Resposta ao Sr. professor "Galo Garandi"
Francelino Alfa
14.06.2005
Ex.mo Sr. Professor!
“Galo Garandi”
Qualidade! Qualidade! Bom
senso, inteligência e sabedoria. Palavras de ordem exigem-se!
Sr professor permita-me que lhe escreva com muita estima e consideração.
Antes porém, vou
simplesmente dizer-lhe “Djarama”. Disse bem, “Djarama”. Esta
palavra que o senhor bem conhece, diz tudo.
Sou um simples cidadão,
guineense, jovem que poderá ser e bem seu filho, que pertence provavelmente -
muitos da minha geração estarão de acordo - à geração rasca, porque tivemos
poucas referências e somos profundamente marcados pelo desencanto.
Vivo há largos anos no
estrangeiro onde resido e trabalho mas tive o privilégio de constatar “in
loco” a real situação do país durante o período em que estive a trabalhar
para uma ONG dinamarquesa. Esta é a 2ª vez que acedo a este sítio vai fazer um
ano em Julho próximo, por 2 razões diversas mas igualmente importantes. Desta
vez, há dois dias, tive a sorte e o privilégio, diga-se em abono da verdade, de
me deparar com este texto a que não podia ficar indiferente dado o seu conteúdo
e a forma simples, sustentada e brilhante como o seu autor o tem escrito. Este
brilhantismo deve-se na minha opinião, a três razões fundamentais:
1ª - Porque é um SENHOR
que vive no país e conhece a sua terra e que no alto dos seus 62 anos não tem
medo da verdade que os nossos políticos tanto temem. Os fracos são medrosos e
preguiçosos e temem o debate e confronto de ideias.
2ª - Porque é um “Homi
Garandi” na verdadeira acepção da palavra que os guineenses bem conhecem e
cujo significado muito respeitam: bom senso, inteligência, sabedoria e lucidez.
3ª - É a qualidade do
texto, rico em conteúdo e na forma. Em conteúdo, pois aborda factos reais a que
a minha geração assistiu - alguns directa, outros indirectamente, outros ainda,
apenas ouviram falar. Como consequência, o despertar de consciências da malta
mais nova que facilmente é manipulável com discursos populistas fruto ainda da
baixa qualidade na nossa educação, da falta de informação das pessoas, do
baixíssimo nível de vida das pessoas ou seja, sem exagero, de algum
obscurantismo ainda das nossas populações. Na forma, é a breve cronologia
histórica, objectiva, a linguagem usada - cuidada e sem insultos - e o domínio
da língua dos Portugas, não fosse você um PROFESSOR REFORMADO que
olha do cimo os graves atropelos que nós, doutores, engenheiros, senhores da
nossa praça dão uso a esta língua que é falada por mais de 200 milhões de
pessoas em todo o mundo. Qualquer cidadão que tem o privilégio de ler este seu
texto estou seguro de que, independentemente de ser guineense ou não,
sentir-se-á contente e certamente “apanhado” por alguma simpatia
intelectual. Este foi o primeiro impacto que este texto provocou em mim.
Os ingleses
dizem: “You really touched my heart there”.
Como cidadão guineense sem
qualquer filiação partidária e que deu alguma contribuição àquele país, não
podia ficar indiferente e peguei imediatamente no computador para fazer estas
breves linhas e dizer-lhe que estou muito feliz e estou certo que muitos mas
mesmo muitos da nossa diáspora sentir-se-ão felizes ao tomarem contacto com este
texto. Estamos todos agradecidos por si pela forma simples, clara na exposição e
mesmo aqueles que não querem ver, não deixarão de reconhecer podendo ou não
rever-se nele. Aqueles que são minimamente inteligentes interrogar-se-ão quanto
ao rumo que o país deve seguir, que é o do progresso e desenvolvimento. Isto só
vem provar que temos gente que pensa aquele país e está preocupada com o seu
futuro. Gente descomprometida, provavelmente!? Pena foi o professor não se ter
identificado mas isto todos nós sabemos e reconhecemos que ainda vivemos numa
sociedade que amordaça... numa terra em que os boatos e o achincalhar o
adversário e, se possível, abatê-lo é pão vosso de cada dia. A verdade dói e só
não vê quem não quer ver. São as calúnias e intrigas; desconfianças e invenções;
falsidades e traições; mesquinhez e laxismos; rivalidades e mentiras;
tribalismos e bruxarias; corrupção e compadrio; nepotismo e sectarismos; eu sei
lá, ....obscurantismo e incompetência farejando a qualquer preço o poder. Um
poder autoritário e despótico. Um poder sem doutrina! Nesse ambiente improdutivo
e nocivo, morre-se por melhor protecção que se tenha! E fingem que não querem a
coisa e comem tudo e comem tudo e não deixam nada. Nessa terra dos “Djugudés”(!)
onde todos se ralham e ninguém tem razão. Casa onde não há pão é o que vale. Em
que os “humanóides” são heróis. Charlatães e vigaristas, reis e senhores.
