A Quem Tributar?
Por: Francelino Alfa
15.04.2007
Este contributo vem no seguimento da reestruturação da Função Pública no país. Falar da tributação e contribuições para a Segurança Social é falar também da viabilidade do país. Mais cedo ou mais tarde, a sustentabilidade da Segurança Social, colocar-se-á ao nosso país. Lá diz o ditado: águas passadas não movem moinhos, e daqui em diante, o que interessará ao país, serão os efeitos que os impostos marginais (não dos impostos de corrupção!) terão sobre os incentivos à oferta de trabalho ou oferta de capital ao país, e que deverá traduzir-se objectivamente em investimento de que o país tanto carece. Uma sábia política de investimento é vital para a economia em que os rendimentos obtidos sejam utilizados no combate à pobreza e à miséria em que vive a esmagadora maioria dos guineenses; acabar com o escândalo da fortuna ilícita dos donos da terra, com amplos privilégios e condições de vida senão igual, todavia, muito aproximada à fina-flor dos países desenvolvidos, mantendo o povo à distância e afrontando sistematicamente a nossa inteligência.
Quase todas as actividades se encontram abrangidas pela Lei da Segurança Social. Os trabalhadores recebem as pensões de reforma que dependem dos seus rendimentos e das contribuições para a Segurança Social no passado. Quanto mais anos descontarmos para a Segurança Social maiores serão as prestações de reforma. O programa de segurança social também financia um programa para incapacitados e de seguro de saúde para os pobres e idosos. Para pagar esses benefícios os trabalhadores e os seus empregadores pagam imposto. O imposto é dividido entre trabalhador e patrão. Pelo menos é assim no mundo desenvolvido.
Ora, comédia à Guiné diz-nos que, alguns patrões pagam as suas contribuições ao Fisco mas o trabalhador da sua firma não paga nada ao Estado. Na verdade, o contrato é informal entre empregador e trabalhador, e em caso de doença ou desemprego, o Estado não presta apoio ao trabalhador. Pequenas lojas e mercearias; firmas de construção civil; empresas de serviços de transportes colectivos de pessoas e mercadorias, são apenas alguns exemplos dessa prática que lesa o Estado e prejudica grandemente o trabalhador. Como fazer para inverter esta situação? Quiçá, um study case para os nossos especialistas. Falar desta matéria envolveria aspectos técnicos, porque a incidência dos impostos através da economia, sobretudo da nossa (bastante informal), torna as análises extremamente complexas e não vou por aí, mas abordar alguns aspectos que julgo pertinentes.
Não é legítimo perguntarmos se a Guiné é um país viável? As pessoas são viáveis? Não quero extrapolar realidades económicas estruturadas e maduras como as dos países do Norte para o nosso país onde nem sequer a formação das infra-estruturas e das estruturas produtivas é realidade marcante e preocupação dos nossos dirigentes.
O país nunca dispôs de um sistema eficaz para o controlo do pagamento de impostos. Quando se fala, por exemplo, da crónica dificuldade dos sucessivos governos em reduzir as despesas correntes do Estado, pagar salários todos os meses, pagar os seus fornecedores de bens e serviços; … da evasão de alguns rendimentos através da economia subterrânea, não nos devemos esquecer os vários factores que estão na sua origem. A Guiné de hoje, é um país à “Bantabá*”! Quem paga em última instância um determinado imposto? O que sucede é que, um dos efeitos mais desastrosos deriva não dos níveis de tributação mas das diferenças entre as taxas de imposto que uns pagam – um Zé-povinho, sério e honesto paga porque não há maneira de fugir aos impostos, e outros –, um dirigente caloteiro, por exemplo – simplesmente não pagam. As Finanças oneram efectivamente a pessoa ou a empresa que paga o imposto. É assim mesmo! Sempre os mesmos a pagarem e benesses para os de costume!
Dificilmente teremos bons hospitais e bons centros de saúde, assistência médica e medicamentosa, pensões de reforma se poucos pagarem impostos. Podemos exigir boas escolas para os nossos filhos, boas estradas e boas pontes? …um aeroporto melhor, habitação social, uma força de segurança eficiente para policiar as ruas e garantir segurança e tranquilidade aos cidadãos? Bem o sabemos nós, que sem segurança não há democracia; sem segurança não há liberdade; sem segurança não há investimento, e é Democracia que permite isso, porque ela regenera e aceita a crítica. Ao contrário da democracia, Ditadura é estanque, não regenera e não tolera liberdade. Ditadura é horrível! Não ouve, não vê e não dialoga! E leva ao medo. O medo é terrível e não coaduna com democracia! E neste momento, está fortemente presente na nossa sociedade já de si paupérrima onde o Estado pouco funciona. Nenhuma democracia se ergue sobre esquecimento e medo. Jamais aceitemos “Democraditadura” na nossa terra (!) porque alguns senhores não querem perceber a profundidade imperativa da mudança positiva que a Guiné-Bissau reclama.
O país deve pagar os professores, os médicos, os juízes; construir hospitais, portos;... pagar todos os trabalhadores no activo e os que estão na reforma. Para fazer tudo isto, os governos precisam de recursos económicos reais e usar com eficiência, os bens económicos escassos, capital, … e trabalho. Portanto, os governos devem governar! E não desgovernar! Para atingir os desígnios nacionais e os fundos para sustentar esses programas, provêm principalmente de impostos e as insuficiências são colmatadas com empréstimos ou ajudas obtidos – infelizmente, a maior parte das vezes, evaporam-se. Muitas vezes também, o serviço da dívida através de taxas de juros elevadas, dificulta o pagamento e condiciona novos contratos, fazendo com que a margem de manobra do país seja limitadíssima. O dinheiro obtido através dos impostos, é o veículo através do qual os recursos reais são transferidos dos bens privados para os bens colectivos.
Os impostos é o que temos de pagar por uma sociedade mais justa e solidária!
Ao fixar os impostos, os governos estão na realidade a decidir como os recursos necessários serão obtidos das famílias e empresas e aplicados em consumo e investimento públicos. Os impostos que devemos pagar devem estar relacionados com o nosso rendimento, riqueza ou capacidade para pagar o que fará aumentar a satisfação social total. Há aqui um deve e um haver. Se todos nós fizéssemos isso, imaginem o que conseguiríamos juntar! Eu sei, que haverá sempre aqueles que dirão: “dapi … kim ki nega sabi? …ami gora ki na bim kumpu Guiné!?**”. Mas se a maioria pagar impostos na proporção do benefício que recebe dos programas governamentais, estamos a criar condições para que as gerações futuras tenham boas escolas e bons professores, mais e melhor educação; haja bons hospitais, bons médicos e bons enfermeiros, e melhores cuidados de saúde; viver a velhice com dignidade … ter segurança para que possamos dormir descansados; ter uma justiça capaz que fortaleça o Estado e as suas instituições. Se as mentalidades não mudam, não adianta ter boas leis. Se todos pagarem impostos, estamos a contribuir para o melhor funcionamento do país!
*Espaço público com poucas regras
** Imaginem … os governantes/dirigentes roubam e a favor (!) quanto mais um miserável como eu (com razão), que vai agora preocupar-se em desenvolver a Guiné!? Esta frase recorrente diz tudo. Portanto, o aparelho produtivo praticamente inexistente, o Estado monstro, o financiamento internacional, estruturas das quais o poder tem que depender, contribuem para desviar esforços dos quadros militantes ou não que tentam utilizar as ferramentas tortas em favor de todos. No entanto, estas ferramentas só se manejam para as elites/jet set, por mais que se tente voltá-las para o povo, dizia alguém. E isto corrompe e desvia dos seus objectivos qualquer boa intenção local. Um bom exemplo dessa prática, são os poucos investimentos que vão para o mundo rural apesar da população rural constituir 85%/90% da população total. No dia-a-dia, sobretudo em Bissau, onde mais de 50% dos investimentos se concentram, delapidam e apropriam-se sem vergonha, dos bens que afinal, são de todos nós!
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO