O QUE REPRESENTA AMILCAR CABRAL, HOJE, NA SOCIEDADE GUINEENSE?

 

 

Por: Intunda Na Montche

 

Dr. Intunda Na Montche

 

06.10.2007

 

 

Antes de mais, apresento as minhas maiores saudações ao Irmão Jornalista Helmer Araújo que deu mais um sinal aos intelectuais desta nossa geração para que tomem consciência daquilo que hoje o nosso país está a sofrer por culpa dos interesses pessoais dos nossos dirigentes políticos. E quero por isso agradecer o nosso Irmão Didinho Casimiro que nos deu esta  grande oportunidade de poder expressar livremente como acontece em todas as democracias do mundo. E para que isto sirva como exemplo para os ditadores  africanos e sobretudo para os da Guiné-Bissau!

 

Chegando a este ponto é preciso mesmo ter a coragem de cada um se pronunciar dizendo chega! Isto é, basta com esta indiferença com o qual os quadros e técnicos guineenses estão a pactuar com a ditadura!! Na qualidade de pessoas formadas e informadas, não podemos ficar silenciosos perante esta situação que está a danificar a juventude guineense! A droga, a delinquência, a criminalidade organizada, a fome, a falta de água potável nas tabancas!

 

Agora fala-se muito da reconciliação!  Que reconciliação é possível hoje na Guiné se, nas tabancas não há o mínimo necessário para a sobrevivência do nosso povo e, mesmo no parlamento guineense, os representantes do povo não demonstram vontade, nem capacidade de instituir uma comissão parlamentar capaz de promover a reconciliação no país por motivo de simples interesses singulares que não são interesses do nosso povo?  

 

É possível uma reconciliação se hoje a juventude guineense não tem acesso a uma formação técnico- profissional que lhe possa oferecer uma oportunidade para uma vida profissional digna, que lhe dê a esperança? É possível a reconciliação numa sociedade onde o salário não chega todos os meses?

 

É possível a reconciliação num país onde a droga gira nas mãos de certas camadas com um certo nível social e político como constatam os relatórios publicados pela comunidade internacional?

 

É possível que haja reconciliação na Guiné numa altura em que em 2007 muitas crianças não têm acesso ao ensino primário fundamental? Então se reflectir é pensar para agir, e se  agir é para resolver um problema, assim sendo, exige-se uma abertura de espírito, responsabilidade e sinceridade, sobretudo na gestão da coisa pública.

 

Neste caso todo o cidadão guineense é chamado a interrogar-se sobre actual situação socio-política do país e procurar respostas antes que venha a ser tarde! Hoje nesta conjuntura geopolítica mundial em que vivemos é necessário afirmação de uma identidade política forte e sustentável e ao mesmo tempo respeitar as regras nacionais, regionais, internacionais e globais, porque fazemos parte de um  mundo que exige a nossa participação para o melhorar.

 

Pelo que, faz muita pena o que se vive hoje na Guiné-Bissau um país com 34 anos de independência, sem conseguir resolver problemas elementares do desenvolvimento, tais como;  de saúde pública, educação e alimentação (agricultura)! 

 

Pergunta-se ainda o porquê de tudo isso? A falta de capacidade dos nossos dirigentes nas resoluções dos problemas? Ou a falta de honestidade intelectual e política?

 

Creio que capacidade não lhes falta, o que falta é a sensibilidade daquilo que é o maior sofrimento do nosso povo! Então se assim for, é necessário recuperar Amilcar Cabral através dos seus saberes para nos enquadrar de novo conforme as exigências da época contemporânea. O nosso país faz parte do mundo, não podemos criar as nossas regras fora das regras da convivência civil em geral, que vigora no mundo, pelo que somos obrigados a viver como seres humanos com a consciência da própria história.

Um outro aspecto importante de que devemo-nos preocupar também é o seguinte: perguntarmos se tudo aquilo que o Irmão activista nos conta sobre a realidade do nosso país é realmente verdade ou são meras falsidades? Então se forem falsidades porque nenhum dos acusados ousa processar o Irmão Activista Fernando Casimiro para que possa demonstrar as provas de tudo aquilo que anda a sustentar?!

 

Queridos Irmãos e amigos da Guiné-Bissau, não podemos continuar a ser indiferentes com o que nos está a acontecer no país só porque temos medo de morrer ou de sermos fuzilados através de mandatos “ordem para matar” como foi o título do livro do falecido DR. Viriato Pam!!! Eu pessoalmente não quero acusar ninguém, mas também é demais, ficar indiferentes por tudo aquilo que nos conta este Activista que teve e tem a coragem de dar a sua cara para o interesse comum do nosso povo e do nosso país e sensibilizando o nosso povo através da prática consciencializadora de que falavam o professor Paulo Freire e o pai da nossa nacionalidade, Amilcar Cabral! Este Homem que conduziu a nossa luta de libertação antes de ser  Político foi antes de tudo um  pedagogo de grande inspiração política e ao mesmo tempo foi um investigador da VERDADE e Activista dos direitos Humanos! Pelo que hoje se somos livres e independentes é graças a ele e sobre tudo graças à grande capacidade que ele tinha e com que soube unir o povo Guineense para desencadear a luta armada para a independênciacia deste mesmo povo.

 

Queridos Irmãos, dirigentes do nosso povo, políticos, religiosos, leigos, Cristãos, católicos,

 muçulmanos, animistas, protestantes, etc., etc. um dia seremos chamados por Deus para responder sobre as injustiças e várias atrocidades que têm acontecido no nosso país mas que nunca tivemos uma opinião contrária pelo facto de não virmos a ser condenados por alguém do poder!!! Por outro lado eu  percebo muito bem estes nossos irmãos que não pronunciam nada a propósito da situação do nosso povo e do nosso país... Mas eu pergunto: até quando vamos continuar com este silêncio que está a cultivar ou melhor que já cultivou a cultura do medo dentro de nós mesmos!

 

No fim, é esta cultura do medo que vai nos julgar!

 

Ora bem, será que temos conservados ainda os valores da nossa luta? Quais são estes valores? Fiz estas perguntas mas nem eu mesmo serei capaz de respondê-las. Mas para mim, o importante não è responder a estas perguntas, o importante é que cada um de nós saiba que estes valores existem e que cada qual deve procurar recuperá-los e vivê-los na própria vida quotidiana. Em todo o caso gostaria de mencionar os quatro (4) valores vividos de uma forma intensa pelo nosso grandioso líder Amilcar Lopes Cabral que são:

 

-  Defesa da pátria;

-  Solidariedade;

-  Recuperação do Homem pelo Homem;

-  Justiça social.

 

Hoje, quase na distância de 34 anos de independência e da morte deste Homem carismático do nosso povo e para nosso povo, num panorama mundial radicalmente diferente, esta figura símbolo parece adquirir uma dimensão nova: sobre razões politicas prevalece o valor indiscutível da coerência pessoal que ele tinha como o compromisso com o nosso povo como ele sempre costumava a dizer.

 

 Todos estes valores que o Amilcar nos deixou estão ainda presentes  nalgumas figuras do nosso povo que podem ser ainda recuperados em dialogo com Amilcar Cabral através destas mesmas figuras presentes hoje dentro das nossas Forças Armadas Revolucionarias do Povo e não só.

Em vários momentos tive conversas com alguns destes camaradas que foram próximos de Amilcar e também de Osvaldo Vieira e de outros grandes combatentes da nossa luta que tombaram nesta mesma, mas que deixaram um testemunho daquilo que era a perspectiva e a visão de Cabral para uma Guiné-Bissau pós-independência! Amilcar e os seus companheiros de luta foram homens ambiciosos... mas ambiciosos no sentido bom da palavra o que não queria dizer serem vaidosos! Ser ambicioso para Amilcar Cabral e os seus companheiros honestos de luta, significava ter uma visão longínqua reconstrutora da Guiné-Bissau baseada em projectos concretos a favor das nossas populações e não na ambição do poder como temos constatado nestes 34 anos de independência. Pois, nós hoje que estamos a falar por escrito ao povo da Guiné-Bissau, nascemos nos anos da independência e naqueles anos já existiam os mesmos dirigentes políticos que ainda hoje estão nos a dirigir o pais! Isto quer dizer que o nosso país faz resistência à mudança!!! Mas digo, antes pelo contrário, precisamos de uma mudança de geração política com uma nova visão capaz de mudar o cenário político guineense para assim dar esperança ao povo! Pelo que as nossas populações estão cansadas e precisam duma nova classe política capaz de projectar uma sociedade nova com base no ensino e educação, através de projectos de formação profissional permitindo assim, a criação de pequenas empresas que possam contribuir para relançar a economia do nosso país e na melhoria das condições de vida do nosso povo.

 

Queridos Irmãos, nesta nossa reflexão é muito importante também falar do papel fundamental que a Universidade tem num processo de transformação social  como aquele do nosso país. Isto é considerado como espaço de confronto entre a tradição e a inovação, pelo que pensar a Universidade, é reflectir sobre as condições do desenvolvimento nacional no contexto das interdependências mundiais, as  interrogações da vida de todos os dias, a evolução do capital intangível, os desafios do presente e dos novos códigos mentais, culturais e epistemológicos. Esta tarefa não será fácil nem recusável porque a Universidade é simultaneamente a depositária dos mais elevados saberes de cada geração e o espaço de livre confronto entre a tendência para conservar o que se conhece e o impulso transformador.

 

Os partidários da educação ao longo da vida privilegiam  as competências  de adaptabilidade à mudança e exigem a contribuição da Universidade para a compreensão do presente e a definição de novas formas de pensar e de agir para o futuro, através do conhecimento cientifico, humano e reflexivo. Nesta perspectiva o nosso país, a classe política e a sociedade civil em geral, têm que levar em conta esta evolução, sobretudo com a  mudança do tempo no qual teremos que adequar hoje.

 

Para além da formação específica da área de estudo, a Universidade promove competências transversais, como comunicação oral e escrita, gestão, liderança, trabalho em equipa e o espírito empreendedor. Nesta ordem de ideia  vale a pena sublinhar que no contexto como o nosso, de um pequeno Estado em desenvolvimento, a identidade da Universidade pública enquanto elemento preponderante no sistema de ensino superior se situa numa zona da transição da matriz moderna, que lhe atribuiu a missão geral de servir a nação e a tarefa especifica de produzir e reservar a difusão do conhecimento como um fim em si mesmo. Ora pergunto, se se pode imaginar a relação entre a Universidade e a nova geração guineense que hoje estão a frequentar as duas Universidades de Bissau que são: Colinas de Boè e Amilcar Cabral? Os Governantes do nosso “NARCO-ESTADO” pensam realmente no fruto que estas duas Universidades vão dar daqui a poucos anos? Os nossos políticos ditadores estão preparados para escutar a opinião ou a sugestão destes jovens que serão formados daqui a pouco? Os nossos Governantes, será que estão a pensar na colocação destes jovens que estão para concluir os estudos nestas duas Universidade? Eu sei que o nosso povo quer ver o fruto das nossas duas Universidades!!! Mas o que falta aqui é a vontade política de projectar e organizar a sociedade guineense devidamente. Mas isso poderá acontecer só quando o nosso país tiver um presidente capaz de renunciar às viagens inúteis e um governo capaz  de gerir a coisa pública com o mais alto nível de responsabilidade.

 

Aqui neste artigo gostaria de sugerir uma coisa muito importante que é o seguinte: que o Governo no próximo Orçamento Geral do Estado dito (OGE), inclua no pacote as despesas financeiras e administrativas das duas Universidades que são: Amilcar Cabral e Colinas de Boè. Porque cabe ao nosso Estado esta função e não aos privados. E para assim diminuir os custos de propinas e para permitir o acesso aos alunos que  das zonas rurais do nosso país. Isto è, os alunos que têm pais pobres que vivem só de agricultura. Também pensar na forma como indemnizar os familiares daqueles que foram fuzilados no caso de 17 de Outubro por uma falsa acusação de golpe de Estado que nunca existiu na verdade, mas só porque o Presidente e o regime daquele tempo tinham medo deste grupo de pessoas inteligentes e que tinham grande personalidade. Portanto, os filhos e familiares destes camaradas merecem ser indemnizados pelo Estado da Guiné-Bissau que viu e deixou-lhes sozinhos por uma morte injusta.  

 

Queridos irmãos, esta indemnização não vale só para os familiares daqueles que foram fuzilados no caso de 17 de Outubro, mas também para todos aqueles que foram vítimas do actual regime do nosso país como no caso do Comodoro Lamine Sanhà e de tantos outros...

Nesta perspectiva apelamos ao Procurador-Geral da República, através do Ministério Público, a promover investigações que possam chegar à VERDADE e esclarecer todos os casos das mortes obscuras que têm acontecido no nosso país mas que nunca chegamos a conhecer os responsáveis destes actos. O meu último apelo neste artigo vai para toda  a sociedade civil da nossa terra para que sejam vigilantes em todos aspectos da vida democrática do nosso país, porque na democracia o controlo de poder é recíproco e ninguém tem poder absoluto.

 

PROJECTO GUINÉ-BISSAU: CONTRIBUTO - LOGOTIPO

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO

www.didinho.org