no dia 07.05.2020 já depois da Nota Informativa do Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular ter tido o devido impacto, estratégico, de angariar posicionamentos de condenação e repúdio através da sua difusão por órgãos de comunicação social nacionais e internacionais.

Reforçamos a nossa condenação e o nosso repúdio seja em que circunstância for, de uma invasão à sede da Assembleia Nacional Popular, no entanto, cabe ao Presidente da Assembleia Nacional Popular ou ao seu Gabinete de Assessoria de Imprensa, devidamente incumbido para tal, denunciar qualquer violação do Parlamento por forças policiais ou outras, e não, ao Secretário-Geral da Assembleia Nacional Popular, que é apenas um administrativo ao serviço da Assembleia Nacional Popular.

Em nosso entender, salvo melhor opinião, os Comunicados de Imprensa dos Partidos Políticos; das Coligações de Partidos Políticos; das Plataformas de Concertação Política de Partidos Políticos (com ou sem representação parlamentar), associados a Grupos Parlamentares, ou Deputados, que lhes representam no Parlamento, não devem ser emitidos em papel timbrado com a designação do órgão de Soberania que é a Assembleia Nacional Popular.

Os Comunicados de Imprensa dos Grupos Parlamentares ou de Deputados como únicos Representantes dos seus Partidos na Assembleia Nacional Popular NÃO VINCULAM a Assembleia Nacional Popular, nem a República da Guiné-Bissau, por isso, é duma extrema irresponsabilidade e incoerência o uso de um formato de partilha de comunicação timbrado, com o nome da República e o Brasão de Armas da Guiné-Bissau, um dos Símbolos Nacionais, e a designação de um Órgão de Soberania que é a Assembleia Nacional Popular

É uma usurpação de um poder institucional de um Órgão de Soberania da República, visando ganhos político-partidários.

Nenhum Grupo Parlamentar ou Deputado, representa a Assembleia Nacional Popular. A representação da Assembleia Nacional tal como estabelece o número 1 do Artigo 20.º do seu Regimento é uma prerrogativa do Presidente da Assembleia Nacional Popular.

Qualquer Grupo Parlamentar representando partidos ou coligações de partidos na Assembleia Nacional Popular (Os Deputados únicos representantes dos seus partidos na ANP não constituem Grupo Parlamentar; os Acordos de Incidência Parlamentar assinados no pós-eleições não dão direito a criação de Grupos Parlamentares, quiçá, não legitimam nenhum Grupo Parlamentar “coligado”), deve ter o seu modelo timbrado, com a sigla, o símbolo/logotipo, do seu partido correspondente (ou se for o caso, da coligação de partidos), para emitir Comunicados de Imprensa, e não, usar o modelo timbrado da Assembleia Nacional Popular, para assuntos que são de suas iniciativas e não, da Assembleia Nacional Popular.

Um dia antes desta orquestrada turbulência política tendo como palco a Assembleia Nacional Popular, já se sabia através das redes sociais que o PAIGC tinha dirigido uma convocatória aos órgãos de comunicação social nacionais e internacionais convidando-os a “presenciar na quinta-feira dia 07 de maio corrente, às 10H00, na ANP ao acto público de confirmação da existência de uma maioria parlamentar com todos os Partidos do Espaço de Concertação Democrática.

O que o PAIGC continua a ignorar é que a Assembleia Nacional Popular é um Órgão de Soberania representativo do Estado, quiçá, de todos os Cidadãos Guineenses, que apenas se sujeita à Constituição da República e que tem suas Leis Internas que estabelecem a sua Organização e Funcionamento, entre elas, o seu Regimento e os Estatutos dos Deputados.

Nem a Assembleia Nacional Popular, nem nenhum outro Órgão de Soberania do Estado se sujeitam aos Estatutos dos Partidos Políticos.

Os Partidos Políticos, a sós, ou por via de iniciativas de concertação, não têm o direito de usar e abusar do timbre da República como cabeçalho dos seus comunicados de imprensa.

O tempo do Partido-Estado há muito que acabou na Guiné-Bissau!

Qual é a responsabilidade de alguns Grupos parlamentares, ou Deputados sem Grupo Parlamentar, quando, através de um Comunicado de Imprensa conjunto com Partidos Políticos se posicionam fora do contexto institucional da Assembleia Nacional Popular, sobre o reconhecimento do Presidente da República da Guiné-Bissau pelos Chefes de Estado da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental – CEDEAO?

Sobre a alegada Maioria Parlamentar, em nossa opinião, nenhuma maioria parlamentar obtida por via de Acordos de Incidência Parlamentar sustenta-se como sendo para toda a legislatura do mandato a que se refere.

Outrossim, justificar uma Maioria Parlamentar com a presença maioritária nos órgãos da Assembleia Nacional Popular é mera demagogia, pois que os órgãos da ANP não são nomeados ou eleitos em função das maiorias, mas sim, da representatividade de cada Partido Político na Assembleia Nacional Popular. Aliás, foi essa confusão propositada que deu em conflito, aquando da constituição da Mesa da ANP, que até hoje não foi sanado, com base no estabelecido no Regimento.

Não se reúne o plenário da Assembleia Nacional Popular para se debater e votar explicitamente uma maioria parlamentar e, ou, consequentemente, confirmar uma maioria parlamentar, quanto mais por via de um Comunicado de Imprensa, de Partidos Políticos, entre Grupos Parlamentares e Deputados únicos representantes de seus partidos na ANP.

Será que o Comunicado de Imprensa da MAIORIA PARLAMENTAR confirmou alguma maioria parlamentar, ou deixou tudo como estava até aqui, numa perspectiva dúbia sobre o desbloqueio ou a dissolução da Assembleia Nacional Popular?

Os mesmos que dizem não aceitar a intromissão da CEDEAO em assuntos de soberania da Guiné-Bissau, são os mesmos que agora já pedem à CEDEAO para que sejam eles a formar Governo, porquanto vencedores das eleições legislativas de 10.03.2019 com maioria relativa, mas confiantes de manterem uma maioria absoluta por via do Acordo de Incidência Parlamentar com outros Partidos Políticos, que lhes permitiu, de facto, formar o primeiro governo desta Xª. Legislatura…

E são esses mesmos que continuam a não reconhecer o Presidente da República, que foi reconhecido pela própria CEDEAO, que recomendou a formação de um novo Governo na Guiné-Bissau de acordo com os preceitos constitucionais, tendo em conta os resultados eleitorais…

No caso da formação de um novo Governo, a CEDEAO pode e deve intervir, pois que, para os mesmos de sempre não se trata de um assunto relacionado com a soberania nacional da Guiné-Bissau, já sobre o reconhecimento do Presidente da República, aí é que a porca torce o rabo

Quanta confusão dos mesmos de sempre…

Positiva e construtivamente.

Didinho 12.05.2020

VIVA O DIA MUNDIAL DA LÍNGUA PORTUGUESA – 5 DE MAIO

VIVA O DIA MUNDIAL DA LÍNGUA PORTUGUESA – 5 DE MAIO

Desde 10 de Maio de 2003, através do Projecto Guiné-Bissau CONTRIBUTO e também, das nossas obras literárias escritas em português, temos dado a nossa modesta contribuição na promoção e difusão da Língua Portuguesa, nossa Língua Oficial e Comunitária, quer no nosso País, a Guiné-Bissau, através dos nossos irmãos guineenses que ainda não tinham despertado para a sua importância enquanto Património de toda a Comunidade de Povos e Países Lusófonos; quer pelo mundo fora, através dos nossos leitores e amigos que, mesmo não tendo qualquer relação histórica e cultural com a Língua Portuguesa, passaram a considerá-la como plataforma para conhecimento e informação doutras realidades comunitárias, por via de interesses diversos, mas sobretudo, pela simpatia e afinidades que nutrem pelo que representa a Lusofonia na sua generalidade, bem como na sua diversidade.

Viva o Dia Mundial da Língua Portuguesa, Património Comum dos Países e Povos Lusófonos!

Positiva e construtivamente.

Didinho 05.05.2020

DIDINHO – PUBLICAÇÕES DE 24 A 30 DE ABRIL DE 2020

PRESIDENCIALISMO OU SEMI-PRESIDENCIALISMO NA GUINÉ-BISSAU

Se a questão entre Semi-presidencialismo e Presidencialismo deve ser encarada numa perspectiva da “vizinhança”, então sugiro que para além destes dois sistemas de poder, se inclua o poder tradicional guineense, que não necessita de comparação com qualquer “vizinhança”…

Falamos de Presidencialismo para a Guiné-Bissau, dando exemplos de vários países africanos, mas ignoramos propositadamente Cabo-Verde, País Irmão, que tem no regime Semi-presidencialista, um dos melhores índices de referência do continente africano, no que tange à Boa Governação, ao Desenvolvimento e ao exercício da Democracia.

Onde o Respeito pela separação de poderes entre os órgãos de soberania (num Estado sustentado pela Desconcentração e Descentralização do Poder Político), faz toda a diferença!

Comparemos os bons exemplos sobre os sistemas de poder em África, e teremos muito a aprender com o regime Semi-presidencialista, que usado a preceito, num país com poucos recursos naturais como cartão de visita, que é o exemplo de Cabo-Verde, tem contudo, nos seus recursos humanos, a maior riqueza para a viabilização dos seus Programas de Estabilidade e Desenvolvimento.

Olhemos também pela experiência constitucional e democrática de Cabo-Verde enquanto País Africano e Irmão, comparativamente com vários outros países africanos, independentes há mais anos do que Cabo-Verde e a Guiné-Bissau, para termos bases de comparação entre o Semi-presidencialismo e o Presidencialismo de que se fala para a Guiné-Bissau.

Na Guiné-Bissau o regime semi-presidencialista só está contemplado no “papel”, pois que, desde sempre, a prática das acções dos Presidentes da República tem sido claramente de um regime presidencialista. As fragilidades institucionais do nosso Estado, também advêm desse presidencialismo prático/vivencial adoptado por via de comportamentos violadores da Constituição e das Leis da República.

Implicitamente, a Guiné-Bissau teve sempre um regime presidencialista camuflado de semi-presidencialista, aí é que está a razão da alegada inviabilidade de um regime semi-presidencialista na Guiné-Bissau.

Ademais, o conceito de Partido-Estado ainda hoje continua a ser decisivo para a disfuncionalidade do Estado Republicano. Se recuarmos no tempo e analisarmos a forma como alguns Presidentes da República actuaram ao longo dos anos dos seus mandatos na Guiné-Bissau, chegaremos facilmente à conclusão de que os seus dirigismos foram sempre numa vertente presidencialista e não semi-presidencialista.

Por isso mesmo é que, se tivermos que equacionar entre o presidencialismo ou o semi-presidencialismo, devemos ter em conta esta realidade na Guiné-Bissau.

Se hoje estamos como estamos, na minha modesta opinião, é por continuarmos a usar, de forma camuflada, um regime presidencialista, recusando respeitar o regime semi-presidencialista formal que emana da nossa Constituição da República.

Por isso, que presidencialismo para a Guiné-Bissau, quando houve Presidentes da República que o assumiram de forma pessoal, como sendo donos do Estado, promovendo a ditadura e negando aos Guineenses a emancipação política numa vertente de cidadania e democracia?

Positiva e construtivamente.

Didinho 30.04.2020


EM DEFESA DO SEMI-PRESIDENCIALISMO

Já partilhei várias vezes a minha visão sobre se devemos manter o regime semi-presidencialista ou mudar para o regime presidencialista, respeitando sempre todos os demais pontos de vista, coincidentes ou divergentes dos meus. Continuarei a respeitar todas as opiniões sobre esta matéria, pois que se não houvesse pluralismo de ideias, não haveria debate e não havendo debate, não haveria questionamento; não havendo questionamento, não haveria respostas e sim, imposição.

Não queremos que haja imposição ao nosso Povo, mas sim, que se dê ao Povo conhecimento, informação, explicação, em suma, que se eduque e se sensibilize o Povo sobre o que é o Estado e como está organizado e estruturado politicamente, com base no estabelecido na Constituição e nas Leis da República.

Sou defensor de um regime semi-presidencialista para a Guiné-Bissau e farei campanha para a sua manutenção, independentemente do que se tiver que inovar ou melhorar na sua sua essência, tendo em conta as diversas realidades multidisciplinares da Guiné-Bissau do século XXI.

Reflectir sobre os sistemas de governo é um imperativo, para se formar uma opinião sustentada sobre a realidade guineense.

Um regime presidencialista para a Guiné-Bissau, é fácil de recomendar, porque é um benefício da dúvida sobre algo que, o nosso país nunca experimentou.

Não basta ver pelas realidades dos outros países africanos com regimes presidencialistas. A maior parte desses países não conheceu clivagens políticas e sociais de um Estado forjado na luta, como é o caso da Guiné-Bissau.

Outrossim, nunca houve de facto respeito e cumprimento das normas constitucionais, por via do absolutismo do poder dos diversos dirigismos do poder político guineense.

Para mim, enquanto não tivermos políticos dignos desse nome, comprometidos com o Interesse Nacional, respeitadores da Constituição e das Leis da República, no dirigismo do Estado, não devemos concluir que o regime semi-presidencialista não é viável para a Guiné-Bissau.

Não é o regime semi-presidencialista que tem falhado! É a classe política que não está à altura das suas responsabilidades; são os partidos políticos que ignoram o Estado, a República, a Constituição e as Leis; é a Sociedade em si, que não está preparada para o exercício da Cidadania e, consequentemente, para fazer parte activa da Democracia.

Num regime presidencialista, se os políticos, os partidos políticos e a Sociedade não estiverem à altura das suas responsabilidades e dos seus compromissos para com o Estado, a República, continuaremos a viver os mesmos problemas, as mesmas crises, os mesmos conflitos que temos vivido até então, com o agravante de haver um centralismo, absolutismo do poder do Presidente da República, que num regime semi-presidencialista está acautelado pelo princípio da separação de poderes entre os órgãos de soberania.

Não devemos mudar só por mudar. É preciso fazer estudos sérios sobre o que tem levado os decisores políticos guineenses a não interpretar e cumprir fielmente a Constituição e as Leis da República. Com base nos estudos de causa e efeito, questionar, debater, analisar, dialogar no sentido de se encontrar o melhor sistema para o país, sem descurar que uma mudança do regime semi-presidencialista para um regime presidencialista implicará alterações profundas na Constituição e nas Leis da República.

Se depois de todos os levantamentos, entre estudos e conclusões, o Povo Guineense entender que devemos mudar o sistema político, então só teremos que respeitar a decisão do Povo, mas esse Povo tem que ser devidamente informado, explicado, sensibilizado sobre o que é o regime semi-presidencialista e o que é o regime presidencialista, para saber o que cada um desses regimes pode significar para o seu Bem-estar, para a Paz, a Estabilidade e o Desenvolvimento da Guiné-Bissau.

Ao Povo, tem que se dar o Poder de Decisão, mas, dando-lhe a conhecer o que até hoje não sabe, infelizmente. Se nem os políticos sabem interpretar a nossa Constituição e as Leis da República da Guiné-Bissau, que fará o Povo que não trabalha no dia a dia com esses instrumentos que sustentam a Organização Política do Estado?

Positiva e construtivamente.

Didinho 30.04.2020


COVID-19: NA LINHA DA FRENTE, À FRENTE DA LINHA OU ATRÁS DA LINHA

Estamos Todos sujeitos ao risco de contágio pelo coronavírus. Uns em ambientes de maior exposição, outros em ambientes a priori considerados de menor exposição.

O fundamental na avaliação das potencialidades de risco, tendo em conta que a doença é altamente transmissível, em qualquer lugar, seja num hospital, num supermercado, num meio de transporte, na rua, em nossa própria casa, é que tanto aquele que frequenta um ambiente de maior exposição, quanto aquele que frequenta um ambiente de menor exposição à contaminação, são potenciais alvos receptores e transmissores do coronavírus.

Uma vez infectado e ninguém sabe se está infectado, até ficar a saber que está infectado, a questão que se coloca é: quantas pessoas não foram posteriormente infectadas em cadeia, por via de um ou outro infectado que desconhecia estar infectado, ou mesmo, ficando a saber que estava infectado, negligenciou as medidas sanitárias de prevenção e protecção pessoal, sobretudo o isolamento profilático, o distanciamento social e a lavagem das mãos com sabão, para evitar propagar a doença e contaminar outras pessoas?

Estar na linha da frente, à frente da linha, ou atrás da linha quando o assunto é a COVID-19 é uma questão de parceria entre o pessoal e o colectivo determinante para ajudar a Salvar Vidas.

Quem está na linha da frente, ou à frente da linha, depende da perspectiva, tem certamente pessoas à sua retaguarda, por isso, também deve saber que há todo um cordão humano em cadeia de relacionamento, de apoio, de solidariedade, de amparo, à sua retaguarda, quiçá, uma cadeia de valores igualmente de alto risco, em caso de qualquer negligência ou descuido de parte a parte, em matéria de cumprimento das medidas sanitárias de prevenção e protecção, por sermos todos, isso sim, potenciais receptores e transmissores do coronavírus.

Salvar vidas face à pandemia COVID-19 passou a ser também um acto de consciência individual para um efeito colectivo, através do cumprimento das medidas sanitárias de protecção e prevenção.

Seja em que linha estiver, proteja-se, previna-se, cuide-se, porque estará a ajudar a salvar Vidas: a sua e a de Todos!

Por isso, todo o cuidado de cada um de nós, somando um Todo, é fundamental para a prevenção e o combate ao COVID-19.

Não espere que fique infectado para só a partir daí, dar conta que deveria ter levado a doença mais a sério, cumprindo com as recomendações das entidades competentes.

Não ignore, não subestime a doença. Ela existe e é mortal…

Positiva e construtivamente.

Didinho 29.04.2020


O MOMENTO EM QUE VIVEMOS

O momento em que vivemos não deve ser de pânico, desleixo, conformismo, resignação…

De ignorância, negligência, desobediência, egoísmo, insensibilidade e oportunismo.

O momento em que vivemos impõe-nos a Cultura da RESILIÊNCIA, do AMOR, da SOLIDARIEDADE.

Da FRATERNIDADE, AMIZADE e TOLERÂNCIA.

Da COMPREENSÃO e do RESPEITO.

De uns para com os outros, de Todos para com Todos

O momento em que vivemos deve ser de Unidade contra o Inimigo Comum a pandemia COVID-19!

Todos Juntos à distância contra a COVID-19.

Todos Juntos à distância por cada um de nós.

Cada um de nós à distância por Todos.

Todos Unidos e Solidários pela HUMANIDADE!

Didinho 28.04.2020


PROPOR UMA NOVA ABORDAGEM

É preciso propor aos Guineenses uma nova abordagem da Educação para a Cidadania focada no Desenvolvimento Social e Económico, por forma a despolitizar e a despartidarizar o Estado e a Sociedade!

Positiva e construtivamente.

Didinho 25.04.2020


SOBRE ANALISTAS E COMENTADORES POLÍTICOS

Hoje em dia, muitos Guineenses definem-se como Analistas ou Comentadores Políticos, porque não tendo ocupação profissional, que lhes dê visibilidade/notoriedade, independentemente de terem ou não, formação profissional ou académica, superior ou outra, nunca exerceram alguma actividade relacionada com as áreas e os domínios de suas formações.

Estão à mercê da politiquice, vivem da podridão da politiquice!

A auto-definição de analista ou comentador político, por quem, apenas emite uma ou outra opinião pessoal sem ser um estudioso, um pesquisador, um crítico, um pensador, de abordagens globais e multidisciplinares, com obras científicas, literárias e outras, conhecidas/pesquisáveis, quiçá, com fonte própria de referência, partilha, consulta e pesquisa, não passa de um aproveitamento característico de um impostor, visando o estatuto de intelectual, que os diplomas não outorgam e através do qual tenta a todo o custo integrar uma classe intelecto-académica, capaz de lhe dar visibilidade, por algo que nunca terá reconhecimento, na sua luta pela sobrevivência, porque ser Analista ou Comentador Político é muito mais do que ser um opinante cidadão na sobrevivência do ganha pão para falar disto ou daquilo que não sabe, mas que a mando de alguém, ou para agradar a alguém, no intuito de garantir a sua sobrevivência, prontifica-se a usurpar: o estatuto de Analista ou Comentador Político.

Haja respeito, pois que, a Política também é uma Ciência!

Didinho 25.04.2020


A PROPÓSITO DAS CONFERÊNCIAS DIÁRIAS SOBRE O CORONAVÍRUS NA GUINÉ-BISSAU

Porque é que as Conferências diárias sobre o coronavírus na Guiné-Bissau limitam-se exclusivamente à apresentação dos casos diagnosticados, se houver novos dados, pondo-se um ponto final na Conferência, quando há muito para conversar e, ou, repetir diariamente, numa perspectiva de sensibilização para a prevenção da doença?

Se for apenas para apresentar os números constantes numa folha de papel, talvez fosse melhor poupar os médicos que fazem essa apresentação, permitindo-lhes estar a cuidar de doentes, e arranjar um porta voz entre profissionais da comunicação social, para esse fim, que, por tudo quanto temos visto, resume-se à apresentação de números, gênero e faixa etária…

Na minha modesta opinião, as Conferências diárias sobre o coronavírus devem incluir também a sensibilização dos cidadãos, face às vivências e convivências entre pessoas, nas diversas áreas de actividade profissional.

Não é uma questão apenas resumida à existência de novos dados, face a novos casos. Deve ser também um pilar na sensibilização e informação às populações, sobre a doença e, as medidas restritivas e preventivas decretadas no pacote do estado de emergência.

Por favor, sejamos mais criativos e mais abrangentes no trabalho que assumimos estar à altura de realizar, com qualidade, face às nossas capacidades.

Nos últimos dias, assim que a Conferência é iniciada, não passa de 1 minuto e já se dá por finalizada a nível de apresentação, ficando o restante do tempo à mercê de mais ou menos perguntas e consequentes respostas…

Positiva e construtivamente.

Didinho 24.04.2020

“SOCIEDADE DE CANSAÇO: DILEMAS DO NOSSO TEMPO”

“Sociedade de Cansaço: dilemas do nosso tempo”

O excesso de “passividade” se manifesta também como “excesso de estimulos”, “informações” e “impulsos”. Modifica radicalmente a estrutura e a economia de atenção.

A sociedade disciplinar de Foucault[1], feita de (hospitais, asilos, presídios, quartéis e fábricas), não é mais a sociedade de hoje. Em seu lugar, há muito tempo, entrou uma outra sociedade, a saber, uma sociedade de (academias de fitness, prédios de escritórios, bancos, aeroportos etc).

A sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais “sujeitos da obediência”, mas sujeitos de desempenho e produção. São empresários de si mesmos (empreendedores). Nesse sentido, aqueles muros das instituições disciplinares, que delimitam os espaços entre o normal e o anormal, se tornaram arcaicos. Também aquele conceito da “sociedade de controle” não dá mais conta de explicar aquela mudança. Ele contém sempre ainda muita “negatividade”.

A sociedade disciplinar é uma sociedade da “negatividade”. É determinada pela “negatividade” da proibição. O verbo modal negativo que a domina é o não-ter-o-direito. Também ao dever inere uma negatividade, a negatividade da coerção. A sociedade de desempenho vai se desvinculando cada vez mais da negatividade. Justamente a desregulamentação crescente vai abolindo-a. O poder ilimitado é o verbo modal positivo da sociedade de desempenho. O plural coletivo da afirmação “Yes, we can” expressa precisamente o caráter de positividade da sociedade de desempenho. No lugar de proibição, mandamento ou lei, entram projeto, iniciativa e motivação. A sociedade disciplinar ainda está dominada pelo não. Sua negatividade gera “loucos e delinquentes”. A sociedade do desempenho, ao contrário, produz depressivos e fracassados.

A mudança de paradigma da sociedade disciplinar para a sociedade de desempenho aponta para a continuidade de um nível. Já habita, naturalmente, o inconsciente social, o desejo de maximizar a produção. A partir de determinado ponto da produtividade, a técnica disciplinar ou o esquema negativo da proibição se choca rapidamente com seus limites. Para elevar a produtividade, o paradigma da disciplina é substituído pelo paradigma do desempenho ou pelo esquema positivo do poder, pois a partir de um determinado nível de produtividade, a negatividade da proibição tem um efeito de bloqueio, impedindo um maior crescimento. A positividade do poder é bem mais eficiente que a negatividade do dever.

Em seu escrito “Vita activa”, Hannah Arendt procura reabilitar a “vida ativa” contra o primado tradicional da vida contemplativa, rearticulando-a em seu múltiplo desdobramento interno. Em sua opinião, a “vita activa” foi degradada de forma injusta na tradição à mera agitação…

No entanto, a sociedade do cansaço, enquanto uma sociedade ativa desdobra-se lentamente numa sociedade do doping. Nesse meio tempo, também a expressão negativa “doping cerebral” é substituída por “neuro-enhancement” (melhoramento cognitivo). O doping possibilita de certo modo um desempenho sem desempenho. Todavia, há também cientistas sérios que argumentam que será de certo modo irresponsável não utilizar tais substâncias. Um cirurgião que poderia operar de maneira mais concentrada com ajuda desse “neuro-enhancer” faria menos erros e poderia salvar mais vidas. Também o emprego generalizado de “neuro-enhancer” não representaria nenhum problema. Bastaria observar um critério de justiça – e quiçá colocando o produto à disposição de todos. Se o doping fosse permitido também no desporto, decairia para uma concorrência farmacêutica. Só a proibição, porém, não impede aquele desenvolvimento pelo qual não só o corpo, mas também o homem como um todo se transforma numa máquina de desempenho, que pode funcionar livre de perturbações e maximizar seu desempenho. O doping não passa de uma consequência dessa evolução na qual a própria vitalidade, que é constituída por um fenômeno bastante complexo, é reduzida a uma função vital e um desempenho vital. Como contraponto, a sociedade do desempenho e a sociedade ativa geram um “cansaço” e esgotamento excessivos. Esses estados psíquicos são característicos de um mundo que se tornou pobre em negatividade e que é dominado por um excesso de positividade. O cansaço da sociedade do desempenho é um cansaço solitário, que atua individualizando e isolando. É um cansaço que Handke, em seu Versuch über die Müdigkeit (Ensaio sobre o cansaço)[2] chama de “cansaço dividido em dois”: “ambos afastaram-se inexoravelmente distantes um do outro, cada um em seu cansaço extremado, não nosso, mas o meu aqui e o teu lá”.

Esse cansaço dividido em dois atinge a pessoa “com incapacidade de ver e mudez”. Só o eu possui a totalidade do campo de visão: “eu não deveria ter-lhe dito ‘estou cansado de ti’, nem sequer um simples “cansado”! (o que, como um clamor comum, poderia ter-nos liberto talvez do inferno individual): esses cansaços consumiram como fogo nossa capacidade de falar, a alma”. Eles são violência porque destroem qualquer comunidade, qualquer elemento comum, qualquer proximidade, sim, inclusive a própria linguagem: “Aquele tipo de cansaço, calado, como teria de permanecer, forçava à violência. Essa, talvez, só se manifestava no olhar que desfigurava o outro”.

A um cansaço calado, cego, dividido, Handke contrapõe um cansaço falaz, vidente, reconciliador. O cansaço, enquanto um “mais do menos eu” abre um entre na medida em que afrouxa as presilhas do eu. Eu não só vejo simplesmente o outro, mas eu próprio sou o outro e “o outro torna-se igualmente eu”. O entre é um espaço de amizade como indiferença, onde “ninguém ou nada ‘domina’ ou sequer tem o ‘predomínio’”. No tornar-se menos do eu, desloca-se o peso do ser do eu para o mundo. É um “cansaço que confia no mundo”; enquanto eu, o cansaço-eu enquanto cansaço solitário é um cansaço sem mundo, destruidor de mundo. Ele “abre” o eu, torna-o “permeável” para o mundo. Restabelece a “dualidade” que foi totalmente destruída no cansaço solitário. A gente vê e é vista. A gente toca e é tocada: “Um cansaço como tornar-se acessível, sim, como plenificação do ser tocado e mesmo do poder tocar”. É o único que possibilita um demorar-se, uma estadia. O menos no eu se expressa como um mais para o mundo: “O cansaço era meu amigo. Eu estava ali de volta, no mundo”.

Em suma, a pandemia covid-19 trouxe-nos também esses dilemas de escolhas, entre: (ficar ou sair de casa; morrer ou viver; aceitar ou abraçar-se ao outro ou adoecer-se pelo outro; entre procurar a cura ou perder a esperança de curar-se…).

A pandemia e a quarentena, por outro lado, estão a revelar que são possíveis alternativas, que as sociedades se adaptam a novos modos de viver quando tal é necessário e sentido como correspondendo ao bem comum. Esta situação torna-se propícia a que se pense em alternativas ao modo de viver, de produzir, de consumir e de conviver nestes primeiros 20 anos do século XXI. Na ausência de tais alternativas, não será possível evitar a irrupção de novas pandemias, as quais, aliás, como tudo leva a crer, podem ser ainda mais letais do que a atual. Ideias sobre alternativas certamente não faltarão, mas poderão elas conduzir a uma ação política no sentido de concretizá-las? No curto prazo, o mais provável é que, finda a quarentena, as pessoas se queiram assegurar de que o mundo que conheceram afinal não desapareceu. Regressarão sofregamente às ruas, ansiosos por voltar a circular livremente[3]. Irão aos jardins, aos restaurantes, aos centros comerciais, visitarão parentes e amigos, regressarão às rotinas que, por mais pesadas e monótonas que tenham sido, parecerão agora leves e sedutoras.

No entanto, o regresso à “normalidade” não será igualmente fácil para todos. Quando se reconstituirão os rendimentos anteriores? Estarão os empregos e os salários à espera e à disposição? Quando se recuperarão os atrasos na educação e nas carreiras? Desaparecerá o Estado de excepção que foi criado para responder à pandemia tão rapidamente quanto à pandemia? Nos casos em que se adoptaram medidas de proteção para defender a vida acima dos interesses da economia, o regresso à normalidade implicará deixar de dar prioridade à defesa da vida? Haverá vontade de pensar em alternativas quando a alternativa que se busca é a normalidade que se tinha antes da quarentena? Pensar-se-á que esta normalidade foi a que conduziu à pandemia e conduzirá a outras no futuro?

Essas inquietações e questões tornam as nossas sociedades, cada vez mais, “cansadas do cansaço da SOCIEDADE”.

Apenas uma opinião!

Santos Fernandes

Bissau, 5 de Maio de 2020.

[1]Han, Byung-Chul Sociedade do cansaço / Byung-Chul Han; tradução de Enio Paulo Giachini. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.

[2]HANDKE, P. Versuch über die Müdigkeit. Frankfurt a.M., 1992.

[3]Santos, Boaventura de Sousa. A Cruel Pedagogia do Vírus, p. 29-30.2020. ALMEDINA.

DIDINHO – ANÁLISE POLÍTICA – 03.05.2020

SOBRE O RECONHECIMENTO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ELEITO DA GUINÉ-BISSAU PELOS CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA CEDEAO E, CONSEQUENTEMENTE, PELO MUNDO

Antes tarde do que nunca…

Entre o anúncio provisório e o definitivo, e a publicação oficial no Boletim Oficial da Guiné-Bissau dos resultados da segunda volta das eleições presidenciais realizadas na Guiné-Bissau a 29 de dezembro de 2019, ocorreram dois episódios caricatos por parte de um dos candidatos, concretamente, o candidato declarado derrotado pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau, único órgão competente à luz da Lei-Eleitoral do país para apurar e publicar os resultados das eleições.

O primeiro episódio foi o reconhecimento categórico do candidato, Eng.º Domingos Simões Pereira ao seu opositor e vencedor da segunda volta das presidenciais de 29 de Dezembro de 2019 General Umaro Sissoco Embaló a quem telefonou por iniciativa própria para lhe felicitar pela sua vitória eleitoral.

Domingos Simões Pereira foi desta forma, a primeira pessoa a felicitar o vencedor da segunda volta das eleições presidenciais guineenses!

O segundo episódio aconteceu quando, depois de ter sido pressionado pelos seus pares, para não aceitar os resultados eleitorais provisórios apurados e anunciados pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau no dia 01.01.2020, o candidato derrotado iniciou uma campanha de recusa em aceitar os resultados e, consequentemente, em não reconhecer o vencedor das presidenciais, a quem já tinha telefonado e felicitado, reconhecendo a vitória deste.

Dois episódios que não deixam de ser marcantes no conflito pós-eleitoral que Domingos Simões Pereira encetou desde então, com vários recursos ao Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau, enquanto entidade suprema do poder Judicial (na ausência de um Tribunal Constitucional), para dirimir litígios que tenham como objecto o contencioso eleitoral.

Entretanto, o candidato declarado vencedor pela Comissão Nacional de Eleições, General Umaro Sissoco Embaló, começou a receber felicitações de Estadistas e Organizações Internacionais. Do Presidente do Senegal, Macky Sall, do Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, do Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, do Presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, do Presidente de Angola, João Lourenço, do Embaixador dos Estados Unidos no Senegal e na Guiné-Bissau, em nome dos Estados Unidos da América, entre outros e de Organizações como a CEDEAO e a União Africana, isto, no mês de janeiro de 2020 com base no anúncio dos resultados eleitorais pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau.

Da sua agenda diplomática, Umaro Sissoco Embaló deslocou-se a vários países africanos, europeus e asiáticos, na qualidade de vencedor (anunciado pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau), da segunda volta das eleições presidenciais na Guiné-Bissau realizadas a 29 de dezembro de 2019.

Da candidatura derrotada e de forma maquiavélica, no sentido de manipular e desinformar a opinião pública nacional e internacional, bem como pressionar a Comunidade Internacional através dos seus lobbies, Domingos Simões Pereira, o candidato derrotado, nunca se referiu à Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau como única entidade competente para apurar e publicar os resultados eleitorais, tal como consta na alínea n) do Artigo 11.º (competência) da Lei N.º 12/2013 de 27 de Dezembro – Lei da Comissão Nacional de Eleições, preferindo intencionalmente atribuir essa competência ao Supremo Tribunal de Justiça, que na verdade não tem nada a ver com o apuramento ou com a publicação dos resultados eleitorais, mas apenas e só, com o contencioso eleitoral, na estrita observância do estabelecido na Lei-Eleitoral em matéria de contencioso eleitoral, tal como consta no Artigo 140.º da Lei Nº. 10/2013  de 25 de setembro – Lei Eleitoral para o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular: Todas as irregularidades verificadas durante a votação ou no momento de apuramento parcial ou nacional dos resultados do escrutínio podem ser impugnadas, por via de recurso contencioso, desde que tenha sido reclamado ou protestado no decurso dos actos em que tenham sido verificadas.

De recurso em recurso, o candidato derrotado que em nenhum momento do processo eleitoral apresentou qualquer reclamação, protesto ou contraprotesto a quem deveria ter apresentado, quis bloquear o processo de confirmação/publicação final e oficial dos resultados eleitorais pela Comissão Nacional de Eleições e, consequentemente impedir a investidura do candidato declarado vencedor pela CNE, o General Umaro Sissoco Embaló, como Presidente eleito da República da Guiné-Bissau, usando o supremo Tribunal de Justiça para esse fim, através da sua rede de influência.

De Acórdão em Acórdão o Supremo Tribunal de Justiça foi fugindo da sua função jurisdicional e da sua competência constitucional, chegando ao ridículo de, implicitamente, fazer parte de uma ampla e encenada orquestração política visando suspender ad aeternum a decisão final da Comissão Nacional de Eleições no concernente ao apuramento e à publicação dos resultados finais e oficiais da segunda volta das eleições presidenciais realizadas na Guiné-Bissau no dia 29 de dezembro de 2019.

A Comissão Nacional de Eleições face às decisões/exigências do Supremo Tribunal de Justiça cumpriu todos os procedimentos legais exigidos, tendo realizado um total de 3 sessões plenárias, uma delas a pedido excepcional da CEDEAO, para o Apuramento Nacional dos Resultados Eleitorais, que deram todos vitória eleitoral ao candidato Umaro Sissoco Embaló.

A Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau cumpriu com a recomendação emanada pela CEDEAO – Ponto 10 do Comunicado de 30 de janeiro

Foram tantas as iniciativas vazias visando a impugnação dos resultados eleitorais, a recontagem dos votos através de um apuramento de raiz, ou a anulação da segunda volta das eleições presidenciais, entre sustentações de alegadas irregularidades nunca provadas, incluindo a denúncia do sequestro do Presidente da Comissão Nacional de Eleições, por militares afectos à candidatura de Umaro Sissoco Embaló, denúncia refutada, desmentida, pelo Presidente da CNE; da célebre acusação que virou comédia, do envolvimento de piratas informáticos que teriam adulterado os resultados eleitorais a favor do candidato vencedor, apresentadas pelo candidato derrotado e sua equipa de advogados, que o descrédito público encarregou-se de os julgar e ao próprio Supremo Tribunal de Justiça.

A CEDEAO teve que entrar em cena quando pediu excecionalmente à Comissão Nacional de Eleições, a única entidade competente, autorizada, a apurar e a publicar os resultados eleitorais, para cumprir com mais uma das exigências do Supremo Tribunal de Justiça, solicitando igualmente, a estes dois órgãos para “cooperarem de maneira construtiva para salvaguardarem a integridade do processo eleitoral, uma condição e garantia para a paz e estabilidade no país”.

Entre o jogo político do Supremo Tribunal de Justiça e da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, e depois do anúncio dos resultados definitivos da segunda volta das eleições presidenciais e da declaração da Comissão Nacional de Eleições sobre o cumprimento da recomendação do Comité Ministerial de Seguimento da CEDEAO, o candidato declarado vencedor, face ao bloqueio à sua investidura através da insuportável e vergonhosa actuação do Supremo Tribunal de Justiça, decide agendar a sua tomada de posse para 27 de fevereiro, a que designou de simbólica, mas que teve uma legitimidade parlamentar através do 1º. Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Nacional Popular e de vários Deputados dos partidos da oposição, (pese embora a ausência dos Deputados do Grupo parlamentar do PAIGC e doutros partidos que suportaram a sua maioria parlamentar pós-eleições legislativas), ainda que não tenha sido realizada na Assembleia Nacional Popular, e sim num Hotel da capital, Bissau, culminando com a passagem presencial de testemunho, pelo Presidente da República cessante, Dr. José Mário Vaz, numa cerimónia oficial no Palácio da República.

Empossado e instalado no Palácio da República, Umaro Sissoco Embaló não perdeu tempo a demitir o Governo dirigido por Aristides Gomes, que antes das eleições legislativas tinha sido imposto como Primeiro-ministro da Guiné-Bissau pela CEDEAO, mas nessa altura, não houve nenhuma preocupação sobre a perda da nossa soberana, por parte daqueles que, nos dias de hoje, reivindicam essa perda de soberania…

A CEDEAO há muito que impõe o que deve ser feito na Guiné-Bissau, por culpa dos políticos e das Instituições da Guiné-Bissau e infelizmente, assim continuará a ser, enquanto não formos capazes de assumir o nosso Compromisso e as nossas Responsabilidades para com o nosso País, bem como, enquanto não formos capazes de nos Entendermos e nos Respeitarmos como Guineenses que somos, a bem da Afirmação e do Respeito da Guiné-Bissau no concerto das Nações!

O Acordo de Conacri imposto aos Guineenses pela CEDEAO, alegadamente numa perspectiva de mediação da crise política e institucional guineense iniciada em 2015 foi como que um rasgar da Constituição da República da Guiné-Bissau e uma usurpação da soberania nacional, tendo merecido a concordância de actores políticos e da sociedade civil do país, que ignoraram completamente que estavam a permitir à CEDEAO passar a decidir pelos Guineenses e em nome da Guiné-Bissau. Chamamos a atenção para essa realidade, por diversas vezes, mas, infelizmente, nunca fomos tidos em consideração, na nossa Missão em prol da Cidadania assente no nosso Compromisso para com a Guiné-Bissau, e em defesa do Interesse Nacional.

Assistimos a medidas de sancionamento impostas a Deputados, políticos, governantes, magistrados, militares e cidadãos comuns guineenses pela CEDEAO, e todos quantos beneficiaram com essas medidas, calaram-se ou até, rejubilaram com essas decisões.

Assistimos à imposição de Chefes de Governo da Guiné-Bissau, pela CEDEAO e ficamos calados, porque era da nossa conveniência.

Assistimos a um confinamento das nossas Forças Armadas face à sobreposição das Forças da ECOMIB na Guiné-Bissau, por imposição da CEDEAO e ficamos calados, porque havendo benefícios, conveniências, qual soberania, qual quê…!

Assistimos a desautorizações frequentes por parte da CEDEAO de um Presidente da República da Guiné-Bissau, Dr. José Mário Vaz, eleito pelo Povo Guineense, com as suas Competências elencadas na Constituição da República da Guiné-Bissau, à qual prestou juramento, e até aplaudimos, porque era da nossa conveniência… Não estava em causa a Soberania Nacional pelos vistos…

Hoje já há queixas contra a CEDEAO, porque só agora alguns deram conta que a Soberania Nacional da Guiné-Bissau está a ser ameaçada, face ao tardio, mas justo, merecido e decisivo reconhecimento oficial do Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco Embaló, pela CEDEAO e por via disso, pela União Africana, União Europeia, Nações Unidas, CPLP e várias outras organizações internacionais, bem como, por vários Países do Mundo…

Hoje há queixas de que a CEDEAO não pode substituir o Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau em matéria de contencioso pós-eleitoral, como se disso se tratasse…

E será que a CEDEAO deveria desautorizar , noutras circunstâncias, o Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, bem como decidir pelos Guineenses, quando a Organização do Poder Político do nosso Estado está devidamente estruturada e de forma detalhada, na nossa Constituição da República?

Onde estava o Eng.º Domingos Simões Pereira, o queixoso derrotado e mau perdedor, que nunca respeitou o Presidente José Mário Vaz, bem como o seu Partido, o PAIGC para defenderem a Soberania Nacional?

Quando lhes convinha, a CEDEAO era um Parceiro “porreiro”, agora, já é uma instituição que apoia golpes de Estado e golpistas, porque decidiu reconhecer oficialmente o Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, enquanto vencedor da segunda volta das eleições presidenciais de 29 de dezembro de 2019…

Vão ter que se insurgir também contra a União Africana, a ONU, a CPLP, a União Europeia, em suma, todas as Organizações Internacionais e todos os Países e Parceiros Internacionais da Guiné-Bissau que já reconheceram o General Umaro Sissoco Embaló como Presidente da República eleito da Guiné-Bissau.

Se isso é apoiar golpes de Estado, então, vamos admitir que disso se trata e arrumar a questão de uma vez por todas, afinal, fomos sempre golpistas em função das nossas conveniências reflectidas nos nossos posicionamentos.

Basta!

O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau, independentemente do reconhecimento do Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco, pela CEDEAO, pode, quando achar que está em condições de o fazer, decidir sobre o contencioso eleitoral pendente, interposto pelo candidato derrotado. Que o faça, pois a CEDEAO não substitui o Poder Judicial Guineense, contrariamente ao que se quis transmitir (face à sua tomada de posição política e institucional sobre um Estado-Membro), relativamente ao processo eleitoral da segunda volta das eleições presidenciais de 29 de Dezembro de 2019 na Guiné-Bissau.

A 01 de março de 2020 questionamos através do artigo intitulado POR QUE SE CALARAM TODOS…?! face ao silêncio das Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau, dos Órgãos de Comunicação Social Nacionais e Internacionais, que fizeram cobertura de todo o processo eleitoral, e das Missões de Observadores Eleitorais Internacionais, que acompanhando todo o processo eleitoral, felicitaram a Comissão Nacional de Eleições, tendo considerado o processo da segunda volta das eleições presidenciais, de TRANSPARENTE e LIVRE.

A Comunidade Internacional finalmente despertou para o precedente grave de pôr em causa as Missões Internacionais de Observadores Eleitorais, face às conclusões dos seus Chefes de Missão, com base em equipas de trabalho compostas por gente capacitada, experimentada, e credível.

Usar os órgãos judiciais para descredibilizar a entidade competente para apurar e anunciar os resultados eleitorais, é promover uma tentativa de golpe de Estado Institucional, visando claramente criar um ambiente prolongado de saturação e desgaste político e institucional, no intuito de anular o processo eleitoral e com isso, negar a vitória justa ao candidato declarado vencedor, através de pronunciamentos sobre recursos que não se enquadram na Lei-Eleitoral da Guiné-Bissau, em matéria de recurso contencioso, foi certamente outra das conclusões a que a Comunidade Internacional chegou, tirando as devidas ilações, para que o ensaio ao bloqueio pós-eleitoral na Guiné-Bissau não reflicta noutros processos eleitorais doutros países que precisam de Observadores Internacionais para que seus processos eleitorais mereçam credibilidade e reconhecimento, internacionais, independentemente da Soberania dos Estados e da validação interna dos seus processos eleitorais pelas suas entidades competentes.


SOBRE O PONTO 7 DO COMUNICADO DA CEDEAO – NOMEAÇÃO DE UM PRIMEIRO-MINISTRO E DE UM NOVO GOVERNO DE FORMA CONSTITUCIONAL E TENDO EM CONTA AS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS

No Comunicado da CEDEAO no qual os Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO reconhecem o General Umaro Sissoco Embaló como Presidente eleito da República da Guiné-Bissau, há uma recomendação, no seu ponto 7 ao Presidente Umaro Sissoco Embaló, no sentido de proceder à nomeação de um primeiro-ministro e de um novo Governo até ao dia 22 de maio de 2020 de forma constitucional e tendo em conta as eleições legislativas realizadas na Guiné-Bissau no dia 10 de março de 2019.

Olhando para a Constituição da República da Guiné-Bissau, em matéria de Sistemas designatórios por via de Eleições, concluímos que não há eleições governativas mas sim, presidenciais, legislativas e autárquicas, sendo que as autárquicas, ainda que contempladas na Constituição da República, nunca foram realizadas.

Isto quer dizer que, na Guiné-Bissau, o Governo não é eleito!

O Governo, que constitucionalmente é um órgão de soberania, a exemplo do Presidente da República, da Assembleia Nacional Popular e dos Tribunais, emana da Assembleia Nacional Popular, tendo em conta os resultados eleitorais obtidos pelos partidos políticos e, ou, pelas coligações de partidos políticos concorrentes às eleições legislativas.

A referência aos “resultados eleitorais” obtidos pelos partidos políticos e, ou coligações de partidos políticos na nomeação de um Primeiro-ministro, e de um Governo, pode ter várias leituras, interpretações e impactos, em função da obtenção ou não, de uma maioria absoluta directa, ou negociada, visando uma configuração parlamentar maioritária, capaz de dar garantias de Estabilidade Política e Governativa, quer ao Presidente da República, numa questão de competência na nomeação do Primeiro-ministro e do Governo; quer à Assembleia Nacional Popular, enquanto órgão legislativo e de fiscalização política representativa de todos os cidadãos guineenses (em matérias como: aprovação do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado, do Plano Nacional de Desenvolvimento, da autorização legislativa ao Governo, entre outros), já que o Governo, enquanto órgão de soberania, é, ao abrigo do Artigo 103.º da Constituição da República da Guiné-Bissau: “politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.”

Ou seja, o Governo, responde perante estes dois órgãos de soberania: o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular, em conformidade com as competências de cada um dos referidos órgãos, nas suas relações com o Governo.

A Lei Nº 10/2013 – de 25 de setembro – Lei Eleitoral para o Presidente da República e Assembleia Nacional Popular estabelece no seu Artigo 120.º  o que a seguir transcrevemos:

Modo de eleição

1. Os deputados da Assembleia Nacional Popular são eleitos por listas plurinominais de Partidos ou Coligação de Partidos apresentada por cada colégio eleitoral, dispondo o eleitor um voto singular de lista.

2. As coligações poderão apresentar listas únicas de Coligação sendo, porém, permitido aos partidos coligados a apresentação de listas próprias, apenas naqueles em que a Coligação não concorrer.

3. As listas são apresentadas aos eleitores durante a campanha eleitoral para que estes tomem conhecimento dos nomes dos candidatos a deputados de cada partido ou coligação de Partidos.

Fim da transcrição.

Constatamos no ponto 3 do Artigo 120.º da Lei Nº 10/2013 que para a eleição dos Deputados, os Partidos ou coligações de partidos devem apresentar as suas listas aos eleitores durante a campanha eleitoral para que estes tomem conhecimento dos nomes dos candidatos a deputados de cada partido ou coligação de Partidos.

Nas eleições legislativas de 10 de março de 2019 concorreram 24 partidos políticos em separado e nenhuma coligação de Partidos.

Ou seja, ao Povo Eleitor, não foi dado a conhecer nenhuma lista dos candidatos a deputado, em nome de uma coligação de Partidos, porque simplesmente, não houve nenhuma coligação pré-eleitoral entre partidos políticos.

Num universo de 102 Mandatos em disputa para a Assembleia Nacional Popular, o PAIGC foi o vencedor com 47 mandatos, seguido do MADEM-G15 com 27, do PRS com 21, da APU-PDGB com 5, da UM com 1 e do PND com 1.

Face aos mandatos obtidos por estes 6 Partidos, que concorreram separadamente às eleições legislativas, nenhum deles conseguiu obter uma maioria absoluta ou qualificada, o que implicou que fossem promovidas estratégias negociadas visando Acordos de Incidência Parlamentar para a formação de uma Maioria Parlamentar, capaz de garantir a Estabilidade Política e Institucional da Assembleia Nacional Popular, por um lado e, por outro, e como reflexo dessa maioria parlamentar, garantir junto ao Presidente da República, a nomeação de um Primeiro-ministro e de um Governo.

O Povo eleitor não deu a nenhum Partido Político o direito de governar sozinho, com base na legitimidade popular, que teria que ser materializada através de uma maioria absoluta ou qualificada de votos do vencedor das eleições legislativas e convertidos em mandatos.

Não Governa apenas quem vence as eleições legislativas, sem ter maioria parlamentar, mas sim, quem consegue, depois da publicação dos resultados das eleições legislativas, na ausência de uma maioria absoluta ou qualificada, formar uma maioria parlamentar absoluta que seja, capaz de garantir a Estabilidade Política e Governativa ao Presidente da República e, à Assembleia Nacional Popular.

O PAIGC (47 mandatos) ciente dessa realidade, antecipou-se e conseguiu assinar Acordos de Incidência Parlamentar com a APU-PDGB (5 mandatos), com a UM (1 mandato) e com o PND (1 mandato), garantindo assim, uma maioria parlamentar assente em 54 mandatos de um total de 102 que compõem a Assembleia Nacional Popular, deixando o MADEM-G15 (27 mandatos) e o PRS (21 mandatos), na oposição.

Com base nessa maioria parlamentar conseguida pelo PAIGC através dos Acordos de Incidência Parlamentar que rubricou com outros 3 Partidos, estava garantida a Estabilidade Política e Governativa, o que permitiu a formação da Mesa da Assembleia Nacional Popular, bem como a indicação de um nome para o Primeiro-ministro.

É importante esclarecer que não havendo uma definição estatutária nos estatutos dos partidos políticos para que o candidato apontado como cabeça de lista para as eleições legislativas venha a ser o nome indicado para Primeiro-ministro, qualquer outro nome pode ser proposto ao Presidente da República para nomeação do Primeiro-ministro, em função de quem venceu as eleições com maioria absoluta, ou conseguiu arranjos parlamentares para garantir uma maioria absoluta no parlamento.

O PAIGC tem esse requisito nos seus estatutos, mas outros partidos não seguem a mesma via.

O Presidente da República, por sua vez, pode aceitar o nome proposto ou recusá-lo, solicitando outra proposta.

Normalmente, por uma questão de bom-senso e da promoção de um clima de bom relacionamento institucional, o Presidente da República deve aceitar o nome proposto logo à primeira, mas como vimos recentemente, face ao conflito político e institucional que se degenerou nos últimos 5 anos, o ex- Presidente da República, Dr. José Mário Vaz recusou o nome do Presidente do PAIGC e cabeça de lista do seu partido às eleições legislativas de 10 de Março de 2019 o Eng.º Domingos Simões Pereira, solicitando outro nome alternativo.

Pode fazê-lo sim, sem que isso signifique violar a Constituição da República.

Também pode dar-se o caso de, havendo concertação entre os partidos que detêm a maioria parlamentar, num processo negociado depois das eleições legislativas, ser indicado um nome para Primeiro-ministro, de um cidadão independente, ou seja, sem filiação partidária. Nunca aconteceu na Guiné-Bissau, mas não há nenhuma norma constitucional ou legal que o impeça. Caberia sempre ao Presidente da República aceitar ou recusar esse nome.

Temos portanto, que os resultados eleitorais obtidos na avaliação e viabilização da nomeação quer de um Primeiro-ministro, quer de um governo, no caso de não se traduzir numa vitória com maioria absoluta ou qualificada de um partido, ou de uma coligação de Partidos Políticos, nas Eleições Legislativas, por si só, não legitimam a formação de um governo minoritário.

É uma falsa argumentação constitucional aquela que alegadamente sustenta que basta ganhar as eleições legislativas, não importando o número de mandatos, para ter direito a indicar um nome para Primeiro-ministro e formar governo.

O número de mandatos é de capital importância no esclarecimento da configuração parlamentar e na definição de uma maioria directa (por via do processo eleitoral em si), ou negociada, quiçá, através de Acordos de Incidência Parlamentar entre Partidos (ou coligações de Partidos), com assentos parlamentares, por forma a garantirem uma maioria parlamentar, depois de conhecidos os resultados das eleições legislativas e na ausência de um vencedor com maioria absoluta ou qualificada.

Nenhum Governo pode ser nomeado ou mesmo, manter-se em funções, sem a confiança política da Assembleia Nacional Popular e essa Confiança, depende da Garantia de uma Maioria Parlamentar!

DAS RELAÇÕES ENTRE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E O GOVERNO

Olhando para o que diz a Constituição da República da Guiné-Bissau, relativamente às relações entre o Presidente da República e o Governo transcrevemos algumas alíneas do seu Artigo 68.º

ARTIGO 68.°

São atribuições do Presidente da República:

g) Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas representadas na Assembleia Nacional Popular;

h) Empossar o Primeiro-Ministro;

i) Nomear e exonerar os restantes membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro, e dar-lhes posse;

j) Criar e extinguir ministérios e secretarias de Estado, sob proposta do Primeiro-Ministro;

m) Presidir o Conselho de Ministros, quando entender;

o) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas;

p) Nomear e exonerar, ouvido o governo, o Procurador-Geral da República;

q) Nomear e exonerar os Embaixadores, ouvido o Governo;

s) Promulgar as leis, os decretos-leis e os decretos;

ARTIGO 69.°

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

b) Demitir o Governo, nos termos do nº 2 do artigo 104° da Constituição;

c) Promulgar ou exercer o direito de veto no prazo de 30 dias contados da recepção de qualquer diploma da Assembleia Nacional Popular ou do Governo para promulgação.

DAS RELAÇÕES ENTRE A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR E O GOVERNO

Olhando ainda para a Constituição da República da Guiné-Bissau relativamente às relações entre a Assembleia Nacional Popular e o Governo, encontramos os seguintes pontos, nos Artigos e nas alíneas correspondentes:

ARTIGO 81.º

O deputado tem direito de fazer interpelação ao Governo, oralmente ou por escrito, devendo-lhe ser dada a resposta na mesma sessão ou no prazo máximo de 15 dias, por escrito, caso haja necessidade de investigações.

ARTIGO 84.°

4 – O cargo de deputado à Assembleia Nacional Popular é incompatível com o de membro do Governo.

ARTIGO 85.°

1 – Compete à Assembleia Nacional Popular:

d) Aprovar o Programa do Governo;

g) Aprovar o Orçamento Geral do Estado e o Plano Nacional de Desenvolvimento, bem como as respectivas leis;

k) Conferir ao Governo a autorização legislativa;

l) Ratificar os decretos-lei aprovados pelo Governo no uso da competência legislativa delegada;

o) Zelar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração;

2 – Quando o Programa do Governo não tenha sido aprovado pela Assembleia Nacional Popular, terá lugar, no prazo de 15 dias, um novo debate.

3 – A questão de confiança perante a Assembleia Nacional é desencadeada pelo Primeiro-Ministro, precedendo à deliberação do Conselho de Ministros.

4 – A iniciativa da moção de censura cabe pelo menos a um terço de deputados em efectividade de funções.

5 – A não aprovação de uma moção de confiança ou a aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta implicam a demissão do Governo.

ARTIGO 89.°

2 –  A Assembleia Nacional Popular reunir-se-á extraordinariamente por iniciativa do Presidente da República, dos deputados, do Governo e da sua Comissão Permanente.

ARTIGO 90.°

Os membros do Governo podem tomar assento e usar da palavra nas reuniões da Assembleia Nacional Popular, nos termos do Regimento.

ARTIGO 91.º

1 – A iniciativa legislativa compete aos deputados e ao Governo.

ARTIGO 92.°

1 – A Assembleia Nacional Popular pode autorizar o Governo a legislar, por decreto-lei, sobre matérias previstas no artigo 87.º. A autorização deve estabelecer o seu objecto, a sua extensão e duração.

2 – O termo da legislatura e a mudança de Governo acarretam a caducidade das autorizações legislativas concedidas.

3 – Os decretos-leis aprovados pelo Governo no uso da competência legislativa delegada serão remetidos à Assembleia Nacional Popular para ratificação, dispondo esta de um prazo de 30 aias para o efeito, findo o qual o diploma será considerado ratificado.

DAS RELAÇÕES ENTRE O GOVERNO E O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Das relações entre o Governo e o Presidente da República a Constituição da República da Guiné-Bissau diz-nos:

ARTIGO 97.º

3 – Compete ainda ao Primeiro-Ministro, sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem conferidas pela Constituição e pela lei, informar o Presidente da República acerca dos assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do País.

ARTIGO 98.º

1 – O Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidos os partidos políticos representados na Assembleia Nacional Popular.

2 – Os ministros e secretários de Estado são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro.

ARTIGO 103.°

O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 104.°

1 – Acarreta a demissão do Governo:

c) A aceitação pelo Presidente da República do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro;

2 –  O Presidente da República pode demitir o Governo em caso de grave crise política que ponha em causa o normal funcionamento das instituições da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos políticos com assento parlamentar.

DAS RELAÇÕES ENTRE O GOVERNO E A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR

De igual modo, das relações entre o Governo e a Assembleia Nacional Popular, a Constituição da República da Guiné-Bissau dá-nos a conhecer os seguintes:

ARTIGO 96.°

2 –  O Governo conduz a política geral do País de acordo com o seu Programa, aprovado pela Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 100.º

1 – No exercício das suas funções compete ao Governo:

d) Legislar por decretos-leis e decretos sobre matérias respeitantes à sua organização e funcionamento e sobre matérias não reservadas à Assembleia Nacional Popular;

e) Aprovar propostas de lei e submetê-las à Assembleia Nacional Popular;

ARTIGO 103.°

O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 104.°

1 – Acarreta a demissão do Governo:

a) O início de nova legislatura:

b) A não aprovação pela segunda vez consecutiva do Programa do Governo;

d) A aprovação de uma moção, de censura ou não aprovação de uma moção de confiança por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções;

e) A morte ou impossibilidade física prolongada do Primeiro-Ministro.


Resumindo e concluindo, quisemos mostrar através das referências constitucionais versadas nas relações entre o Presidente da República e o Governo, e vice-versa; entre a Assembleia Nacional Popular e o Governo e vice-versa, a real dependência do Governo face ao Presidente da República, e à Assembleia Nacional Popular, na justa competência explanada no Artigo 103.º da Constituição da República da Guiné-Bissau: O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

Ao analisarmos como é nomeado o Governo na Guiné-Bissau, de forma constitucional, e tendo em conta os resultados eleitorais das eleições legislativas de 10 de Março de 2019, cujo vencedor foi o PAIGC sem no entanto ter conseguido uma vitória eleitoral com maioria absoluta ou qualificada, tendo posteriormente negociado e rubricado Acordos de Incidência Parlamentar com outros partidos representados na Assembleia Nacional Popular, no caso de uma denúncia, quiçá, rutura do Acordo de Incidência Parlamentar com a APU-PDGB, partido que tem 5 mandatos na Assembleia Nacional Popular, essa maioria parlamentar, fruto desse Acordo de Incidência Parlamentar pode ser posta em causa na própria Assembleia Nacional Popular, sendo que só mesmo na Assembleia Nacional Popular poderá ser confirmada, ou não, a manutenção desse Acordo ou a sua rutura, numa perspectiva de alinhamento dos posicionamentos em forma de votos, dos deputados, face a qualquer iniciativa nesse sentido, quer seja para aprovação do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado; ou da apresentação duma Moção de Censura ou duma Moção de Confiança ao Governo;

Importa, contudo, face aos mandatos obtidos pelos 6 partidos nas eleições legislativas de 10 de Março de 2019 e depois da demissão, pelo novo Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco Embaló, do primeiro governo constitucional da décima legislatura (nomeado pelo então Presidente da República, Dr. José Mário Vaz), analisar o ponto 7 do Comunicado da CEDEAO numa recomendação ao Presidente Umaro Sissoco Embaló, no sentido de proceder à nomeação de um primeiro-ministro e de um novo Governo até ao dia 22 de maio de 2020 de forma constitucional e tendo em conta as eleições legislativas realizadas na Guiné-Bissau no dia 10 de março de 2019.

Um pormenor importante é que a recomendação da CEDEAO não fala de um novo Primeiro-ministro, mas sim, de um Primeiro-ministro e de um novo Governo. 

Até que ponto esses detalhes são importantes para a nossa análise?

São importantes porque visam em certa medida, legitimar a verdade pós -eleitoral, em matéria de existência duma maioria parlamentar sustentada e atualizada.

Ainda que o Presidente da República eleito, General Umaro Sissoco Embaló tenha demitido o primeiro governo constitucional da décima legislatura chefiado pelo Dr. Aristides Gomes, baseado numa maioria parlamentar obtida pelo PAIGC depois dos Acordos de Incidência Parlamentar com outros 3 partidos políticos com assentos no parlamento, e nomeado um segundo governo, pese embora a inobservância de procedimentos constitucionais e legais para o fazer, em nossa opinião, o certo é que o segundo governo desta décima legislatura também necessita da legitimidade parlamentar para se manter em funções e isso terá que passar necessariamente pela Assembleia Nacional Popular, através dos requisitos de aprovação, quer do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado ou, através de iniciativas directas por via de uma Moção de Confiança, ou de Censura das partes interessadas.

É aqui que o Ponto 7 da Recomendação dos Chefes de Estado da CEDEAO ao Presidente da República da Guiné-Bissau merece atenção especial do Presidente da República.

As disputas políticas na Assembleia Nacional Popular não devem merecer tomada de partido pelo Presidente da República.

O Presidente da República, segundo o ARTIGO 62° da Constituição da República da Guiné-Bissau, é: 1 – o Chefe do Estado, símbolo da unidade, garante da independência nacional e da Constituição e Comandante Supremo das Forças Armadas. 2 – O Presidente da República representa a República da Guiné-Bissau.

Face ao acima exposto, o Presidente da República deve contribuir para a Unidade e não para a Divisão dos Guineenses, assumindo ser Presidente de Todos os Guineenses e demarcando-se das simpatias político-partidárias e das influências consequentes capazes de condicionar e prejudicar o exercício do seu cargo a bem da Nação.

O Governo, segundo a constituição, é politicamente responsável perante o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular. Nas relações com a Assembleia Nacional Popular, o Governo só responde perante a Assembleia Nacional Popular e não perante o Presidente da República, isto deve ficar claro.

A configuração parlamentar da Assembleia Nacional Popular e, consequentemente, a nomeação de um Primeiro-ministro e um novo Governo, deve ser um assunto exclusivo da Assembleia Nacional Popular e não do Presidente da República.

É certo que o Presidente da República pode demitir o Governo ao abrigo do número 2 do Artigo 104.º da Constituição da República da Guiné-Bissau em caso de grave crise política que ponha em causa o normal funcionamento das instituições da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos políticos com assento parlamentar.

Demitir o Governo, não implica, porém, a dissolução da Assembleia Nacional Popular, nem tão pouco, a usurpação das competências constitucionais da Assembleia Nacional Popular, no que tange às suas relações com o Governo.

Já a dissolução da Assembleia Nacional Popular acarreta automaticamente a demissão do Governo.

Assim sendo, o Presidente da República da Guiné-Bissau deve tentar conciliar com a Assembleia Nacional Popular, a verificação e confirmação de uma maioria parlamentar a fim de decidir sobre a continuidade do atual Primeiro-ministro e do seu Governo, ou, a sua demissão e nomeação de um Primeiro-ministro e um novo Governo, caso por exemplo, a anterior maioria parlamentar concertada do PAIGC e os partidos com os quais assinou Acordos de Incidência Parlamentar, se mantenha firme, mesmo depois do anúncio controverso da rutura do Acordo de Incidência Parlamentar pela APU-PDGB (5 mandatos), que já veio dar a conhecer ter rubricado um novo Acordo de Incidência Parlamentar com o PRS (21 mandatos), o que equivale dizer que, somando seus mandatos aos mandatos do MADEM-G15 (27 mandatos), configurariam uma nova maioria parlamentar.

Importa questionar a existência de uma maioria parlamentar absoluta ou qualificada entre o PAIGC e os seus parceiros, ou entre o MADEM-G15 e os seus parceiros, pois que, constatamos que muitos deputados eleitos solicitaram suspensão dos seus mandatos para ocuparem cargos ministeriais, o que equivale dizer que, em matéria de votação no parlamento, estando como governantes, não podem decidir, sendo as suas decisões tomadas por outros deputados, seus suplentes na linha de sucessão no parlamento, caso todo esse processo tenha sido realizado de forma legal, tendo em conta o que está regulado nos estatutos dos deputados.

Estatutos dos Deputados da Guiné-Bissau – ARTIGO 9.° – Substituição dos Deputados

1 – A substituição dos Deputados, em caso de vacatura ou suspensão do mandato, será feita nos termos do disposto nos artigos 123. ° e 124. ° da Lei n°4/ 93, de 24 de fevereiro.

Até ser confirmado um novo figurino parlamentar, na Assembleia Nacional Popular, o Governo em funções carece de legitimidade política, institucional e constitucional, daí a pertinência do Ponto 7 da Recomendação da Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO.

Caso se consiga calendarizar um debate no Parlamento para se tirar a limpo a questão da configuração de uma maioria parlamentar (antes da data sugerida, não necessariamente exigida em forma de ultimato, pela CEDEAO – 22 de maio), e na confirmação de uma maioria parlamentar que apoie o atual Governo em funções, a plataforma dessa maioria pode decidir por manter (ou não) o atual Primeiro-ministro na Chefia do Governo, de um novo Governo que seria reconhecido como constitucional e assente na legitimidade democrática, pela Assembleia Nacional Popular e não necessariamente, pelo Presidente da República.

É de capital importância que a CEDEAO saiba como funciona o sistema parlamentar maioritário que decide sobre a nomeação de um Primeiro-ministro e de um Governo na Guiné-Bissau.

Se não houver conciliação entre o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular, no sentido de se viabilizar na Assembleia Nacional Popular, o debate sobre a legitimidade do Governo em funções, por via da confirmação de uma maioria parlamentar atualizada, e tendo em conta a Recomendação da CEDEAO no seu Ponto 7, o Presidente da República, em nosso entender, não deve demitir o Governo, para nomear outro, por sua iniciativa. É inconstitucional e prolongará a crise política e institucional na Guiné-Bissau!

No caso de não haver condições de entendimento para a legitimação do governo, no parlamento, o Presidente da República pode alegar a existência de uma grave crise política e decidir pela dissolução da Assembleia Nacional Popular, conforme estabelece a alínea a) do número 1 do ARTIGO 69.° da Constituição da República da Guiné-Bissau.

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

a) Dissolver a Assembleia Nacional Popular, em caso de grave crise política, ouvidos o Presidente da Assembleia Nacional Popular e os partidos políticos nela representados e observados os limites impostos pela Constituição.

Sendo que, em nosso entender, o Presidente da República teria que considerar sempre os limites formais e temporais para dissolver a Assembleia Nacional Popular, como estabelece o número 1 do Artigo 94.º da Constituição da República da Guiné-Bissau. A Assembleia Nacional Popular não pode ser dissolvida nos 12 meses posteriores à eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou de emergência.

Dissolver o Parlamento não deve ser o primeiro, nem o segundo recurso de um Presidente da República face a uma grave crise política e institucional, mas sim, o último de todos os recursos possíveis, e esgotadas todas as possibilidades existentes, a bem da salvaguarda do Interesse Nacional.

Porém, na ausência de entendimentos/consensos, políticos, no seio da Assembleia Nacional Popular, e para impedir que o Interesse Nacional seja prejudicado, cabe ao Presidente da República decidir em consciência e em conformidade com a Constituição da República, face ao juramento prestado, que consta no seu Artigo 67.º  “Juro por minha honra defender a Constituição e as leis, a independência e a unidade nacionais, dedicar a minha inteligência e as minhas energias ao serviço do povo da Guiné-Bissau, cumprindo com total fidelidade os deveres da alta função para que fui eleito”.

Ouvimos recentemente o Presidente da República exigir o desbloqueio da Assembleia Nacional Popular para que o Programa do atual Governo fosse recebido, apresentado e debatido na Assembleia Nacional Popular, dependendo a sua aprovação ou não, da maioria absoluta de votos dos deputados presentes.

Temos acompanhado as recentes diligências do Presidente da República da Guiné-Bissau nas suas auscultações aos partidos políticos com assento parlamentar, aos demais órgãos de soberania, visando tomar conhecimento fatual das crispações no seio da Assembleia Nacional Popular e como deve proceder constitucionalmente, para encontrar a melhor solução para a Guiné-Bissau, sobretudo, para responder constitucionalmente ao Ponto 7 da Recomendação da CEDEAO sobre a nomeação de um Primeiro-ministro e de um novo Governo.

Em nosso entender, caso não se consiga um entendimento político institucional, após várias iniciativas nesse sentido, a melhor solução seria obviamente a dissolução da Assembleia Nacional Popular, que acarretaria automaticamente a demissão do actual governo, e a convocação de Eleições Legislativas antecipadas. Contudo e mesmo sendo uma decisão soberana e constitucional, o Presidente da República deveria comunicá-la antecipadamente aos seus pares da CEDEAO, justificando as razões constitucionais e legais que o moveram a essa decisão, salvaguardando sempre a defesa do Interesse Nacional e a satisfação das necessidades coletivas.

Pode-se questionar se a realização de novas eleições legislativas não poderia redundar numa nova crise caso não haja de novo um vencedor com maioria absoluta ou qualificada.

Sim, pode acontecer, mas será sempre um novo contexto, provavelmente com novas lideranças partidárias ou fusões entre partidos políticos e um novo desafio ao Povo eleitor, cada vez mais desgastado com as sucessivas crises políticas e institucionais que têm bloqueado a Guiné-Bissau.

Aproveitamos para lembrar ao Presidente da República a importância do Conselho de Estado, seu órgão político de consulta, segundo o Artigo 73.º da CRGB e sobretudo pelo fato de ainda não terem sido dados a conhecer oficialmente os nomes dos cinco cidadãos designados pelo Presidente da República pelo período correspondente à duração do seu mandato, conforme a alínea e) do ARTIGO 74.° da Constituição da República da Guiné-Bissau

ARTIGO 74.º

1 –  O Conselho de Estado é presidido pelo Presidente da República e composto pelos seguintes membros:

a) O Presidente da Assembleia Nacional;

b) O Primeiro-Ministro;

c) O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;

d) O representante de cada um dos partidos políticos com assento na Assembleia Nacional Popular;

e) Cinco cidadãos designados pelo Presidente da República pelo período correspondente à duração do seu mandato.

2 – O representante a que se refere a alínea d) do número anterior é escolhido por cooptação entre os deputados à Assembleia Nacional Popular.

3 – Os membros do Conselho de Estado são empossados pelo Presidente da República.

DAS RELAÇÕES ENTRE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR

ARTIGO 68.°

São atribuições do Presidente da República:

c) Dirigir mensagem à Nação e à Assembleia Nacional;

d) Convocar extraordinariamente a Assembleia Nacional Popular sempre que razões imperiosas de interesse público o justifiquem;

f) Fixar a data das eleições do Presidente da República, dos deputados à Assembleia Nacional Popular e dos titulares dos órgãos de poder local, nos termos da lei;

g) Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas representadas na Assembleia Nacional Popular;

ARTIGO 69.°

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

a) Dissolver a Assembleia Nacional Popular, em caso de grave crise política, ouvidos o Presidente da Assembleia Nacional Popular e os partidos políticos nela representados e observados os limites impostos pela Constituição;

c) Promulgar ou exercer o direito de veto no prazo de 30 dias contados da recepção de qualquer diploma da Assembleia Nacional Popular ou do Governo para promulgação.

2 – O veto do Presidente da República sobre as leis da Assembleia Nacional Popular pode ser superado por voto favorável da maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções.

ARTIGO 71.°

1 – Em caso de ausência para o estrangeiro ou impedimento temporário, o Presidente da República será substituído interinamente pelo Presidente da Assembleia Nacional Popular.

2 – Em caso de morte ou impedimento definitivo do Presidente da República, assumirá as funções o Presidente da Assembleia Nacional Popular ou, no impedimento deste, o seu substituto até tomada de posse do novo Presidente eleito.

ARTIGO 72.°

2 – Compete à Assembleia Nacional Popular requerer ao Procurador-Geral da República a promoção da acção penal contra o Presidente da República sob proposta de um terço e aprovação de dois terços dos deputados em efectividade de funções.

DAS RELAÇÕES ENTRE A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR E O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ARTIGO 85.°

1 – Compete à Assembleia Nacional Popular:

e) Requerer ao Procurador-Geral da República o exercício da acção penal contra o Presidente da República, nos termos do artigo 72° da Constituição; Votar moções de confiança e de censura ao Governo;

j) Autorizar o Presidente da República a declarar a guerra e a fazer a paz;

ARTIGO 89.°

2 – A Assembleia Nacional Popular reunir-se-á extraordinariamente por iniciativa do Presidente da República, dos deputados, do Governo e da sua Comissão Permanente.

ARTIGO 94º

1 – A Assembleia Nacional Popular não pode ser dissolvida nos 12 meses posteriores à eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou de emergência.

2 – A dissolução da Assembleia Nacional Popular não impede a subsistência do mandato dos deputados até abertura da legislatura subsequente às novas eleições.

Positiva e construtivamente.

Didinho 03.05.2020

Fontes de consulta:

Assembleia Nacional Popular

Comissão Nacional de Eleições

CEDEAO