A propósito dA candidatura de Carlos Gomes Júnior
“Ampus, garandis kuma kama bu
tá dita nel sabi só ora ku bu distindil coltcha”.
Olávio César Fernandes
01.03.2012
É
interessante o debate jurídico e político-social instalada com o anúncio oficial
de candidatura do cidadão Carlos Gomes Júnior (Cadogo Jr.) ao cargo do
presidente da República da Guiné-Bissau. A questão central colocada sobre a
legalidade ou não do ato produziu em larga medida interpretações tendenciosas,
quer para legitimar a intenção manifesta, quer para reprová-la a luz da
incompatibilidade funcional.
Mas, por
não ser especialista em matéria do direito reservo-me a não entrar em
detalhes. Porém, tendo em conta a azáfama necessidade de refletir o cenário
sob outra prisma, a observação que aqui faço pretende analisar e enquadrar a
situação, tão somente dentro do contexto político-institucional guineense e,
sobretudo, proporcionar um exercício que possibilite pensar nos riscos ou
benefícios da decisão que é aplaudida por uns e contestadas por outros.
Sem
sombra para dúvida, há que reconhecer que do ponto de vista
político-burocrático, extra-PAIGC sente-se, vê-se e percebe-se um aparente
reconhecimento das ações de incipientes políticas públicas realizadas pelo
Executivo liderado por Cadogo Jr. junto da massa eleitoral e também é
igualmente perceptível nos discursos de representantes de parceiros
internacionais no país.
Por
outro lado, do mesmo modo, vale considerar que no aspecto
funcional-institucional, principalmente, no da relação com a classe
castrense e classe política há uma percepção implícita ou explícita de falta
de confiança entre as partes que dissemina medo e insegurança com fortes
probabilidades de incentivar uma ação subversiva violenta no decorrer do
período eleitoral ou logo depois.
O grande
problema que tem conduzido os líderes políticos e militares ao colapso nas
últimas décadas na Guiné-Bissau, em parte, relaciona-se, entre outros
fatores, com o oportunismo cego, generalizado e desmedido de sua parte e de
seus principais colaboradores.
É
justamente no circuito deste oportunismo cego que tinha sido impossível
dialogar e convencer os Ninistas após a aterragem do helicóptero no Estádio
Nacional 24 de Setembro de que não era oportuno o regresso ao poder de Nino
Vieira, isso tendo em consideração a hostilidade do contexto historicamente
construída, e também porque nitidamente tinha perdido o seu poder de mando.
É verdade que uns apoiavam-no por convicção sobretudo por aquilo que
política e militarmente representava, mas uma boa parte dos apoiantes
circundantes via no regresso do chefe a oportunidade de se associarem a
movimentação e garantir o acesso aos recursos.
Em
relação à intenção de Carlos Gomes Júnior, a situação não difere muito em
termos contextuais de observação supracitada. A existência de crispações
fantasmagóricas ainda não exorcizadas perseguem e ameaçam à vista desarmada
a segurança no país e, consequentemente, a legitimidade do poder conquistado
nas urnas.
Senão
vejamos: normalmente um golpe de Estado é dado ao presidente da República e
não ao primeiro-ministro. Cadogo Jr. como primeiro-ministro já enfrentou,
pelo menos, de acordo com informações oficiais, três supostas tentativas de
alteração violenta da ordem constitucional.
Cronologicamente, o primeiro aconteceu no dia 5 de Junho de 2009 e resultou
nos assassinatos do deputado Hélder Proença, do ministro Baciro Dabó e mais
dois agentes, o segundo foi o inusitado caso 1 de Abril marcado pela
detenção por militares durante algumas horas do primeiro-ministro Cadogo
Jr., pela queda do então CEMGFA Zamora Induta e ascenção de António Indjai a
esse cargo e a saída do contra-almirante José Américo Bubo Na Tchuto da sede
das Nações Unidas em Bissau e o terceiro aconteceu no dia 26 de Dezembro de
2011 e resultou na detenção de contra-almirante José Américo Bubo Na Tchuto,
nos assassinatos de Vladmir Fernandes e do Major Iaia Dabó.
No
mínimo um fato novo, merecedor de uma especial atenção de estudiosos
interessados em observar e analisar as perspectivas da dinâmica subversiva
na Guiné-Bissau.
Entretanto, se é verdade que, como primeiro-ministro, Cadogo Jr. sofreu tudo
isso, não se pode esperar outra coisa, caso venha a ser eleito presidente da
República, senão a continuidade de ações violentas com o propósito de
alterar a ordem constitucional e afastá-lo do poder.
Bem,
vale também reconhecer que qualquer outro candidato vencedor do pleito de 18
de março terá igualmente pela frente um ambiente ameaçador e instável, mas
este cenário me parece ainda mais perigoso com a provável vitória eleitoral
de Cadogo Jr. Neste momento, apesar da evidência do riscos, parece difícil
fazer Cadogo Jr. e os Cadoguistas reconsiderarem a posição por dois motivos
claramente observáveis:
O
primeiro prende-se com interesses ocultos de investimento por parte de
países como Angola, China, Portugal, etc., que, obviamente preferem manter
um “interlocutor” para garantir a viabilidade dos empreendimentos iniciados.
E pelos vistos, tudo indica que será realizada uma campanha milionária.
O
segundo, que particularmente vejo como mais forte, é a aspiração pessoal
movida pela necessidade que o líder demonstrou ter de consolidar o seu poder
e, provavelmente, promover alterações políticas constitucionais.
Num país
institucionalmente democrático seria normal e natural a pretensão de Cadogo
Jr. concorrer e assumir a Presidência da República, mas no cenário atípico
que é desenhado e redesenhado na Guiné-Bissau essa atitude parece-nos
inoportuna para garantir a frágil estabilidade; inadequada porque
interrompeu um projeto de governação, e irracional porque ele está com
dificuldades em entender a realidade ao redor, mesmo tendo noção dos riscos
que corremos.
Depois
do dia 26 de Dezembro o filme que estamos a assistir na região circundante
da residência do primeiro-ministro parece o dos últimos momentos de Nino
Vieira – reforço enganador de aparato e dispositivo de segurança. Aliás, a
humilhação que os militares impuseram aos policiais muito recentemente em
frente à CNE precisa e deve ser entendida como um mau presságio. Se não
forem tomadas medidas adequadas, infelizmente, o destino político de Cadogo
Jr. também pode ser reduzido a ponta de AK.
Tendo em
conta o cenário possível, a posição mais sensata seria, a meu ver, que o
eleitorado guineense conseguisse eleger um candidato que possa articular de
forma serena e responsável para fazer equilibrar a relação civil/militar,
civil/civil e militar/militar que, sem dúvida, seria a ponte para permitir
que Cadogo Jr. continuasse a desenvolver seu projeto de governo até ao
fim do mandato e, com isso, permitir o eleitor novamente renovar o mandato
do PAIGC ou apostar numa outra legenda.
VAMOS CONTINUAR A
TRABALHAR!
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