NÃO AO FUNDAMENTALISMO TRIBAL!
Por: Isabel Maria da Costa (Nety)
15.03.2009
De muitos desafios com que nos confrontamos hoje em dia e a todos os níveis, torna-se relevante recuarmos no tempo para uma melhor percepção do nosso “cantinho global” e por meio da meditação sentirmos a vibração de todo um conjunto de coisas que nos rodeiam como parte integrante deste universo.
Como se de uma necessidade imperiosa se tratasse, sinto-me na obrigação de tão simplesmente tentar traçar ou interpretar através de um pequeno esboço aquilo que considero ser importante e recorrendo a um pequeno “ retrato” da nossa história tentar alargar um pouco a brecha já iniciada por alguns, para de alguma maneira contribuir em parte, para uma minúscula compreensão da nossa realidade factual como um povo multi-étnico!
É de salientar que no decurso da nossa história, muitos foram os valores incutidos para a formação de cada indivíduo, naturalmente, alguns foram descartados na evidência do não enquadramento ou então, por não se adequarem à realidade. Do incumprimento de alguns requisitos comuns, tais como, a paz, progresso...devido ao afloramento ou insistência nos erros do passado, seria aconselhável uma sessão terapêutica, isto é, o recurso à “hipnose” que tecnicamente, traduz-se no resgate das nossas vivências passadas!
Sob o ponto de vista cronológico, admite-se em certos casos cisão na história global (nossa), ocasionada pela negligência involuntária, alicerçada tão-somente em fragmentos para responder às múltiplas questões! Por isso é imprescindível uma profunda reflexão no sentido de haver uma maior correlação dos factos e eventuais reformulações das nossas reais motivações para a construção de uma Guiné melhor!
A Guiné-Bissau é um país geograficamente constituído por oito regiões: Bolama - parte insular e as restantes regiões continentais: Biombo, Cacheu, Oio, Quinara, Tombali, Bafatá e Gabú a maior, que englobam os respectivos sectores e as distintas tabancas, e por aí adiante. Essa distribuição comporta de forma aleatória e diferenciada vários grupos sociais com certas afinidades entre si e outros nem tanto. Deste modo, forma-se um leque variado tanto em números, hábitos, credos, usos e costumes... a que se confere a nominação de etnia. Pelos registos, contam-se treze etnias ou mais, das quais, segundo o INEP, desfilam-se pela ordem decrescente numérico-percentual como mostra o quadro abaixo:
ETNIAS |
% |
ETNIAS |
% |
Balanta |
29.1 |
Biafada |
2.3 |
Fula |
21,5 |
Bijagós |
2 |
Manjacos |
14 |
Felupe |
1.6 |
Mandingas |
12 |
Balanta- Mané |
1.6 |
Pepel |
7.2 |
Mansoancas (cunante) |
1.2 |
Mancanha (brame) |
3.2 |
Baiote |
0.9 |
|
|
Nalu |
0.6 |
Convém realçar, que esses dados estatísticos não são tão recentes quanto isso, circunstancialmente, devido às razões óbvias que muitos conhecem em relação ao nosso país! Entretanto, espero que estas pequenas anotações sirvam de base para no mínimo espreitarmos essa singular riqueza!
No entanto, essa multitude reúne características particulares bem acentuadas nas suas organizações. Das quais citam-se as duas estruturas mais importantes: a estratificada vertical ou piramidal, definida como uma estrutura hierarquizada, no topo figuram respectivamente, os nobres e chefes com mais privilégios e na base, os camponeses e outros, patente na etnia Mandinga, Pepel (Régulos e os seus súbditos). A não estratificada horizontal, basicamente igualitária sem chefes, mas com um concelho de Homens grandes ou anciãos sem fins económicos ou materiais, destacada na etnia Balanta. As restantes etnias podendo ser consideradas intermédias como é o caso dos Manjacos, Mancanhas...
Supõe-se que, num leque tão vasto e diversificado, viria indiscutivelmente enriquecer de forma categórica a nossa vertente sócio-cultural e não produzir divergências que de certa forma têm fomentado alguns complexos ou crispações no seio da população guineense!
Portanto, desta pequena introdução, sugiro que recuemos um pouco no sentido inverso da nossa história, isto é, até ao período colonial. É preciso constatar que, do ponto de vista táctico estratégico, esses factos acima mencionados não passaram despercebidos por parte dos “solidários”, tendo sido explorados ao máximo, numa tentativa de levar avante a campanha de pacificação e obediência junto dos nativos na esperança de tornar eficaz a já enferrujada máquina colonial!
Para além dessas evidências, saltava à vista a resistência física dos Balantas associada a uma organização não estratificada em contraste por exemplo, com a organização estratificada dos Fulas e Mandingas aliada a uma aparente fragilidade! Tendo em conta esses factores bem como a ocupação territorial maioritariamente em regiões habitadas (Quínara, Oio e outros) por Balantas, operacionalmente, viria a calhar bem, visto que, as suas probabilidades eram bem maiores que qualquer outro grupo, tanto no aspecto numérico, bem como, dos territórios (três?) ocupados num total de oito. Factores que contribuíram em parte para o recrutamento selectivo “militar voluntário”, embora com alguma resistência, traduzida em fuga , emigração ou êxodo para as outras regiões próximas ou fronteiriças!..
Perante esta dicotomia, isto é, as faces da mesma moeda, suportada pelos “solidários” não admira que o seu reflexo como herança e influência no núcleo dos defensores da pátria se arrastasse até aos dias de hoje, por outro lado, dada a ausência de reformas estruturais com o passar dos anos. Surpreendentemente, de muitas campanhas levadas a cabo, uma delas seria instigar contradições, rivalidades e conflitos entre os vários grupos, separá-los para melhor reinar! Mas estava fora de questão que esse critério viesse a converter-se numa “tradição” e mais tarde numa arma mortífera!
Poder-se-á desta maneira “tão simples” justificar a origem do maior número de indivíduos de etnia Balanta nas actuais Forças Armadas guineenses, tal e qual, a sua participação activa e maioritária na defesa dos direitos da nação e a conquista da independência, sem esquecermo-nos das primeiras zonas libertadas!
Mas atenção, não quero com isto dizer que as outras etnias não participaram, de maneira nenhuma, pelo contrário, houve resistência em todas as frentes, um facto a destacar por exemplo, os Pepéis, na região de Biombo concretamente em Bissau, onde as campanhas nunca foram pacíficas, por outro lado, os Biafadas... resultando em mortes sem precedentes, consequências de numerosas batalhas sangrentas.
Curioso é, digo eu, de tudo que se herdou, o melhor instrumento que é a língua portuguesa, é deficiente e mal aplicada!!! Em contrapartida passou a reinar a falta de liberdade, exploração do homem pelo homem, manipulações, imitações, mentiras!...
Contudo, não raras vezes tem-se observado posturas que dão claras evidências da fragmentação histórica da Guiné, de forma alusiva tentar dar respostas a casos isolados através de manipulações, luta pela sobrevivência e protagonismos, em certos casos, para justificar possíveis deteriorações ou clivagens sociais, gerando clima de desconfiança, mal-estar e outros!
Por um lado, podemos admitir que essas posições são “aceitáveis”, isto é, no terreno da competitividade sã, desafios amigáveis em prol de benefícios comuns ou generalizados que contribuirão efectivamente para o desenvolvimento, e não um hipotético fuzilamento do nosso “mosaico étnico-cultural” sem dúvida, uma das maiores riquezas desta pequena parcela do globo que nos foi destinada! Daí, o imperativo da realização desta pequena viagem no tempo para a valorização dos dados inerentes à nossa natural e complexa diversidade.
Particularmente, fico estupefacta e triste por este tema se candidatar aos “panos de fundo” na nossa sociedade! Eventualmente, dadas as oportunidades de vivências e convivências em virtude dos laços parentais e sociais que tive, vincadas nos valores inculcados desde muito cedo, razões pelas quais considero infundável, quer para justificar casos passados quer os actuais. E muito me orgulho de poder dizer que contribuíram positivamente para uma mentalidade mais aberta! Salvaguardando ainda as convivências com pessoas de “origens diversas”, reflectindo uma enorme tolerância e harmonia entre todos sem que houvesse conflito de interesses por parte ou entre Fulas, Mandingas, Balantas, Manjacos, Nalus, Bijagós, Pepéis, Mancanhas...) uma experiência que relato em jeito nostálgico e dizer que foram e continuam a ser todos humanos e talvez os melhores, dos quais, aspiro reencontrar, acreditando tratar-se das melhores experiências que me proporcionaram até hoje. Obrigada!
Este resumo tão-somente serve para incentivar um espreitar esguio na nossa cultura (étnico) social, desejando uma maior união e confiança entre todos e quem sabe, advirem daí possíveis bons frutos!
Unidos pela diferença e esta pela diversidade do bem maior.
Portanto, é urgente a devida higiene mental para o bem-estar de todos! Um desafio entre muitos!
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