PODER
William cecil vieira Vaz * 24.07.2010 A palavra “poder” já há muito tempo vem sendo estudada. Várias teorias políticas e filosóficas foram desenvolvidas trazendo sempre grande fascínio ao homem, Galbraith afirma que “poucos são os que mantêm uma conversa sem referência ao poder.” Não se pode falar de poder sem fazer um apontamento a obra “O príncipe” de Nicolau Maquiavel realizada em meio a uma transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, que iniciou-se na Itália, entre os séculos XIV e XVI, numa época marcada por transformações e rupturas de valores tradicionais, principalmente o religioso. Nicolau Maquiavel, um pensador renascentista, compreendeu sua realidade e transferiu para a política as inovações no seu tempo. A obra realizada por este filósofo demonstra a maneira céptica de encarar o ser humano, a concepção de poder acima da ética, pois tudo é válido, contando que o objectivo de permanecer no poder seja alcançado, isto é “os fins justificam os meios” e ainda expõe as verdadeiras intenções de um governante ambicioso, onde pode-se notar o diferente posicionamento, as hesitações e decisões ditadas pela força. O poder maquiavélico refere-se a um poder que age secretamente, onde mantém suas intenções e finalidades desconhecidas, onde utilizam-se meios imorais, agressivos e perversos para atingir seu objectivo. Suas teorias eram formuladas com a experiência normal de seu tempo, pois viu muitas lutas, ascensão e queda de grandes cidades. A concepção dessas experiências conduziu a idéia de que uma nova sociedade tornara-se necessária. O conquistador, para manter-se no poder, deve seguir duas regras: primeiro, fazer com que se extinga o sangue do antigo príncipe; segundo, não fazer mudanças nas leis nem nos impostos. Todos querem conquistar Estados, honrarias e glórias, mas nem todos são capazes de o fazer. “O desejo de conquistar é coisa verdadeiramente natural e ordinário e os homens que podem fazê-lo serão sempre louvados e não censurados. Mas se não podem e querem fazê-lo, de qualquer modo, é que estão em erro, são merecedores de censura”. Maquiavel distingue dois tipos de Estado: o principado, governado por uma só pessoa e a república, governada por várias pessoas, podendo ser aristocrática ou democrática, referindo-se basicamente aos novos principados (e não aqueles herdados), que podem ser conquistados pela "virtude", pela "fortuna", pela violência ou pelo consentimento dos cidadãos. Os conceitos de "virtude" (isto é, energia, coragem, vigor, talento e valor pessoal) e de "fortuna" (isto é, destino e sorte) são muito importantes na visão histórica de Maquiavel, que os considera igualmente relevantes em tudo o que se consegue realizar. Para ele, não existe a distinção entre principados bons e maus, governantes legítimos e ilegítimos. O que conta é a capacidade e o êxito do príncipe em manter o Estado e o poder. Para isso, os fins justificam os meios e qualquer acção empreendida é válida. Para Maquiavel, o bom governante é aquele que, mesmo tendo chegado ao poder por actos criminosos, consegue mantê-lo quaisquer que sejam os meios utilizados. Inteiramente desvinculada de qualquer preocupação ética ou moral, a teoria política de Maquiavel serviu de inspiração e de justificativa às acções dos monarcas absolutistas da Europa Moderna. Max Weber na sua obra “Ciência e Política: as duas vocações”, define o poder em três categorias e fundamenta a sua legitimação: o poder tradicional, o poder carismático e o poder legal. O poder tradicional é legitimado pelos costumes, pelo hábito, pela tradição daquele de exercer autoridade como o patriarcalismo, onde a autoridade é do pai, o patrimonialismo que é do coronel, do patrão e a gerontocracia que a autoridade está na figura do mais velho. O poder carismático é autoridade que se baseia em dons individuais, é a confiança depositada em alguém que tem carisma e que dele fazem chefe. È o poder que os homens dão obediência não pela força ou pelo costume, mas porque neles depositam a fé e o Poder legal (racional) é a autoridade que se impõe pela legalidade, se embasa numa estrutura legal, positiva, estruturada em regras estabelecidas; o dever obediência não está numa pessoa, mas numa norma. Não bastam técnicas para conquistar e manter o poder se houver a legitimação do poder pelo povo, a legitimação é oferecida por outros aos que pretendem com ele governar. Weber define poder como “a oportunidade existente dentro de uma relação social que permite a alguém impôr a sua própria vontade mesmo contra a resistência e independentemente da base na qual esta oportunidade se fundamenta”. Norberto Bobbio define a palavra poder como a capacidade de agir e de produzir efeitos. Hobbes e Maquiavel tinham opiniões semelhantes no que diz respeito ao homem, pois ambos consideravam o homem um ser egoísta, predisposto a cometer actos anti-sociais. Hobbes colocava que o poder era adquirido de duas formas: pela força natural(coerção), o Estado por aquisição ou pelo consenso(comum acordo). Max Weber ensina que o consenso fornece legitimação ao poder do soberano que é dado por aqueles que consentiram, o povo. Montesquieu tenta resolver um problema que é a da liberdade política e do poder e seu exercício. Para isso formula em sistema, o “sistema de freios e contra pesos” que há uma combinação da força de forma moderada. Destaca-se aqui a teoria e separação dos poderes que hoje é adoptado em nosso País, tem por objectivo freiar o poder com o poder, torná-lo eficaz, porém moderado. Esta teoria define-se em três poderes em equilíbrio: o poder executivo(presidente,o rei e seus ministros), o poder legislativo(deputados,a câmara baixa e alta) e o judicial( magistrados). Para Montesquieu essa seria a forma de assegurar que o poder fosse limitado não havendo assim o uso e abusos de poder. O poder para Marsal é entendido como uma relação de domínio do individuo sobre as mentes e as acções de outros indivíduos. Quanto a disposição de mandar e de obedecer Nietzche formulou a seguinte pergunta: ¿Qué es lo que induce a los seres vivos a obedecer y mandar, y a que obedezcan incluso cuando mandan? ..... Siempre que he visto un ser vivo he encontrado voluntad de poder; hasta en la voluntad del siervo encontré voluntad de ser señor. Al más débil le induce su voluntad a servir al más fuerte, porque esa voluntad quiere dominar lo que es más débil aún: se trata de un placer del que no quiere privarse. ( Nietzche apud Guerrero) Guerrero expõe que as relações de poder podem se desenvolver nos seguintes processos: a submissão, a identificação, a interiorização, e a posição. A submissão é a disposição de submeter-se as ordens de outros sem contestar ou oferecer resistência. Já a identificação é o caso em que o indivíduo deixa de ser o mesmo e se transforma em uma pessoa idêntica as demais e actua como os poderosos esperam que ele faça. O outro processo de relação de poder é a interiorização, chamado também de processo de socialização, o indivíduo faz seus principais valores do sistema dominante, se apropia de certas características que refletem o sistema de poder e se operam certas mudanças na conduta do individuo que tende a ser mais ou menos permanentes. Estas características podem ser denominadas como: valores, motivos sociais, atitudes, crenças, etc. e por último a relação de poder pelo processo de posição é uma reacção de rejeição a autoridade, de inconformidade com o poder. Há três meios de exercer o poder, Galbraith coloca que existem atributos que outorgam a usá-lo que é o poder condigno, o poder compensatório e o poder condicionado. O poder condigno “obtém submissão infligindo ou ameaçando conseqüências adequadamente adversas.” Isto é impõe a sua vontade as preferências do individuo fazendo com que seja desagradável não se submetê-la. O poder compensatório diferente do poder condigno é a conquista da submissão oferecendo uma recompensa positiva. Já o poder condicionado, condiciona submissão a uma mudança de convicção, é realizado através da persuasão. O poder sempre existiu na história do homem, foram as formas de como utilizá-lo e de como legitimá-lo que o modificaram. Na Idade Antiga o poder era mitológico, na Idade Média o poder era legitimado pela filosofia e a igreja e na Idade Moderna o poder está relacionado com o saber, a epistemologia. O poder faz parte da nossa sociedade, sendo impossível ver o desenvolvimento de tecnologias e de forças produtivas que são próprias do capitalismo, sem a presença do poder. Como Galbraith expresssa, o poder pode ser mal, mas socialmente necessário. Quando é observada a relação entre países é identificada a relação baseada no poder, poder econômico, militar e político e para que alguns países se mantenham no “status” é necessária uma atitude firme para que a manutenção da sua soberania não seja ameaçada. O poder é assunto a ser abordado de maneira céptica e não como uma idéia maligna. Face as considerações acima expostas convido-vos a refletirem comigo.De que adianta ter valores e atribuições políticos sem ter o poder para que se possa colocá-los em prática? O poder que detem a administração pública é necessariamente essencial para a realização de certos actos que assegurem a sua finalidade. De que adianta ter uma estrutura para realização de actividades sem ter o poder para que se possa colocá-los em prática? Para terminar gostaria de assinalar a insuficiência do poder por si só para pôr e manter em funcionamento uma administração pública eficaz, eficiente, capaz de responder a todas as questões que lhe são colocadas. Melhorar o funcionamento da administração pública na Guiné-Bissau passa também por uma abordagem prática, obediência as leis, boa legislação e muito boa vontade política.
Referências MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. Porto Alegre: L& PM Pocket, 2004. WEBER, Max. Ciência e política : as duas vocações. São Paulo: Martin Claret, 2003. BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicolau; PASQUINO,Gianfranco. Dicionário Político. 5o, vol., Brasília:UNB,2000. WOLKMER, Antonio Carlos. Introdução à história do pensamento político. Rio de Janeiro e São Paulo:Renovar, 2003.
GUERRERRO, Fernando. Una breve historia del poder. Disponível em: http://www.monografias.com/trabajos14/hist-poder/hist-poder.shtml. Acessado em: 3 maio 2010. GALBRAITH, J. Kenneth. Anatomia do poder. 4a ed. São Paulo: Pioneira, 1999.
* Licenciado em Direito - UFSC (Brasil) VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR! Associação Guiné-Bissau CONTRIBUTO |