A MISSÃO MILITAR ANGOLANA EM GUINÉ-BISSAU (MISSANG) E OS INTERESSES ECONÔMICOS.
Timóteo Saba Mbunde * 26.04.2012 Desde 2010 cogitava-se envio para a Guiné-Bissau duma força de estabilização, a princípio de natureza multilateral ou regional em função de solicitações do executivo da Guiné-Bissau com vista a efetuar reformas nos setores da defesa e da segurança. O primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior declarou em Bruxelas: [...] O presidente da Guiné-Bissau já solicitou o envio de uma força de estabilização à comunidade internacional. A presença desta força em solo guineense visa criar condições adequadas para a construção de forças republicanas na Guiné-Bissau (O PAÍS 2010).
Porém, não era consensual a instalação de militares estrangeiros em Guiné-Bissau, muitos concordaram, mas igualmente muitos manifestaram que não era necessário. O próprio representante do secretário-geral da ONU em Guiné-Bissau, Joseph Mutaboba aponta: [...] Oficialmente a ONU em Bissau ainda não sabe o que realmente pretendem as autoridades guineenses, mas se vier a ser contatada analisará o assunto, mas [...] que se calhar o país precisa mais de um programa de reforma do seu exército do que mandar vir uma força ou missão de estabilização (BALDÉ, 2010). Apesar de alguns países a exemplo de Moçambique se sensibilizaram e disponibilizaram a participar em qualquer missão multilateral, O país (2010). Ressaltou o ministro moçambicano de negócios estrangeiros e da cooperação, Oldemiro Balói: [...] A República de Moçambique está disponível para participar em qualquer missão, incluindo numa força de estabilização na Guiné-Bissau, [...] Moçambique está aberto e disponível, para participar em qualquer missão que possa contribuir para os esforços de paz na Guiné-Bissau (O PAÍS, 2010).
O que se concretizou foi um acordo bilateral entre governos da Guiné-Bissau e Angola, gerando a instalação de MISSANG no território guineense em 21 de março de 2011. Além de mais, o governo Angolano passou a apoiar e a conceder linhas de crédito ao seu homólogo guineense. Em fevereiro de 2011 o congresso angolano aprovou um crédito de 600 milhões de dólares a favor da Guiné-Bissau (VOA VOZ DE AMÉRICA, 2011). Não se esperava que fosse um acordo bilateral (Bissau-Luanda) do qual se resultaria a instalação de uma força de estabilização na Guiné-Bissau, um procedimento raro nas relações internacionais contemporâneas. De fato, a expectativa era no mínimo a presença de forças de estabilização de natureza e caráter multilateral. O protagonismo de Angola se deve também ao fato de Estados fortes inclusive as instituições internacionais não terem barganhando a favor de uma força de natureza multinacional ao invés de uma missão de um só ator estatal, a Angola. O regime internacional, sendo conjunto de princípios, normas, procedimentos decisórios em torno dos quais convergem os atores sobre uma determinada matéria internacional Esteves (2003 p. 85), associado á problemática da Guiné-Bissau é menos politizado. [...] Quanto menos “politizado” for um regime (ou quanto menos conflito existir entre os principais atores) e, portanto, menos central e determinante for o diferencial de capacidade política dos membros sobre o resultado das negociações, maiores as chances dos atores não dominantes, em especial os países intermediários, de ter um papel de relevo no fórum. E, inversamente, quanto mais as negociações forem conduzidas com base na hierarquia de poder existente (regimes mais “politizados”), menor tenderá a ser o espaço para atuação dos países intermediários. A MISSANG gerou polêmica entre os atores políticos domésticos, os partidos de oposição a contestaram. O Partido da União Patriótica Guineense (UPG) qualifica a instalação das tropas angolas em Guiné-Bissau de ocupação estrangeira e que a classe castrense guineense é incompatível a uma força estacionária angolana no seu país, tendo em conta as características da MISSANG, com fortes tradições militar e de comando (NANSIL, 2011). Várias vozes políticas como a de Silvestre Alves, líder do Movimento Democrático Guineense discordaram com a presença angolana (CASSAMA, 2011). Em Angola também, muitos criticaram a postura Angolana: [...] De facto, Luanda tem apostado nos esforços em curso para se conseguir alcançar a estabilidade naquele país lusófono. [...] Ao mesmo tempo criticam, contudo este esforço financeiro que, segundo afirmam, serviria para dar resposta a muitas necessidades internas dos angolanos (Oliveira, 2011). Porém o governo do José Eduardo dos Santos se mostrava determinante a perseguir seus interesses no cenário internacional e colocando desta feita questões internas em segundo plano. Sobre a importância econômica, (MORGENTHAU 2003 p. 225) declara: Segundo MORGENTHAU (2003 p. 225), que o poder econômico pode exercer muita influencia sobre a determinação do poder de uma nação e capaz de gerar mudanças impressionantes. Em 17 de setembro de 2007, Guiné-Bissau e Angola assinaram um acordo de exploração conjunta de bauxite na região de Boé (sudeste da Guiné-Bissau).
Na ocasião Soares Sambú declarou à imprensa que seria criada uma sociedade anônima de capital comum, acrescentando que a empresa Bauxite Angola concederia ao governo guineense 13 milhões de dólares depois de determinados os prazos de pagamento pelas duas partes. A sociedade teria três acionistas, nomeadamente uma empresa pública guineense, com 10 por cento das ações, a outra angolana, com 20 por cento, e a Bauxite Angola, com os restantes 70 por cento. A empresa Bauxite Angola deve ainda comercializar e explorar o mineral e será autorizada a explorar outros minerais do subsolo do país. De acordo com o ministro guineense, estima-se que as reservas de jazidas de Bauxite na região de Boé atinjam 110 milhões de toneladas (MACAUHUB, 2007).
Diante desse quadro a declaração do ministro da defesa angolano ao Jornal de Angola (2011) se torna demasiadamente reducionista e limitada. Cândido Pereira Van-Dúnem diz: [...] A Guiné-Bissau é um país irmão, quer sob o ponto de vista de consangüinidade, quer do ponto de vista da natureza filosófica dos partidos que levaram os respectivos países às independências, nomeadamente o PAIGC e o MPLA. [...] Estamos apenas a retribuir um gesto magnânimo que os nossos irmãos da Guiné-Bissau demonstraram num passado não longínquo nem recente. Como deve saber (durante a luta armada de libertação nacional), contingente da Guiné-Bissau veio em socorro dos seus irmãos angolanos quando precisávamos da solidariedade internacional. Não se trata de um meio de troca, mas sim de uma relação de irmandade. Foram essas as razões que estiveram na base desta decisão política (MANJE; Da Rosa, 2011). A agência noticiosa MACAUHUB (2009) informou que a empresa Bauxite Angola construiria e geraria um porto de águas profundas em Buba (sul da Guiné-Bissau) nos termos de um acordo com o governo da Guiné-Bissau: [...] O presidente da Bauxite Angola, Bernardo Campos, disse que o futuro porto vai tornar-se a porta de entrada e saída dos produtos da Guiné-Bissau. A construção pela Bauxite Angola do porto de Buba, o maior do gênero na África Ocidental, enquadra-se no projeto de exploração da bauxite de Boé, num custo estimado em 321 milhões de dólares (MACAUHUB, 2009). Lembra-se que as reservas de bauxite da Guiné-Bissau estão estimadas em 113 milhões de toneladas. A “baixa política” (basicamente econômica), na atual ordem de interdependência complexa entre atores internacionais, as questões econômicas são muito importantes para os estados terem poder KEOHANE; NYE apud NOGUEIRA; MESSARI (2003, p. 85). Concluindo, a política externa de Angola através da MISSANG foi calculada e executada pelos formuladores da sua política externa em termos fundados nos interesses econômicos na Guiné-Bissau. Portanto, motivos econômicos impulsionaram a instituição da MISSANG, os defendidos objetivos relacionados à paz e estabilidade político-militar e institucional da Guiné-Bissau são meio que viabilizaria a consecução efetiva de metas econômicas estabelecidas. O que é que teria motivado as atuais articulações e arranjos laboriosos e inéditos da diplomacia angolana no plano internacional em sensibilizar incansavelmente como nunca aos atores estatais e organizações internacionais para intervirem na Guiné-Bissau? Teria sido apenas por amor a democracia, solidariedade, estabilidade? Duvido, então reflitamos.
Referências -MORGENTHAU, H. J. A Política entre as Nações: a luta pelo poder e pela paz, Brasília: Und, 2003. -ESTEVES, P. L. (org). Instituições Internacionais: Segurança, Comércio e Integração, MINAS Gerais, Belo horizonte: PUC - Minas, 2003. -NOGUEIRA, J. P e MESSARI, N. Teoria das Relações Internacionais: Correntes e Debates, Rio de Janeiro, RJ: Elsevier, 2005.
-Nansil, S. Guiné-Bissau: UPG considera Missão Militar Angolana uma ocupação. Bissau Digital. (2011) Disponível em: <http://www.bissaudigital.com/>. Acesso em: 07 Mar. 2012.
-Oliveira, Panguinho. Angola: apoio financeiro a Guiné-Bissau dá que pensar em Luanda. (2011). Disponível em: <http://www.vozangola.com/CM_2011.html>. Acesso em: 23 Fev. 2012.
-Guiné-Bissau quer força de estabilização. O País. (2010). Disponível em: <http://www.opais.net/pt/opais>. Acesso em: 08 Mar. 2012.
-Macauhub. Guiné-Bissau assina acordo com Angola para exploração de bauxite.(2007).Disponível: <http://www.macauhub.com.mo/pt/2007/09/17>.Acesso em: 13 Set. 2011.
-Balde, M. Mutaboba Considera que Força de Estabilização não é Necessária. (2010) Disponível em <http://www.rfi.fr/portail_br.asp>. Acesso em 13 Fev. 2012.
-Cassama, L. Missão militar angolana provoca polêmica na Guiné-Bissau. Voz da América. (2011) Disponível em<http://www.voanews.com/portuguese/news> Acesso em 01 Mar. 2012.
-Manje. B; Da Rosa. K. Ministro da defesa de Angola reitera apoio à Guiné. (2011). Jornal de Angola. Disponível em <http://jornaldeangola.sapo.ao/20/0/> Acesso em 26 Fev. 2012.
-Guiné-Bissau: Angolana bauxite angola vai construir porto em Buba. Macauhub (2009). Disponível em <http://www.macauhub.com.mo/pt/2009/05/18/7065/Acesso em 14 Mar. 2012.
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