O PODER NA GUINÉ-BISSAU: ENTRE A HIPOCRISIA E O SERVILISMO

Suborno - "suco di bas" quadro de João Carlos Freitas de Barros "Caíto"

 

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

20.01.2008

Se hoje, a comunidade internacional continua a questionar quem mais para dirigir a Guiné-Bissau senão de entre os nomes de João Bernardo Vieira, Kumba Yalá ou Malam Bacai Sanhá, isso é, em parte, culpa dos próprios guineenses que, não acreditando na renovação e, consequentemente, na afirmação de valores emergentes, cujos percursos, por si só, deveriam simbolizar a esperança e uma visão de futuro para a mudança urgente e necessária de que o país precisa, continuam a ser cúmplices da manutenção, em cena, de fantasmas que se confundem com governantes, de assassinos que se confundem com magistrados da nação, ou de camaleões que confundem  a cor do interesse nacional com a cor do interesse pessoal, partidário, etc.

Hoje dizemos nas conversas de rua que foi a comunidade internacional, por jogos de interesse, a impor o general ditador Nino Vieira como Presidente da Guiné-Bissau, quando, em condições normais: de Justiça e transparência, ao general ditador impunha-se um inquérito exemplar pelas atrocidades cometidas durante quase duas décadas de irresponsabilidade governativa num percurso em que foi sempre senhor absoluto nas tomadas de decisão.

Para além do general ditador, todos os demais irresponsáveis cujos desempenhos e acções foram ou têm sido prejudiciais ao país e aos guineenses deviam (e devem) ser processados judicialmente, para que ninguém fique impune e para que a Verdade e a Justiça sejam tidas como espelhos conselheiros de cada guineense, na Guiné positiva que devemos pensar construir; uma Guiné-Bissau que sirva de orgulho aos guineenses, mas também de referência aos nossos amigos e ao mundo!

Hoje, essa comunidade internacional deve estar arrependida por ter forjado o regresso do general ditador ao poder, confiante de que a estabilidade governativa na Guiné-Bissau só seria possível através de um poder ditatorial, o tal com que Nino Vieira destruiu a Guiné-Bissau, tendo inclusive mandado assassinar todos quantos lhe foram incómodos.

Os guineenses, felizmente, conhecem o seu passado. Sabem o que aconteceu ao longo de 34 anos de independência, ainda que nada tenha sido feito no sentido de levar à Justiça os que hoje continuam a desgovernar, a destruir, a mandar matar, a comprometer o país com negociatas do narcotráfico etc.

Francisco Benante entre os generais Ansumane Mané e Veríssimo Seabra, ambos assassinados, sendo que os autores morais e materiais ficarão impunes ao abrigo da Amnistia aprovada pela Assembleia Nacional Popular.

Mas hoje, ficamos a saber, por um deslize do Presidente da Assembleia Nacional Popular, o Dr. Francisco Benante, que: " ...quando os valores de direito, a justiça e a segurança se contradizem, a única solução que resta é privilegiar a segurança da sociedade em detrimento da justiça."

Ou seja, encontramos resposta para muitas interrogações sobre questões óbvias a merecer acção judicial, mas que, por conveniência e em nome de uma certa sociedade, foram simplesmente ignoradas... Francamente triste!

Não estou aqui para incentivar os guineenses a revoltarem-se contra nenhum poder, seja ele qual for, no entanto, não posso, nem devo ficar indiferente ao que se passa na Guiné-Bissau, porquanto, também ser a minha terra!

Não sendo apologista da violência e muito menos do sacrifício de vidas humanas para se conseguir atingir determinado fim, não posso deixar de ser coerente com a lógica de que, tudo na vida, em condições normais, consegue-se apenas com sacrifício e os guineenses, se quiserem mudar algo na Guiné, têm que assumir que estão dispostos a enfrentar todos os desafios que uma mudança exige,  preparando-se para enfrentá-los de imediato no dia-a-dia!

Eu estou preparado para qualquer sacrifício, longe de fundamentalismos ou radicalismos, mas atendendo aos princípios da ética e da moral, da democracia e da vida, acima de tudo, para garantir a minha liberdade e a dos meus irmãos na terra que é de todos nós, fazendo com que os reflexos dessa liberdade permitam projectar novos horizontes, de Estabilidade, de Paz e Desenvolvimento para o nosso país!

Na Guiné-Bissau, o povo foi desde sempre sacrificado e, nos tempos que correm, continua a sê-lo, servindo interesses que não os seus, fazendo sacrifícios para servir elites e não a si próprio.

 Para que o conceito de sacrifício tenha utilidade na mudança de vida dos guineenses e consequentemente, na afirmação e dignificação do país, cabe ao povo guineense exigir responsabilidades aos que dirigem os destinos do país!

Cabe ao povo guineense reclamar ser ele o dono da terra e não dar esse privilégio a uma centena de oportunistas que em nome desse mesmo povo tem-se enriquecido de noite para dia, empurrando o país para uma situação de desgraça e comprometendo o futuro das gerações vindouras.

A pobreza, numa alusão global, tem contribuído para a "morte lenta" do povo guineense, uma "morte" que deve ser evitada!

Mas num país de pobreza extrema para a maioria do seu povo, num país em que a maioria dos funcionários do Estado não recebe os seus salários (alguns têm anos de salários por receber), sejam eles os que trabalham na Guiné, sejam os que trabalham nas missões diplomáticas no exterior e até os estudantes bolseiros, como é possível que todos fiquem indiferentes vendo o desfile de viaturas de luxo no país, assistindo à construção de palacetes, ao esbanjar de dinheiro nas deslocações de governantes ao estrangeiro, premiadas com ajudas de custo incomportáveis para o país?

Como é possível que os guineenses fiquem à espera de milagres para a resolução dos seus problemas?

Onde estão os hospitais e centros de saúde em vez de palacetes?

Onde estão as escolas em vez das viaturas de luxo?

Onde está a responsabilidade da governação cumprir com os direitos dos funcionários, quando os governantes não se queixam de salários em atraso e mesmo que se queixassem, é visível que não passam por dificuldades por que passam os funcionários públicos, que há muito perderam conta do que o Estado lhes deve! ?

Quem, para além dos guineenses, deve lutar pelos seus direitos?

Quem, para além dos guineenses, deve exigir o cumprimento dos deveres aos nossos governantes?

Quem, para além dos guineenses, deve exigir que a Justiça seja um património comum, um pilar de sustento da própria democracia e não uma sombra de si própria, quando os compromissos de conveniência se sobrepõem aos compromissos nacionais expressos na carta magna que é a Constituição da República?

Quem, para além dos guineenses, para dizer aos governantes e politiqueiros, particularmente ao Sr. Dr. Francisco Benante, Presidente da Assembleia Nacional Popular que só num Estado ditatorial, como o nosso, é que por conveniência, grupos de pessoas se sobrepõem à Justiça, um bem colectivo, tal como argumentou no seu discurso de cumprimentos de Ano Novo ao Presidente da República e em relação à Amnistia Geral aprovada pelos deputados?

"Essa amnistia, Senhor Presidente da República, não tem por fim a impunidade como certos sectores da nossa sociedade alegam. Ao contrário, os Senhores Deputados da Nação, conscientes das suas responsabilidades, compreenderam que, quando os valores de direito, a justiça e a segurança se contradizem, a única solução que resta é privilegiar a segurança da sociedade em detrimento da justiça."

Discursos, actos e comportamentos hipócritas num país que continua a ter a Verdade e a Justiça como princípios contrários à Reconciliação, à Paz, à Segurança e Estabilidade, porquanto a maioria dos politiqueiros, governantes, ex-governantes e alguns militares, os de alta patente, terem princípios contrários ao espírito da Verdade e da Justiça, visto terem cometido assassinatos, desvios de dinheiro etc. e temerem a confrontação com a Justiça!

Os que estão nesta situação (poucos, mas com poder), querem fazer crer aos muitos (sem poder) e que pensam o contrário, que a razão não lhes assiste e, por via disso, devem aceitar que se condicione a Justiça em detrimento da Segurança.

Que segurança Sr. Dr. Francisco Benante?

O que é a Justiça, senão uma casa estruturada com leis, princípios, regras e valores tendentes a servir os interesses, arbitrar conflitos e proteger a sociedade, num todo, evitando que os mais poderosos, quer pelo estatuto de autoridade de poder, quer pelo estatuto do poder económico, quer do estatuto do poder da força etc. estejam acima dos que não se enquadram nestas definições etc. e, por conseguinte, se considerem impunes?!

E desde quando chegamos ao ponto de se terem esgotado todas as alternativas, para afirmar que a única solução que resta é privilegiar a segurança da sociedade?

O nosso povo foi ouvido?

Os deputados que estão em funções, por acaso foram os que o nosso povo escolheu da forma como se apresentaram nas eleições de 2004?

O governo que hoje temos é o governo que o nosso povo escolheu em 2004?

Os familiares de inúmeras vítimas de assassinatos, abusos de poder etc. foram ouvidos ou sensibilizados previamente sobre esta Amnistia?

O Dr. Francisco Benante, a exemplo de outras figuras da nossa praça, tal como o Dr. Francisco Fadul, a quem muitos guineenses chegaram a ter como pessoas capazes de mudar a Guiné, parece ter encontrado no camaleão, o exemplo a seguir sobre a melhor forma de estar na vida, misturando-se com todos, bastando para isso a mudança de cor...

O Sr. Dr. Francisco Benante é jurista...mas pelos vistos não acredita na essência da Justiça, ou será que por não conseguir "vencer" o general ditador, resolveu aproximar-se a ele utilizando a técnica do camaleão?

 Ou será ainda que está a utilizar a técnica dos engraxadores de sapato por forma a garantir apoio para uma provável candidatura à liderança do PAIGC?

Se tudo correr como previsto, teremos ainda este ano eleições legislativas, o que significa que também a nível da Assembleia Nacional Popular poderemos ter mudanças, pois o Pacto de Estabilidade Governativa tem -se auto-fragilizado, o que motiva desde já, uma certa desconfiança (mútua) dos partidos signatários, para mais, quando os referidos partidos, internamente têm problemas urgentes por resolver, sem que saibam como resolvê-los...

O Dr. Francisco Benante que já foi Presidente do PAIGC estará a preparar-se para uma nova candidatura à liderança do maior partido guineense (está no seu direito, mas, não comprometa o povo guineense com as suas pretensões), aproveitando o carisma de alguns dissidentes que nunca esconderam ser fiéis ao general ditador Nino Vieira, para o apoiarem na disputa a essa liderança, desde que o Dr. Francisco Benante faça cumprir na Assembleia Nacional Popular determinados requisitos impostos; como a Amnistia Geral e sabe-se lá mais o quê que claramente beneficia Nino Vieira e todos os seus fiéis executantes?

Ou será que as relações entre o Presidente da República e o Presidente da Assembleia Nacional Popular foram sempre as melhores? Como explicar então que, institucionalmente, ao senhor Presidente da Assembleia Nacional Popular, segunda figura na hierarquia do Estado, o Presidente da República sempre ter negado/ignorado essa realidade, pois nunca delegou, nas suas ausências frequentes do país, responsabilidades de Estado ao Presidente da Assembleia Nacional Popular, como manda a Constituição da República?

Li o discurso do Dr. Francisco Benante na cerimónia de cumprimentos de Ano Novo ao Presidente da República e para além de muita hipocrisia, também encontrei evidências de muito servilismo.

É caso para dizer: ao Presidente da República e à primeira dama, tudo de bom. E para o povo guineense Sr. Dr. Francisco Benante?

 

República da   Guiné-Bissau

Assembleia Nacional Popular

 

 

Intervenção de Sua Excelência, senhor Dr. Francisco Benante, Presidente da Assembleia Nacional Popular, na cerimónia de cumprimento de um Novo Ano, à Sua Excelência Senhor Presidente da República, no dia 07 de Janeiro de 2008.

 

Novembro 2007

Sua Excelência Senhor Presidente da República e Primeira-dama,

Excelências 1ª e 2º Vice-Presidentes da ANP,

Senhores Conselheiros e Assessores do Senhor Presidente da República

Digníssimos Deputados da Nação,

Excelências Senhores:

-          Presidente da Comissão Nacional Eleitoral;

-          Inspector Superior da Luta contra a Corrupção

-          Presidente do Conselho Nacional da Comunicação Social;

Minhas senhoras e meus senhores,

Com o dealbar de um novo ano, estamos a renovar as nossas esperanças de cimentar as nossas conquistas e criar novas e mais convincentes estratégias para que possamos conduzir o nosso país ao bom porto.

Quero saudar Sua Excelência Senhor Presidente da República, bem como a Primeira-dama e igualmente os altos dignitários do país aqui presentes e desejar-lhes um Novo Ano de saúde, de prosperidade, de venturas e de longa vida.

O Novo Ano, deve ser uma nova oportunidade para conjunta e corajosamente procurarmos encontrar as melhores soluções para a Guiné-Bissau, renovando uma vez mais o nosso desejo, em nome da paz e dos superiores interesses da nossa pátria, a nossa expressa vontade de lutar no sentido de construirmos os alicerces sólidos para o desenvolvimento da Guiné-Bissau em todos os domínios.

Para além de uma mera cerimónia protocolar, esta oportunidade que nos proporciona confraternizar e perspectivar uma nova era de esperança, que entendemos como sendo um ponto de partida crucial para a consecução das nossas legítimas aspirações de construirmos uma nova Guiné-Bissau mais democrática e mais próspera e que esse desenvolvimento possa ir ao encontro das supremas ambições do nosso corajoso e abnegado povo.

Quero aqui testemunhar a plena e cabal disposição dos Deputados da Nação em continuar a dar o seu melhor para que este desiderato patriótico possa ser materializado de forma sustentável e transparente.

Excelência, Senhor Presidente da República,

Acabamos de aprovar de forma livre e por unanimidade, a Lei da Amnistia Geral, como uma medida essencial que vai permitir o reencontro dos irmãos guineenses, em geral e dos Combatentes da Liberdade da Pátria, em particular.

Essa amnistia, Senhor Presidente da República, não tem por fim a impunidade como certos sectores da nossa sociedade alegam. Ao contrário, os Senhores Deputados da Nação, conscientes das suas responsabilidades, compreenderam que, quando os valores de direito, a justiça e a segurança se contradizem, a única solução que resta é privilegiar a segurança da sociedade em detrimento da justiça.

Quero assim, em nome da Assembleia Nacional Popular, levar ao conhecimento de Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, que os Deputados da Nação reconheceram e afirmaram que a concessão da amnistia geral não deve ser jamais entendida como um incentivo à prática de actos semelhantes aos que foram amnistiados, em termos de futuro, mas sim o fim definitivo desse tipo de comportamento.

Nesta ordem de ideia, convido expressamente Sua Excelência Senhor Presidente da República, se assim o entender e achar oportuno, a organização de um encontro nacional, envolvendo as Instituições da República, a sociedade civil e demais participantes que entender ser úteis, para nesse fórum, explicarmos ao povo guineense, o sentido desta amnistia e em nome da República que o Senhor representa como garante supremo da Constituição, pedirmos desculpa aos guineenses em nome dos erros que todos nós cometemos e que são a causa principal e única do nosso atraso e sofrimento.

Sua Excelência Senhor Presidente da República,

Esta cerimónia tem lugar no ano em que novas eleições legislativas devem ter lugar, condição que deve servir para consolidar e reforçar as instituições da República, como condições vitais para podermos atingir os objectivos que fixámos como prioritários e vitais para assegurar o futuro da Guiné-Bissau, ou seja, a consolidação da paz, da reconciliação e da materialização em bases sustentáveis do Estado de Direito Democrático.

Estamos absoluta e firmemente convencidos que só com um clima de normalidade e reforço das Instituições da República, podemos retirar a Guiné-Bissau da situação de grande e crescentes dificuldades com que se confronta, daí o meu apelo ao reforço da nossa união e de interdependência, como factores de garantia de sucesso para os grandes problemas que temos pela frente.

O nosso apelo é um acto cívico, ético e patriótico, que deve ser entendido como um sinal claro de responsabilidade perante os imensos desafios que temos na nossa luta comum contra a pobreza e cujas principais vítimas continuam sendo as mulheres e as crianças guineenses.

Continuamos a defender que as experiências vividas num passado recente e as ilações que todos nós delas retiramos, dão-nos hoje não somente a certeza, como aprofundam a nossa convicção de que só as vias do diálogo, do entendimento e da legalidade constituem as premissas que devem guiar a nossa actuação e dar consistência prática a nossa vontade e determinação de construir sustentavelmente a Guiné-Bissau.

Para o efeito, as minhas renovadas esperanças de ver o ano de 2008, como o ano da consolidação da paz e da estabilidade para a Guiné-Bissau e aproveitar esta oportunidade para reiterar à Sua Excelência Senhor Presidente da República o nosso firme desejo de trabalhar e reforçar a nossa colaboração, na base da complementaridade e interdependência, em prol da Guiné-Bissau e dos guineenses.

Desejo, em nome dos Deputados da Nação, os melhores votos de um Novo Ano de felicidades e de prosperidade para Vossas Excelências e para todos os guineenses.

Quero, para terminar, reafirmar aos guineenses e à Sua Excelência Senhor Presidente da República, o nosso firme compromisso de continuar a trabalhar com ética e rigor, colocando sempre à frente os interesses da Guiné-Bissau.

Boa saúde, longa vida e prosperidades para Sua Excelência Senhor Presidente da República, para a Primeira-dama e vossa família.

A nação guineense pode contar connosco como Deputados e muito obrigado!

Mas não só Francisco Benante é exemplo de hipocrisia e servilismo nos dias de hoje na Guiné-Bissau.

Dr. Francisco Fadul sempre ao serviço da conveniência

Quem não segue o percurso do Dr. Francisco José Fadul, ele que, vai criando partidos e fugindo deles à medida que é confrontado com opiniões adversas?

Quando se cria um partido, deve-se lutar por ele, e isso implica rever o que está mal, sempre que houver crises e nunca abandonar esse mesmo partido, simplesmente por divergências de opinião.

O Dr. Fadul que hoje ocupa o cargo de Presidente do Tribunal de Contas da Guiné-Bissau sendo igualmente Presidente de um partido, o PADEC, não poderia ser mais contraditório nas suas reivindicações partidárias ao longo dos últimos meses, reivindicações essas em gesto de pré-campanha eleitoral, dando a conhecer, num deslize também, o seguinte:

Ao ser confrontado com o facto de ser Presidente de um partido e aceitar presidir uma instituição do Estado, neste caso, o Tribunal de Contas, o Dr. Fadul respondeu da seguinte forma: "Não existe nenhuma interdição legal e os últimos antecessores eram igualmente dirigentes partidários, de outras formações políticas. "

O Dr. Fadul esqueceu-se de que dirigente partidário não é a mesma coisa que líder partidário, ou Presidente de um partido!

Um líder partidário ou Presidente de um partido, é quase sempre a figura desse partido para as eleições legislativas ou presidenciais e, por força disso, não deve estar à frente de uma instituição como o Tribunal de Contas, pois, tal como já se viu, o Dr. Fadul, assim que assumiu a Presidência do Tribunal de Contas começou por fazer campanha contra o Governo em funções, no sentido de o desgastar, desestabilizando a governação e o país, ele que é um representante do Estado!

Os antecessores de que fala o Dr. Fadul não eram Presidentes dos seus partidos e, mesmo que o fossem, onde está a ética, o sentido de mudança, de romper com o passado incorrecto, da aprendizagem dos erros para evitar que se repitam, Sr. Dr. Fadul?

Porque aceitou, argumentando que no passado também foi assim, o Sr. que diz não viver do passado nem para o passado...e sim para o futuro. De que futuro se refere Dr. Fadul, do seu futuro pessoal?

O Dr. Fadul, numa entrevista ao jornal Kansaré a 08 de Agosto de 2007,  e confrontado com os motivos que o levaram a abandonar o seu anterior partido o PUSD referiu-se ao passado da seguinte forma:

"Não vivo para o passado nem do passado, mas para o futuro. São já sobejamente conhecidos esses motivos, mas não me prendo a eles. Só quem é incapaz de inteligência fica amarrado ao ontem, por não saber adaptar-se consciente e criativamente a novos contextos e conjunturas.  

O Dr. Fadul, já sabemos que há muito domina a arte do camaleão, mas está na hora de lhe fazer ver que basta de tanta hipocrisia, de tanta arrogância e servilismo a favor do seu herói Nino Vieira.

Nestes meses de afastamento da função pública, continuei sempre a agir como homem de Estado: já escrevi onze projectos, inclusivamente o de nova Constituição para o meu povo e o meu país que, contra todas as calúnias e difamações, amo acima de mim próprio e, contra todas as repressões e opressões, vou continuar a servir. E não há força neste mundo capaz de mo impedir. 

Se o Dr. Fadul não consegue  manter os partidos que cria, como arranja argumentos para elaborar e sustentar uma Constituição? Por acaso consultou algum constitucionalista nacional nesse sentido, ou teima em ser o único a ter assas para voar, como costuma dizer...?

Foi-lhe questionado se tinha apresentado condições para aceitar o cargo de Presidente do Tribunal de Contas, ao que prontamente respondeu:

- Independência total, só limitada pela lei. Contrapartidas, nenhumas: continuo com o estatuto remuneratório de pensionista, por minha opção, isto é, fico na mesma e trabalho de novo para o Estado e a sociedade.

Pelo que me foi dado a conhecer, e se estiver errado, peço ao Dr. Fadul que me corrija, pois sei que terá oportunidade de ler este texto; o actual Presidente do Tribunal de Contas é pensionista na condição de Coronel das Forças Armadas, ao abrigo do estatuto de Combatente da Liberdade da Pátria... Verdade ou mentira, cabe ao Dr. Coronel Francisco Fadul responder!

A ser verdade, como conseguiu a patente de Coronel das nossas Forças Armadas Sr. Dr. Fadul?

No desempenho deste cargo de Presidente do Tribunal de Contas, porque não age dentro da ética profissional e institucional, ao invés de tratar na praça pública questões de Estado, quando há espaço próprio para a abordagem deste tipo de situações?

Não se pense que sou contrário à denúncia e punição das infracções que têm lesado o Estado guineense, longe disso!

O que acho que deve ser feito, é promover a transparência, com base na legitimação dos cargos públicos, em primeira instância e, elaborar processos legais, não por conflitualidade de interesses, pessoais ou partidários, mas,  no sentido de proteger e servir o Estado.

Daí o Dr. Francisco José Fadul não preencher os requisitos para ocupar o cargo que lhe foi oferecido pelo Presidente da República.

É preciso de facto que se reveja a questão dos dinheiros desviados, das casas do Estado que passaram a ser património dos governantes que ao deixarem os seus cargos ficam com tudo que adquiriram em nome dos ministérios ou instituições representados!

Mas já que o Dr. Fadul está à frente do Tribunal de Contas, porque não confirmar ou desmentir as acusações que fez a Nino Vieira, numa entrevista ao semanário português "EXPRESSO" a 05 de Dezembro de 1998 e em que, entre muitas coisas, disse o seguinte:

F.F. - Exactamente. Nino Vieira, que nunca recebeu herança que se conheça, que nunca recorreu a um crédito bancário significativo, hoje é um dos homens mais ricos do mundo.

EXP. - Do mundo?

F.F. - Sim. E Presidente de um dos países mais pobres do mundo. A sua fortuna está avaliada num montante aproximado ao da dívida externa da Guiné-Bissau.

EXP. - Essa acusação é pesada. Dispõe-se a prová-la em tribunal?

F.F. - Já escrevi um livro sobre isso, mas ninguém o imprimiu. Se for o caso, garanto que me defenderei.

Hipocritamente, o Dr. Fadul responderá que não vive do passado ou para o passado, mas sim...para o futuro e, ponto final!

Hoje a imagem que o Presidente do Tribunal de Contas, na pessoa do Dr. Coronel Francisco José Fadul, transmite ao país é de que o Tribunal de Contas alterou o seu estatuto de instância judicial, na qualidade de um órgão de Soberania, para o de um partido político conhecido como PADEC, candidato às próximas eleições legislativas na Guiné-Bissau, tendo como candidato à chefia do governo o seu Presidente, do PADEC e do Tribunal de Contas, obviamente...

Infelizmente, a hipocrisia e o servilismo fazem parte da boa governação na Guiné-Bissau, que o diga o actual Primeiro-Ministro e todos os que anteriormente desempenharam essa função, pois a cada viagem do general ditador - Presidente da República, (ida e volta), tem que ir ao aeroporto quer queira ou não...para se colocar em fila e cumprimentar o dono do poder!

Quanto a outros símbolos da mesma espécie, os exilados Kumba Yalá e Malam Bacai Sanhá continuam a usufruir das mordomias que o acordo pós- eleições presidenciais de 2005 lhes proporcionou, sendo que um a viver em Marrocos e outro no Senegal, ambos livres de encargos e principescamente subsidiados...para se manterem mudos, surdos e cegos...

Que o nosso povo se levante. Que o nosso povo se organize. Que o nosso povo saia à rua sempre que for necessário! Se o povo reclama por Justiça, deve haver Justiça...! É preciso que o povo volte a ser o dono da terra!

ENTREVISTA DE FRANCISCO JOSÉ FADUL, PRESIDENTE DO PADEC, AO JORNALISTA BACARI MANÉ, DO JORNAL KANSARÉ, DE BISSAU, A 08.AGO.2007, PARA A EDIÇÃO DE 13 DO MESMO MÊS 

O que é, quando e quais os objectivos e motivos que estão na base da criação do PADEC? 

A situação de atraso do país e de penúria dos trabalhadores; a exoneração do Estado em relação aos seus fins – ou seja, o Estado não está a cumprir a finalidade da sua existência; a corrupção; o peculato; o abuso de confiança; o enriquecimento sem causa; a degradação da moral, da saúde, da educação, da segurança social; a criminalidade violenta; o despesismo público; a ausência de investimento público; o empobrecimento contínuo dos Camponeses através da insistente desvalorização da castanha de caju em proveito de monopólios clandestinos, a marginalização e humilhação dos Combatentes da Liberdade da Pátria, das Mulheres e dos Jovens. 

Que motivos o levaram a abandonar o PUSD? 

Não vivo para o passado nem do passado, mas para o futuro. São já sobejamente conhecidos esses motivos, mas não me prendo a eles. Só quem é incapaz de inteligência fica amarrado ao ontem, por não saber adaptar-se consciente e criativamente a novos contextos e conjunturas.  

Como analisa o seu percurso político? 

Uma permanente fonte de satisfação espiritual, pois me permite oferecer contínua e gratuitamente aos meus concidadãos e ao mundo o que a vida - com a graça de Deus, o investimento do meu pai e o meu esforço disciplinado - me permitiu acumular de bom.  

Há quem diga que o Governo do Fórum de Convergência para o Desenvolvimento foi obra sua. Quais as razões que o levaram a abandonar este espaço e as funções de Conselheiro Pessoal do Presidente da República? 

Fui, realmente, quem o concebeu, escreveu, negociou, coordenou e humildemente convenceu as partes integrantes a confiarem umas nas outras, a pôr de lado o que as separava ou diferenciava, como condição de estabilidade e de governabilidade do país, e com o nobre objectivo final de construir o progresso e a prosperidade para cada um dos nossos concidadãos. 

Mas era necessário governar efectivamente! E o tempo foi consumido em discursos altivos, em pretensiosismos de duvidosa intelectualidade e de tecnicidade falhada. O Governo tinha o dobro do número de pelouros que devia ter num país em ruínas. A farsa arrogante e obtusa continuou. Como ninguém parecia disposto a respeitar os pressupostos justos que me tinham norteado a sugerir e a criar o projecto daquela aliança política e porque a situação se degradava aceleradamente, agravada por truques e falsidades contra os próprios aliados (contra mim em especial), decidi sair e deixar que me provassem que as asas com que voavam eram deles. Mas o tempo rapidamente provou que não sabiam voar, como aliás eu já tinha várias vezes assegurado previamente a quem tinha o direito de ouvir oficialmente os meus considerandos e conselhos. 

Por outro lado, muitos barafustaram quando da criação do Fórum. Chamaram-no de ilegal, inconstitucional. Mas pouco depois, imitando a mesma engenharia política, criaram uma cópia e, beneficiando dos erros, das incapacidades e do nulo serviço do Fórum, substituíram este no Governo. A partir de então, passaram a considerar legal e constitucional o que na véspera injuriavam…Enfim, política de polichinelo

Saí da Presidência porque as minhas propostas e sugestões esbarravam continuamente com o ascendente de gente - da Presidência e de fora desta - de mentalidade monolítica, monopartidária, astuciosa, acintosa, ardilosa, incompetente e insensível aos sofrimentos dos trabalhadores e ao descalabro do país. Gente com uma cultura de poder desviada do serviço aos cidadãos e centrada na ostentação, no discurso balofo, na aparência, gente que já nem se lembrava das promessas eleitorais mais recentes, talvez porque não tinham enfrentado o povo nas suas tabancas, a pedir-lhe o voto e, por isso, o povo não fazia parte do seu horizonte político. 

Como ninguém tomava as medidas que a situação exigia e como nem sequer eram aceites as minhas recomendações e projectos de intervenção no sentido de que o Estado devia confessar publica e honestamente aos cidadãos os seus erros e a gravidade da situação (com a promessa e o cuidado de fazer melhor para cada um, em cada órgão de soberania), compreendi que não tinha mais nada a fazer lá. Saí a 26 de Abril, mas já tinha declarado a vontade de sair desde 20 de Janeiro, isto é, setenta e dois dias depois da minha nomeação. 

E, afinal, aqui também eu tinha razão, infelizmente: a droga, cujo tráfico “não devia ser admitido”, revelou-se a si própria como uma realidade atroz e indigna, tornando o nosso país tristemente célebre em todo o mundo; o desgoverno, que “não devia ser admitido”, evidenciou-se a si próprio e fez cair … o próprio Governo; a incompetência e o crime, saltaram aos olhos de todos, com empresas ilegais à conta dos agentes superiores do Estado, para explorar impiedosamente os camponeses já na miséria; com impedimentos arbitrários à legalização de sindicato; com negociatas de Bilhetes de Identidade de segurança duvidosa, de chapas de matrícula para os carros “que até permitem detectar os ladrões dos carros”, como se os ladrões, depois de roubarem os carros, lhes mantivessem as matrículas legais para poderem ser descobertos; com financiamentos a estruturas e efectivos de um partido, como nos tempos do monopartidarismo e sem pagar aos empregados do Estado; com financiamentos à corrupção de chefias de outros partidos, para destruir as lideranças destes e fazer regredir a democracia impedindo o pluralismo político-partidário; e muito mais, à custa de fundos públicos, como andares construídos em seis meses. Uma vergonha!... 

Quais são as estratégias para reconquistar a notoriedade que tinha? 

Não preciso de conquistar notoriedade. O Senhor está a pedir-me esta entrevista de fundo, exactamente porque sou notório! E sou-o pela minha honestidade, pelo meu trabalho incansável e consequente e pelo meu sentido de serviço aos que são espezinhados, aos que não têm voz. E, como não sou vaidoso mas também não sofro da doença de falsa modéstia, vou dizer-lhe outra razão: porque estudo permanentemente com humildade, para aprender a fazer melhor, para saber, e para servir. Tenho Deus como Juiz e como protecção. Quem pode fazer-me mal? 

Nestes meses de afastamento da função pública, continuei sempre a agir como homem de Estado: já escrevi onze projectos, inclusivamente o de nova Constituição para o meu povo e o meu país que, contra todas as calúnias e difamações, amo acima de mim próprio e, contra todas as repressões e opressões, vou continuar a servir. E não há força neste mundo capaz de mo impedir. 

Quais os partidos que serão seus futuros aliados perante o Pacto que assumiu o  Governo? 

Não criei Partido por causa do Pacto nem por causa de nenhum outro actor político. Fi-lo porque, eu e muitos milhares, não podemos assistir impávidos à desagregação da identidade nacional, do sentimento de pertença a este povo e a este país, nem ao agravamento contínuo da qualidade de vida dos nossos concidadãos. Como me perguntou um dos amigos do nosso projecto de sociedade que mais insistiram comigo para reactivar o nosso Partido, “será que, depois de nos termos habituado a ponderar a situação nacional em busca de soluções justas, iríamos passar agora a pensar só nas nossas barrigas?” Não. Jamais! A política é algo nobre, dignificante, gratificante moral e espiritualmente a quem a assuma para o bem de cada pessoa humana. 

No passado, conhecendo a lei sociológica da complexidade crescente ou “princípio de Chardin”, sabia que o número crescente de partidos, gerando dispersão dos centros de poder político, iria activar tacitamente mecanismos sociais de convergência, para impedir que a dispersão se agravasse transformando-se em desagregação. Mas sabia também que essa convergência poderia vir a destruir muitos actores políticos individuais e colectivos.  

Por isso, fiz minha estratégia pessoal prioritária a de provocar a convergência voluntária, negociada, dos partidos, o que poderia permitir a sobrevivência das suas nomenclaturas (das suas direcções ou chefias), não desperdiçando o país quaisquer capacidades humanas na sua procura de uma mobilidade social produtora de progresso, de prosperidade. 

Mas devo ter-me enganado quanto à honestidade e razoabilidade dos parceiros de convergência, mais preocupados em conquistar benesses para si próprios, para os amigos partidários e para os parentes étnicos ou familiares, do que em estabelecer e fixar um mínimo político nacional, isto é, um desígnio colectivo, uma causa comum de todos os guineenses, a perseguir por todos, independentemente da cor partidária, da religião, da etnia, da raça. 

Assim, agora, já não estou interessado em convergências planeadas. O tempo e a mobilidade social encarregar-se-ão, sobretudo nas urnas, de provocar modelos de convergências mais estáveis e justos, embora mais dolorosos, porque irão fazer desaparecer do espectro político nacional muitos partidos e as suas respectivas lideranças. É só esperar para ver, pois o futuro vem a caminho!  

Mas eu e os meus irmãos de projecto social não vamos ficar de braços cruzados! Vamos continuar a trabalhar, defendendo os que não têm voz e marcando a diferença pela nossa disciplina política e ideológica, pela nossa auto-exigência e pelo nosso espírito de sacrifício. Não vamos fazer quaisquer alianças que diluam a nossa identidade como partido. Somos o PADEC e vamos pedir ao povo, aos eleitores, que nos confiem a administração do país. 

Qual a sua ideologia política? 

Sou socialista democrático. O meu Partido, o PADEC, é socialista democrático. 

O modelo de Estado que o PADEC defende é o de um Estado Social, instrumento da sociedade em permanente prontidão para corrigir o nefasto, o excessivo e o factor de segregação e exclusão. 

Em termos político-ideológicos, um tal Estado não se configura nas paixões que esgotam às mesas de Café pretensos e sobranceiros intelectualismos desgarrados da vivência quotidiana dos que sofrem por fome, miséria, atraso, analfabetismo e pelo medo, insegurança e exoneração cívica que estas fragilizações lhes insuflam. 

Também, um tal modelo de Estado não se realiza no devaneio desenraizado do conhecimento, da informação, da instrução. Tem de atender devidamente os imperativos e condicionantes da sociedade científica e tecnológica para que a humanidade caminha e da qual já conhece os estribos nas novas tecnologias da informação e da comunicação, potenciadoras da aceleração do processo de globalização estrutural e sistémica que inexoravelmente se consolida. 

O modelo de Estado defendido pelo PADEC não poderá caminhar às cegas, nem aos solavancos, nem ao sabor de caprichos autocráticos ou ditatoriais. Deve fundar-se numa Estratégia de Desenvolvimento a Longo Prazo, que articule estratégias parcelares ou sectoriais como as de Redução da Pobreza, Reforma Político-institucional e Transformação Estrutural e Sistémica da Economia (esta, numa gradação trifaseada que contemple nomeadamente etapas de Emergência, Relançamento e Desenvolvimento). 

Uma tal estratégia deve reflectir o estado da sociedade a que será aplicada e esta, na Guiné-Bissau, é uma sociedade em transição, onde o tradicional e o moderno coexistem; onde o empirismo e a racionalidade científico-tecnológica andam juntos; onde as lógicas infra-estatal (etnias, clãs, “castas”, famílias, etc.) e supra-estatal (ONU, UA, CEDEAO, UEMOA, CPLP, etc.) impendem sobre um Estado que ainda não consolidou sequer a sua própria lógica ou, por outras palavras, um Estado que ainda não é completamente Estado quer estrutural quer sistemicamente; onde as tradições de abuso de autoridade (feudalismo tradicional, fascismo colonial, ditaduras nacionais) e de acefalia sistémica ou horizontalidade do poder ou gerontocracia, deixam traços consideráveis. 

Neste contexto de historicidade sócio-política e antropológica, as avaliações sobre opções político-ideológicas devem ser cautelares, visando a salvaguarda do dado comum histórico-moral e, simultaneamente, catalisadoras, promovendo a aceleração da mobilidade social a partir de um projecto participado, aberto, globalizante do dado nacional-estatal, exercício esse que exige grande flexibilidade e coerência. 

Também, no plano mundial, assiste-se hoje, na sequência do colapso do comunismo e do fim da guerra fria, a um apaziguamento ideológico que determina uma grande confluência do discurso ideológico, harmonizando as várias correntes do pensamento político democrático e esbatendo as grandes diferenças que tradicionalmente as caracterizavam. 

O PADEC, partido de um país subdesenvolvido e de uma sociedade retardada, enfrenta a necessidade de, rapidamente, socializar o acesso (de todos) às conquistas do progresso e da modernidade, pelo que deve adoptar a filosofia e a estratégia mais adequadas à premência da situação. 

Assim, o PADEC opta por um vector ideológico principal, o do SOCIALISMO DEMOCRÁTICO, sem desprezar o contributo da social democracia e do liberalismo: à solidariedade redistributiva e correctora da opção socialista democrática (isto é, não colectivista, nem estatizante, nem estatista, cultivando embora um relato ético-filosófico que inscreve, entre outros valores, a noção de causa, de projecto colectivo), acresce o PADEC a descentralização e a autonomia da sociedade civil face ao Estado (tão caras à social democracia centrista) e a liberdade, iniciativa e realização individuais (apanágio do liberalismo democrático, isto é, não individualizante nem egocêntrico-narcizista, cultivando embora um relato onde pontifica a pessoa individual). 

Se o seu vector ideológico principal é o do socialismo democrático balizado pela independência da sociedade civil e do indivíduo, já o PADEC se situa politicamente como um partido de CENTRO-ESQUERDA, onde a interdisciplinaridade centrista é matizada de um cunho ou propensão popular – não populista – ao encontro da urgência em corrigir os graves desequilíbrios, desigualdades e discriminações reinantes, correcção que fará incidir sobre os mecanismos sociais e institucionais da segregação e da exclusão e não sobre situações adquiridas (exceptuadas as que a via judicial, na sua soberania e apoliticidade, venha eventualmente a modificar para o ressarcimento de lesões processualmente fundamentadas em juízo). 

Por outras palavras, para fazer justiça social, o PADEC não vai expropriar ricos, mas democratizar o sistema económico nacional; não vai “anular” os diplomas escolares a quem os detenha, para criar uma espécie de “igualdade” tábua-rasa, mas vai democratizar o acesso e a frequência da escola e premiar o aproveitamento dos de mais humilde condição socio-económica em caso de igualdade de prestação com os mais favorecidos a esse nível. E vai mobilizar e organizar todos os que o queiram, para que os ricos sejam socialmente úteis na Estratégia de Redução da Pobreza e para que os diplomados sejam um factor de educação, libertação e capacitação técnico-científica dos analfabetos e dos cidadãos não qualificados profissionalmente. 

É esta a concepção de SOLIDARIEDADE NA FRATERNIDADE, que o PADEC erguerá nos espaços político, ético, social, moral e económico da sociedade guineense, como primeiro estandarte do Estado-nação que vai construir na Guiné-Bissau, com vista ao desenvolvimento e na activa cidadania democrática. 

Como se posiciona politicamente em relação a Nino Vieira? 

É o Chefe de Estado democraticamente eleito e, só por isso, tem de merecer o meu respeito. Tem-me pedido conselho de muito longe em longe e eu não lho tenho regateado, embora já não esteja ligado a ele funcionalmente. Tenho-lho dado com o coração e com a ciência, isto é, com honestidade mental e com sentido de dever cívico. 

Sobretudo (é assim mesmo que lhe falo, com respeito e com convicção), tenho-me esforçado por manter viva nele a chama da responsabilidade do Combatente da Liberdade da Pátria, de ser justo com o seu povo e de não dispensar qualquer unha do poder a gente sem perfil nem postura, ainda que sejam os seus amigos mais íntimos, pois o que ganhará com eles é somente o divórcio total em relação aos interesses legítimos dos cidadãos, interesses que lhe cabe salvaguardar e não permitir que os seus amigos os pisem. A estes, que lhes ofereça prendas pessoais, do seu bolso! 

Tenho-lhe perguntado, respeitosamente: quando os seus amigos políticos o divorciam dos camponeses, dos trabalhadores públicos e seus sindicatos, dos jovens, dos combatentes da liberdade da pátria, dos cidadãos ex-servidores da administração colonial – isto é, de todos aqueles a quem deu grandes garantias durante a campanha eleitoral da Segunda Volta das últimas presidenciais - será que querem o seu bem pessoal, o  sucesso do seu mandato, a pacificação do país, a consolidação da nação, o progresso nacional, o rigor da lógica do Estado de Direito Democrático? Estão é a empurrá-lo para fora da nossa História e devia reagir e reassumir o lugar que ontem conquistou, ao lado dos que sofrem e precisam de ser atendidos e libertados!  

Quer comentar a situação sociopolítica do país?  

Já o fiz quando, atrás, respondi à sua pergunta sobre os motivos da criação do nosso Partido, o PADEC; quando expliquei o porquê de ter deixado o Fórum e o seu Governo mostrarem-me se as asas com que voavam eram deles; e quando expliquei com mais detalhe do que antes os verdadeiros motivos que me levaram a decidir deixar a Presidência da República. 

Só queria acrescentar duas coisas: 

  • Embora o Fórum se tenha pervertido depois, foi com enorme satisfação que, ao criar o Fórum, arranquei catorze deputados, usando apenas a cabeça, as mãos, o computador, a impressora, papel, caneta e quatro horas de trabalho, a quem tinha comprado (com o dinheiro do povo) doze deputados do meu projecto político, quando este usava outro veículo partidário. Foi só para deixar claro que não admito falta de respeito de incompetente, ignorante e corrupto… E não perdi nada, pois fiquei como estava antes, enquanto os outros “espertos” caíram das nuvens e ainda estão em queda livre… que os próximos Congressos partidários vão confirmar.
  • Quanto ao actual Governo, já denunciámos ao Senhor Presidente da República a sua ilegalidade e ilegitimidade, enviando cópias a todos os órgãos de soberania, inclusivamente (porque somos educados e conhecemos a ética) à Presidência do Conselho de Ministros. Queremos acrescentar que, mesmo que o Governo apresente um Programa à ANP e esta o aprove, mantém-se a ilegalidade de base na constituição do Pacto que sustenta o Governo e, logicamente, a ilegalidade do Governo. Por isso, pedimos e continuaremos a pedir a demissão do mesmo e nem estamos a inventar nada do outro mundo, pois, se já uma vez aconteceu a demissão de um Governo no nosso país, por ilegalidade no “simples” processo da respectiva nomeação, quanto mais agora, em que o sustentáculo do Governo é ilegal em consequência de duas decisões judiciais. Além disso, o actual Governo não cumpriu promessas vitais que fez aos camponeses e aos trabalhadores e pensionistas do Estado e continua em pré-campanha eleitoral com fundos do Estado, que são desbaratados chocantemente, à maneira feudal, perante as câmaras de televisão, quando o mesmo Governo não paga salários nem pensões. Quer dizer, os membros do Governo, que nunca tinham sido milionários, ostentam publicamente, a cada passo, ofertas de dezenas de milhões de Francos CFA que nunca tiveram e só podem ter conseguido através do Tesouro público ou do tráfico ou outra forma de enriquecimento ilícito (figura jurídica tipificada na lei guineense), em grosseira missão de campanha eleitoral. E, ainda por cima, usando o nome do Presidente da República. Em que é que ficamos? É urgente uma tomada de posição do Senhor Presidente, na qualidade legal de árbitro institucional, ou será legítimo a qualquer um concluir que ele está a gostar desta grave situação!

Se o seu partido estivesse no poder, como seria a Guiné-Bissau? 

Um Estado de paz e progresso, que só se constrói com justiça, com trabalho, com sinergias (isto é, sem exclusão de nenhum guineense), com respeito pelos direitos fundamentais da pessoa humana, com gestão estratégica, séria e responsável perante os eleitores e perante os órgãos públicos constitucionalmente competentes (e não com tchapa-tchapa sem Norte), inserido na comunidade internacional como um parceiro honesto, activo, progressivo e promotor consciente de uma ordem global, à escala planetária, cada vez mais justa e solidária. Uma Guiné-Bissau à medida do amor e da auto-estima dos guineenses, uma Guiné-Bissau compatível com a sociedade do conhecimento, isto é, com os avanços da Ciência, da Tecnologia, da Democracia e do Direito Internacional. 

Enquanto membro do Comando Supremo da extinta Junta Militar, com que regalias ficou? 

Com nenhuma. Devolvi tudo o que tinha recebido, enquanto outros recebiam às escondidas dois carros registados já em seus nomes pessoais e reivindicavam um salário de Ministros de Estado. 

Mais tarde, foi-me pedido que aceitasse de volta um automóvel e que me mantivesse em casa paga pelo Estado, “porque o mundo perguntava-lhes se estavam a vingar-se de mim, pois só eu é que não tinha direito a que o Estado me tratasse como ex-líder de órgão de soberania”. Com este argumento, aceitei. Mas foi Sol de pouca dura: assim que dei uma entrevista ao Semanário Gazeta de Notícias expondo o mal que o poder estava a fazer no país, retiraram-me o carro e deixaram de pagar a renda da casa, além de terem tentado inventar dois processos-crime contra mim, que morreram da mesma maneira que nasceram: sem verdade e sem alma.  

Tudo isto só porque me recusei a aceitar vinganças e come-come com o dinheiro do Estado e, acima de tudo, por dois motivos principais: primeiro, porque me recusei a aceitar o “projecto” que ficou conhecido por “Magna Carta”, pelo qual a Junta Militar deveria ficar mais dez anos no poder, um documento que representava a maior confusão jurídica que já conheci na minha vida, com titulares de funções jurisdicionais e de funções políticas misturados em órgãos que eram uma autêntica salada antidemocrática, fruto da ganância de alguns em manter um poder para o qual não tinham legitimidade, nem jamais alcançariam pelos seus próprios meios ou méritos. E, segundo, porque, interpretando fielmente o meu estatuto de Primeiro Ministro da República, recusei-me a ser um Primeiro Ministro apenas da Junta Militar e, nesse desempenho, salvei, com a ajuda da comunidade internacional, a vida de Nino Vieira, de sua família e de todos os que, militares, polícias e políticos, se tinham mantido fiéis, durante a Guerra do 7 de Junho, ao Presidente da República, cumprindo assim, escrupulosamente, o Acordo de Abuja, segundo o qual ninguém podia ser perseguido por ter pertencido à Junta Militar ou por ter apoiado o Presidente da República (testemunhas: Kofi Anan, Samuel Nana Sinkhan, Sadate Djob, António Dias, Ema Bonino, Miguel Amado, entre muitos outros). Mas depois da vitória eleitoral de Nino, em 2005, vi aqueles mesmos que me injuriavam e me perseguiam por ter tido a decência de respeitar e defender a vida dele e dos seus, entrarem em casa dele aos abraços, dançando com fingida alegria para o felicitar, mas pedindo-me com sinais que não os denunciasse!). Vidas tristes, bizarras…  

Não gostaram: difamaram-me, organizaram todo o tipo de complots contra mim, sujeitaram-me a interrogatórios com dois gravadores de som, injuriaram-me, mas ficaram surpreendidos quando lhes respondi, calma e firmemente, no Salão da Base Aérea, por três vezes seguidas, que “eu, Fadul, não temo nem me amedronto” (ami, Fadul, n’ca ta medi nim ca ta panta) “nem admitirei qualquer falta de respeito a quem quer que seja e, se não gostarem, nem preciso de boleia para voltar a Bissorã!” 

Depois, não satisfeitos, fizeram desaparecer todos os meus documentos de Combatente da Liberdade da Pátria de todos os arquivos de três instituições (uma privada e duas públicas), onde esses documentos tinham entrado e deviam constar. Mas não sabiam nem podiam esperar que eu dispunha de outros originais. E, até agora, o Estado ainda não me pagou os meus direitos estabelecidos ao Decreto-Lei Nº 1/86, de 15 de Março, o que me levou a intentar uma acção judicial a 12 de Junho último e, se esta não tramitar, levarei o caso a Tribunal Internacional pois, felizmente, com o avanço da democracia e dos direitos humanos no mundo, qualquer pessoa individual é hoje sujeito de Direito Internacional, tanto como os Estados e outras entidades públicas, internacionais e para-universais. 

Como analisa a democracia guineense? 

A nossa democracia, apesar dos seus muitos estrangulamentos, é muito mais séria e firme – do ponto de vista teórico-formal, isto é, das normas de direito - do que a de muitos outros países africanos. Mas, no campo da vida prática de todos os dias, enferma de bloqueios e obstruções gritantes. No entanto, só quem não quer entender é que não compreende que a nossa sociedade está a mudar. Infelizmente, esta mudança não está a acontecer por contribuições favoráveis do Estado (salvo raras excepções bem personalizadas) e, sim, pela coragem dos guineenses. Sobretudo pelo valor e pela postura da nossa juventude (músicos, cantores e poetas, membros de associações cívicas e de partidos políticos), bem como de algumas personalidades (políticos, jornalistas, intelectuais). 

Tem alguma mensagem, em termos de advertência ou de apelo, aos seus militantes em particular e ao povo guineense em geral?   

Uma mensagem de esperança, da certeza que tenho no futuro: a fé de que viveremos em paz, democracia, desenvolvimento e plena cidadania; a fé de que ergueremos as nossas cabeças e os nossos ombros para encarar a vida e o mundo de frente, sem vergonha nem fraqueza; a fé de que Deus não abandonará o Seu povo na Guiné-Bissau. 

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