NOTAS CONSTRUTIVAS SOBRE O CONFLITO POLÍTICO NA GUINÉ-BISSAU: onde está o problema e a solução?
Ricardino J. D. Teixeira[1]
ricardino_teixeira@hotmail.com
26.06.2009
De um período para cá, alguns líderes de partidos políticos e da sociedade civil nacional e internacional dividiram-se em dois campos opostos e antagônicos na busca de respostas urgentes para os problemas com os quais a Guiné-Bissau vem enfrentando ao longo da sua história política, principalmente com os assassinatos recentes no país de Amilcar Cabral. De um lado, encontram-se os proponentes da intervenção militar estrangeira. Apoiando-se em argumentos como a perda da soberania nacional devido às disputas de poder profundamente influenciada pela promiscuidade política de alguns elementos de Estado.
No outro lado, estão os proponentes de solução interna para a crise política. Essa segunda perspectiva ganhou força ultimamente, não só dentro do país entre os principais líderes políticos, como fora dele. A recente opinião de ex-presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, parece ser paradigmática dessa nova tendência de opinião internacional.
As duas perspectivas não resolvem o problema, reforça-o. Tudo não passa de uma construção retórica de uma visão simplista sobre formas de resolução de conflito na Guiné-Bissau. Se for isso ou aquilo, dependem de interesses, lugar e visão de cada um subjacente ao problema. Quem diz que o problema político da Guiné exige uma intervenção militar, no momento? Quem garante que internamente surgirão soluções democráticas aos problemas? A busca de novas alternativas não surgirá só de fora e nem apenas entre a elite política, mas uma construção que combina o interno e o externo. Isto porque a missão das forças de intervenção visa apenas uma aparente estabilidade, bastante contingente e frágil, não toca nas questões de raiz.
Também os partidos políticos e classe política guineense não parecem em condições de apresentar um projeto orgânico de Estado para resolução de problemas da sociedade. O que temos assistido e visto são estratégias e projetos de personificação da política e das questões políticas para assumir o controle hegemônico de Estado. A política guineense sempre foi personificada, muito antes da independência nacional contra o regime fascista de Portugal. Essa personificação teve implicações serias na formação de novas elites governamentais. O centralismo-partidário e a personalismo do sistema político guineense solaparam as bases internas e externas que pudessem facilitar a emergência de novas elites com capacidade política de articular as diferenças numa cadeia de equivalência no processo da construção social e da identidade nacional.
Não podemos continuar a rejeitar as diferenças que constituem a base da sociedade guineense. Este foi o grande mérito de Cabral, porém não mereceu consideração desde o primeiro governo de Luís Cabral que assumiu o poder político na Guiné-Bissau. Também não deixa de ser verdade que a influencia teórica de Cabral sobre os intelectuais guineenses foi bastante forte. O que continua difícil são as pessoas aceitarem a perda da centralidade de conflito de classes na análise do pensamento social e político da Guiné-Bissau. Não podemos transpor a realidade ocidental para a realidade concreta guineense. Na Europa e nos Estados Unidos são perfeitamente concebíveis as análises baseadas no conflito de classe, sobretudo no atual contexto da crise financeira onde a classe trabalhadora é a mais afetada.
Essa forma de analisar o problema oculta o peso de outros grupos sociais que lutam pelo reconhecimento e hegemonia, apesar da forte herança de miscigenação e de contatos históricos baseados na troca e comércio entre diferentes grupos sociais que hoje constitui a sociedade guineense. Nisso daí, nós compartilhamos e concordamos, mas não podemos esquecer o peso de outros grupos sociais que lutam pelo reconhecimento na sociedade contemporânea guineense. Esse reconhecimento não pode ser separado das questões materiais, culturais, econômicas ou quando projetamos caminhos para a resolução de conflitos políticos no continente africano, particularmente na Guiné-Bissau. Se for só para repor temporariamente a legalidade constitucional do Estado sem ir a raiz do problema, a intervenção militar não serve. Se for só para demonstrar ou tentar demonstrar a sociedade civil nacional e internacional que os líderes políticos são capazes de resolver o problema internamente, sem intervenção estrangeira, também não resolve o problema. A solução está fora ao mesmo tempo também está entre os próprios guineenses e amigos da Guiné-Bissau.
[1] Mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor de sociologia na Faculdade de Ipojuca - Brasil
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Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO