A IMPORTÂNCIA DO PASSADO NO PRESENTE E NO FUTURO DA GUINÉ-BISSAU

 

UM PONTO DE SITUAÇÃO SOBRE O PAÍS

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

20.04.2008

O passado é um registo, seja de que forma for, que nos permite rever em qualquer ocasião e circunstância, as diferentes fases do nosso percurso.

Como guineenses, porquanto sermos a continuidade de gerações que a nossa terra-mãe gerou, independentemente das raízes que caracterizam a proveniência dos nossos antepassados (somos resultado de confluências civilizacionais e culturais), devemos ter em conta a importância do passado; do passado recente da nossa terra, bem como de todo o registo histórico dos diversos percursos das muitas gerações anteriores à proclamação da nossa independência nacional.

Volto a dizer, uma vez mais, que seria importante empenharmo-nos no estudo e conhecimento do nosso passado: realidades, causas e consequências,  para melhor nos situarmos perante as muitas questões que continuam sem respostas e ainda hoje nos dividem, atrasando o país na definição e projecção de um rumo (do nosso próprio rumo), tendo por base orientações específicas, científicas, realistas e sustentáveis, que o passado, numa referência colectiva e pormenorizada, nos pode fornecer, bem como, as capacidades técnico-profissionais, a nível de quadros formados, que hoje a Guiné-Bissau dispõe.

Por diversas vezes solicitamos a colaboração de quadros nacionais das áreas das Ciências Sociais e Políticas, no sentido de se fazerem levantamentos, leituras e análises ao livro aberto que deve ser o registo histórico da memória colectiva da Guiné-Bissau.

Também temos vindo a solicitar que instituições nacionais disponibilizem  dados estatísticos e estudos diversos.

Infelizmente, são poucos os que têm dado as suas contribuições na matéria, aproveito para lhes agradecer em nome do Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO, sendo que, por exemplo, uma Instituição, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas da Guiné-Bissau (INEP), que até poderia ter um papel mais activo na formação e informação dos guineenses e não só, fica aquém dos pressupostos da sua própria designação, por não disponibilizar/divulgar/ partilhar os estudos que supostamente faz.

Porque é que os estudos de âmbito social (ou outros) não são divulgados?

Porque é que até hoje o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) não tem uma página na Internet para que estudantes e investigadores guineenses ou outros, possam encontrar elementos que lhes permitam conhecer melhor as realidades da Guiné-Bissau?

Não estou aqui para desprestigiar o INEP, instituição de reconhecida importância, sobretudo pela excelência dos recursos humanos que tem na sua estrutura. Esta minha observação, é um desabafo construtivo no intuito de desafiar o próprio INEP a dar passos no sentido da inovação. Há que ter em conta que o primeiro passo é o mais importante, pois sem ele, ficamos sempre no mesmo sítio...

O que é preciso para que se crie a página do INEP na Internet?

Estou disponível para ajudar, caso haja vontade na criação da página!

O presente trabalho não sendo uma abordagem exclusiva ou conclusiva por definição, pretende desafiar o debate de ideias numa referência sobre a importância do passado tendo em conta o presente que se vive na Guiné-Bissau e, consequentemente, o futuro que podemos vir a colher. 

Futuro (o amanhã) que é  resultado da colheita da semente plantada ontem (o passado), cuidada ou descuidada hoje (o presente).

O passado é visto, normalmente, em função de duas realidades distintas e inseparáveis: o lado positivo e o lado negativo, pois o ser humano, não sendo perfeito, varia nas suas caminhadas entre estes dois percursos.

Há quem use e abuse do passado apenas tomando em consideração certas referências, por conveniência, obviamente, esquecendo-se que a memória colectiva, no seu registo, não distingue - excluindo, o passado por etapas positivas ou negativas, ou em função de protagonistas e da época dos acontecimentos registados.

Nós somos o passado, porquanto elos de continuidade de gerações que não devemos apagar dos registos desse mesmo passado, ou assim não fosse, como poderíamos argumentar a nossa própria existência?

Uma das razões dos sucessivos falhanços na reconciliação da família guineense, por exemplo, está nas diversas tentativas de se querer apagar os registos do passado nas suas várias formas e categorias, concretamente no que diz respeito aos erros cometidos.

O passado, disponibilizado como livro aberto, é a melhor ferramenta de aprendizagem  no sentido de  aproximar as pessoas das realidades em que vivem.

Quando as pessoas conhecem o meio à sua volta, quando conseguem distinguir o bem  e o mal através dos registos de aprendizagem que o passado, como livro aberto lhes proporciona, então a tendência é evitar cometer os erros do passado e aperfeiçoar as realizações positivas que os registos do passado contêm, ou seja, "deixa-se para trás" o que não é bom e evolui-se no que as experiências dos registos definem como positivo. Esta é a lógica racional positiva que faz a diferença na evolução das sociedades contemporâneas.

Na Guiné-Bissau, a evolução não existe, mas sim retrocesso da sociedade, que passa precisamente pelo inverso da lógica racional positiva, ou seja; cultiva-se o erro, pois paradoxalmente, é tido como algo fácil de conseguir e das suas consequências, advêm benefícios para quem os comete.

Na Guiné-Bissau temos assistido, desde sempre, a tentativas de assassinato do nosso próprio passado, principalmente, por parte de quem dirige os destinos do país!

Pessoas que, por estarem ou terem estado no poder, cometeram, ou têm cometido diversos erros, o que seria normal, na condição de humanos, mas anormal perante a constatação de que, por cada erro cometido, deve-se evitar a sua repetição e não é isso que acontece no dirigismo da Guiné-Bissau.

Erros, que se podem definir por categorias, sendo que a maioria deles se insere numa catalogação que podemos, de  forma generalizada, designar por CRIMES LESIVOS À PÁTRIA!

Se pararmos para reflectir sobre o nosso percurso desde a proclamação unilateral da nossa independência em 1973 e tomando a verdade como base de avaliação desse mesmo percurso, certamente que hoje, os mais esclarecidos não podem ficar indiferentes a tanta conivência/cumplicidade pela desgraça que se abateu sobre a Guiné-Bissau.

Mas quem tem medo do passado?

Só teme o passado quem realmente teve participação negativa, directa ou indirectamente e consta no percurso histórico que a memória colectiva guineense regista, ainda que não compilada, mas gravada no ecrã que são os olhos e as mentes das pessoas!

Só teme o passado quem tem a mentira como princípio, ao invés da verdade!

Só teme o passado quem faz da Injustiça o pilar que deve ser a Justiça!

Porque continuam alguns a confundir o facto de se querer dar a conhecer o passado, livro aberto para consultas, esclarecimentos e registos, com questões como ressentimentos, incentivos à vingança, ou mesmo má imagem para o país, etc.?

Porque os que sustentam esta teoria não fazem mais do que confirmar que não cultivam da melhor forma o exercício da mente. É-lhes difícil ir ao fundo das questões, ou seja; ao encontro de respostas, porquanto serem conformistas e amnésicos (por conveniência ou limitação), bem como, nalgumas situações, serem elos da corrente negativa que pretende apagar parte da nossa memória colectiva, por razões de interesse pessoal, obviamente!

Não se deve projectar o futuro sem contemplar aspectos do passado e do presente e esses teóricos demonstram não ter pontos de referência na programação de objectivos sustentados para o futuro da Guiné-Bissau!

Há pessoas que dizem que as minhas reflexões contêm espírito de vingança, ódio, ressentimentos etc., porque continuo a insistir na abordagem de assuntos do passado. Nada mais cómodo para quem  me critica por isso, mas não tem coragem para, positivamente, chamar a atenção dos que comprovadamente, prejudicaram e têm prejudicado o país e constam dos registos da memória colectiva do nosso povo!

Quando é que os amigos dos malfeitores terão coragem para lhes dizer que devem aprender com os erros/crimes cometidos no passado para que os mesmos não se repitam no futuro, a bem da Guiné-Bissau e dos guineenses?

Quando é que os amigos dos malfeitores terão coragem , não só de elogiar o desempenho de brilhante guerrilheiro (como se tem dito), que foi por exemplo, o general João Bernardo Vieira, mas também, de responsabilizá-lo pelos assassinatos e desgovernos de duas décadas à frente do dirigismo nacional?

Será que os registos da memória colectiva guineense só contemplam as acções de Nino Vieira enquanto guerrilheiro?

Claro que não!

Porque se julga que manter vivas as memórias do passado é prejudicial à sustentabilidade de um clima de paz e estabilidade no país?

A Guiné-Bissau é hoje o que é, precisamente por não ser um país capaz de se olhar ao espelho, de ver os seus problemas de forma séria e tentar solucioná-los.

Os guineenses, erradamente, continuam a pensar que quem critica o que está mal no país, é contra o interesse nacional e para se falar do país, só se devem dizer coisas boas, mesmo que, à vista de todos, o mal persiste e vai fazendo vítimas entre os próprios guineenses, mesmo tendo em conta que esse mal já vem do passado!

Quem pensa de forma livre (não condicionada), no interesse do país e dos guineenses, sabe que  devemos cultivar o princípio da verdade e ter a Justiça como instrumento de sustentação do Estado de Direito que queremos que seja a Guiné-Bissau.

Se hoje chegamos ao ponto em que chegamos, pela negativa, devemos olhar para trás (passado) para compreendermos as razões dos nossos falhanços!

A Paz e a Estabilidade cultivam-se e na Guiné-Bissau, essas sementes ainda não foram lançadas à terra contrariamente ao que se tornou usual afirmar, porquanto os erros do passado continuarem a ser modelos de referência no presente, quando há muito devíamos ter optado por fórmulas seguras, realistas, sustentáveis e positivas que a Paz e a Estabilidade representam no seu todo, num conceito universalista e não exclusivo à Guiné-Bissau, conforme os interesses e conveniências do poder!

Infelizmente, ainda hoje, à verdade contrapõe-se com a mentira; à Justiça contrapõe-se com a impunidade e por aí fora...Por isso, as memórias estarão sempre presentes, porquanto, pontos positivos de referência comparativa e não elementos malignos na caracterização e formação de um retrato anti-patriótico dos que pensam e vêem o país de forma diferente, mas pela positiva!


Se hoje a Guiné-Bissau está como está, a responsabilização maior cabe naturalmente aos guineenses mas, não se deve omitir o envolvimento da Comunidade Internacional nas diversas crises que fizeram com que a situação no país chegasse hoje ao ponto em que chegou.

Tornou-se frequente a contradição entre organismos internacionais, tais como as Nações Unidas e certos países aglomerados na estrutura que designamos como Comunidade Internacional, em relação a constatações, avaliações e posicionamentos sobre a Guiné-Bissau.

Tão depressa se diz que a Guiné-Bissau é um país muito instável e à beira da explosão, como de repente se diz que está tudo bem e o país caminha para a estabilidade.

Os guineenses devem tirar conclusões, fazendo leituras e interpretações quer das suas próprias constatações quer das constatações e avaliações feitas pela Comunidade Internacional em relação ao país.

Países como a França, Portugal, a China, a Líbia, Marrocos e o Senegal, bem como organismos internacionais, tendo à cabeça as Nações Unidas, têm contribuído para que o mal seja sinónimo de positivismo na Guiné-Bissau.

Não basta a injecção de dinheiro para que se pense que se está a ajudar o país!

A quem serve o dinheiro que tem sido supostamente disponibilizado em nome do povo da Guiné-Bissau e na prática não o é; dinheiro esse e outras ajudas que têm contrapartidas de retorno em vários sectores para os referidos países e, também para as instituições como as Nações Unidas?

A Guiné-Bissau não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades havendo uma rede de cumplicidade conspirativa interna a favor de interesses externos, (quer no tocante ao narcotráfico, quer nas relações entre países e instituições), que se aproveita das fragilidades do país para hipotecar os seus recursos, de valor superior aos dinheiros e ajudas disponibilizados!

Quem ajuda de boa fé, faz questão de seguir o percurso dessas ajudas, questionando se necessário (a aplicação das mesmas), caso os resultados não forem visíveis, no entanto, não é isso que acontece nas várias iniciativas que se dão a conhecer e aqui, olhando para o passado, vemos que, em função da impunidade que cresce, cada vez há mais pessoas que se aproveitam dos dinheiros do país ou doados ao país, para as suas realizações pessoais, pois a Justiça não actua, porque o sistema não permite, como tem sido ao longo dos anos (ter em conta registos do passado).

Um dos países que mais apoios concedeu à Guiné-Bissau desde os tempos da luta armada, a Suécia, resolveu em 2005 suspender todas as ajudas ao nosso país, argumentando que já era altura de "a Guiné-Bissau caminhar pelos seus próprios pés".

Não havia dúvidas em relação às conclusões do governo sueco, mas ainda assim, pessoalmente, achei que era deveras penalizador para o povo guineense essa decisão.

Não sei se é hábito cidadãos comuns terem reacções do género, mas para sensibilizar o governo sueco sobre o prejuízo duma tal decisão para a Guiné-Bissau, escrevi uma carta ao Primeiro-Ministro da Suécia, carta essa extensiva ao povo sueco.

Carta recebida, resposta enviada, pelo Gabinete do Primeiro Ministro sueco, dando conta do assunto ter sido  encaminhado para o Ministério Sueco dos Negócios Estrangeiros.

Carta aberta a Sua Excelência o Senhor Primeiro Ministro do Reino da Suécia

 

Ex.mo Senhor Primeiro Ministro 

Antes de mais,  gostaria de lhe dizer que esta carta a si dirigida é também extensiva ao povo amigo da Suécia.

Sem rodeios de apresentação, porque o propósito desta carta não é a minha pessoa, Fernando Casimiro (Didinho), mas sim o meu país, a Guiné-Bissau, peço-lhe, Excelência, a sua especial atenção e consideração para esta minha reflexão que se segue: "Três razões para que a Suécia não suspenda as ajudas à Guiné-Bissau".

1-Pela Vida

" A vida só tem sentido se, para além de nós, outros também puderem viver..." Fernando Casimiro (Didinho)

Com esta minha pequena, mas abrangente meditação, quero sensibilizá-lo, Senhor Primeiro Ministro, para a importância que a ajuda sueca representa no sustento das condições de vida das populações da Guiné-Bissau.

O anúncio oficial do termo da cooperação bilateral entre a Suécia e a Guiné-Bissau, foi feito em Bissau, tendo como justificação, a necessidade de, após mais de 30 anos de assistência técnica e financeira, ter chegado a hora da Guiné-Bissau "começar a andar pelos seus próprios meios".

Esta decisão não pode deixar indiferente nenhum cidadão guineense! A Suécia, sempre foi e continua a ser uma referência no modelo de ajuda aos povos e países menos desenvolvidos. A Guiné-Bissau e os guineenses reconhecem-no e agradecem.

Esta decisão, Senhor Primeiro Ministro, ainda que se possa aceitar e, tendo em conta a forma lacónica como foi comunicada, por um lado penaliza o povo da Guiné-Bissau, que continua carente de ajuda externa, mas por outro, vem demonstrar o quão urgente a Suécia em particular e o Mundo em geral, devem reformular todo o processo de ajudas aos países carenciados, de forma a que não se continue a alimentar fracassos, não se continue a enviar ajudas que depois são canalizadas para outros fins que não os apoios específicos previamente determinados.

Entre a Suécia e a Guiné-Bissau e nas pessoas de Olof Palme e Amilcar Cabral, nasceu uma relação de amizade digna do simbolismo caracterizador do que é suposto ser a convivência entre povos.

A Suécia, que tive a oportunidade de visitar por 2 vezes: 1984 e 1986, sempre me marcou pela imagem de um modelo a que chamo: "Pelo Social, Pelas Pessoas".

Os inúmeros e avultados apoios concedidos à Guiné-Bissau até aos dias de hoje, não conseguiram atingir, na verdade, os resultados esperados. Mas, e precisamente porque importa analisar os fracassos para se arranjar soluções, é que a Suécia e a Guiné-Bissau se devem sentar à mesma mesa e dialogar.

Dialogar no sentido de possibilitar que as ajudas a disponibilizar sejam efectivamente úteis através de um novo modelo de ajuda e de cooperação baseado nas realidades concretas da Guiné-Bissau e na disponibilidade objectiva da Suécia.

Excelência, a relação de amizade que existe entre a Suécia e a Guiné-Bissau, entre o Lars e o Malam, entre a Ulla e a Binta, entre o Erik e o Pansau, por exemplo, aconselha a que se dê uma nova oportunidade aos mais desfavorecidos na Guiné-Bissau.

Sectores vitais como a Educação e a saúde, precisam continuamente da ajuda sueca.

Os projectos das ONG´s precisam continuamente da ajuda sueca, pois as ONG´s chegam onde o Estado não chega.

2-Pela Democracia

Não se pode passar ao lado das constantes turbulências político-militares na Guiné-Bissau quando se faz o balanço das ajuda recebidas da Suécia no quadro da cooperação até aqui existente.

Conhecedor dos principais problemas sociais da Guiné-Bissau, a Suécia desde cedo compreendeu a necessidade de apoiar a reforma nas Forças Armadas, disponibilizando meios financeiros para o efeito no intuito de se prevenir situações de instabilidade política, económica e social. Meios esses destinados à desmobilização e integração de militares na vida social activa.

A Suécia também disponibilizou ajudas consideráveis à Liga Guineense dos Direitos Humanos, contribuindo desta forma para o fortalecimento das estruturas democráticas na sociedade civil guineense.

