CONTROLAR A EUFORIA, COM REALISMO!
Fernando Casimiro (Didinho)
07.02.2010
Que fique claro que não tenho nada contra quem vê o Primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior como o "salvador" da Guiné-Bissau! Diria que temos apenas pontos de vista distintos na apreciação da figura do Primeiro-ministro, passado/presente.
Escrevi anteriormente e volto a reafirmar que, o Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO não é, nunca foi, nem será contra as instituições da República da Guiné-Bissau!
Tendo ainda como referência o recente encontro em Lisboa entre o Primeiro-ministro Carlos Gomes Jr. e a Comunidade Guineense radicada em Portugal, constatando um clima de euforia (compreensível) dos meus compatriotas, ansiosos pelo regresso à Pátria-Mãe, depois de uma grande campanha de propaganda em nome de uma estabilidade ainda inexistente, quero alertar para os equívocos e perigos de tomadas de decisão baseadas em falsas promessas que podem vir a custar o arrependimento e a destruição do que muitos dos nossos compatriotas conseguiram conquistar com muitos anos de árduo trabalho no estrangeiro.
Tenho respeito pelas decisões de cada um, aliás, não sou tutor de ninguém e, por isso, não pretendo, de forma alguma, influenciar quem quer que seja na decisão de regressar ou não à Guiné-Bissau nesta fase.
É bom que se tenha em consideração o seguinte: O Primeiro-ministro neste seu encontro com a Comunidade Guineense radicada em Portugal, em nenhum momento da sua intervenção convidou os guineenses na diáspora a regressar ao país para darem os seus contributos na edificação da Nação Guineense.
Convêm dizer que, se houvesse interesse por parte do Primeiro-ministro em relação à participação da diáspora guineense na construção e desenvolvimento da terra que é de todos os filhos, filhas, netos e netas da Guiné-Bissau, qualquer convite ao regresso deveria ser feito a partir de Bissau, num gesto de boa-vontade, de ruptura com a desconfiança que continua a existir em relação aos que se encontram no exterior e que muitas vezes são injustamente catalogados de promotores de instabilidade e da má imagem da Guiné-Bissau no mundo.
Alguns dirão que o Primeiro-ministro não tem, necessariamente, a obrigação de convidar os guineenses ao regresso à Pátria, no entanto, não se trata de obrigação, mas sim, de um gesto de confiança e de reaproximação da Grande Família Guineense, mesmo sabendo que qualquer decisão será sempre pessoal ou familiar!
O Primeiro-ministro farta-se de fazer propaganda na promoção do investimento empresarial e é nessa base que, pude constatar que muitos guineenses estão ansiosos por regressar e criar negócios. Óptimo!
Quantos guineenses na diáspora têm de facto, condições reais, para o regresso no intuito de criarem empresas/negócios e promover a criação de postos de trabalho aos seus compatriotas?
Os poucos que estarão nessa situação, devemos encorajá-los obviamente e desejar-lhes os maiores sucessos.
E quanto aos guineenses que não têm capital para investir, entre trabalhadores e recém formados no estrangeiro, há realmente condições estruturais para os seus regressos, de forma a contribuírem para o desenvolvimento do país?
Devemos ter em conta que o grande factor que se alia a esta onda de euforia para o regresso à Guiné-Bissau é, sem dúvida, a crise económica mundial que tem afectado as economias de quase todos os países onde residem guineenses.
Muitos estão no desemprego; muitos começam a não ter como pagar as suas dívidas, começando a ver seus bens penhorados. Perante tão cruel realidade dos efeitos da crise económica mundial, por vezes entra-se no desespero e quando ouvimos o canto da ainda inexistente estabilidade e das falsas expectativas a nível de mais e melhores oportunidades profissionais, não olhamos para o passado e muito menos imaginamos o futuro. Apenas vemos o presente, num prisma de optimismo e de esperança, o que não deixa de ser legítimo, e lá vamos nós...
Obviamente que regressar à nossa casa, em condições normais, não deveria constituir motivo de apreensão, mas, conhecendo a nossa casa e tomando em conta os verdadeiros motivos que levaram cada um a deixar a Guiné-Bissau, não deixa de merecer inquietação.
Compreendo o estado emocional, em baixa, dos nossos compatriotas face à cruel realidade dos efeitos da crise económica mundial e, por assim dizer, também compreendo a euforia do regresso à Pátria-Mãe.
Seria bom que se tivesse em consideração que a Guiné-Bissau também não está em condições de oferecer postos de trabalho, nem aos que lá estão, entre milhares de jovens quadros superiores regressados dos estudos no exterior, ou daqueles formados nas Universidades do país.
O país, a meu ver, não tem condições para receber e enquadrar um grande número de pessoas que decidirem regressar nesta fase, sendo que isso teria elevados custos sociais para o país.
Não acredito que pessoas que estão habituadas a pensar e a exprimir livremente, a ter energia eléctrica, água canalizada, habitação condigna, escolas condignas para os seus filhos, assistência médica etc., aceitem de ânimo leve, em pleno século XXI, os elevados sacrifícios que a maioria das nossas populações tem suportado ao longo dos anos, porque, Djitu ka tem...
É bom não esquecer que na Guiné-Bissau, ainda hoje, o pensar ou ser diferente é sinónimo de ser contra o regime e, portanto, inimigo dos que detêm o poder!
O Primeiro-ministro Carlos Gomes Jr. sabe e bem, que um regresso maciço de guineenses ao país pode vir a provocar ondas de contestação à sua governação, principalmente, no tocante à incapacidade de se criarem postos de trabalho para tanta gente, numa altura em que o desemprego já é extremamente elevado no país e com o agravante de ser quase impossível conseguir arranjar uma habitação digna do termo para se viver.
Um regresso maciço dos nossos compatriotas na diáspora, iria revelar, de forma gritante, as reais carências sociais na Guiné-Bissau.
Não seria pessimismo recordar a euforia do pós 14 de Novembro de 1980 e a proclamação da Concórdia Nacional. Muitos quadros de reconhecido valor regressaram ao país, quer por convites directos, quer pelo espírito patriótico de quererem ajudar o país. Muitas famílias decidiram abandonar tudo nos países onde estavam a residir.
Foi uma enorme desilusão e nalguns casos, uma autêntica tragédia!
Muitos foram ignorados e humilhados desde a chegada ao país. Outros, competentes, livres no pensamento e na acção, foram perseguidos, detidos, torturados e assassinados, sem nunca terem tido possibilidade de se defenderem...
Eram outros tempos dirão alguns. Outros tempos, mas continuamos com pessoas da mesma "escola" no poder, nos dias de hoje, digo eu...!
Aos que querem regressar, todo o meu respeito e compreensão, contudo, aos que querem regressar, "oferecendo-se" ao Primeiro-ministro, através deste nosso Projecto, aconselho-os a não enveredarem por esse caminho, pois isso não faz parte da nossa Missão!
Vamos continuar a trabalhar!
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Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO