UNIÃO AFRICANA: MAIS UMA CIMEIRA DE AMIGOS...

 

Batuque- Manuela Jardim

 

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

27.01.2007

didinho@sapo.pt

A oitava Cimeira da União Africana UA terá lugar em Addis Abeba, Etiópia, de 29 a 30 deste mês, tendo como temas de fundo:

1- Ciência, Tecnologia e Pesquisa Científica para o desenvolvimento

2- Alterações climáticas em África

Diria que estes assuntos inscritos na ordem do dia da Cimeira são assuntos importantes mas consequentes de outras abordagens e realizações que têm sido recomendadas por organismos internacionais de abrangência mundial.

Torna-se necessário, efectivamente, que a União Africana se decida pelo debate de questões que também se debatem noutros continentes por forma a acompanhar a rota de interesses e propósitos da chamada era da globalização.

Mas como se pode acompanhar a era da globalização, sem antes cumprir com os requisitos necessários à compreensão, reconhecimento e valorização das etapas primárias dos conceitos gerais sobre a valorização do ser humano?

Como pode o continente africano avançar sem que haja primeiro, uma formação e consequente evolução e desenvolvimento de consciência humana para a valorização da maior riqueza do mundo e que é precisamente o Homem?

Para esta pergunta faço outra pergunta em jeito de resposta: Quanto vale a vida humana em África?

Em África, infelizmente, a vida humana vale muito pouco. Em África, infelizmente, o conhecimento humano ainda vale muito pouco. Em África, infelizmente, a liberdade das populações é uma questão quase sempre definida pelas conveniências do poder.

A União Africana com as suas cimeiras anuais vai lançando temas para debates a nível do continente, mas não procura fazer cumprir as metas das discussões havidas sobre os temas discutidos.

Parece que tudo está bem, que as recomendações são cumpridas e, passa-se para novos assuntos, quando não é o que se conclui, sendo que se deveria insistir nas abordagens imperativas que são uma realidade e continuam actuais no espaço africano tais como  a Educação, a Saúde, os Direitos Humanos (na sua vasta acepção) e a Governação, também na sua globalidade. Temas específicos para objectivos concretos e de avaliação facilmente constatável quando os resultados são positivos ou negativos, consoante as estratégias adoptadas, o que ajuda sempre a definir novas estratégias.

Esta inoperância da União Africana deve-se sobretudo a factores políticos, aos efeitos da sobrevalorização do poder em relação à sociedade.

Os países africanos, na maioria dos casos, não funcionam como sendo espaços dos seus cidadãos, mas sim, espaços dos que detêm o poder.

Nas cimeiras da União Africana prevalece o compadrio das governações vergonhosas, fora de prazo, sendo que continua a marcar pontos a questão do argumento da não ingerência nos assuntos internos de cada país para, à partida, não se apontarem exemplos dos males de que padece o nosso continente fruto dos desastres das governações ditatoriais ainda hoje existentes.

Esta semana, o próprio Presidente da Comissão Africana, Alpha  Konaré, reconheceu a necessidade de África abandonar o princípio da argumentação da não ingerência nos assuntos internos dos Estados e aplicar o da não indiferença.

"É imperioso assumir o nosso princípio de não indiferença que significa ingerência de cortesia e de solidariedade. Se não nos dissermos a verdade um ao outro, estaremos a caminhar directamente para a catástrofe", disse Alpha Konaré.

Esta é uma realidade que deve ser debatida na União Africana, que deve ser promovida como um dos requisitos da boa governação e consequentemente, do relacionamento entre povos e governos.

A União Africana, no entanto, está "condicionada" aos poderes de decisão dos presidentes dos Estados Membros e as palavras de Alpha Konaré serão interpretadas apenas como um desabafo de alguém que está de saída, (não se recandidata a novo mandato) e que deveria ter a coragem de fazer estas considerações noutras alturas e não teve.

Para os africanos em geral, aqueles que não têm sido motivados pelas actividades da União Africana, não deixa de ser uma óptima constatação, pois nunca é tarde para se denunciar um dos piores argumentos de sempre na defesa da ditadura pelos ditadores e na indiferença da salvaguarda dos princípios e valores universais em relação aos Direitos Humanos por parte de outros países, muitos até membros duma mesma comunidade, como é o caso dos Estados membros da UA.

Também esta semana Kofi Annan, de regresso ao Gana, seu país Natal, fez um interessante discurso sobre questões africanas, tendo apontado, em resumo, causas e efeitos das governações em África e os seus reflexos nos dias de hoje.

Para Kofi Annan, os africanos deveriam ser os donos do seu destino e guiados por eles próprios não só em direcção à liberdade mas também em direcção ao progresso e prosperidade, o que lamentavelmente não tem sido o caso.

"Alguns libertadores africanos transformaram-se em opressores e destruidores. Vários conflitos apodereceram e as economias ficaram estagnadas".

Annan sublinhou a necessidade duma segurança reforçada, emitindo o desejo dum desenvolvimento de melhor qualidade e o grito para um respeito acrescido pelos direitos humanos e pelo Estado do direito.

"Quando um continente é considerado por outros como um continente em guerra, isso obriga os parceiros e os investidores a fugir."

A África precisa deste tipo de discursos, mas é na acção, na difusão e na mobilização para a análise deste tipo de pensamentos que surgirão as consequências da mudança que possibilitarão a formação, evolução e desenvolvimento da consciência humana em África.

Uma nova consciência humana em África será, decerto, uma nova etapa na recuperação do tempo perdido e na sustentação da esperança de um desenvolvimento que aliando a riqueza dos recursos humanos à riqueza dos recursos naturais fará de África o celeiro, o sustento do Mundo, não fosse o nosso continente o berço da Humanidade!

Os povos africanos sofrem com as ditaduras, com as guerras. Morre-se à fome e à sede, por doença, muitas vezes evitáveis havendo campanhas de sensibilização. Os povos africanos anseiam por melhores condições de vida mas, que importa isso aos governantes africanos?

África é um continente em crise, mas é em África que se encontram as principais saídas para as crises no Mundo. Não se deve ficar indiferente aos problemas de África e dos africanos!

www.didinho.org