Os três pontos vitais
Por: Samuel Reis*
12.02.2008
Na Guiné-Bissau estabeleceu-se uma autêntica ditadura não oficializada. Aliás,
sendo a ditadura uma forma de governo, talvez nem isso haja na Guiné, porque não
parece haver qualquer forma de governo! O que há é um pequeno grupo de pessoas
privilegiadas que vive à custa do povo, pouca governação exercem sobre ele.
Contudo este pequeno grupo de oportunistas, para manutenção do seu estatuto,
precisa de controlar alguns pontos na vida dos guineenses.
É necessário promover a ignorância para que possam ter poder, é necessário
alimentar o conflito para que possam ter paz, é fundamental manter uma falsa
noção de liberdade para escravizar o povo.
São estes, a meu ver, os três pontos vitais para o equilíbrio do status quo.
1 - Ignorância é Poder:
Não é difícil compreender porquê que um povo ignorante é incapaz de se insurgir
contra os tiranos. Ignorância é uma verdadeira doença mental que destrói povos
de dentro para fora e o povo da Guiné-Bissau está num estado avançado da
infecção.
Os oportunistas sabem usar a ignorância a seu favor e bloqueiam o acesso do
povo à cultura com zelo, afinal, é aí que reside o seu poder. Porque quanto mais
cultos forem os guineenses mais difícil se tornará a tarefa de os enganar e
manipular.
É por esta razão que a educação do país é precária, é por esta razão que não se
constroem nem bibliotecas, nem escolas, nem nada que possa de alguma forma (por
mais remota e improvável que seja) contribuir para o enriquecimento da cultura,
e é por essa razão que também não se melhoram as condições das infraestruturas
já existentes.
2 - Guerra é Paz:
Se não fora o colonialismo jamais haveria tantas fronteiras com linhas rectas
em África.
Durante o chamado "colonialismo" os europeus dividiram África a régua e
esquadro desrespeitando toda a cultura e história Africanas, como ainda hoje é
costume acontecer. Isto deu origem a países como a Guiné-Bissau, em que inúmeras
etnias foram forçadas a formar um país, sendo na verdade vários territórios
antes do colonialismo os ter "unido".
Assim a Guiné-Bissau é um território com todas as condições para criar
conflitos onde não existe absolutamente nenhuma razão lógica para que eles
existam, e os ditadores sabem disto! "O povo unido jamais será vencido", mas com
o povo dividido a vitória dos opressores é certa, e o povo guineense está
dividido, cegado por racismo que não lhe permite compreender que não há
absolutamente nenhuma diferença entre um guineense Fula e um guineense Papel ou
seja de que etnia for. Enquanto houver um membro que seja de uma etnia contra
outra etnia não será possível o verdadeiro desenvolvimento do país.
3 - Liberdade é Escravatura:
Ao estudar história cedo nos apercebemos de que um povo ignorante e ocupado com
guerrinhas civis pode ser facilmente controlado, mas é sempre uma potencial
ameaça caso a elite cometa algum erro demasiado grande. É portanto aconselhável
manter a ilusão de liberdade, de esperança num futuro melhor, para que o povo
caia num sono profundo e sonhe com dias melhores sem nunca fazer absolutamente
nada.
Os oportunistas privilegiados adormecem a fera que é o povo (e que terrível
fera!) num clima mau, mas suportável. Eles sabem muito bem que o povo ignorante,
dividido e cheio de ilusões é perfeitamente manipulável e não se insurgirá a
menos que a situação fique absolutamente insuportável. Assim eles mantêm a
situação no limiar da suportabilidade, e de quando em vez promovem um pouco de
falso patriotismo, atirando areia aos olhos do povo, mas sem nunca dizer nada
importante ou que contribua para a união do país.
Agora, na última parte deste texto, é altura de apresentar as minhas sugestões:
Em relação ao primeiro ponto. A Guiné é um país onde o acesso à cultura é
realmente difícil, mas não completamente bloqueado. Ao produzir cultura
(literatura, música, poesia, pintura, escultura, etc.) aos ler livros, ao
procurar a verdade e a verdadeira educação (que vem do enriquecimento
intelectual acompanhado de enriquecimento de carácter, ético e moral), ao ler os
textos deste site ou simplesmente ao reflectir sobre o estado do país e as
medidas a tomar, estaremos a contribuir para o nosso desenvolvimento intelectual
enquanto indivíduos, mas também para o desenvolvimento intelectual e cultural do
país, enquanto cidadãos!
Relativamente ao ponto número dois. É preciso amar o povo, a luta e a causa
como Amílcar Cabral amou! Todos os guineenses têm que tomar consciência de que
são irmãos enquanto povo, e claro, irmãos enquanto seres humanos. Mas é
importante perceber que todo o guineense está ligado pela cultura, pela
história, pela dor e por todo sofrimento que todas as etnias suportaram enquanto
uma só. Na verdade, só existe uma raça e etnia, a humana!
Por fim, o terceiro ponto. Esta é a hora de agir! Jamais devemos permitir que
nos encham de mentiras e patriotismo de fachada. Organizem grupos de discussão,
marquem metas e objectivos, organizem manifestações para os alcançar. O estado
das coisas só muda quando tomarmos uma atitude, quando nos envolvermos de corpo
e alma e com amor pelo país e pelo seu povo.
Mas lembrem-se, jamais se rendam à violência, porque isso seria um enorme
desrespeito para com todos os que deram a vida na longa caminhada para a
independência com a esperança de que nunca mais houvesse derrame de sangue na
Guiné-Bissau.
Nô Djunta Mon!
* 16 anos de idade, estudante na área de Línguas e Humanidades do 10º ano com aspiração de vir a ser jornalista
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO