COBARDES & COMPANHIA

 

 

Por: Flaviano Mindela dos Santos

 

 

26.06.2007

 

 

Cresci aprendendo que a nossa história sempre foi recheada de factos gloriosos, apesar da exiguidade do nosso território.

Cresci aprendendo a nossa história também, através dos relatos das várias façanhas protagonizadas por grandes homens e mulheres, no decurso das periódicas lutas contra os invasores, sob lideranças de digníssimas personalidades de exemplos honrosos, como Okinka Pampa, Mama Djanké Wally e Amílcar Lopes Cabral.

Aprendi sobretudo que, nessa heróica odisseia, como em qualquer outra, cuja razão de ser é a afirmação de um povo, não faltaram pesados sacrifícios, e numerosas perdas de vidas. Tudo para contrariar as tentativas de domínio total, e consequente humilhação. O que teve como merecida recompensa, o culminar na nossa singular independência, com o desígnio de organizarmos a nossa sociedade como um próspero Estado Nação.

Obviamente que para mim e mais outros, tudo isso sempre foi motivo de um enorme orgulho, fertilizando os meus megalómanos sonhos, típicos de uma mente juvenil, como era a minha.

 

Hoje sou um homem emocionalmente feito e emancipado pelo acumular de uma certa carga de experiência, mas sem confiança no presente. E racionalmente desfeito e indignado pelo acumular de uma certa falta de paciência, mas com esperança no futuro.

 

Quem diria que volvidos todos esses anos, chegaríamos ao cúmulo de ter como ministro da administração interna, um indivíduo, de quem, frequentemente se fala de boca à orelha, ser responsável por várias condutas criminosas?

Quem diria que volvidos todos esses anos, chegaríamos ao cúmulo de ter como ministro da administração interna, um indivíduo, que já foi preso, amarrado e exibido na praça pública, tendo o registo visual desse facto corrido meio mundo, de calças manchadas a fresco, com o seu próprio mijo?

Quem diria que volvidos todos esses anos, chegaríamos ao cúmulo de ter como ministro da administração interna, um indivíduo, que por alguma razão, transmite a uma grande maioria de nós, a sensação de desconfiança, em vez de segurança?

 

Quanto a mim, estas perguntas como consequências, têm as suas respectivas respostas como causas. E são as seguintes:

Tornámo-nos numa sociedade de gente que prefere vergar, no lugar de desafiar;

De gente que prefere mendigar, no lugar de sacrificar;

De gente que prefere morrer a arrastar, no lugar de morrer a caminhar.

E por favor, salvo o devido respeitinho, não me venham entristecer ainda mais com as supostas maquinações interesseiras, da rotulada comunidade internacional! Que disso, até o cão do meu vizinho, também já ouviu falar noutro dia na esquina. Mesmo assim, não deixou de levantar uma das patas traseiras.

 

Uma vez, o conhecido antigo presidente dos Estados Unidos da América, Bill Clinton, na altura ainda em exercício das suas funções, confrontado por um jornalista de forma crítica. Afirmou o seguinte, do qual concordo:

- Que a comunidade internacional tal como a conhecemos, não passa de um conjunto de países, onde cada qual procura de uma maneira ou de outra, impôr os seus interesses prioritários, aos seus congéneres.

A partir desse momento, fiquei melhor esclarecido sobre essa e outras questões que me pareciam demasiado complicadas, deste nosso mundo. Portanto, a minha inabalável convicção é de que, só nós conseguiremos resolver, ainda que gradualmente, todos os nossos problemas estruturais. A dita comunidade internacional, quando muito, poderá ajudar por via da coincidência de interesses. Mas é sempre pertinente que nós, por nossa pura iniciativa, demonstremos de antemão, e claramente, qual o rumo que pretendemos para o nosso destino.

É essa a nossa única alternativa para a construção de uma sólida rampa de lançamento, onde colocaremos os nossos veículos, em direcção ao desenvolvimento sustentado.  

 

O nosso principal problema, há muito que nos fez o grande favor de se auto identificar completamente, com um nome inconfundível, designado: ninismo.

Um regime político retrógrado, que nunca conseguiu disfarçar o seu predilecto método de funcionamento, baseado numa obsoleta táctica guerrilheira, na qual tudo o que avança num sentido diferente, deve ser infalivelmente considerado um potencial alvo a abater. Com um exclusivo objectivo, o da permanência indeterminada na ribalta, dos seus equivocados beneficiários.

Foi assim que ao longo dos anos da sua vigência, esse referido regime político, como é do conhecimento dos mais atentos, basta para isso um simples exame retrospectivo, empenhou-se na lamentável tarefa de promover a mediocridade, e de combater a assiduidade. Razão pela qual acabamos por chegar ao actual cenário pré anárquico, que só pode interessar aos que não se importam com os limites, desde que seja para baixo. Resultando numa rápida e extraordinária proliferação em toda a extensão do nosso quotidiano, de incontáveis patifes, dos da pior espécie, que não se cansam de desfilar em atitudes exibicionistas e saloias, ao ponto da incrível, mas verdadeira conjuntura, de conseguirem causar fortes náuseas aos famigerados abutres. Basta constatarmos o cada vez mais reduzido número, desses sim, indispensáveis necrófagos, por andarem a fugir para outras paragens menos indecentes.

 

Se assim é, porque é que não nos dignamos combater justamente o ninismo enquanto regime político, afastando as suas práticas malignas, de modo a podermos premiar os nossos melhores, incentivando os nossos mais capacitados?

Se assim é, porque é que enfiamos as duas mãos nos bolsos, e fingimos assobiar para o ar, quando um compatriota nosso foi espancado no silêncio da noite, por simplesmente ter actuado dentro dos restritos parâmetros da liberdade de consciência e de expressão, que a nossa constituição democrática lhe consagra como político e cidadão?

Se assim é, porque é que temos de continuar a ouvir falar das alegadas conspirações, com o vil propósito de silenciar vozes consideradas incómodas, por critérios que ninguém chegou de ver mais gordo ou mais magro, porque alguém escolheu usar os seus direitos, para cumprir um dos seus deveres de cidadania?

 

De que massa afinal fomos feitos?! Qual é o nosso quilate?! Qual será a nossa herança?!

 

Por tudo isso, veio-me à memória uma passagem dos abundantes ditos de Amílcar Lopes Cabral, o qual quero aqui partilhar com quem nunca teve a bendita oportunidade de as conhecer.

 

…Como disse aos camaradas há já muito tempo, essas duas coisas: a inteligência e a coragem, infelizmente ou felizmente, os nossos amigos e os nossos aliados não podem mandar-nos em caixotes. Podem mandar armas e munições. Mas a inteligência, a vontade de estudar, a determinação no trabalho e a coragem para avançar contra o inimigo, não podem vir nos barcos, nem em caixotes. Têm que ser coisas nossas, absolutamente nossas, como o chão da nossa terra, como as árvores do nosso mato, como os nossos filhos e os nossos parentes.

Nascem e crescem nas nossas cabeças, e nos nossos corações…

 

Querem acreditar que estas simples e sábias palavras, foram há muito,  muito tempo dirigidas com todo um requintado método pedagógico, durante os importantíssimos seminários, a exactamente uma plateia composta pelos tais camaradas que mais tarde…

 

Tanto me orgulha pertencer a este povo e tanto me envergonha pertencer a esta sociedade!

 

Ser, Conhecer, Compreender e Partilhar.

PROJECTO GUINÉ-BISSAU: CONTRIBUTO - LOGOTIPO

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

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