Postas de pescada à «Alpoim»!
- 7-May-2004 - 12:51


A 18 de Fevereiro deste ano de 2004, o jornal português "Público", transcrevia na sua edição, uma entrevista do capitão-de-mar-e-guerra português,(na reserva) Alpoim Calvão, concedida à Agência Lusa, em Bissau, onde se encontrava ao serviço de um canal de televisão estrangeiro.


Por Fernando Casimiro (Didinho)

Nas suas declarações, Alpoim Calvão, responsabiliza o PAIGC e, a Organização da Unidade Africana (O.U.A.), pelo eclodir da guerra, na Guiné, pois, segundo ele, a guerra era "evitável" se tanto o PAIGC, como a O.U.A, não tivessem interferido...

Alpoim Calvão, diz ainda que, o PAIGC, recusara uma proposta de Lisboa, no sentido da independência: "O PAIGC, não quis entrar na coligação da União dos Naturais da Guiné Portuguesa (UNGP), liderada por Benjamim Pinto Bull e que congregava oito dos nove partidos nacionalistas então existentes".

Alpoim sublinha ainda que os acertos da independência da Guiné, tinham sido feitos em Julho de 1963, por Salazar, pelo regime português e, aceites por Senghor, presidente do Senegal e, Benjamim Pinto Bull, da parte dos naturais da Guiné.

A proposta de independência, visava, primeiro, a formação de quadros, para depois se caminhar para uma autonomia e, mais tarde, a independência.

Continuando, diz que o PAIGC, obteve apoios de países radicais da O.U.A. e, lançou-se abertamente na luta armada, sendo natural que o outro lado (Portugal)se defendesse e agisse de forma a defender os seus interesses para alcançar os seus fins.

Calvão disse ainda que, se o PAIGC, tivesse aceite integrar a coligação e a O.U.A. não interferisse, a Guiné-Bissau estaria hoje "muito melhor do que se encontra".

A dado passo da sua entrevista, questiona: "Passados 30 anos, alguém de bom senso pode dizer que a independência foi um sucesso? Era este o sonho de Amilcar Cabral? Mas foi este o caminho em que ele (Amilcar Cabral) meteu o país.

Alpoim Calvão acusou ainda Amilcar Cabral, de ter sido um homem com dois discursos: "um de homem de Estado e outro de racista", um para dentro do partido e outro para fora.

Segundo Alpoim Calvão, Amilcar Cabral, pedia aos guerrilheiros do PAIGC, para não se casarem com cidadãs estrangeiras, mas sim com mulheres guineenses.

Ainda segundo Alpoim Calvão, Amilcar Cabral propunha o terrorismo.

Tive a oportunidade de ler esta entrevista, no dia em que foi publicada, tendo decidido dar resposta ao sr. capitão Alpoim Calvão, logo que me fosse possível.

Aproveitando este espaço, do Notícias Lusófonas, aqui deixo a minha revolta de guineense e lusófono.

O 25 de Abril em Portugal, acabou com o fascismo, mas, infelizmente, não acabou com os fascistas! Eles andam aí... e, Alpoim Calvão, é um deles. Ir a um país em missão de serviço e, conceder uma entrevista de carácter insultuoso, para com esse país, é no mínimo, reprovável.

Nem Amilcar Cabral, nem o PAIGC, precisam de defesa, em relação a esta tentativa de desvirtuação da história, feita por Alpoim Calvão. Cabral, que, teve como primeira esposa, uma cidadã portuguesa, com quem teve 2 filhas,(é racista...?) ficou conhecido mundialmente, pelo desempenho positivo que teve na luta a favor dos povos oprimidos, incluíndo o povo português, que vivia debaixo duma ditadura feroz.

O PAIGC, fundado e superiormente dirigido por Amilcar Cabral, foi sempre e, até às independências da Guiné e de Cabo Verde, referência ímpar de sucesso evidente dos movimentos de libertação, de então.

Mais do que questionar se passados 30 anos, a independência da Guiné-Bissau, foi ou não um sucesso, convém associar o forte impacto que a guerra na Guiné teve, no despertar de consciência que, culminou com a revolução de Abril e, no derrube da ditadura em Portugal.

O projecto de independência proposto por Salazar, com a aprovação de Senghor e, Benjamim Pinto Bull, só podia ser um projecto neo-colonialista, pois o próprio regime em Portugal era colonialista.

Em cinco séculos de colonialismo, Portugal não chegou a formar sequer, uma dezena de quadros superiores guineenses. Cabral foi uma das excepções.

Volvidos 30 anos de independência, a Guiné-Bissau não confirmou o espírito dos ideais da libertação, rigorosamente trilhados no percurso da luta pela independência, é certo, mas, estamos empenhados em "refundar" o país e, mostrar que valeu a pena a independência.

Creio que, não só os guineenses devem ter ficado indignados com a entrevista de Alpoim Calvão, mas, todo o espaço lusófono, pois mentes fascistas e colonialistas são equiparáveis às mentes terroristas...

Na Guiné-Bissau, ainda assim, arrota-se a camarão e não a pescada, meu capitão...

Chegue-se para lá !!!
 

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