CRIANÇAS HOJE, GOVERNANTES AMANHÃ!

 

 

 

Filipe Sanhá *

 

filipesanha@iol.pt

01.06.2010

Filipe SanháA luta de libertação encabeçada pelo PAIGC, nas matas da actual República da GUINÉ – BISSAU, foi dura, muito dura, para o estabelecimento de uma Pátria e uma Nação! Quem nasceu e viveu numa zona tão densamente rodeada de mata cerrada, como Olossato, tem razões para dizer que as nossas brincadeiras e outros jogos lúdicos eram, permanentemente, interrompidos, devido a ataques sistemáticos da guerrilha. Temos razões, para nos interrogarmos da validade de tantos sacrifícios consentidos por mulheres e homens que protagonizaram essa grande epopeia libertadora. Nasci em Olossato! É uma localidade ancorada entre Bissorã, Farim e Morés. A distância entre Olossato e Bissorã é de apenas 18/20 km, de terra batida! Era o único acesso possível, por estrada, durante a guerra, porque o resto estava intransitável, devido a intensidade dessa mesma luta guerrilheira. Entre Bissorã e Olossato o trânsito era militarmente escoltado, que chegava a durar meio-dia ou mais! Foi duro e muito duro! Pensávamos que com o terminar da guerra armada, o dia seguinte seria o de desenvolvimento! Enganamo-nos, todos nós, que éramos crianças à época! No prelúdio na nossa “magna independência”, acreditávamos que a Guiné – Bissau encontrara o rumo, reconquistara a sua soberania e com isso a nossa dignidade. É um direito que todos tínhamos, em sonhar, sonhar e delirar nesse sonho! Todavia, após 36 anos de independência, com os sucessivos governos da República, temos vindo a assistir a um aumento espiral e gradativo de lutas internas e intestinas no seio do principal partido protagonizador dessa luta libertadora, o PAIGC. Em 1974/75, todos os atentos, à dignificação da nossa cidadania, começavam a perceber, que este partido era, efectivamente, um movimento, apesar da suposta legalização, como partido político / militar, ter tido lugar, no Congresso de Cassacá. Foi, na verdade o momento da afirmação da liderança do seu fundador, Amílcar Cabral, mas não do Partido! Recorrendo à história do PAIGC, não coincidente, naturalmente, com a da nossa existência, diria que foi o primeiro de entre vários momentos de sobressaltos! Assistimos, impotentes, nesta fase que devia ser colorida de glórias, na batalha para o desenvolvimento, mas ao invés, continuamos marcados e manchados de sangue e frustrações, que nos deprimem, diariamente, de forma vergonhosa! Somos iguais a todos os países do Mundo! Somos trabalhadores, corajosos, honestos, competentes e ambiciosos, como os demais países, independentemente, das confissões religiosas, filosofia política ou localização geográfica! Perguntemo-nos, o porquê desta trágica trajectória que nos empurra, cada dia que passa, para a beira do abismo? Alguém tem que tomar as medidas urgentes e necessárias, que convoque todos os guineenses, esclarecidos, no país e na diáspora, para um debate profundo sobre os perigos que nos espreitam pela “fechadura da porta”, com o espírito de adopção e assunção de medidas correctivas deste nosso percurso sinuoso! Sem estabilidade e segurança não haverá crescimento económico e o desenvolvimento do país continuará a ser uma miragem, portanto inatingível! As nossas expectativas implícitas avisam – nos que não há nada a fazer! Recuso – me em aceitar esta visão catastrofista para o meu País! Por isso, hoje, dia 1 de Junho, é bom lembrar, que Cabral afirmara e, escrevera, que “as crianças são as flores da nossa luta e razão do nosso combate”, mantendo acesa a chama da GUINENDADE, perseguindo os ideais de desenvolvimento que fizeram prosperar outros países! Consciencializemos que as crianças da jovem república continuam a sofrer, com as notícias negativas que fazem correr muita tinta, nas páginas dos jornais mais destacados do mundo! Os pais, parentes, amigos e concidadãos dessas crianças, continuam a sofrer, porque não têm trabalho, e, os que trabalham não recebem os seus salários atempadamente, para lhes dar as condições, minimamente, aceitáveis que todas as crianças do mundo reclamam e merecem! Não era o meu sonho de criança, não era o sonho da quase a generalidade dos sobreviventes dessa tempestuosa guerra de libertação. Baseando nessa frase simbólica de Cabral, devemos neste dia reflectir sobre o que queremos! Um território com pouco mais de 36.000 Km2, albergando 1.500.000 almas, como é o nosso caso, e, com o prenúncio de mais-valias em petróleo, ouro e outros minérios valiosos, é chegado o momento para paramos e pensarmos sobre se queremos viabilizar a nossa identidade unitária nacional, como nação, onde cresçam as nossas potencialidades e expectativas governativas, ou se, ao invés, pretendemos hipotecar definitiva e irremediavelmente o nosso futuro colectivo! Perguntemo-nos, nesta onda de claudicação da nossa pátria, onde param os homens lúcidos, com visão futurista e com poder no nosso País? Estarão na sociedade civil e nos partidos políticos, ou em ambos? Não seria ideal os partidos políticos juntarem a sua voz à da sociedade civil para debaterem o actual estado da Nação, redesenhando o nosso mapa projectivo? Somos todos guineenses, patriotas, de primeira água que querem o melhor para o País! Se falharmos na condução deste nosso destino comum, partiremos para onde? Lado nenhum, meus irmãos e compatriotas! Se não repensarmos a nossa vida colectiva, principalmente, a das nossas crianças, estaremos no primado da nossa autodestruição! Acredito que haja pessoas que ainda não se aperceberam disso, mas a esmagadora maioria das nossas populações, mesmo os mais analfabetos, já se aperceberam dessa luz intermitente no fundo do poço! Tratemos e cuidemos de nós mesmos, porque ainda estamos a tempo de evitar a nossa hecatombe colectiva! Todos fomos crianças e mantemos as nossas memórias bem vivas do que aconteceu aos nossos 4 - 5 anos de idade. Quando eclodiu a guerra de libertação, em 1963/64, tinha eu 8 anos, portanto mais motivos tenho para conservar / preservar a (s) minha (s) memória (s) sobre os acontecimentos que precederam, e, durante a guerra! Tudo aquilo que tem acontecido desde 1974, data universal do reconhecimento de jure, da República, marcará, negativamente, as nossas crianças, e, mais preocupante se traduzirá, se ponderarmos, que serão eles os capitães de amanhã na condução da nossa pátria amada, a que alguém resolveu baptizar com o nome da REPÚBLICA da GUINE – BISSAU. As nossas crianças reclamam sim, o direito à educação, saúde, protecção e segurança, na sua dimensão mais abrangente! Tal como desejo a todas as nossas crianças, estendo os meus parabéns, a todas as crianças do Mundo, neste dia especial, independentemente, das suas condições sociais e económicas, com votos sinceros de felicidades.

Saudações Associativas

Filipe Sanhá

* Psicólogo, Mestre e Doutorando pela Universidade de Coimbra (Portugal)

 

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