«Autoridades incapazes de controlar
tráfico de droga», diz perito ONU As autoridades guineenses estão sem capacidade para controlar o tráfico de droga, defendeu hoje em Bissau, António Mazzitelli, chefe do departamento das Nações Unidas de combate à droga e ao crime organizado na África Ocidental. Mazzitelli, que falava em conferência de imprensa após uma missão de cinco dias na Guiné-Bissau, durante a qual visitou as zonas mais vulneráveis à entrada de droga, disse que a Guiné-Bissau não tem condições para controlar as fronteiras e os narcotraficantes aproveitam-se dessas "fragilidades". Os portos, as zonas costeiras e os aeroportos são os locais mais "vulneráveis" pelos quais os narcotraficantes passam as drogas nomeadamente cocaína, que seguem depois para a Europa. Portugal e Espanha são, em regra, os principais mercados desses produtos, muitas vezes dissimulados no estômago dos traficantes, declarou António Mazzitelli. Os cidadãos da Africa Ocidental, nomeadamente nigerianos, e os latino-americanos são os principais narcotraficantes que operam na Guiné-Bissau, referiu ainda o perito da ONU. Destacou ainda que em vários centros de reclusão de Europa existem pessoas detidas com passaporte da Guiné- Bissau, mas cuja origem é falsa. António Mazzitelli afirmou também ter deparado com situações "bastante graves" de elementos da Justiça que se mostraram impossibilitados de aplicar as leis contra os narcotraficantes e outros criminosos devido a falta de protecção. Segundo Mazzitelli, os magistrados disseram-lhe que têm medo de condenar um criminoso, porque este poderá sair em liberdade "após alguns dias", uma vez que não existem centros de detenção "dignos desse nome". "A Guiné-Bissau não tem um centro penitenciário digno desse nome. Os que existem, oferecem condições infra- humanas", defendeu António Mazzitelli. O ministro da Justiça guineense, Namuano Dias, que também assistiu à conferência de imprensa, lamentou tal realidade, apesar de reconhecer a veracidade dos factos. "Infelizmente lamentamos essa triste realidade, mas é tudo verdade o que esta missão da ONU veio constatar no nosso país", afirmou Namuano Dias, sublinhando que o governo já tinha feito o mesmo diagnóstico. Segundo o ministro da Justiça, as duas preocupações constam do programa do governo que vai ser submetido ao Parlamento na próxima semana, no qual é referenciado "de forma clara" a urgência de adopção de medidas para atacar o tráfico de droga e o crime organizado. A falta de meios financeiros é, segundo Namuano Dias, a razão principal para que as autoridades não dêem início a um combate sério aos narcotraficantes. Fonte: www.noticiaslusofonas.com |
Análise sobre a extensão de um indicador
Por: Fernando Casimiro (Didinho)
29.01.2006
Num país em que o uso da força mete medo ao cidadão comum, como analisar a declaração de medo por parte de um Órgão de Soberania da República, neste caso: os Tribunais, na representação dos seus juízes?
O indicador agora fornecido a António Mazzitelli, chefe do departamento das Nações Unidas de combate à droga e ao crime organizado na África Ocidental, mais do que uma verdade e preocupação, é uma sugestão a várias interpretações que podem ter extensões inclusivamente de ordem política, nas decisões que competem aos Tribunais guineenses e, concretamente, ao Supremo Tribunal de Justiça.
Pode parecer fácil dar a conhecer às Nações Unidas a realidade da falta de protecção e de meios no sentido de "pressionar" para que sejam angariados e concedidos financiamentos ao país, supostamente para a estruturação de políticas a implementar no combate ao narcotráfico. No entanto, a minha leitura sobre a declaração de medo por parte dos magistrados guineenses pressupõe uma cumplicidade no terreno entre o poder e o crime.
Cumplicidade não activa nem declarada, como é óbvio, mas passiva e reconhecida indirectamente pelas respostas de quem de direito a quem de direito.
É ao Estado que se impõe ser de Direito na sua opção e afirmação por uma concepção democrática e não o Direito ser do Estado, na conveniência e conivência dos que se posicionam nos cargos mais altos da hierarquia do Estado para se servirem a eles próprios.
Na Guiné-Bissau de hoje, revivem-se momentos de um passado recente em que o Poder Judiciário volta a resignar-se às suas competências formais e teóricas numa mobilidade de acção calculista, como garantia sustentada para a "boa convivência" que o Poder Político impõe e exige cumprimento para a sobrevivência do referido Poder Judiciário.
A referência feita ao caso de tráfico de droga pela voz de magistrados guineenses pode ser vista como uma forma de aceitar a realidade que já ninguém consegue disfarçar na Guiné-Bissau. No entanto, o aceitar dessa realidade é uma questão meramente estratégica no sentido de sacudir a água do capote, na medida em que cabe ao Poder Judiciário cumprir com as suas obrigações e fazer com que as leis sejam cumpridas por todos.
Se o General que dirige o país tem um batalhão a fazer guarda à sua pessoa, se os ministros têm guarda-costas para os protegerem, porque é que não se dá protecção aos juízes, quando militares e forças de segurança abundam no país?
Será que para deixar de haver impunidade na Guiné-Bissau a primeira condição é financiar a construção de cadeias de alta segurança?
Quando um Juiz assume ter medo de condenar um traficante de droga, esse mesmo juiz terá coragem de dar um parecer favorável a um processo de impugnação contra uma decisão do General que supostamente é o primeiro magistrado da Nação na sua decisão de demitir um governo legitimado nas urnas?
É claro que os juízes guineenses não têm essa coragem e já deram, eles mesmos, essa resposta...!
A ditadura continua a marcar pontos na Guiné-Bissau. Os guineenses não devem permitir que isso aconteça!