Somos um país em que roubar 100 Francos CFA és ladrão. Roubar um milhão és um
grande cidadão. Em que a arrogância, presunção e bazófia bacoca constituem
admiração. Onde a personalidade fundamental dos seus cidadãos é a inveja e a
mediocridade e, gente com qualificação é acantonada e apartada, em que a cunha
política ou partidária é quem mais ordena. E mata-se com facilidade por motivos
políticos e económicos onde os direitos mais elementares da pessoa humana são
desrespeitados e não haverá outro caminho se não o retrocesso. A única salvação
será a mudança de mentalidades. A massa crítica não suporta aquele “modus
vivendi” para a alegria dos mordomos, medíocres e “cegos” onde se
discutem pessoas em vez de ideias e projectos para o desenvolvimento. A
chicana, rumores e especulação tomam contornos de maledicência e maldade e, a
verdade é sinónimo de perseguição e às vezes, de linchamento. O que é que vemos
e assistimos? Fuga e sangria de gente qualificada. Alguém dizia que cada um tem
o que merece. A intolerância tomou lugar da fraternidade. As pessoas preferem
andar aos tiros do que dizer a verdade. Como dizia Carlos Lopes, esse
ilustre guineense, preferimos “matchundade”. Mas o que é esta coisa de
“matchundade”? Não é senão o medo do debate e confronto de ideias e a
procura da verdade e, a força sobrepõe-se à razão. Sempre!!
Senhor PROFESSOR, o
seu texto inspirou-me e dada a pertinência que suscita e dado o momento
particular em que o país está a viver, aqui e agora para os nossos jovens, para
as mulheres, as nossas mães, para as nossas irmãs, enfim, para o meu povo, é
chegado o momento de refrescarmos a memória. Todos! Pois bem, recordar
é fácil para quem tem memória e esquecer é difícil para quem tem coração. Quem
estaria a recusar o passado, estaria condenado a revivê-lo. Num país como o
nosso, os problemas de fundo subsistem, nomeadamente a degradação do sistema de
saúde e do ensino, a falta de infra-estruturas, a falta de emprego, em que em
média, cada cidadão guineense vive com menos de 1 dólar por dia (dados da ONU
do ano passado para a classificação do IDH - Índice de Desenvolvimento
Humano) e, mais grave ainda, a degradação dos valores essenciais da pessoa
humana como sejam a moral e a ética. Dívida externa de milhões, vogando de vento
em popa onde nesta reunião da semana passada do G8 em Londres, a Guiné-Bissau
não foi elegível. Talvez na segunda remessa só daqui a 12/18 meses se
este governo cumprir os critérios da boa governação para que o G8 possa
eventualmente anular parte da dívida guineense, orçada em 800 milhões
de euros. Que interessam os senhores Kabys, Kumbas -
vendilhões sem miolos? Estes dois senhores, concerteza, que são figuras
incontornáveis e marcantes e que não deixarão de fazer parte da nossa história,
devem ser definitivamente ignorados e fazendo parte do nosso triste passado.
Neste tempo de facilitismo, de oportunismo, de cinismo e de incoerências até,
vêm com discursos açucarados e populistas, vazios de conteúdos, desviando as
atenções das pessoas, seduzindo-as com ofertas de televisões e mais ridículo
ainda, com ofertas de geradores num país sem LUZ ELÉCTRICA, sem
esgotos, sem serviços de saneamento básico digno desse nome, atacando
países amigos da Guiné esquecendo-se que somos um país pobre, muito pobre, leram
bem, muito pobre (!) em que mais de 55 % do orçamento no nosso
Estado (outra vez, dados oficiais - não falo de coisas que não sei!!) provém de
assistência oficial de outros governos. Falam mal de Internet, fazem chantagens
aos jornalistas, censuram os media. Um de uma maneira, outro, de outra. A
velha máxima: quem não está connosco é contra nós. Recebam as suas ofertas
mas não votem neles. Pensem naquele que vos assegurará escolas e hospitais
condignas com luz eléctrica, água potável e com móveis. Votem em consciência e
com convicção. Votem na mudança para um futuro melhor! O nosso sistema
democrático precisa de mudança ... de novos protagonistas e de políticas
novas e diferentes.
Esqueçam esses dois
senhores. QUE DEIXEM O POVO EM PAZ, POR FAVOR!!
A vós jovens que constituem
a maioria da população e com idade para votar, peço-vos encarecidamente visto
que estas eleições são demasiadamente importantes para o nosso futuro colectivo,
que pensem no que vos reserva o dia de amanhã, pois sois a esperança. Os
políticos medíocres locais têm medo da diáspora por isso, inventam coisas como
falar mal de Internet que só potencia a liberdade e o conhecimento mas não é
isto que me interessa neste momento. O que vos digo é que o futuro do país a vós
pertence. Por essa razão, não mais podia estar indiferente às vicissitudes da
vida que levam muitos de vós a enveredar por caminhos errados, não por
bel-prazer, todavia, como consequência da frustração a que foram votados pela
própria classe política governante. Estando o país a viver o “Histórico
Carnaval Democrático” dada a palavra ao povo, perguntem à vossa consciência
o que foi feito no passado pelo futuro do país e, consequentemente, o nosso?
Perguntem aos vossos pais, aos vossos amigos mais velhos, aos vossos familiares
como era a Guiné até meados dos anos 80, vejam e revejam as fotografias daquela
época. Perguntem à vossa consciência quem foram os governantes que conheceram
desde que nasceram até ao presente momento. O que prometeram e, o que fizeram
por nós, por vós e pelo país, senão a desgraça e o sonho sempre adiado?!
Alguém que tem por si o
fermento da lei não está nunca longe de agir como um tirano. Pensem no que
fizeram estes dois senhores!? O medo resulta da experiência de privação. Um ser
animal não se reconhece miserável, mas nós humanos podemos ser miseráveis por
nos vermos miseráveis e, neste caso, o sentimento de violência pode despertar,
se bem que é compreensível por sermos um país pobre, o que não é pretexto para
não nos engrandecermos. Outrora a Guiné - Bissau esteve nas bocas do
mundo! Todos nós ouvimos falar através dos nossos pais, que se fez uma luta
heróica e gloriosa. Os homens é que fazem a HISTÓRIA (homenagem a Amilcar Cabral
à testa! - um vulto simplesmente esquecido e ignorado!! O seu pensamento é
debatido nas escolas e institutos dinamarquesas, nas universidades europeias e
americanas). Os recursos naturais, ainda que extremamente importantes (fala-se
muito agora no nosso petróleo) não constituem de per si a prosperidade de um
país, há que considerar também os recursos humanos, que são a pedra de toque
para todo e qualquer processo de desenvolvimento. Eu podia estar aqui a
dissertar ou divagar sobre que caminhos para o desenvolvimento? Mas estes
diagnósticos estão feitos! Educar para DEMOCRACIA ! A educação
está na base de toda a criatividade de uma nação; é o que dá às pessoas os
elementos racionais com os quais podem formar a sua própria opinião sobre a
seriedade e a capacidade, bem como a proposta dos seus líderes. Somente desta
forma é que pode ser garantida uma democracia estável, na qual as pessoas possam
viver de acordo com as suas próprias acções e convicções e, resolver os seus
próprios problemas. Nenhum país se desenvolve sem a Educação! Hoje é sabido que
é impossível conceber um plano coerente de desenvolvimento e estabelecer sua
estratégia correspondente sem se dar prioridade à valorização dos recursos
humanos. PATATI , PATATA.....BLÁ, BLÁ, BLÁ etc., mas não é esse o meu
objectivo. O meu objectivo é certamente enviar esta mensagem de solidariedade ao
povo guineense em geral, aos jovens em particular, até um certo ponto
sensibilizá-los onde quer que se encontrem e, pela forma árdua como lutam pelo
seu dia - a - dia, pelo SABER e CONHECIMENTO para que não sejam
ludibriados e enganados. E esta solidariedade é também extensiva aos demais que
por razões óbvias não conseguem desempenhar cabalmente a missão que lhes cabe no
desenvolvimento da nossa terra, ora porque são discordantes e “chutados”
para o canto, ora porque não possuem qualquer filiação partidária ou cunha
política e, a todos aqueles que se perdem na delinquência, prostituição e demais
princípios pouco aceites pelos nossos padrões culturais. Este meu “estado de
alma” se assim se pode dizer, é também pôr toda a gente a questionar e a
pensar nas coisas e que se inspirem em textos como estes não tendenciosos, de
uma clarividência e sabedoria dignos de um professor, HOMI GARANDI. Tenho
consciência da pouca eficácia que este meio de comunicação possa provocar junto
das nossas populações dado a natureza do próprio mas a vós “Jovens Sortudos e
afortunados” passem palavra aos demais, nos vossos comícios, através da
rádio, pelo telefone, nos campos de futebol, nas festas, nos “djumbai” ...
permitindo o tal efeito multiplicador que de outra maneira seria impossível.
Se houver vontade podemos mudar o curso da nossa História. Viver é crer nalgumas
pessoas, sobretudo em alguém. Acreditemos! Há que sonhar de novo! As soluções
surgem pela capacidade em assumirmos compromissos. Se em política como aquela a
que estamos habituados, em que nada é dramático, os tempos mudam, as vontades
também. Como havia dito HOMI GARANDI, há candidatos a presidente mais
habilitados técnica e moralmente que até estão nesta corrida eleitoral.
Basta de terra de “BACA N´BUS”!
Um Bem haja!
Um Abraço Fraterno
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO