COMENTÁRIOS AO PARECER JURÍDICO DA

ORDEM DOS ADVOGADOS DA GUINÉ-BISSAU

 

 

Carlos Pinto Pereira

ppereiracarlos@gmail.com

22.02.2012

DR. CARLOS PINTO PEREIRA "CAÍA"Acabo de ler o PARECER JURÍDICO emitido pela Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, com data de 13 de Fevereiro de 2012, a pedido do Movimento da Sociedade Civil para a Paz, Democracia e Desenvolvimento, publicado pela Secretaria-Geral da Ordem.

Levanto dúvidas quanto ao formato utilizado para a aprovação de um tal Parecer, ainda que reconhecendo a competência da OAGB em emiti-lo. Porém, teria preferido que a Ordem se tivesse distanciado da questão, deixando para os Relatores, ainda que de entre eles o Bastonário, a total responsabilidade pela opinião emitida. Aliás, trata-se apenas de uma opinião, como qualquer outra, ainda que assinada em nome da OAGB. E como opinião que é, vale o que vale, e apenas isso. A utilização de um timbrado da Ordem ou a assinatura do seu Bastonário não alteram em nada a natureza de simples opinião, que só pode vincular individualmente quem a emitiu ou com ela concordou.

No que me diz respeito, fiquei desapontado com o parecer, porque a sua Conclusão contraria frontalmente as premissas que os próprios Relatores afirmaram como válidas logo na abertura do texto.

Com efeito são os Relatores que afirmam no Intróito do Parecer, depois de vários considerandos, que “…, quanto à sua elegibilidade (do candidato actual Primeiro-Ministro), não se levanta nenhum problema de índole jurídica”.

Ora se não se levanta qualquer problema jurídico, com pretender que à conclusão se pretenda atribuir natureza jurídica? Isto torna a questão grave, na medida em que, utilizando as vestes de uma Instituição que devia pautar a sua acção pelo estrito respeito da legalidade, se pretende esconder uma tese de natureza exclusivamente política, sem qualquer suporte legal.

Como advogado e membro da Ordem, por sinal o membro n.º 0001, portanto o “Doyen” (cargo ainda não existente formalmente), e sem necessidade de prevalecer da veste de Conselheiro do PM para a área jurídica, não devo nem posso pactuar com tal situação, a de a Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau emitir um Parecer, dito jurídico, sem citar uma única norma constitucional ou legal violada. Ou seja, sem motivar o parecer, exactamente num domínio em que, como eles próprios reconhecem, a motivação ou fundamentação é obrigatória.

Qual foi a norma violada? O Parecer não cita nenhuma norma relevante.

As únicas normas citadas no Parecer são as que se referem à cumulação do cargo de PR com qualquer outro, público ou privado – artigos 63.º e 65.º da Constituição e artigo 10.º da Lei Eleitoral, citados no Ponto 1 do Parecer, ou à falta de competência do PR Interino para exonerar ou nomear um Primeiro-Ministro – artigo 71.º da Constituição, citado no Ponto 4 do Parecer.

É ainda citada a norma do artigo 24.º relativa ao princípio da igualdade, por o Primeiro-Ministro ter “abandonado o cargo e, em consequência, auto nomeado uma substituta que também acumula as tarefas com as de Directora da candidatura dele” (sic). Ainda neste âmbito é citado o artigo 1.º e seguintes da Lei n.º 14/97, de 2 de Dezembro.

Nenhuma outra norma jurídica é citada.

Perguntamos?

Poderá ou deverá a situação de facto existente subsumir-se ao previsto por aquelas normas.

Do meu ponto de vista não, por se tratarem de situações distintas.

A situação de facto é a seguinte: o Primeiro-Ministro não pediu nem suspensão nem dispensa do cargo. Ainda menos abandonou o exercício do cargo. O Primeiro-Ministro não acumula o cargo com qualquer outro incompatível.

O Primeiro-Ministro anunciou publicamente que, nas suas ausências e impedimentos é normalmente substituído pela Ministra da Presidência do Conselho de Ministros, da Comunicação Social e dos Assuntos Parlamentares, Porta-Voz do Governo, podendo ainda sê-lo por qualquer outro Membro do Governo por si indicado. Esta substituição e a comunicação a ser feita ao Presidente da República do Decreto n.º 20/2011, de 11 de Maio, que aprova a Lei Orgânica do Governo. Esta é uma situação normalíssima, que já ocorreu sem problemas por dezena de vezes (sempre que o PM se deslocou ao estrangeiro, em visita oficial ou de trabalho ou em viagem privada).

Por sinal neste anúncio público o Primeiro-Ministro teve o cuidado de referir que a (o) próxima (o) Primeira ou Primeiro-Ministro (a) só seria conhecida (o) após a proclamação dos resultados das eleições presidenciais antecipadas, porquanto só o novo Presidente da República poderá nomear e dar posse ao novo Primeiro-Ministro.

Portanto, concluímos, o Primeiro-Ministro da República da Guiné-Bissau é e continua a ser o Senhor Carlos Gomes Júnior. Sê-lo-á até que seja empossado o novo Presidente da República. Então, se assim é, onde foi ferido o princípio da legalidade?

Passando à segunda questão, perguntamos: Pode o Primeiro-Ministro em exercício candidatar-se a eleições presidenciais?

Em primeiro lugar diremos que nada, nem na Constituição da República nem na Lei, impede um Primeiro-Ministro ou um Presidente em exercício de se candidatarem a quaisquer eleições, excepção feita ao número de mandatos para as eleições presidenciais (só pode apresentar-se por duas vezes).

Ou seja, se a Constituição ou a Lei não o impedem, de forma expressa e não implícita (como o faz para o caso de militares no activo e de Magistrados), então ele pode candidatar-se. É isto que decorre do princípio da legalidade defendido pelos Relatores.

Em segundo lugar, até à nomeação e tomada de posse do novo Presidente eleito não existe nenhum problema de cumulação de cargos ou funções. Não há que supô-lo ou inventá-lo.

É que, mesmo no caso de o actual Primeiro-Ministro vir a ser eleito Presidente da República, ainda assim não haverá nenhum problema de acumulação, porquanto poderá, antes da tomada de posse, renunciar ao seu cargo de PM para então ser empossado como PR. A renúncia ao cargo numa tal situação é perfeitamente legal e nada tem de anormal, devendo até ser considerada como sendo o resultado de uma avaliação positiva do anterior mandato noutro órgão de soberania. 

O país ficará alguns minutos, horas ou dias sem PM, mas não se vislumbra onde é que a situação pode constituir uma violação da Constituição ou da Lei. Pelo menos não somos capazes de descortinar a norma violada. Ora, se assim é, talvez o “dito” problema se resolva com bom senso e humildade.

Ou seja, nem em termos de elegibilidade nem em termos de compatibilidade ou qualquer outro, existe violação da lei. Menos se vislumbra a questão levantada da violação do princípio da igualdade ou de crime de responsabilidade de titulares de cargos políticos que os Relatores pretendem descortinar do exercício do direito de dispensa consagrado na lei eleitoral. O Primeiro-Ministro em exercício não é obrigado a pedir essa dispensa. Trata-se de um direito que a lei lhe confere, que ele exerce ou não, por livre determinação pessoal.

Assim sendo, só me resta pedir aos meus Ilustres Colegas que me ajudem a compreender o Parecer emitido. Quando indicarem o fundamento jurídico da sua tese então voltaremos em resposta, se para tal houver necessidade.

Até pode acontecer que me convençam.

Porém, o problema criado é que, até prova em contrário, deixaram que a Ordem ficasse mal na “fotografia”, na medida em que se pode pensar que ela quis influenciar a próxima decisão do Supremo Tribunal de Justiça, único órgão de soberania competente para esta acção.

Bissau, 20 de Fevereiro de 2012.

 

Carlos Pinto Pereira

 

PARECER JURÍDICO (POR VALIDAR) DA ORDEM DOS ADVOGADOS DA GUINÉ-BISSAU SOBRE A CANDIDATURA DE CARLOS GOMES JR. À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, POR SOLICITAÇÃO DO MOVIMENTO NACIONAL DA SOCIEDADE CIVIL   17.02.2012

 

ESPAÇO PARA COMENTÁRIOS AOS DIVERSOS ARTIGOS DO NÔ DJUNTA MON


VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

associacaocontributo@gmail.com

www.didinho.org

   CIDADANIA  -  DIREITOS HUMANOS  -  DESENVOLVIMENTO SOCIAL