CARTA ABERTA AO CANDIDATO NINO VIEIRA
Galo Garandi
20.07.2005
Senhor General,
Sou um simples cidadão que vive
da sua magra reforma de professor primário que lhe escreveu aquando do
início da campanha destas presidenciais 2005.
Volto a escrever-lhe a escassos
dias do fim da mesma campanha porque os guineenses carecem de explicações, agora
mais do que nunca, da origem do seu património e da declaração certificada dos
seus bens em 1975 e agora 2005, quer ganhe ou perca as actuais eleições.
Um conselho de “mandjuá”
de idade. Desta vez, se voltar a ser Presidente, ponha tudo em seu nome e não em
nome da sua esposa ou dos seus filhos ou “amigos”, não vá o diabo
tecê-las.
O que se passa na sua cabeça,
só você o sabe. Mas a percepção que tenho – a partir dos sinais que nos
transmitiu durante esta campanha com as suas palavras, seus gestos e suas
expressões – é que você nutre uma grande arrogância e um profundo desprezo para
com o povo guineense, sua inteligência e, sobretudo, para a sua classe política
que pretende ser a vanguarda esclarecida desta sociedade.
Permita-me dizer-lhe que, pela
primeira vez depois da guerra de 7 de Junho, concordo parcialmente consigo na
percepção que tem da sociedade guineense. Assim, no que respeita ao
desprezo da classe política guineense. Não podíamos estar mais de
acordo, Senhor General!
Lembro-lhe que numa das suas
entrevistas a um jornal português, dizia que a “Guiné
era um país de traições”. Decorridos sete anos, o tempo
encarregou-se de nos mostrar que neste aspecto só temos a reconhecer que tinha
toda a razão. A maioria do comando militar da ex-Junta Militar foi traída e
decapitada. O povo foi traído nas suas aspirações de justiça com
J grande pelos militares e pelos políticos que fintaram
o povo.
Os mesmos políticos – uns “escribas”
e outros “populistas” justiceiros – estão hoje miseravelmente à sua
mercê por uns míseros francos CFA e promessas de desprezíveis lugares que lhes
permitam assegurar a vida fácil a que sempre se habituaram a custa do erário
público.
Enfim, senhor General, há
evidências mais do que suficientes para que o povo julgue implacavelmente estes
oportunistas e ambiciosos que não olham a meios para atingirem os seus fins. Por
isso, qualquer que venha a ser o desfecho das eleições do próximo dia 24 de
Julho de 2005, os guineenses devem reconhecer-lhe este bom serviço que lhes
prestou ao mostrar-lhes, publicamente, a verdadeira cara das pessoas que, num
passado recente, eles julgavam inocentes, patriotas, puros e bons filhos de “tchon”,
grandes estadistas de renome internacional.
Quanto à arrogância e o desprezo para o povo e a inteligência dos guineenses; permita-me, senhor General, continuar a discordar e denunciar esse seu grande defeito que dificilmente conseguirá reconhecer. Este povo é humilde mas respeitável e respeitador de quem o respeita.
É a arrogância e o desprezo
para com o seu povo que leva um Ex-Presidente (máximo) a ousar falar
publicamente da sua corrupção pessoal e da corrupção do seu regime e dos seus
Ministros, porque convencido que nada lhe pode acontecer visto que os governados
não são inteligentes. Pode ser verdade. Mas pode também não ser bem assim como
está a pensar...
Como cidadão insultado na
sua moral e inteligência, peço a justiça (Ministério Publico) do país para abrir
um processo - crime contra o cidadão Ex-Presidente João Bernardo Vieira, seja ou
não Presidente no dia 25 de Julho próximo.
Com efeito, quando um
Ex-Presidente da Republica (gestor da coisa pública) cujo regime arruinou
completamente o seu país e catapultou o seu povo para uma miséria e atraso
ignóbil, em vez de prestar contas do seu reinado de 18 anos vem dizer que um
empresário lhe roubou bens que nunca manifestou ao povo ou que um dos seus
ex-Ministros roubou fundos públicos mas que ele (Presidente), apesar disso,
promoveu-o no seu partido e no seu regime ao ponto de ser a segunda figura do
Estado, é caso para todos os guineenses com alguma honra ficarem INDIGNADOS e
INSULTADOS na sua inteligência. Basta senhor General!
É, em reacção a isso que ouvi
da sua boca, que lhe faço esta carta senhor General. Como disse no princípio, já
lhe tinha feito uma carta no inicio desta campanha a pedir-lhe que esclarecesse
o eleitorado guineense alguns aspectos da sua gestão (18 anos) do país. Durante
a campanha não ouvi nenhuma explicação quanto aos problemas que colocara, a
saber: a destruição sistemática da economia, os crimes praticados no seu
regime e a ausência de um projecto político credível para a Guiné no seu
programa eleitoral.
Pronto, aceito agora que a sua
arrogância e desprezo para com este povo não lhe permitem responder tais
questões colocadas por um simples velho, reformado professor primário.
Volto a escrever-lhe a escassos
dias do fim da campanha porque os guineenses carecem de explicações, agora
mais do que nunca, quanto à origem do seu património e reclamam uma declaração
certificada dos seus bens em 1974 e agora 2005, quer ganhe ou quer perca as
eleições!!!. Um conselho. Desta vez, se voltar a ser Presidente ponha tudo
em seu nome e não em nome da sua esposa (que também pode voltar a traí-lo) ou
dos seus “amigos”, não vá o diabo tecê-las.
Como a vida das pessoas também
tem uma história, vou contar aos meus compatriotas guineenses apenas uma
pequeníssima faceta da sua vida que conheço. Sei que você é filho de uma modesta
e honesta engomadeira do bairro de Chão-de Papel (Bissau) que sempre trabalhou
para ganhar a vida e sustentar os seus. Você foi parar à epopeia da Luta de
Libertação Nacional porque pairava sobre si a suspeição de um roubo na empresa
onde trabalhava como ajudante de electricista em Bissau. Tanto quanto sei, você
saiu fugido de Bissau não para abraçar o movimento nacionalista (ou o PAIGC) mas
porque tinha contas a ajustar com a justiça colonial. Permita-me também, dizer
ao povo, que quem o levou para o PAIGC, a muito custo, foi o velho comandante
Luciano N’DAO. Penso que não vale a pena contar outros aspectos negativos da sua
vida como combatente (no mato) porque este povo precisa de ser poupado dessa
faceta negra do seu herói.
Com a
independência, a sua apetência para mulheres e dinheiro rapidamente o transforma
em governante-corrupto. Como alguém disse, você é o único dos seus companheiros
que se enriqueceu depois da independência. Tornou-se no homem mais rico do país,
à custa das funções que foi ocupando no Estado. À custa destas funções o senhor
facilmente se envolveu com Jonas Savimbi. O reconhecimento desse envolvimento é
a quantidade de ouro e diamantes de Angola que, através de si, Savimbi branqueou em Bruxelas (Bélgica). A sua esposa foi objecto de detenção
no aeroporto de Bruxelas a transportar ilegalmente ouro consigo.
Você tirou partido dos seus
Ministros mafiosos, associando-se a eles e outros conhecidos mafiosos
internacionais portugueses para, em proveito próprio, vender e comprar todas as
empresas públicas comerciais e industriais de que o país dispunha (Armazéns de
Povo, Socomin, Dicol (disse ele agora), Titina Sila, Cumeré, Blufo, Bambi,
Volvo, Oxigénio e Acetileno, etc., etc.). Torna-se sócio do outro mafioso
africano – o presidente Lassana Conté, da Guiné-Conakry – para melhor se dedicar
ao tráfico de diamantes da Serra Leoa.
Com um salário de Presidente de
1 200 000 Mil Pesos (20 000 francos CFA) que você dizia ganhar enquanto Chefe de
Estado (ver entrevista ao jornal português Expresso de 2001) não consegue
justificar ao povo da Guiné-Bissau como adquiriu e porque deixou em nome de
familiares e de terceiros os bens que reclama agora.
Mais uma vez, e como não citou
propositadamente grande parte dos seus bens, vou-lhe lembrar os outros bens que
escamoteou ao povo (mas que todo o guineense conhece) agradecendo penhoradamente
que esclareça ao povo como comprou os seguintes bens e quanto deve nesta data
nos Bancos pela compra do referido património imobiliário, uma vez que
sabemos que não herdou nada nem nasceu rico:
Vivendas:
1. A residência
habitada pelo PM (que disse ser do filho);
2.
O Palácio residencial oficial
do Presidente na Rua Bafatá (que a sua esposa reclama ter comprado para garantir
o futuro dos seus filhos);
3.
A vivenda onde se encontra
instalada a Agencia do ex-BIG na Avenida Unidade Africana;
4. A vivenda
geminada onde funcionam os serviços de Protocolo do Estado, na Avenida Amílcar
Cabral;
5.
O Complexo residencial do
Bairro Militar
6.
A vivenda do Bairro de Luanda
onde morava a sua ex-segunda esposa que era propriedade do Banco Nacional
Ultramarino;
7.
A vivenda do bairro de Ajuda (nova fase) actualmente ocupada por
Zamora Induta;
8.
A vivenda geminada do bairro de Luanda;
9.
A vivenda no Bairro de Chão de Papel ocupada pelo ex-General Veríssimo
Correia Seabra;
10.
A vivenda em Bruxelas onde reside a sua família (que
estava em nome do arquitecto senegalês Pierre Goudiaby);
11.
A Vivenda da Vila Nova de Gaia onde esteve
refugiado em Portugal
12.
A vivenda no Bairro de Fann-Mermoz em Dakar (construída pelo arquitecto
Pierre Goudiaby)
13. A
vivenda em Cascais/Portugal (em nome do seu primo Murido Vieira)
14. A vivenda em Maputo/ Moçambique onde reside a sua filha advogada
Empreendimentos:
15.
A propriedade agrícola de Ensalma
16. A propriedade
agrícola de Finete/Bambadinca, em nome da sua mãe;
17.
A propriedade agrícola de Gã-Mamudo/Bafatá
18.
A propriedade agrícola dos palestinianos conhecida pela granja de Prábis, em
nome do Avito José da Silva
19.
A Petromar
(que disse ser da sua esposa e que prometeu doar ao Estado não sei bem porquê,
mas enfim...);
20.
A companhia de cerveja CICER de que é
accionista com o empresário português de Expo
21.
A GUIPORT de que é sócio com outros seus ex-Ministros
dos Transportes e um empresário português
22.
As empresas de pesca que tem em Conakry a pescarem nas
águas territoriais da Guiné-Bissau
Enfim, senhor General, já
agora, em nome da reconciliação nacional, diga-nos toda a verdade e só a verdade
para nos libertarmos deste tenebroso passado.
Se explicar tudo isso, pode contar com o meu voto enquanto cidadão que lhe admirará para o resto da vida pela contribuição que dará para salvar este país da sua desintegração por vergonha dos seus políticos.
Atenciosamente.
Galo Garandi
Seu compatriota e professor primário na reforma
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO