A GUINÉ-BISSAU ENTREGUE À SUA "SORTE"  (2)

 

Amilcar Cabral  "Abel Djassi"

 

 

Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

12.04.2010

Fernando Casimiro (Didinho)Convido todos os guineenses (incluindo o Sr. Presidente da República e demais membros representativos dos órgãos de soberania do país; governantes, políticos em geral e militares), na qualidade de cidadãos do país que se dá a conhecer por República da Guiné-Bissau, à leitura e consequente avaliação do manual de perguntas e respostas sobre a Manutenção de Paz das Nações Unidas, assim como, da Carta das Nações Unidas, ambos disponibilizados neste trabalho.

Numa altura em que se volta a equacionar o pedido do envio de uma Força Multinacional Militar e Policial para a Guiné-Bissau, havendo uma parte da população a favor e outra contra, nada melhor do que dar a conhecer aos guineenses informações precisas sobre o que é e no que consiste uma Força de Manutenção de Paz das Nações Unidas.

Assistimos a muita conversa sobre o assunto, mas estou em crer que a maioria dos guineenses continua a interpretar mal, por desconhecimento, o significado de uma Força de Manutenção de Paz da ONU.

Também é notório um desconhecimento e/ou desinteresse e/ou conveniência dos sucessivos Governos da Guiné-Bissau na avaliação e definição, em conformidade, do estatuto real do país, marcado por sucessivos conflitos, incluindo uma guerra civil de onze meses entre 1998 e 1999.

Uma atitude de desconhecimento e/ou desinteresse e/ou conveniência que tem prejudicado a Guiné-Bissau, tendo em conta que, um reconhecimento pontual, ponderado e assumido das múltiplas consequências que os cíclicos conflitos internos têm provocado, obrigaria as Nações Unidas, ao abrigo do estipulado na sua Carta Magna, a prestar toda a assistência à Guiné-Bissau, na qualidade Estado-Membro e de país habitualmente gerador de conflitos internos graves, que põem em causa não só a sua própria Paz e segurança interna, mas também, a Paz e a segurança dos países vizinhos e, consequentemente, de toda uma região.

Se podemos apontar o dedo aos sucessivos Governos da Guiné-Bissau pelo desconhecimento e/ou desinteresse e/ou conveniência em reconhecer e assumir a Guiné-Bissau como um país de conflitos, também é verdade que o mesmo se pode fazer em relação à própria ONU, que, apesar de todas as evidências do que tem acontecido na Guiné-Bissau, particularmente desde o primeiro golpe de Estado, a 14 de Novembro de 1980, nunca enquadrou a realidade social, política e militar guineense como uma realidade presente nos diversos escalões de referências típicas de países geradores de conflitos. 

Como é que se pode almejar a Paz, a Estabilidade e o Desenvolvimento na Guiné-Bissau, quando nos intervalos das crises, ou seja, no pós-conflito, ignorando os constantes erros do passado, apenas se fomenta a realização de eleições, justificando depois a realização dessas eleições como sinal expresso de maturidade política e democrática, dando a entender que, tudo o que tinha acontecido de mal, ficaria eternamente resolvido com as novas autoridades saídas das eleições?

Afinal, como é que se justificam os repetitivos conflitos na Guiné-Bissau, quando todos dizem haver estabilidade?

A resposta para mim é simples: A Guiné-Bissau nunca beneficiou, de facto, de nenhum programa social e humanitário, em toda a sua amplitude, no âmbito da prevenção e resolução de conflitos!

"O contexto e os modelos também se modificaram: a manutenção da paz começou por ser um modelo primordialmente militar de vigilância do cumprimento do cessar-fogo e de separação dos combatentes, após uma guerra entre Estados. Hoje, a manutenção da paz evoluiu para um sistema integrado que inclui muitos elementos -- pessoal militar, policial e civil -- que trabalham juntos para preservar a paz no perigoso período após um conflito. Desde o final da Guerra Fria, a manutenção da paz das Nações Unidas foi, frequentemente, conjugada com a consolidação da paz, em operações multidimensionais complexas levadas a cabo em meios onde houve um conflito intra-Estado" http://www.unric.org/html/portuguese/peace/pkpngfaq/introducao.htm

Tomemos em consideração algumas passagens de perguntas e respostas sobre a Manutenção de Paz das Nações Unidas, para percebermos que a situação por que tem passado a Guiné-Bissau OBRIGA a uma intervenção das Nações Unidas, o que nunca aconteceu, sendo que, tem-se dado a entender que, cabe única e exclusivamente às autoridades guineenses decidir se pretendem ou não o apoio das Nações Unidas, por exemplo, no envio de uma Força Multinacional de Manutenção de Paz.

Por que as missões de manutenção da paz da ONU são essenciais no mundo atual?

Diversos motivos - políticos, econômicos ou sociais - somados ao descontentamento e a frustração das populações que não conseguem sair do círculo vicioso da pobreza, podem levar a guerras. Muitos dos conflitos dos nossos dias poderão parecer remotos para aqueles que não se encontram diretamente na linha de fogo. Mas as nações do mundo devem confrontar os riscos de uma intervenção com os perigos comprovados da inanição. Se a comunidade internacional não tentar controlar os conflitos e resolvê-los pacificamente, eles podem degenerar em conflitos maiores, envolvendo um maior número de protagonistas. A história recente tem demonstrado que as guerras civis entre facções diferentes num país podem provocar rapidamente a desestabilização de países vizinhos e alastrar a regiões inteiras. Nos tempos modernos, são poucos os conflitos que se podem considerar verdadeiramente "locais". Os conflitos geram frequentemente toda uma série de problemas por exemplo, o tráfico ilegal de armas, o terrorismo, o tráfico de droga, fluxos de refugiados e danos ambientais. As suas repercussões fazem-se sentir longe da zona imediata do conflito. As actividades de manutenção da paz ONU, que contam já com 60 anos de experiência no terreno, são uma ferramenta indispensável. O facto de essas actividades serem empreendidas em nome de uma organização global composta por 191 Estados Membros confere-lhes uma legitimidade e universalidade únicas.

Fonte: ONU

Falar de certas coisas implica, para além de conhecimento de causa, objectividade.

O que se pretende quando se posiciona a favor de uma Força de Manutenção da ONU na Guiné-Bissau?

1 - Que com base na experiência de 60 anos da ONU nesta matéria, se consiga transmitir aos guineenses, na prática, as lições sobre como prevenir e resolver conflitos.

2 - Que se consiga, de facto, incutir na mente dos guineenses, o espírito da Paz e suas consequentes ramificações positivas.

3 - Que se consiga, de facto, sensibilizar sobre os Direitos, Liberdades, Garantias e Deveres Fundamentais dos cidadãos.

4 - Que se consiga, de facto, sensibilizar os guineenses para o reconhecimento, o respeito e a consideração pelas Instituições da República.

5- Que se consiga, de facto, reverter/transformar a dinâmica dos conflitos em elementos propulsores do Desenvolvimento.

6 - Que se consiga, com todas estas acções pacíficas, mobilizar os cidadãos para a adopção da Verdade e da Justiça como valores de sustentação da Paz!

A questão do orgulho nacional tem sido factor de posicionamento contrário ao envio de uma Força de Manutenção da Paz da ONU à Guiné-Bissau por muitos guineenses.

Uns dizem que os guineenses entendem-se perfeitamente, por isso, não é necessário recorrer a nenhuma Força estrangeira.

Outros dizem que as Forças estrangeiras poderiam complicar ainda mais os problemas da Guiné-Bissau; que poderíamos ter militares de países nossos vizinhos, que não têm interesse na estabilidade da Guiné-Bissau, etc. Sobre este assunto, nada melhor do que ler e ficar a saber como é constituída uma Força de Manutenção da Paz.

Se havia dúvidas de que os guineenses não se entendem, essas dúvidas dissiparam-se, creio eu, com os acontecimentos do passado dia 01 de Abril. Com efeito, é fácil reconhecer que os guineenses não se entendem pela via do diálogo, pois no panorama sócio-político e militar não há, nunca houve uma cultura de diálogo. O diálogo na Guiné-Bissau confunde-se com um recorrente abuso de autoridade que, por sua vez, demonstra quem de facto é a autoridade máxima do país, por ter a força das armas, dando a conhecer que na verdade as Instituições da República apenas existem formalmente.

Quando ouço ou leio que não precisamos de tropa estrangeira na nossa terra, volto a questionar aos que se posicionam dessa forma por que razão sentem orgulho de ver os nossos militares em Missão de Paz da ONU noutros países?

Por que razão nunca se posicionaram contra a inclusão dos nossos militares nessas Missões?

Uma verdade que muita gente desconhece ou não se lembra é que, por exemplo, a nossa gloriosa luta de libertação nacional, não teve unicamente a participação de guineenses e cabo-verdianos.

Até mesmo cidadãos de países vizinhos, como a Gâmbia e a Guiné-Conacri lutaram lado a lado com guineenses e cabo-verdianos durante a luta de libertação nacional. Iafai Camará e Ansumane Mané eram naturais da Gâmbia e optaram mesmo por ficar na Guiné-Bissau, mas há mais exemplos para além destes.

De Cuba, partiram diversos combatentes internacionalistas, numa primeira fase, escolhidos criteriosamente, eram negros, para passarem despercebidos pelo exército colonial português. Ensinavam, cuidavam dos doentes e feridos e participavam nas operações de guerra.

A determinada altura deixou de haver critérios na escolha e envio desses combatentes internacionalistas cubanos, ou seja, não tinham que ser negros. Quem não se lembra do célebre cidadão cubano, Capitão das Forças Armadas na altura, Pedro Rodriguez Peralta, ferido e feito prisioneiro de guerra em 1969 nas matas da Guiné, sujeito a torturas de toda a espécie e posteriormente enviado para Portugal, onde veio a servir de moeda de troca depois da revolução de Abril, com um prisioneiro americano detido em Cuba?

Que importa a nacionalidade de quem nos pode ajudar, oferecendo-se ou disponibilizando-se quando solicitado para tal?

Muito humildemente e respeitando todos os posicionamentos em relação ao pedido ou não do envio de uma Força de Manutenção da Paz da ONU para a Guiné-Bissau, acho que essa solicitação faria com que as Nações Unidas reconhecessem, pela primeira vez, a gravidade do desleixo, do abandono a que foi votada a Guiné-Bissau ao longo destes anos de conflito interno e fossem obrigados a activar os diversos programas de apoio previstos para os países geradores e potenciais propagadores de conflitos a outros territórios.

A Guiné-Bissau está a perder e vai continuar a perder enquanto não reconhecer, não manifestar, não recorrer ao direito internacional, na qualidade de Estado-Membro das Nações Unidas, para obter o reconhecimento do Estatuto de País em Permanente Conflito, que designo abreviadamente por  P.P.C. e assim, passar a fazer parte dos países que suscitam preocupações acrescidas, dada a sustentabilidade e o potencial que caracterizam os seus conflitos e o consequente alastramento a outros espaços geográficos.

Não devemos ter pressa para atingir o Desenvolvimento. Há muitos degraus a subir até lá chegarmos!

Amilcar Cabral dizia: "Precisamente porque tenho pressa é que vou devagar".

Fazer propaganda de uma Estabilidade inexistente, só para transmitir boa imagem, atrair e garantir a confiança dos investidores, é deitar tudo a perder na Guiné-Bissau. Vejamos quantos milhões de milhões foram investidos, doados ou perdoados à Guiné-Bissau ao longo de quase 37 anos de independência. O que é que se fez, o que é que existe, o que é que mostra que valeu a pena toda essa ajuda/investimento?!

Vamos continuar a mentir, a omitir os factos, a recusar aprender com os erros do passado?

Vamos continuar a dizer, arrogantemente que não precisamos de ajuda de ninguém na busca de soluções para problemas que há muito demonstramos não ser capazes de resolver por nós próprios?

Vamos continuar a desperdiçar a oportunidade de reivindicar às Nações Unidas o direito internacional de apoio face ao estatuto não forçado, mas real, de País em Permanente Conflito que somos?

Vamos continuar a dar razões para que se alegue que a Guiné-Bissau é um Estado Falhado e por assim dizer, que cada um use e abuse do nosso território e do nosso povo como bem entender?

A Guiné-Bissau não pode, não deve ser abandonada à sua sorte, porquanto ser um Estado-Membro das Nações Unidas. Cabe à ONU, em última instância, como é a actual situação de refém das autoridades da Guiné-Bissau, decidir por uma intervenção Humanitária e o consequente envio de uma Força de Manutenção de Paz, ou será que devemos todos esperar que haja um novo conflito (mais um), de grandes proporções, para ao invés de uma Força de Manutenção de Paz, recorrer-se a uma Força de intervenção militar num ambiente de confronto anunciado? 

Os guineenses devem exigir um posicionamento firme face à real situação da Guiné-Bissau em conformidade com os considerandos da Carta das Nações Unidas. Ajudar a resolver os problemas conflituais na Guiné-Bissau evitando suas consequentes ramificações aos países vizinhos, bem como a toda a região da África ocidental  é UMA OBRIGAÇÃO das Nações Unidas, ao abrigo do Direito Internacional!

Os guineenses devem inteirar-se do manual que dá a conhecer o que é e para que serve a sua Força de Manutenção da Paz, para que fiquem devidamente esclarecidos sobre o assunto!

 

Perguntas frequentes sobre a Manutenção de Paz das Nações Unidas

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