SÓ SE ACEITAM IMIGRANTES COM “BAGAGEM”!
Por: Flaviano Mindela
26.11.2006
Que ninguém venha a estranhar, quando por hipótese, num futuro próximo, este título do meu artigo, passar a estar patente, ao longo das fronteiras de toda a Europa!
Como sabem, a imigração é nos anos que correm, um dos temas que os governantes europeus, apontam como uma questão que deveria ser motivo de acção conjugada, de forma mais profunda a nível da União Europeia.
Mais uma vez, estamos a assistir as cínicas manobras de uma Europa que, desde sempre, empenha-se seriamente na resolução estrita, dos seus problemas, e não dos problemas dos outros que, em certos momentos, até ajudaram a criar.
Quando muito, podem existir coincidências de interesses. Aí sim, entra a necessária, (antes cooperação, agora de maneira muito pomposa), parceria com os outros povos.
Mas pronto, obviamente que fazem o que lhes compete; resolvendo os seus problemas, dando exemplos aos outros povos, para que façam o mesmo.
Todos nós sabemos que, os europeus chegaram onde hoje estão, reivindicando sempre com muita determinação, os seus direitos junto das autoridades responsáveis no momento e, em últimas consequências, saem mesmo à rua, para gritarem: basta!
No dia 21 de Novembro de 2006, fazia eu parte da plateia duma conferência, intitulada: Fórum Gulbenkian Imigração.
Da comunicação de Franco Frattini, que é só, o Vice-Presidente da Comissão Europeia e Comissário da Justiça, Liberdade e Segurança, explicando como é que se pretende conjugar os dois elementos desta problemática; Imigração e Integração. Retirei as seguintes duas importantes ilações:
1 - A Europa prevê uma grave crise demográfica que importa antecipar.
2 - A Europa quer preencher o seu mosaico populacional, com pessoas capacitadas.
Se recuarmos na História, poderemos constatar que, no decorrer das duas grandes revoluções: Revolução do Neolítico e Revolução Industrial, os europeus foram buscar noutras paragens, o que lhes era mais imprescindível para o sucesso dessas mesmas revoluções, sem sequer pensarem nos sérios prejuízos que causariam aos nativos dessas paragens.
Durante o Neolítico, onde como sabemos, a força bruta era uma mais valia, através da escravatura, foram retirar das várias partes do continente africano, homens, mulheres e até crianças, fisicamente mais fortes. Primeiro, para que pudessem aguentar as duras viagens na travessia dos oceanos; segundo, para poderem executar melhor, as futuras tarefas nos extensos campos agrícolas.
Naturalmente que isso significou uma monumental falha, no que deveria ser uma evolução normal, das sociedades africanas, cujas consequências negativas, donde se destaca, claro: uma abrupta quebra das produções agrícolas, causando fome, facilitando a propagação de doenças, impossibilitando o desenvolvimento intelectual, etc.
Todos esses factores juntos, só podiam afectar profundamente o estádio seguinte, rumo a uma, porque não mesmo Revolução Industrial? E ainda hoje, continuam a reflectir nos nossos males.
Na era moderna, com toda a crueldade que o colonialismo espalhou, ainda tiveram um fácil acesso às matéria primas pertencentes aos outros povos, com nenhuma contrapartida para esses, conseguindo com isso sustentar o grande sucesso que foi a Revolução Industrial para eles.
Agora, com a cínica pretensão de apoiar na formação dos potenciais emigrantes, como uma das medidas para pôr em funcionamento a conjugação dos dois conceitos fundamentais dessa questão: Imigração e Integração, em parceria com os Estados de origem, por propor a esses, já na próxima Cimeira sobre Imigração, em Tripoli na Líbia, leva-me a desconfiar que é só mais uma manobra, para se apropriarem dos nossos mais capazes, encorajando-os a abandonarem os seus países, com isso, adiar uma vez mais, o merecido alto nível do desenvolvimento humano, que é efectivamente uma condição imprescindível, para podermos acertar os passos, no decorrer dessa terceira grande revolução. A do Conhecimento.
Mas o que mais motivou este meu artigo, por julgar isso de uma incoerência grave, tem a ver com a intervenção no período de debate nessa conferência, do nosso já conhecido compatriota Fernando Cá. Identificou-se como Presidente da Associação Guineense de Solidariedade e, teceu duras críticas ao que disse, tem sido uma má política de Imigração na Europa. Logo lembrei-me de o já ter ouvido num passado recente, em declarações na antena da RDP-África, em defesa do acto político do Presidente da República da Guiné-Bissau, quando esse resolveu demitir o então Governo.
Na terra dos outros, criticar um exercício político por nos negar alguns direitos, e na nossa própria terra, apoiar um exercício político que nos subtrai alguns direitos.
Isto só pode ser uma atitude, igual a pregar vinho, e beber água.
Embora só agora, acho que este assunto, pelo andamento da carruagem, vai merecendo algumas considerações.
É evidente que, na nossa Constituição Democrática, o Presidente da República, tem poderes para demitir o Governo. Mas entre ter o poder e exercer esse mesmo poder, existe um espaço que tem de estar muito bem preenchido e cuja massa de preenchimento, são os chamados: requisitos do acto. Isto tudo porque, um Governo, numa Democracia como é a nossa, resulta normalmente da expressão da vontade soberana dum Povo, tal como o Presidente da República. Precisamente, por esse importante facto, existem na Constituição, mecanismos legais para evitar excessos.
Na minha opinião, na altura não estava completamente preenchido o espaço referido.
Demitir um Governo, segundo as orientações fixadas na nossa Constituição Democrática, implica a verificação e preenchimento respectivo de todos os requisitos, o que significa, ter necessariamente em consideração, as consequências mediatas e imediatas de uma demissão.
Logo, acarreta uma obrigação de se fazer um árduo exercício de futurologia. Porque, para além do preenchimento de todos os requisitos, também tem que se olhar para as tais consequências mediatas e imediatas.
Portanto, somente deve estar consolidado o motivo para demitir um Governo, com os requisitos totalmente bem preenchidos e, a certeza de que as consequências sejam elas imediatas, como mediatas, serão benéficas para o futuro do país.
Se pelo contrário, ainda que estiverem os requisitos todos preenchidos, e saber-se claramente que, as consequências para o futuro do país, serão desastrosas, então o melhor é não demitir o Governo vigente.
Da mesma forma que, para mim, uma previsível má consequência mediata, ainda que seja futura, naturalmente, deve significar uma considerável falta de requisito, para demissão de qualquer Governo.
No caso da Guiné-Bissau na altura, a meu ver, não só não estavam todos os requisitos preenchidos, assim como, as consequências imediatas e mediatas se adivinhavam claramente, de gravíssimas repercussões.
Para justificar essa minha posição: como consequências imediatas, quero destacar a interrupção de um bom exercício governativo, unanimemente reconhecido ao então Governo e; um possível eclodir de um conflito político-militar, se pensarmos no ambiente em que tudo aconteceu.
Quanto às consequências mediatas, vou salientar o possível comprometimento duma Mesa Redonda que se avizinhava; e a quebra de um normal ciclo legislativo, de que tanto, a nossa já de si deficiente democracia, ambiciona.
Agora, analisando esse momento na sua vertente política.
Se ainda estavam no ar, os restos da poeira levantada pela grande contestação dos resultados eleitorais, que decidiram a ocupação da cadeira presidencial, ao avançar com o acto da demissão e consequente nomeação de um outro Governo, o Presidente da República cometeu um clamoroso erro político, acabando com isso por afectar de maneira muito negativa, a legitimidade democrática desse novo Governo, por via da dúvida que pairava, sobre a sua própria legitimidade democrática.
Portanto, a legitimidade carismática que este Governo não consegue conquistar, é uma das consequências disso mesmo, ao que vem juntar ainda, a fama de gestão corrupta e danosa da coisa pública, de alguns membros seu.
A salvação para este Governo, estava então na famigerada Mesa Redonda, que lhe permitiria a captação de uma importante soma, para financiamento duma parte muito significativa do seu programa, e assim poder eventualmente legitimar-se, através de um bom exercício governativo.
Tchásss!!!
Aterrou outra vez Koumba Yalá. Como um habilidoso necrófago político que é, sem perder mais tempo, começou logo a alimentar-se dos restos em muito avançado estado de putrefacção que, de um jeito matreiro e característico, ajudou a espalhar, neste deserto que já a algum tempo vamos atravessando, com alucinações, que de vez em quando, nos fazem vislumbrar pequenos oásis, e no momento de saciarmos a sede, evaporam-se.
E ainda muita gente finge não saber, o porquê do fracasso da Mesa Redonda.
Foi um tremendo muro no estômago da nação que estimamos pertencer e, muito bem dado.
O factor que fez aparecer e sustenta essa guerrilha comandada por Koumba Yalá, com os sucessos que esse tem alcançado ao longo dos poucos anos, mobilizando os apoios das populações por desespero, é exactamente um terreno bastante fertilizado, que um exército comandado por Nino Vieira, lhe proporciona, com os insucessos que esse tem espalhado ao longo dos muitos anos, desmobilizando os apoios das populações por desespero, factor que o fará decrescer e desaparecer.
De resto, tudo será simplesmente uma reprodução do chamado efeito dominó, para assistirmos na bancada, sem muito mais podermos fazer.
Apesar destas grandes adversidades, já se fazem sentir os ventos húmidos, vindos do horizonte. Sinal de que, aos poucos, e num futuro muito próximo, vamos atingir terras férteis. E, os verdadeiros culpados desta difícil e longa travessia, pela ordem natural das coisas, ficarão para trás, viverão e morrerão lentamente, nesse maldito deserto.
Enquanto isso não acontecer, muitos mais abandonarão a fileira da travessia, procurando outras paragens, como nós que já cá estamos, para com eles partilharmos os bocados que os europeus nos vão deixando debaixo das suas mesas. E juntos, limitarmos a tentar livrar os dedos das nossas mãos, dumas eventuais pisadelas que, por vezes, até são mesmo voluntárias.
Ser, Conhecer, Compreender e Partilhar.
VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!
Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO