UM VERDADEIRO EMPURRÃO À CONFRONTAÇÃO
Óscar Barbosa (Cancan)*
22.03.2007
O sinal de esperança dado de forma convincente e patriótica por uma esmagadora maioria de Deputados que votaram em consciência e patriotismo o derrube do actual Governo liderado pelo Senhor Dr. Aristides Gomes, pode esvair-se e recolocar a Guiné-Bissau, uma vez mais, numa crise cujos contornos nos deixam bastante apreensivos.
Estamos em crer que o Senhor Presidente da República não pode deixar escapar esta oportunidade que lhe caiu do céu para, no mínimo, se reconciliar consigo mesmo e com uma grande e esmagadora maioria de guineenses.
Acontece e não tenho nenhuma dúvida em afirmá-lo, que os guineenses estão envergonhados com a classe política nacional e como esta transmite a imagem da Guiné-Bissau no estrangeiro.
Na minha modesta opinião, talvez por ter sido ensinado que o respeito conquista-se com o nosso comportamento, permito-me afirmar que os guineenses e as suas instituições, a todos os níveis, têm obrigatoriamente que se respeitar para que possamos merecer o respeito dos outros!
A 16 de Março o Parlamento guineense aprovou inequivocamente uma Moção de Censura ao actual Governo, o que significa perante as leis que regem este país que o Executivo de Aristides Gomes passou a ser simples e puramente um governo de mera gestão, aguardando somente que o Presidente da Republica emitisse um decreto, puramente formal, para dar sequência à decisão soberana e constitucional tomada pela Assembleia Nacional Popular.
Até ao momento em que emito estas opiniões, nada, absolutamente nada disso aconteceu, para espanto dos guineenses e da comunidade internacional.
Em nossa opinião, a Presidência da República da Guiné-Bissau, está a ultrapassar os limites da arrogância do poder para passar à provocação.
Analisado este assunto de um prisma puramente técnico e também político, pois como cidadão tenho igualmente esse direito, só posso afirmar que o Senhor Presidente da República lá deverá saber o porquê de tanta «confiança» em poder pisar tudo e todos na Guiné-Bissau, rasgando e resgatando a Constituição da República quando e como lhe apetece.
Utilizando o ex-Primeiro Ministro, senhor Dr. Aristides Gomes, rejeitado por todos os partidos políticos com assento parlamentar, através duma moção de censura votada em sede própria pela maioria dos deputados, os actos públicos da Presidência da Republica (antes, durante e depois da votação) são de puro encorajamento à desobediência das decisões da Assembleia Nacional Popular que empossou o actual inquilino da Avenida Unidade Africana, em 2005.
A não imediata demissão do já demitido Primeiro-Ministro é quanto a nós, um verdadeiro empurrão à confrontação, num momento ímpar da nossa história recente de país soberano e independente em que, pela segunda vez, há oportunidade de união nacional para estancar a instabilidade e relançar o país para os caminhos que verdadeiramente interessam à população, nomeadamente o funcionamento normal do ano lectivo, criação de emprego e funcionamento do sistema sanitário.
Perante esta teimosa resistência, ousamos modestamente perguntar:
o A quem mais poderá interessar uma confrontação?
o Mas confrontação contra quem?
o Confrontação com que meios?
o Confrontação para alcançar que fins?
O tempo encarregar-se-á de nos edificar, se a teimosia for mais forte que o bom
senso, que todos nós esperávamos do Presidente da República de todos os
guineenses.
Alerta-se a quem ainda está a dormir para o perigo que, uma vez mais, espreita à porta de todos nós cidadãos, se não se puser termo, agora e imediatamente, as manobras dilatórias de manter, ilegalmente, este Primeiro Ministro em funções ainda que travestido de «chefe de um governinho de gestão».
Creiam na voz da minha
experiência de mais de 30 anos em redor do poder.
Estas manobras passam por:
o Demorar a acusar «formalmente» a recepção da moção de censura que a ANP transmitiu à PR (já começou);
o Atrasar o inicio de consulta (ou consulta demorada) aos partidos para a indigitação de um novo PM ; podendo inclusive
o Rejeitar sistematicamente os nomes a indigitar como futuro PM;
o Rejeitar sistematicamente qualquer estrutura de Governo que vier a ser proposta pelos assinantes do Pacto de Estabilidade; provocando
o Discussões intermináveis à volta dos nomes dos futuros membros do Governo
o Acções de desestabilização contínua dos partidos assinantes do Pacto, mesmo após a constituição de um Governo legítimo;
o Descredibilização do Pacto de Estabilidade subscrito por mais de 2/3 dos partidos políticos legalizados no país.
Entretanto o Senhor Dr.
Aristides Gomes vai fazendo basicamente três coisas muito simples, enquanto vai
ganhando tempo:
1. Acelerar e instalar as estruturas de “Coordenação de apoiantes de Nino Vieira» com vista ao assalto ao Congresso do PAIGC (Maio 06) contra senhor Malam Bacai Sanhá e senhor Carlos Gomes Júnior (em curso);
2. Incentivar manifestações populares de apoio à sua pessoa e ao PR e de condenação à ANP; Criar a maior confusão possível no seio parlamentar para justificar a sua instabilidade e consequente motivo para dissolução assim que a ala fiel ao PR ganhar o congresso de PAIGC; ou na eventualidade de perder este congresso criar o seu partido ou juntar-se ao PPD do senhor Braima Embalo, seu ex-Ministro da Administração Territorial;
3. Sabendo que a sessão Parlamentar termina em finais de Março (÷ 7 dias), ir-se aguentando discretamente a «desgovernar» tanto quanto possível, para continuar a ter acesso aos fundos públicos de que precisa para instalar as suas estruturas políticas de base eleitoral em completa ignorância da decisão da ANP, fingindo recorrer à decisão a instâncias que só os seus Conselheiros jurídicos podem imaginar.
Tais actos que, quando encurralado, o senhor Dr. Aristides Gomes não deixará de apelidar fraudulentamente de «actos de gestão corrente do governo derrubado» terão múltiplas formas:
o viagens dos membros do Governo;
o assinaturas de contratos e convenções;
o autorizações de exercício e exploração de actividades,
o negociações com entidades estrangeiras,
o representação do país em fóruns políticos internacionais,
o gastos incontrolados,
o aceleração do endividamento,
o tomada de decisões de fundo com datas falseadas, etc.
Em suma, cavar ainda mais do que já está o buraco financeiro a herdar pelo seu mais que irreversível substituto PM.
o
Face a este mais
do que previsível cenário, que pode durar até finais de Abril, que farão os
partidos políticos e a sociedade civil?
Combater por todos os meios legítimos a tentativa de instalação de ditadura em curso, a tentativa de neutralizar as instituições democráticas e o ensaio do PR se assumir como único mandante no país.
Este combate sem tréguas justifica-se pela necessidade de, uma vez por todas, respeitarmo-nos para merecermos ser respeitados interna e externamente, respeitando as instituições democráticas e as leis da República que todos os titulares de órgãos de soberania juraram.
Tendo presente as razões que originaram os tristes acontecimentos de Janeiro no
vizinho sul, a Guiné-Bissau não deve aceitar ser transformada em Guiné-Conakry
bis!
O nosso apelo vai em direcção à comunidade internacional para que saiba estar
sempre do «lado da democracia» e, desta forma, ajudar os guineenses a
livrarem-se de actos antidemocráticos que podem acelerar a transformação do seu
belo país num «narco-estado», como parece ter compreendido a Embaixadora
dos Estados Unidos à saída de uma audiência com o Senhor Presidente da
República. Infelizmente uma grande maioria de guineenses não teve a oportunidade
de escutar esta diplomata, devido ao “black-out” imposto com a
paralisação dos órgãos de comunicação estatais. Um à parte, será que silenciaram
mesmo estes órgãos para não falarem dos pontos quentes da política guineense? Se
assim for não é só lamentável, como vergonhoso e inadmissível. Espero bem que
não.
Voltando à minha opinião sobre os acontecimentos políticos, posso daqui afirmar
que os guineenses estão envergonhados com a classe política nacional e como esta
tem transmitido a imagem da Guiné-Bissau no estrangeiro! Pelo menos é esta
opinião que corre nos locais do “diz-que-diz”.
Posto isto, penso ter chegado a hora dos políticos guineenses acertarem passo com a HISTÓRIA e com o TEMPO.
Uma oportunidade como esta que nos foi oferecida pelo PAIGC, PRS e PUSD e a que têm estado a aderir os partidos políticos guineenses, não acontece todos os dias.
Aproveitemos e avancemos em direcção à paz, à estabilidade e à verdadeira reconciliação. De contrário será o caos e o salve-se quem puder.
*Jornalista
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO