MEMORANDO DE ENTENDIMENTO PRÉ-ESTABELECIDO ENTRE MALAM E KUMBA
Alberto Oliveira Lopes *
21.08.2009
Soube-se que o atual presidente da República da Guiné-Bissau (Malam Bacai) e o candidato derrotado na segunda volta das presidenciais (Kumba Ialá) assinaram um memorando de entendimento para reconhecer os resultados do último escrutínio presidencial de 26 de julho de 2009. Logo após a publicação dos resultados provisórios, Kumba respeitou o acordo e reconheceu sua derrota. O referido acordo me deixou perplexo e com muitas interrogações. Pois, nada vem ao meu imaginário se não caracterizar o acordo como um instrumento que concede privilégios e não como um elemento que tem por finalidade garantir estabilidade, consolidar a paz e a retoma da normalidade funcional das instituições públicas e privadas.
Não podemos continuar aceitar a ser enganados por nossos governantes com acordos que não trazem benefícios à população guineense, senão benefícios aos seus signatários. Hoje, fazendo uma analogia pautada na veracidade dos factos, pude tirar ilações de que temos dois presidentes em função do acordo preestabelecido entre Bacai candidato eleito (apoiado pelo PAIGC) e Kumba, candidato derrotado, apoiado pelo PRS. Revendo a história dos candidatos derrotados e dos que foram depostos após serem eleitos, eles sempre foram beneficiados com base em acordos obscuros com justificativos infundados. Senão, vejamos:
Quando Nino Vieira foi deposto por uma força militar em conseqüência do conflito político militar de 7 de junho de 1998, foram vários os justificativos para proporcionar a sua fuga do pais, entre os quais, a ida para a vizinha Gâmbia para fazer tratamento médico, o que acabou por não acontecer. Como foi o desfecho desse episódio?
O mesmo aconteceu com o presidente Kumba quando foi deposto por uma força militar onde ficou por algum período sob residência vigiada. Pelos mesmos justificativos infundados, e alegando sempre a questão de saúde o então presidente foi beneficiado para fixar residência em Marrocos e, mais tarde, em 2005, voltou sem cara de vergonha e se candidatou à Presidência da República. Não teve votos suficientes para continuar na corrida, tendo decidido apoiar Nino Vieira na segunda volta. Pessoa que ele havia chamado sempre nos seus discursos de sanguinário, traidor etc... Algo que não deixa de ser verídico. Mas resta perguntar quais foram os motivos que o levaram a apoiar um sanguinário na segunda volta das Presidenciais de 2005?
Em 1999 Bacai perdeu na segunda volta para Kumba e em 2005 voltou a perder na segunda volta para Nino Vieira. Proferiu discursos rejeitando os resultados, mais tarde acabou por abrigar os resultados. Depois de tudo, Bacai fixou sua residência em Dakar. Qual foi o pano de fundo dos encontros que teve com Nino Vieira em Dakar?
É de perguntar com que recursos essas figuras mantiveram suas estadas nesses Países (estrangeiros)?
Mais uma vez estamos perante uma situação muito vergonhosa, situação essa que deve merecer atenção de todos nós. No atual cenário político guineense, o candidato derrotado na segunda volta das presidências de 26 de julho passado, tem regalias equiparadas a do presidente eleito¹ a mando do memorando de entendimento assinado entre o vencedor e o vencido. Eis a razão que me levou a dizer que temos dois presidentes. Ainda falta saber outros segredos das clausulas do referido acordo. Quem sabe se desta vez Kumba irá fixar sua residência em NEW YORK? Apesar de ter afirmado que vai fixá-la na Guiné-Bissau.
Sinto muito quando um traidor do povo guineense goza do estatuto equiparado a do presidente da República, escoltado como se fosse ele o presidente eleito. Ainda por cima, tenta enganar a si mesmo julgando que está a enganar o povo guineense, quando presta declarações num encontro que manteve com Malam e primeiro ministro Carlos Gomes júnior após a publicação dos resultados. Quando o Sr. Carlos Gomes Júnior foi questionado por um jornalista se “o governo iria cumprir com as regalias previstas para o antigo chefe de Estado (KUMBA) no Memorando de Entendimento, assinado no último final de semana, Kumba Ialá antecipou –se ao primeiro-ministro, dizendo que as regalias não são o mais importante, pois o mais importante é o país” ² será que podemos acreditar nessa declaração de Kumba? Não!
Se os interesses do país estivessem acima de tudo, KUMBA não teria necessidade de assinar um memorando de entendimento pleiteando regalias. Podia simplesmente reconhecer os resultados eleitorais de 26 de julho sem nenhum pleiteio de vantagem, tendo como referência HENRIQUE ROSA que soube mostrar ao mundo que a Guiné-Bissau tem políticos que pautam pelo civismo para alcançarem o poder e respeito pelas instâncias superiores do País.
Será que Kumba não sabia que os interesses do país estão acima de tudo aquando do seu mandato (1999 - 2003), período no qual o país mergulhou numa desordem total a todos os níveis?
Quando Kumba apoiou Nino (um opositor dos ideais de Amilcar Cabral), na segunda volta das presidenciais de 2005, não sabia que os interesses do país estavam acima de tudo?
Não sou contra qualquer tipo de segurança a nenhum guineense quando existem motivos para tal. Aliás, todos nós temos direito à segurança e proteção no âmbito da cidadania.
Kumba é cidadão como qualquer outro, assim como quaisquer outros candidatos derrotados nas presidenciais ocorridas na Guiné-Bissau desde o início das eleições democráticas multipartidárias, razão pela qual não poderia ser privilegiado.
Se a lei eleitoral guineense permite essas regalias, então resta perguntar por que os candidatos derrotados nas sucessivas eleições presidenciais desde 1994 na Guiné-Bissau não usufruíram das mesmas regalias que o recém derrotado (Kumba) acabou de usufruir?
Os problemas políticos guineenses não se prendem nos acordos, mas sim na lavagem de memória dos nossos políticos, governantes e militares que transitam à margem das leis do País.
O mundo oferece-nos vários caminhos, cada um escolhe por onde seguir, essa escolha depende mais do carácter do que dos ensinamentos. Beto Lopes
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¹ - informação disponível no site www.bissaudigital.com
² - Fonte: LUSA - Agência de Notícias de Portugal
*Estudante do 4º ano de enfermagem - Brasil
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO