AS CONTAS DE UMA AMIZADE

 

Nino Vieira Carlos Gomes Jr.

 

De:  Domingos Pereira - "Mortunega"

28.03.2007

Embora relacionado com um caso - a tentativa falhada da detenção e humilhação do Senhor Carlos Gomes Jr, ex-Primeiro Ministro da Guiné-Bissau - que, de momento está a perder actualidade no país, julgo que, pela sua importância, pela conexão dos factos, pelos personagens envolvidos e, principalmente, pelos reflexos e eventuais consequências que este assunto trará na vida política e social da Guiné-Bissau, hoje, ou um dia mais tarde, este assunto, deve merecer uma análise da minha parte e quiçá, o privilégio de merecer o interesse dos nossos concidadãos.

Espero que saibam fazer boa leitura deste meu artigo, que à partida talvez possa parecer um artigo em defesa do Sr. Carlos Gomes Júnior. Porém, este artigo, é no fundo mais um artigo que descreve factos indesmentíveis que nos devem atrair a atenção, para que no fim se possa compreender, talvez melhor, algo que liga dois homens e o que pode estar a separá-los cada dia mais. Realço no entanto, e para dizer a verdade, que conheço estes dois personagens por aquilo que aqui descrevo e não por uma particular amizade ou relacionamento especial.

Todos sabem que, Carlos Gomes Júnior e Nino Vieira, foram amigos de longa data. Partilharam bons momentos, comungaram interesses e quiçá devem até ter negócios de permeio. Tudo isto, partindo daquilo que se dizia em Bissau, mas nada de concreto sobre o assunto.

Agora, irei a alguns factos indesmentíveis que são do conhecimento público e outros do meu conhecimento pessoal e restrito das minhas relações: Com o eclodir do conflito político militar de 1998, Nino Vieira incompatibilizou-se com todos aqueles que lhe quiseram chamar à razão e dissuadi-lo da via da guerra e da auto-destruição do povo da Guiné-Bissau.

Cadogo, soube-o sempre e talvez vocês leitores hoje, nesse período, aconselhou Nino Vieira a enveredar pelo caminho do diálogo e abdicar da Guerra. Nino não gostou e começou a hostilizar o seu amigo de longa data chegando a escorraçá-lo do Palácio segundo fontes próximas dos dois lados.

Nino só ouvia a sua doce amada "Sabel", o Samba Lamine, o João Monteiro, o Manecas Santos, o Avito José da Silva, o Baciro Dabo, o Zé Manel Mendes Pereira e tantos outros do núcleo duro do seu "Conselho de Guerra".

Talvez guiado pelos seus princípios, Gomes Júnior passou a assumir-se frontalmente contra a beligerância de Nino Vieira, tendo a ousadia de convidar em pleno Parlamento Guineense Nino Vieira a abdicar do poder por ser o factor da instabilidade e razão principal da Guerra. Nino não gostou, e por "mera" coincidência, Cadogo quase pagou com vida quando um obus de Bm 10, enviado algures proveniente da Marinha de Guerra, lhe varreu literalmente a casa tendo-se safado por um triz. Depois desse aviso e várias outras armadilhas engendradas (incluindo um convite para lhe fazer sair de Bissau via Bubaque... aceitou, mas advertido à ultima hora desistiu, e salvou decerto a vida...), Cadogo Jr acabou por zarpar para a D. Maria através do Aeroporto Osvaldo Vieira então no poder da Junta Militar. Em bom tempo o fez, senão era uma vez...

Convém lembrar, que o inicio do "braço de ferro" entre Nino e Cadogo começou com a sua participação na Comissão de Inquérito sobre o Tráfico de Armas.

Cadogo, membro destacado dessa Comissão pelo PAIGC, não aceitou fazer de joguete no jogo orquestrado por Nino para tentar manipular o inquérito e encontrar bodes expiatórios. Nessa resistência estava bem secundado por Agnelo Regalla, Oliveira Sanca e demais outros cabeças duras da praça.

Assim, as desavenças entre Cadogo Jr e Nino começaram e até à ruptura, contaram a sequência dos acontecimentos atrás citados.

Porém para não me perder, volto à realidade deste meu artigo e ao plano recentemente frustrado de prender o Sr. Carlos Gomes Jr. Um plano abortado que podia ter consequências terríveis para a sua vida. Dessa prisão, Carlos Gomes sairia, das duas uma: ou morto ou inutilizado para toda a vida.

Sabe-se hoje de fontes fidedignas que, o plano para a consumação da prisão do Cadogo, teve luz verde do General e foi preparado conjuntamente até ao ínfimo pormenor por Dionísio Kabi e Artur Sanha. Este, por um lado, sedento de vingança pela porrada que provocou e levou na sequência do encabeçamento da marcha de assalto à sede da CNE, e por outro, para escamotear a sua responsabilidade na organização e montagem dessa manifestação que provocou a morte de três jovens activistas do PRS. Esses jovens, inocentemente instrumentalizados serviram de carne de canhão dos planos do Artur Sanha então ao serviço dos interesses do General... Note-se que esse CASO, foi o ponto de viragem para o apoio do PRS ao General. Kumba estava reticente em apoiar o General, as bases estavam mais inclinadas a apoiar Bacai. Então tinha que se forjar um facto novo, um factor de revolta forte que mexesse com o sentimento dos balantas... e Artur Sanha exerceu um papel fundamental de provocar... as autoridades até o desfecho final... e até hoje não se sabe quem disparou.

Dizia-se que, no rescaldo da frustrada prisão de Carlos Gomes Júnior, o General vem inadvertidamente desabafar perante uma delegação de anciões que, o verdadeiro assunto que o opõem a Cadogo, é uma questão de imóveis. Disse em crioulo... "ami nha prublema ku el i pabia i toma nha casas". Caiu a mascara da farsa e descobre-se o móbil que estava por trás da prisão e mais que provável aniquilamento de Cadogo. Era mais um que entrava para a conta pessoal do General.

Incrível... um homem que foi Primeiro Ministro da Guiné-Bissau, ia ser ilegalmente preso, consequentemente, brutalmente espancado e talvez, até morto... por causa de uma casa(s) que o General alegadamente diz terem-lhe sido subtraídas. Em que mundo estamos ?... Incrível, a Guiné-Bissau mais uma vez, seria posta à prova de uma eventual confrontação por causa de um ajuste de contas do General com o cidadão Carlos Gomes sobre assuntos de índole patrimonial !!!.

Se o General está assim certo da propriedade da(s) sua(s) casa(s) porque não recorre à via judicial que é a sede própria para reclama-las e assim, poupar-nos de tormentas e sobressaltos desnecessários?

Pergunto Senhor General: Quais casas? Quantas casas? Onde estão essas casas?

Todo o bem imóvel tem a sua história, existe a traçabilidade da sua aquisição, as provas de pagamento, existe o seu registo... enfim, uma gama de meios e provas com que poderá valer para reivindicar os seus alegados bens e poupar-nos mais uma vitima para satisfação dos seus interesses.

Também lhe digo Senhor General, se são varias casas que diz estar a reivindicar, terá que explicar-nos a nós o povo, a nós os Antigos Combatentes Deserdados, donde lhe advêm tanta riqueza para deter quase todo o património imobiliário da Guiné-Bissau cuja lista não caberia em cinco folhas de vinte e cinco linhas. Uma lista de bens que começa no nobre edifício do STJ, ao ex-BIGB-Bandim, a quarteirões inteiros do Chão de Papel, passando pelo Hotel Palace, Complexo Habitacional do Bairro Militar e acabando em dezenas de Pontas e Pedreiras...

Também lhe pergunto, Senhor Carlos Gomes Júnior: Se bem me lembro em 1994, deu uma entrevista ao então Expresso-Bissau, onde entre outras considerações dizia que nunca seria "testa de ferro de ninguém"..., creio também, incluindo o General. Então, para o bem da nossa tranquilidade, para a tranquilidade da sua família e também, pela amizade anónima de todos quantos lhe são gratos e queridos... porque não expor o General ao desafio de apresentar pública e documentalmente os alegados bens que alega terem-lhe sido subtraídos por si..., ou então pedir unilateralmente uma auditoria internacional ou accionar a Comissão competente da ANP na qualidade de Deputado para provar à proveniência e legalidade dos seus bens e, também as do General.

Por ora, damos-lhe a vantagem de que, sempre lhe conhecermos a pertença de bens vários e um empresariado de sucesso. Mas essa vantagem não o iliba de interrogações que só lhe trarão vantagens dissipar. Ao General, dele não se conhecem heranças nem poupanças para comprar meio Bissau.

O desafio é aliciante e quiçá, poderá contribuir para quebrar um tabu e trazer toda a verdade ao conhecimento público e afastar as más línguas sobre a transparência dos seus bens.

Assim, a meu ver, dissipar-se-ão todas as dúvidas e as reservas que se suscita em muitas mentes sobre a ambiguidade do que é do Cadogo Jr e o que é do General.

Creia Senhor Carlos Gomes Júnior, se ponderar e aceitar este desafio pioneiro, seria mais um exemplo de coragem que daria aos Guineenses e mais do que nunca ganharia o apreço e admiração de muitos mais Guineenses que guardam gratas recordações da sua passagem pela Primatura da Guiné-Bissau.

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