JOÃO MASSAPINA E AS RECORDAÇÕES DA GUINÉ-BISSAU
Um comentário ao artigo do jornalista Paulo M. A. Martins.
Publicado em http://blog.comunidades.net/paulomamartins/
Por: João Massapina
2007-08-24
Caro Paulo Martins
Pois realmente a Guiné-Bissau é um caso muito próprio na realidade africana.
Em 1993 tive a rara oportunidade e honra de ali me deslocar, e poder constatar
que as pessoas ali viviam de um modo muito estranho, não somente por razões
étnicas e culturais, mas sobretudo porque o País vive numa constante
instabilidade.
Nessa altura, em funções de ministrar um curso de acção política a um dos
partidos da chamada oposição a Nino Vieira, tive a noção de que durante aquelas
semanas sempre fui seguido, e devidamente vigiado.
Ainda mais confirmei esta situação quando fui contactado por Jorge Quadros, o
homem de mão que escrevia os discursos de Nino Vieira, e fazia a ligação a
certas pessoas europeias que visitavam o País. Nessa altura visitou-me no hotel,
segundo ele a mando de Nino para tentar um encontro para esclarecer a política
do país.
Entendi como aliciamento para outra qualquer situação, tipo sonegação de
informações.
Achei no mínimo caricata e estranha a situação. Obviamente que não compareci a
esse encontro, e mandei desde logo um recado agradecendo mas informando que não
me sentava à mesa com ditadores.
Mais tarde no aeroporto fui impedido de embarcar por 3 elementos da polícia,
enquanto não lhes fosse devidamente esclarecida a razão da visita e os contactos
com o Dr. Victor Mandinga do PCD. Também aí fui de muito maus fígados e os
deixei a falar sozinhos, o avião acabou por levantar com mais de 30 minutos de
atraso, e ficaram sem qualquer informação.
Dizer ainda que reencontrei Jorge Quadros em Lisboa, pessoa muito culta e
afável, que me deu a conhecer estar a situação muito má na Guiné-Bissau, e a sua
própria situação nada agradável. Nessa altura, almoçamos e acabou por confessar
que a corrupção governamental era algo de terrível e incontrolável e que
realmente essas situações de tráfico eram reais, a Guiné-Bissau servia para
plataforma de rastreio de tráfico para a Europa.
Lembrar que Jorge Quadros veio a ser assassinado em Bissau, algum tempo depois,
e a sua morte nunca foi devidamente esclarecida, existindo mesmo quem afirme que
alguém próximo de Nino Vieira teria feito o trabalho porque Jorge Quadros sabia
demais de situações muito próximas ao Presidente, se não mesmo do próprio
Presidente.
Ainda referir que em uma deslocação a Varela, zona junto da fronteira com o
Senegal, durante a noite foi visível tanto a linha de fogo da guerrilha no lado
do Senegal, e ao mesmo tempo movimentos muito estranhos na praia do lado da
Guiné.
A realidade era manifestamente de grande riqueza de algumas figuras, sem existir
aparentemente razão para isso, e de miséria total de outras, neste caso a grande
maioria da população.
Nos raros bons restaurantes de Bissau, e na única discoteca que se podia
frequentar na época, era sim visível essa opulência, e também a convivência
fraterna entre pessoas de fracos recursos com elementos algo estranhos, que se
movimentavam com muito à-vontade nesses meios.
Uma forma de viver muito estranha, onde todo o mundo tem que ter guarda-costas,
mudar de casa em cada noite, nunca dizer onde vai ou jamais seguir uma vida de
rotinas.
De referir e salientar que Nino Vieira é novamente o Presidente da Guiné-Bissau,
e com ele regressaram por certo muitos estrategas da chamada economia
subterrânea que beneficia uns poucos, em contraste com a miséria total de uma
maioria.
Para se corromper um policia de fronteira bastavam em 1993, simples 6 (seis)
cervejas, foi assim que a minha ex-esposa passou uma mala de pele de cobra sem
pagar os direitos de alfandega.
África é realmente algo de muito belo, mas ao mesmo tempo de muito especial, mas
a Guiné-Bissau é mesmo um caso à parte...
Ninguém duvide que tudo aquilo que se possa imaginar ser possível, e mesmo o
impossível, pode ali acontecer.
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VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO