Sargento
Natche *
sargentonatche@hotmail.com
02.07.2009
O
mundo está sempre em mudança constante; o que é verdade hoje amanhã pode ser
mentira e vice-versa e a Guiné não foge à regra, no entanto, em vez de mudar
para melhor (Guiné ku bali) segue em sentido contrário.
Outrora era a sina dos cabo-verdianos
“burmedjos” vocabulário constante dos castrenses como forma de desabafo.
Quando algo lhes corre mal não
assumem as suas responsabilidades e vai de empurrá-las para os outros,
arranjando um álibi para os seus males “ i burmedjos que dana terra” estes são
sempre culpados.
Já é tempo
de nos unirmos para construir o país e não dar tanto relevo aos defeitos, mas às
qualidades.
Hoje em dia
os ilustres da nossa praça usam e abusam do dito tribalismo, mas não sei se é
por ignorância ou por desconhecimento absoluto do significado da palavra, aliás,
aproveitando isso para manipularem a seu belo prazer as pessoas que confiam
neles, fomentando contradições e intrigas no seio das populações. Algumas
pessoas não olham a meios para atingirem os fins, mesmo seguindo a via menos
aconselhável ou que não se justifica.
Assim,
todas as pessoas que ascendem ao poder fazem-no sempre acompanhadas de pessoas
de suas confianças.
Para os
mais esquecidos, na época do consulado do malogrado presidente Luís Cabral,
apesar de tudo, os cabo-verdianos (burmedjos) é que eram os “maus” da fita.
A época do
outro malogrado presidente Nino Vieira quem eram? (talvez um bom equilibrador da
balança), mas todos nós sabemos quem eram os governantes e de que bairros eram
oriundos, sem falar da etnia.
No caso de
17 de Outubro, quem foram os opressores dos prisioneiros? A que falange
pertencem? Quem foram os sofredores das sevícias?
Não se ouve
nenhuma alma viva a falar, pelo menos em público, do tribalismo e nem tão pouco,
ninguém se atrevia a dizer que os papeis é que tinham feito isto ou aquilo
contra os balantas, mesmo com desmando do senhor general, ninguém sussurrava, os
mais críticos limitavam-se a dizer que o “flanu” e tal é que era responsável por
isso ou aquilo, mas não se culpava uma etnia /tribo.
Porque é
que terminou esta teoria, de responsabilizar cada um pelo seu acto? Passaram a
pagar os justos pelos crimes dos outros; ou talvez estes pseudo-intelectuais
copiaram aquilo que acontece aqui, em alguns dos países europeus, em que quando
um negro (preto) pratica um acto que é punível ou contra a ética da sociedade
dizem que são os pretos sem distinção do prevaricador (o mal é sempre dos
imigrantes).
Caso Koumba
Ialá (Mohamed Ialá Embaló - KI/MIE conforme a conveniência... mas não me admiro
com isso, porque posso dar um exemplo do ilustre locutor, falecido senhor Aladje
Malam Indjai mais conhecido por Mandjai, o velho eterno comunicador da rádio, a
sua origem é de etnia balanta, tendo-se convertido posteriormente ao Islão).
Cada um é livre – liberdade e autodeterminação.
Qual é a
etnia da Guiné que não se misturou? De uma forma directa ou indirecta somos
consanguíneos, até com pessoas de outros países temos cruzamentos. À luz do
conhecimento actual a genética quebrou a barreira das diferenças (DNA).
Voltando ao
assunto, porque é que todos os desmandos ou asneiras deste senhor (KI/MIE) é
conotado ou atribuído aos balantas? Porque não chamar os boys pelos nomes (ele
mais o seu grupinho)?
Acho,
aliás, tenho certeza de que aqueles setenta e tal por cento de votos que obteve
aquando das presidenciais de 1999/2000, não foram só dos balantas, é impossível
(quando ganhou as eleições)!
E quero
afirmar categoricamente e sem margem de dúvida, que nem todos os balantas
concordam com a política do KI/MIE ou com a sua cúpula; nem todos comungam da
sua opinião, portanto basta de denegrir a imagem de uma etnia, chega de insultar
outras pessoas de uma forma gratuita, pessoas de bem e que têm como única
preocupação o melhor para a Guiné.
Se ele
colocou três primeiros-ministros da sua etnia / confiança, isso não reflecte o
universo de cem por cento daquela etnia; mas também podemos reportar isso ao
mandato do malogrado presidente Nino Vieira, em que há um primeiro-ministro que
é indispensável, uma pedra angular (sem menosprezar a pessoa e a sua
competência) que servia de bombeiro (no bom sentido do termo), que sempre que as
coisas corriam mal era ele o apagador de fogos. Assim também como os ministros
que giravam à volta dele, só a pasta é que mudava, do resto tudo é era igual ou
mantinha-se na mesma.
Soube pela
comunicação social que abstenção na região de Biombo é superior a sessenta por
cento para ser rigoroso, é muito acima da média nacional. O que justifica esta
situação? Perda da confiança nos políticos? Por ser época da chuva/trabalho na
lavoura? Ou será o descontentamento pelo assassinato do presidente Nino Vieira?
E outros? Será o tribalismo (arma de arremesso)? Ou será protesto sobre a
situação do país? E se fosse numa região ocupada maioritariamente pelos
balantas? Como seria? Quais seriam os comentários?
Pois então,
guineenses, unamo-nos em torno de um projecto de desenvolvimento do país, nada
de confusão, intrigas, dividir para reinar, não interessa preto, branco,
mulato/mestiço; fula, mancanha, djacancá, nalús, oíncas etc.
Somos todos
da mesma família guineense o nosso contributo é valido, deixemos com desprezo os
apologistas da divisão, eles vivem disso e se calhar não se sentem bem sem a
confusão.
Já agora,
abordando este assunto (tribalismo) em relação às Forças Armadas.
Toda a
análise que vou apresentar é numa perspectiva empírica, sem documentos
científicos para sustentar a tese, os historiadores saberão explicar isso melhor
do que eu (reconhecer as nossas limitações é uma virtude), não houve uma
pesquisa científica, é tudo baseado na explicação dos velhos.
Os anciões
de todas as tribos/etnias da nossa terra praticam as suas actividades de acordo
com a sua localização geográfica. Há zonas que produzem mais amendoim (mancara),
outras produzem milho, arroz, outras actividades relacionadas e por aí fora.
Posto isto,
Bissau era habitada outrora maioritariamente por papeis, que tinham ou têm como
actividade principal a pesca, transporte de pessoas através de pirogas de uma
margem para outra, mais conhecidos por “nhomincas”e sobretudo, os estivadores,
que trabalham nos portos nas descargas de barcos; não é de admirar que aquando
do massacre de 03/08/1959 tivessem morrido muitos papeis, quase que me atrevo a
dizer que todos aqueles mortos eram da etnia papel.
Manjacos
eram comerciantes, fulas pastores nómadas, balantas mais no interior, camponeses
(não quer dizer que uma etnia detinha exclusividade de uma actividade).
É por isso
que quando a luta de acção indirecta baseada na sabotagem na cidade e nos
centros urbanos e sobretudo em Bissau (maioria dos activistas são papeis), foi
transferida para interior (campo) sob acção directa da guerrilha ou seja luta
armada no sul do país, o suporte dos dirigentes do PAIGC naquela zona na sua
maioria eram balantas.
Naquela
zona o PAIGC tinha uma base de retaguarda no país vizinho (Guiné Conakry) e aí
se encontravam os altos dirigentes e o Bureau político, tendo-se estabelecido
laços de amizade e confiança, colocando-se algumas pessoas deste círculo nos
postos chaves, porque davam mais segurança.
Foi por
isso que aquando do 14/11/1980 o malogrado presidente Nino Vieira tinha como sua
escolta directa ou a sua segurança pessoal, militares na sua maioria de etnia
balanta que lhe inspiravam confiança, devido aos laços de amizade e lealdade que
vinham do tempo da luta, até ao conhecido e triste caso de 17 de Outubro.
Também foi
criado um mito de que os combatentes que lutaram na zona sul do país é que eram
os mais corajosos, “bravos” e valentes, tendo-lhes sido atribuídos lugares
chaves, devido à influência, à convivência e à confiança que os altos dirigentes
do Comité Central tinham em relação aos militares daquela zona. É por isso que
se vê nas chefias militares os balantas (sobretudo do sul e podia-se se dizer
que é regionalismo), não podemos confundir isso com tribalismo e nem tão pouco
com o regionalismo.
Reitero
mais uma vez um apelo ao bom senso, todas as pessoas que chegam ao poder
fazem-no sempre acompanhadas de pessoas de suas confianças e até, de suas
gerações, diz-se “amiguinhos”. Isto não é só na Guiné mas em toda a parte.
Apelo mais
uma vez que a verdade não seja distorcida, abandonando o conceito do tribalismo,
de raça, aliás este último em termos científicos, o conceito já caiu em
desuso, e agora já se usa o conceito de afinidade populacional.
Por mais
incrível que pareça, a Guiné é único país do mundo em que quando se insulta uma
pessoa dão-lhe uma categoria de respeito, o doutor (abô i dutur!), em vez de
ficar lisonjeado, fica furioso, um nivelamento por baixo, contrariamente, se o
chamar de “touro bravo” (este bravo não é no sentido da valentia, mas de
selvagem = rude), fica feliz.
Espero que
com a publicação dos resultados da eleição, os vencedores e vencidos, estejam
todos unidos em prol do bem-estar dos guineenses, em torno de um projecto para a
reconstrução nacional onde haja lugar para todos os guineenses,
independentemente da cor da pele, afinidade populacional ou não guineense, desde
que demonstrem interesse para ajudar na construção do país.
Vamos
pensar nisso!
*
Licenciado em Biotecnologia