A Transparência da Investigação
Recebi hoje de manhã uma notícia relativamente à Guiné-Bissau, anunciando uma investigação do uso da vacina contra a Pólio para prevenir o Coronavírus.
Dias atrás, revi um artigo em que o Dr. Robert Gallo debruçou sobre este assunto: vacina oral contra a Poliomielite (Oral Poliovirus Vaccine-OPV) ajudou a reduzir a mortalidade pela infecção gripal Influenza e outras infecçōes virais: “porque não experimentar esta vacina no Coronavirus”?
Embora a teoria suportando esta investigação seja plausível, muitas questōes merecem respostas.
1 – Porquê a Guiné-Bissau?
País com escassos recursos hospitalares, falta de oxigénio, carência de cuidados intensivos: se um dos investigados apanha uma reação adversa, vai ser transportado para a Dinamarca ou deixado morrer em casa?….
Por mais inócua que seja a vacina, o efeito desejado (objectivo da investigação) é aumentar a imunidade do sujeito investigado; O corpo humano reage diferentemente de pessoa para pessoa (em vez do esperado nível de imunidade, o que pode acontecer se o indivíduo desenvolve um excesso de imunidade, causando doenças como a hypersensitivity pneumonitis?
Temos capacidade para tratar estas consequências?
Investigaçōes deste tipo devem ser começadas (se não completamente conduzidas) em países com condiçōes para lidar com emergências ligadas aos produtos investigados.
A minha modesta opinião: comecem a investigação na Dinamarca (parece-me que os Lead investigadores são dinamarqueses) e depois de dados iniciais positivos, então podem “ajudar” o povo irmão da Guiné-Bissau!
2 – Atempadamente, ou seja, antes de iniciar esta investigação, houve anúncios nas rádios, nos jornais, na TV e outros canais de comunicação social, a informar o público sobre esta investigação?
3 – Sendo um estudo experimental, aos sujeitos do estudo foram fornecidos um formulário para consentir voluntariamente a investigação?
4 – Quando é que os líderes da investigação submeteram a proposta de estudo, e depois de aprovado, será que partilharam o resumo do estudo planeado com os potenciais sujeitos da investigação?
Em 1993 quando fui à Guiné para o funeral do meu pai, troquei impressões com alguns cientistas e estudantes dinamarqueses em Bissau, respeito muito a vontade de ajudar; o espírito de altruísmo que mostraram em relação ao povo guineense, mas estou muito preocupado com esta investigação: não com o objectivo da investigação em si, mas com o lugar da investigação, e se os sujeitos a ser investigados estarão devidamente informados antes de assinar o contrato.
É importante nunca esquecer o Código de Nuremberga:
1 – Consentimento Voluntário é essencial.
2 – Os resultados da investigação devem ser para o BEM da Sociedade.
3 – A Investigação em Humanos deve ser baseada em resultados de investigaçōes prévias em animais.
4 – As Investigaçōes devem ser conduzidas evitando sofrimento/lesão Física e Mental.
5 – Nenhuma Investigação deve ser conduzida se pensamos que pode causar morte/invalidez.
6 – Os riscos não podem exceder os benefícios.
7 – Facilidades adequadas (ex: Hospitais) devem ser usadas para proteger os sujeitos da investigação.
8 – As Investigaçōes devem ser conduzidas somente por cientistas qualificados.
9 – Os sujeitos da investigação podem optar por sair da investigação a qualquer momento.
10 – O Líder da Investigação deve estar preparado para terminar a investigação quando acontece uma lesão, Invalidez, ou morte do sujeito investigado.
Numa nota sobre o coronavirus, um trabalho de investigação foi divulgado nas últimas 24 horas (“oriundo da Inglaterra e feito em residentes na Inglaterra!!!): a dexametasona (um esteroide que andamos a usar por mais de 20 anos nos cuidados intensivos) na dose de 6mg/dia, pode reduzir a mortalidade nos doentes intubados (de 40% para 20%), ou doentes que necessitam de muito oxigénio (reduzindo o risco de morte de 25% para 20% – não tão impressivo neste caso).
Joaquim Tavares (Djoca)
16.06.2020
EUROPEAN DIPLOMATE IN INTENSIVE CARE