Porque é preciso continuar a sensibilizar os guineenses para a necessidade de uma rápida assimilação dos conceitos da democracia, ainda que adaptada às realidades do país, a ajuda sueca continua a ser indispensável.

Indicar os mais de 30 anos de ajuda Sueca à Guiné-Bissau é positivo na transmissão de uma relação de amizade e de cooperação, mas não pode ser definida como um período que estabelece etapas de reconhecimento na continuação ou suspensão das ajudas e da cooperação entre os 2 países.

Porque no momento actual se estão a dar passos positivos no sentido do reencontro com a estabilidade e porque a execução de reformas necessárias para uma melhor implementação dos princípios democráticos e da sustentação de um Estado de Direito na Guiné-Bissau também necessitarem de apoios de países amigos como a Suécia, peço-lhe, Excelência, que reconsidere a suspensão das ajudas à Guiné-Bissau.

3-Pelo desenvolvimento

A mudança geracional, aliada ao crescendo de quadros formados, tem contribuído positivamente para a diversidade da mentalidade dos guineenses, numa visão futurista rumo ao desenvolvimento.

Nesta perspectiva, Senhor Primeiro Ministro, estamos perante a necessidade de se continuar a apoiar a Guiné-Bissau na busca de pontos de referência que possibilitem o fortalecimento do espírito de iniciativa bem como a capacidade de inovação dos seus recursos humanos.

Esta talvez seja a melhor altura não para suspender as ajudas à Guiné-Bissau, mas sim para reforçar essas ajudas. 

A Guiné-Bissau precisa reganhar a confiança dos seus amigos e parceiros estratégicos é certo, mas, o momento é de viragem e se os amigos e parceiros estratégicos não tiverem em linha de conta que as mudanças que estão em curso precisam de motivação, de apoios, então estarão todos a contribuir  não para a recuperação de um país, mas sim para o afundar desse mesmo país.

Excelência, por Olof Palme e Amilcar Cabral, pela Suécia e pela Guiné-Bissau, faz sentido criar um novo modelo de ajuda e cooperação.

Termino a minha carta desejando-lhe óptimo desempenho no exercício das suas funções.

Com os melhores cumprimentos,

Fernando Casimiro (Didinho)

07.03.2005

English version Versão Inglesa


From: sb.registrator@primeminister.ministry.se

To: fernando.casimiro@mail.telepac.pt

Sent: Monday, May 09, 2005 1:38 PM

Subject: SB2005/5906

Postal address        Telephone        E-mail: registrator@primeminister.ministry.se

SE-103 33 Stockholm        +46 8 405 10 00

SWEDEN

Visitors' address        Fax

Rosenbad 4         +46 8 723 11 71

2005-05-09  SB2005/5906

Prime Minister Office

 Sweden

Assistant

 Karolina Stromberg

Fernando Casimiro

fernando.casimiro@mail.telepac.pt

On behalf of the Swedish Prime Minister, Mr. Goran Persson I wish to thank you for your e-mail regarding the relations between Sweden and Guinea-Bissau.

In order to make sure your letter gets the right attention I have forwarded it to the Ministry for Foreign Affairs where they deal with issues like this one.

Sincerely yours, 

Karolina Stromberg

É claro que não houve recuo na decisão do governo sueco, até porque desde essa altura, até à realização das eleições presidenciais de 2005 na Guiné-Bissau, as crises político-militares foram-se sucedendo e, claro está, isso não poderia abonar a favor do reatamento da ajuda sueca ao país.

É importante salientar que os suecos conhecem e bem certas realidades guineenses, o que fez com que as relações entre a Suécia e a Guiné-Bissau nunca fossem relações baseadas na hipocrisia, contrariamente ao que se verifica entre a Guiné-Bissau e muitos países nos dias de hoje.

Há tempos, um governante guineense disse-me, bastante radiante, que a China ajuda desinteressadamente a Guiné-Bissau, bastando o pais pedir para construir esta ou aquela infra-estrutura, para imediatamente o governo chinês aceitar o pedido.

Naturalmente, não quis duvidar do que tinha acabado de ouvir, mas fiz ver a essa pessoa que, por detrás dessa abertura poderiam estar contrapartidas que ele próprio, apesar de ser governante, desconhecia, e que não teria necessariamente a ver com o seu campo de acção.

Ficamos cada qual com os seus pontos de vista, mas há cerca de 2 meses, um amigo cabo-verdiano que reside em França enviou-me uma mensagem, dando-me a conhecer que tinha visto num canal de televisão francês, uma reportagem sobre os navios pesqueiros chineses nas águas territoriais da Guiné-Bissau e em que, num único dia de pesca, os chineses capturavam o equivalente ao pescado capturado pelos autóctones num ano! Será que os guineenses sabem que por detrás das supostas ajudas a custo zero, o país está a compensar à China desta forma?!

Quem pode imaginar o futuro dos nossos mares, quando hoje se está a destruir as espécies, através da pesca desregrada que praticam os pesqueiros chineses e não só?

Há muito que dinheiros do Tesouro Público guineense são desviados por governantes guineenses para agências bancárias na Europa, o que não deve passar despercebido  aos próprios governos europeus.

Há muito que apartamentos de luxo e vivendas são comprados a pronto pagamento na Europa e também em certos países africanos, por guineenses afectos ao poder, à custa do Tesouro Público guineense directa ou indirectamente, ou à custa da lavagem de dinheiro do narcotráfico, sem que desses países se questione o que quer que seja!

Há muito que a Comunidade Internacional fala do narcotráfico na Guiné-Bissau e, pelos vistos, continua a fingir não saber quem está por detrás de tudo isso, num país onde quase todos os guineenses sabem quem é quem no dito negócio!

Abordar o momento presente  da Guiné-Bissau implica necessariamente olhar para o passado.

Gostaria de desafiar países e instituições internacionais que ao longo dos quase 35 anos de independência ajudaram financeira e materialmente a Guiné-Bissau, a divulgarem os valores monetários dessas ajudas!

Certamente, numa perspectiva positiva, cometendo e corrigindo erros, uma utilização racional positiva dessas ajudas permitiria ao país estar hoje numa situação diferente, para melhor, o que não acontece, porquanto, não se ter tido em conta as exigências obrigatórias do rigor na caminhada para o desenvolvimento, quer por parte dos governantes guineenses, quer por parte dos doadores internacionais.

O que não acontece, igualmente, por não se ter accionado os mecanismos legais de um Estado de Direito, de forma a inquerir, responsabilizar e punir, judicialmente, os que lesaram os interesses nacionais, em proveito próprio, etc.

A Guiné-Bissau há muito que deixou de ser levada em consideração como país de pessoas sérias, cultas e competentes!

Desde há muito que perdemos o estatuto de sermos referenciados orgulhosamente, como sendo o país de Amilcar Cabral, que a heróica luta de libertação nacional nos conferiu. As respostas a esta e a outras constatações estão presentes nas páginas do livro aberto que é a nossa memória colectiva. Não estão no futuro, mas no passado!

Se hoje, João Bernardo Vieira está de novo no poder na Guiné-Bissau, a responsabilização por tamanha irresponsabilidade  não se limita aos guineenses que o apoiaram, mas sobretudo à França que sempre o apoiou e continua a suportá-lo, vendo nele um defensor dos seus interesses na região, independentemente do que os guineenses pensam ou dizem sobre o próprio Nino Vieira!

Portugal e a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), por força das circunstâncias, sempre pactuaram com as convergências dos interesses franceses na região, interesses esses que dão vantagem ao nosso vizinho Senegal, prejudicando as viabilidades de desenvolvimento da Guiné-Bissau.

A caminho de 35 anos de independência, quem pode ignorar o passado?

Há dias, em conversa com alguém, fiquei a saber que depois do golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, em que foi derrubado Luís Cabral, primeiro Presidente da Guiné-Bissau, e que, detinha o Bilhete de Identidade nº2 emitido pelos serviços de identificação da Guiné-Bissau, visto o nº 1, ter sido postumamente atribuído a Amilcar Cabral, fundador da nossa nacionalidade, que João Bernardo Vieira, tinha simplesmente alterado o registo dos arquivos de identificação, retirando a Luís Cabral o registo nº2 que lhe tinha sido conferido, passando ele, João Bernardo Vieira a ser o cidadão nº 2, por ter ascendido ao cargo de Presidente da República...

Quem pode fechar os olhos à pobreza que acompanha a maioria dos guineenses, cuja sobrevivência tem sido possível graças ao apoio de familiares que trabalham no estrangeiro?

Seria bom que a Western Union, bem como bancos portugueses e não só, facultassem números sobre as remessas enviadas por trabalhadores guineenses no estrangeiro, para que se possa ter uma noção do impacto de contenção  e alívio da tensão social que essas remessas têm na Guiné-Bissau.

No entanto, há malfeitores que continuam a desviar dinheiros do país, construindo palacetes, quer com  dinheiros do erário público, quer com dinheiros do narcotráfico, vangloriando-se de um estatuto no presente que o passado não regista em termos de heranças ou negócios lucrativos legais, que lhes possa ter beneficiado!

E continuamos indiferentes em relação a tudo que a nossa memória colectiva regista, porque julgamos que a Paz e a Estabilidade conseguem-se com a indiferença e nos murmúrios das nossas lamentações à sombra de uma qualquer bananeira que nos vá dando bananas, enquanto houver...

O país deve salários a muita gente, não cumpre os seus compromissos com o povo trabalhador, mas garante dinheiro para os compromissos e regalias dos governantes.

Há anos que existe uma Missão diplomática da Guiné-Bissau em Portugal.

Há anos que uma residência (foto) que está localizada numa zona próxima das instalações da nossa embaixada em Lisboa, é tida oficialmente como residência do chefe da Missão Diplomática, neste caso, o Embaixador.

Entretanto, há anos que nenhum embaixador reside na dita residência (foto), sendo que, no passado, chegou a ser ocupada por filhos e familiares de Kumba Yalá, bem como algum pessoal afecto à Embaixada durante o período em que Kumba foi Presidente da Guiné-Bissau, tendo o embaixador que residir noutra casa, sendo que, um dos embaixadores de então, Joãozinho Vieira Có, que também foi Ministro dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau, na sua missão de embaixador em Portugal, teve que solicitar uma habitação camarária a uma autarquia da Grande Lisboa, para se poder instalar.

A residência, nos dias de hoje, aparenta ter sido remodelada. Já não estão lá os filhos de Kumba Yalá, mas continuam por lá, salvo erro, 2 pessoas dos serviços gerais da nossa embaixada.

A vivenda não está, no entanto, registada como propriedade da embaixada da Guiné-Bissau e, nem consta fazer parte de um presumível acordo de cedência mútua entre os governos de Portugal e da Guiné-Bissau a nível de instalações diplomáticas, como se tem argumentado.

De quem será então a dita vivenda, ou melhor, quem utilizou o dinheiro da Guiné-Bissau para a sua aquisição e, posteriormente não a registou como património do país?

Porque será que o actual embaixador não utiliza a referida residência, que até vale milhões, poupando os gastos do nosso país no pagamento de outra residência que deve estar a usar actualmente?

Ou será que já se pagou a actual residência do actual embaixador, cunhado da esposa do general João Bernardo Vieira, nos mesmos moldes em que no passado se adquiriu a vivenda (foto) da Av. Torre de Belém, ao nº12, de forma a que futuramente seja mais uma casa adquirida com o dinheiro da Guiné-Bissau e registada em nome de qualquer pessoa?

O país vive na pobreza extrema, mas há dias, aquando da cerimónia de lançamento em Lisboa, do livro "Admirável Diamante Bruto e outros contos" do escritor Waldir Araújo, assisti à chegada do nosso Embaixador, num digno Mercedes... qual crise, qual quê!

Será que todas as nossas Missões Diplomáticas têm Mercedes do tipo?

Quem paga e como, essas mordomias, quando os nossos funcionários esperam e desesperam que o Estado lhes pague anos de salários em atraso, tendo filhos e familiares para cuidar?!


Recentemente, o jornal português  Público publicou uma reportagem sobre a questão do narcotráfico na Guiné-Bissau numa referência ao envolvimento e benefício de militares guineenses com o negócio. Sabiamente, a reportagem toma em consideração o passado e o presente na abordagem dos assuntos publicados!

De dois pontos de vista apresentados: um do Presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos e outro, do cineasta guineense Flora Gomes, sinto-me tentado a comentar a opinião do Flora Gomes, discordando dos seus pontos de vista, mas respeitando-os.

Para mim, Flora Gomes defende "amigos da luta", argumentando com o facto de muitos terem feito "coisas extraordinárias na luta de libertação", esquecendo-se de que, as coisas boas feitas na luta, ficaram-se por esse período, pois se assim não fosse, hoje, certamente, com os ensinamentos de Cabral, a Guiné-Bissau seria uma referência pela positiva.

E porque será que só se deve falar das coisas extraordinárias da luta de libertação, fechando os olhos ao que acontece no presente?

Não se generaliza a questão do narcotráfico aos militares, aos políticos e governantes, mas sim, tem-se referenciado nomes e áreas de acção de pessoas,  porquanto não haver provas de facto, ligadas ao narcotráfico. O que não significa que se esteja a generalizar.

Por outro lado, Flora Gomes demonstra não ter força moral, como agente cultural, dado às massas, para tentar inverter a situação por que passa o país, pois ele como produtor cinematográfico, pode e muito, contribuir para a consciencialização do povo guineense!

Acalmia militar não é alheia ao narcotráfico que invadiu a Guiné-Bissau

21.03.2008, Ana Dias Cordeiro (textos) e Nuno Ferreira Santos (fotos), em Bissau


Passado e presente parecem coincidir num momento de trégua. Por bom senso dos líderes? Ou enriquecimento daqueles que antes faziam a guerra?


Crianças de várias idades caminham em fila ao longo da estrada. Sozinhas ou em pequenos grupos. Com sacolas ou cadernos desfolhados. De mãos baloiçando sem nada, passo apressado, quase sempre um sorriso na cara. Marcham a caminho da escola, longe, por vezes muito longe, da tabanca (aldeia) onde vivem. São poucas as que não desistem. Ninguém ainda pensou num transporte para elas.
A outras horas do dia, são mulheres e também crianças que caminham levando à cabeça bidons de água e lenha para fazer carvão e vendê-lo nesta mesma estrada que liga Bissau a Bafatá, no Leste.
Entrevêem-se casas com telhados de colmo. Parecem vazias - como se aqui se vivesse do nada. O verde dos campos não brilha como em estação de chuvas. Mas cobre extensões quadradas de colheitas, num país quase sempre mergulhado na incerteza. Numa ou noutra casa, rara, um cartaz do Presidente, João Bernardo (Nino) Vieira, colado ao lado da porta.
Nino Vieira regressou do exílio em Portugal e foi eleito em 2005, depois de deposto no conflito com a junta militar de 1998 e 1999. Foi aclamado por alguns, temido por muitos. Esperava-se que o seu regresso levasse o país ao "caos", diz o presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), Luís Vaz Martins, aludindo aos potenciais conflitos com os militares da junta que o depuseram e hoje estão no topo da hierarquia das Forças Armadas (FA).
O caos não aconteceu
Porém, passado e presente parecem coincidir num momento de trégua. O esperado caos não aconteceu. Por experiência ou falta de margem relativamente às FA, Nino Vieira optou pela convivência pacífica. "Ele soube gerir a situação", sintetiza Vaz Martins. "Já há dois anos que não se vivem situações verdadeiramente assustadoras. Isso tem a ver com a postura do Presidente, que é também um militar", sustenta Vaz Martins, que foi um dos maiores críticos do seu regresso.
Um país mais pobre
A Guiné-Bissau é hoje, apesar da relativa estabilidade, muito mais pobre do que antes do conflito de 1998 e 1999 e dos quatro anos da presidência de Kumba Ialá. Em meados dos anos 1990, um terço da população vivia com menos de um dólar por dia. Hoje, são cerca de dois terços nessa situação. Mesmo assim, diz o secretário de Estado português dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, João Gomes Cravinho, que esteve recentemente em visita oficial ao país: "Houve uma melhoria nos últimos 12 meses. E, por isso, há que continuar este caminho."
O Parlamento guineense aprovou recentemente a controversa Lei da Amnistia, que perdoa os crimes no âmbito dos conflitos político-militares até Outubro de 2004 - nesse mês foram assassinados o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), general Veríssimo Correia Seabra, e o responsável pela Informação das FA, coronel Domingos de Barros. A lei é porém vista como um passo para uma "verdadeira reconciliação" e para se avançar para a urgente reforma das FA. Subjacente a esta reforma tem de estar a aceitação por parte dos militares de partirem, sem receio de serem perseguidos judicialmente ou de viverem sem recursos. Junto ao quartel-general e ao Ministério da Defesa, em Bissau, estão a ser construídos, com dinheiro da cooperação chinesa, casas para os oficiais.
O dinheiro da droga
Também estes têm sido elogiados pela sua contenção. Estará ela ligada a uma maior satisfação? Para alguns, terá sido o dinheiro do narcotráfico, desde que a Guiné-Bissau se transformou num importante ponto de passagem para a droga (que vem da Colômbia com destino à Europa), que permitiu satisfazer algumas altas patentes das FA e propiciar esta estabilidade. "Sabem que, se nada mudar, continuarão a tirar proveito dessas situações", comenta Lídio, um estudante de Bissau.
Vivendas de dois ou mais pisos, com espaçosas varandas, estão a ser construídas. Dão um ar diferente à capital. Pertencem a altos responsáveis militares, ex-ministros (alguns muito próximos de Nino Vieira) ou funcionários em posições-chave, como por exemplo um responsável das alfândegas.
Para Luiz Vaz Martins, esta é uma importante razão para a recente acalmia no país. "A droga tem criado riqueza para alguns sectores das Forças Armadas que deixaram de ver a política como forma de enriquecimento. São pessoas que levam uma vida de luxo, com carros topo de gama e grandes vivendas. Tal só é possível com o dinheiro do narcotráfico", considera. "Este negócio, embora ilícito, acomodou aqueles oficiais que antes estavam interessados em interferir na política. Agora, uma situação de desestabilização também não lhes interessa, porque podem vir a perder tudo."
Reconhece que há aqui um "outro lado da moeda". E diz: "A droga tem um aspecto muito negativo. Mas veio trazer uma certa calma e estabilidade ao país."
O cineasta Flora Gomes tem outra visão. Para ele, a acalmia é sinal de uma "tomada de consciência" dos próprios militares. Quanto às informações que circulam sobre supostas conivências de militares com os narcotraficantes, diz: "É bom não generalizar. Desses homens, muitos deles fizeram coisas extraordinárias, na luta de libertação. É verdade que deve haver pessoas com alguma influência envolvidas nisso. Mas o que terá trazido essa estabilidade é também a consciência de que não é com a guerra que se reivindicam coisas, muitas das vezes justas."
Até quando a acalmia?
Esta "acalmia" inverteu as expectativas iniciais. No ano passado, e porventura decorrente do assassínio no fim de 2006 do ex-chefe de Estado-Maior da Marinha, Lamine Sanhá (que estaria em posição de denunciar algumas redes de negócios ilícitos), chegou a temer-se que a droga originaria um novo conflito.
Até quando então esta acalmia? Segundo o calendário eleitoral, estão previstas legislativas para este ano, embora ainda sem data marcada. Acompanha-as, porém, um dado inédito que preocupa os círculos diplomáticos: altos responsáveis dos dois principais partidos - PAIGC e PRS - terão já começado a visitar as populações no interior do país em busca de apoios a troco de dinheiro; e ao contrário das vezes anteriores, o dinheiro circula agora em grandes quantidades, justamente por poder estar relacionado com a droga.
Um país "extraordinário"
A luz ao entardecer, na entrada para Bissau, ofusca os receios que estes rumores - verdadeiros ou falsos - inspiram para os próximos tempos na Guiné. Antes realça a ideia dos que dizem que "este é um país extraordinário, onde as pessoas naturalmente se entregam umas às outras, sem reservas" - assim falava Carlos Schwartz, a propósito do reencontro de ex-combatentes guineenses e portugueses, no simpósio internacional de Guiledje, que a sua ONG Acção para o Desenvolvimento organizou em Bissau no início deste mês. Ou das pessoas que, segundo o realizador Flora Gomes, "isoladamente trazem uma luz, uma esperança de que os guineenses podem fazer coisas boas, embora sabendo que há dificuldades". O cineasta guineense fala do "estado de desespero em que a Guiné se encontra". Mas pede para não se olhar apenas para o "lado negativo". "Se nós, homens da arte, músicos, pintores, escritores, pudéssemos sair dessa órbita de confusão - em que não se vê a verdade - e inventar a nossa órbita, dos homens que sonham, faríamos da Guiné-Bissau um grande país."
O PÚBLICO viajou a convite de Cooperação Portuguesa
1/3
da população vivia abaixo do limiar da pobreza nos anos 1990.
Hoje 2/3 de pessoas estão nessa condição

 

As eleições marcadas para 16 de Novembro

Pude ver, pela televisão, o discurso encomendado do Sr. general João Bernardo Vieira, contraditório como sempre entre o que ele pensa e o que alguém escreve para ele ler.

Nenhum Presidente de qualquer República pode estar à vontade a discursar, quando o que está a ler, não foi por ele alinhavado. Quem conhece Nino Vieira sabe que nunca foi ele a escrever os seus discursos, isto, regressando aos registos do passado.

Um Chefe de Estado sem bagagem, que sempre precisou de perguntas, antecipadamente, para depois marcar uma data para ser entrevistado e, assim, ter já no papel as respostas para as questões dessa mesma entrevista...

Um Chefe de Estado que não aceita o debate, porquanto nunca estar a par do que se passa no seu próprio país!

No dia em que foi à Assembleia Nacional dar conta de que esta legislatura termina a 20 de Abril e, por conseguinte, o dia 21 de Abril seria um "novo" dia, Nino Vieira disse e todos ouviram e viram, que não marcava a data das eleições, porque o actual governo, incumbido da realização das mesmas, ainda não tinha conseguido reunir fundos para o efeito.

Horas depois, o mesmo Nino Vieira, já em casa, decidiu decretar a data de 16 de Novembro de 2008, como sendo a data para a realização das eleições legislativas na Guiné-Bissau.

O que é que aconteceu no espaço de poucas horas, para que Nino Vieira resolvesse marcar uma data?

O governo teria conseguido, em poucas horas, o dinheiro prometido por organismos internacionais e alguns países, para a realização das eleições?

Claro que não!

Convém, ao abordar a questão das verbas prometidas pela Comunidade Internacional para a realização das eleições legislativas este ano na Guiné-Bissau, não esquecer que a Comissão Nacional de Eleições já deu a conhecer que há facturas por pagar, das eleições anteriores, ocorridas em 2004 - legislativas e, 2005 - presidenciais!

Valores a ter em conta e que, obrigam a uma nova avaliação do montante total que deverá servir para custear as eleições deste ano como também para solver dívidas de eleições anteriores.

A Comunidade Internacional, incrédula com esta situação, não deverá, todavia, deixar cair por terra a realização das eleições, ainda este ano, tendo como argumento a falta de verbas, como prontamente Nino Vieira deixou transparecer!

É claro que Nino Vieira foi aconselhado a marcar a data das eleições, pois a questão das verbas, sendo promessa a concretizar pela Comunidade Internacional, não poderia ser usada para agravar, a tensão política e social no país.

Entretanto, é notória a má fé de Nino Vieira, no sentido de vir a protagonizar um novo episódio na governação do país.

As recentes consultas com a convocação do Conselho de Estado, partidos políticos e sociedade civil, não passam de meras formalidades, demonstrativas de cumprimento da Constituição, quando o Sr. general sempre violou a Constituição da República.

Hoje argumenta-se que caso decida dissolver a Assembleia e formar um novo governo, o seu governo, estará simplesmente a cumprir com o que consta na Constituição.

Também se ouviu o Presidente da Assembleia Nacional Popular, o Dr. Francisco Benante, com uma mão vazia de soluções, dizer que se está perante uma situação atípica, porquanto as eleições terem sido marcadas para 16 de Novembro e a presente legislatura terminar a 20 de Abril, o que cria automaticamente um vazio de poder, caso a Assembleia cesse funções e haja queda do governo.

Atípica porquê, Sr. Dr. Francisco Benante?

Quais são os papeis e responsabilidades das diferentes comissões da Assembleia Nacional Popular?

Quem tem a missão de estipular um calendário de actividades, bem como de discussões sobre as actividades constantes no calendário da Assembleia Nacional Popular?

Porque é que, sabendo que as eleições iriam ser realizadas este ano e que a data da marcação cabe ao Presidente da República, não se debateram antecipadamente, as duas habituais hipóteses que sempre são colocadas quando se trata da marcação de eleições, ou seja: o período anterior à época das chuvas e o período posterior à época das chuvas?

Tomando em consideração estes períodos, não se descortinaria a data do termo desta legislatura e a possibilidade de se criar o tal vazio de que agora se fala?

A situação é atípica, ou houve irresponsabilidade da Assembleia Nacional lidando com um assunto de tamanha importância, Sr. Dr. Francisco Benante?!

Para Nino Vieira, o regresso ao passado confirma-se em absoluto, porquanto, neste momento, constitucionalmente ter todos os poderes para decidir o que bem entender e, caso venha a vetar a recente emenda na lei, que prorroga o mandato dos deputados, não estranhemos que num dos seus discursos volte a dizer aos guineenses que até a sua camisa irá mandar na Guiné!

Onde está a leitura do passado, para que hoje se evitassem erros do género?

Nino Vieira só em última instância e por pressões externas, não vetará a emenda ora aprovada pelos deputados.

Há muito que o Sr. general vem sendo aconselhado pelo seu detractor principal num passado não muito distante, o Prof. Doutor, como faz questão de ser tratado, Francisco Fadul, actual Presidente do Tribunal de Contas, o mesmo Francisco Fadul que disse, em Dezembro de 1988, que Nino Vieira devia ser julgado!

O mesmo Francisco Fadul que disse na mesma entrevista de Dezembro de 1988, ao semanário Expresso, entre muitas coisas, o seguinte:

F.F. - Exactamente. Nino Vieira, que nunca recebeu herança que se conheça, que nunca recorreu a um crédito bancário significativo, hoje é um dos homens mais ricos do mundo.

EXP. - Do mundo?

F.F. - Sim. E Presidente de um dos países mais pobres do mundo. A sua fortuna está avaliada num montante aproximado ao da dívida externa da Guiné-Bissau.

EXP. - Essa acusação é pesada. Dispõe-se a prová-la em tribunal?

F.F. - Já escrevi um livro sobre isso, mas ninguém o imprimiu. Se for o caso, garanto que me defenderei

O mesmo Francisco Fadul que, recentemente, entrevistado pelo jornal Kansaré, disse  não viver do passado...

Ora aqui está um excelente exemplo de conveniência na abordagem do passado.

É Francisco Fadul, o actual homem de mãos de Nino Vieira, o mais que provável Primeiro-Ministro, caso Nino Vieira resolva dissolver a Assembleia Nacional Popular.

Quem não se lembra dos constantes e recentes ataques de Francisco Fadul, já na qualidade de Presidente do Tribunal de Contas, por decreto presidencial, ao ainda governo, saído do Pacto de Estabilidade Governativa?

Pessoalmente não concordo com o fim da legislatura só porque chegou a data exacta de  4 anos para o seu fim conforme estipula a Constituição. Na verdade foi o Sr. general João Bernardo Vieira, ao demitir o governo saído das eleições de 2004 quem possibilitou toda a confusão que hoje prevalece na questão da sustentação ou não da constitucionalidade dos órgãos de soberania.

Uma vez mais, devemos olhar para os erros do passado para termos presente o prejuízo que foram os vazios de governação, motivados por derrubes de governo; quer pelos poderes constitucionais, quer por golpes de Estado!

Mas seja como for, Nino Vieira não é solução, nem tem soluções para a Guiné-Bissau e o futuro do país, com ele, infelizmente, só pode ter como colheita a desgraça, que é o que ele sempre simbolizou nas suas governações!

Saibamos tirar ilações das lições do passado e não tentar apagar os registos do passado, sem os quais, jamais nos livraremos de cometer os mesmos erros, só dando conta disso, depois da constatação prática dos mesmos.

A Guiné-Bissau tem perdido muito tempo e oportunidades, por continuar a ser repetente da mesma classe, a 1ª, desde que entrou para a "Escola Primária" no patamar de formação dos Estados Independentes,  há quase 35 anos!

Apesar destas constatações, das contrariedades de alguns (poucos) positivismos e muitos pontos negativos, se tomarmos em consideração os falhanços do passado, e invertermos a bússola para uma rota virada para o positivismo, com muito trabalho pela frente, é certo, conseguiremos fazer da Guiné-Bissau um PAÍS a SÉRIO!

Não tenhamos medo do passado!

Vamos continuar a trabalhar!

Cultivamos e incentivamos o exercício da mente, desafiamos e exigimos a liberdade de expressão, pois é através da manifestação e divulgação do pensamento (ideias e opiniões), que qualquer ser humano começa por ser útil à sociedade! Fernando Casimiro (Didinho)

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