POLÍTICA EXTERNA DO GRANDE BRASIL DE PEQUENAS RELAÇÕES COM OS PALOP: uma resenha crítica da tese  

POLÍTICA EXTERNA DO GRANDE BRASIL DE PEQUENAS RELAÇÕES COM OS PALOP: uma resenha crítica da tese  

RIZZI, Kamilla Raquel. O grande Brasil e os pequenos Palop: política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe (1974-2010). Tese de Doutorado em Ciência Política, UFRGS, Brasil, Porta Alegre: 2012, pág. 301.

Ricardino Jacinto Dumas Teixeira

Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira

Avenida da Abolição, CE 62790-000, Brasil

ricardino@unilab.edu.br

Introdução

Esta resenha buscou dialogar com a tese “o grande Brasil e os pequenos PALOP: a política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe”, apresentada pela pesquisadora brasileira Kamilla Raquel Rizzi ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no Brasil.

A análise foi estruturada em três momentos: (I) o contexto da pesquisa e o caminho metodológico seguido para a construção do corpus; (II) a análise da política externa do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe e (III) as considerações finais sobre questões analisados, a fim de proporcionar um espaço para o estreitamento de diálogo entre os pesquisadores e tornar a tese acessível ao público leitor.

Contexto e o caminho metodológico

Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tome e Príncipe são países ex-colônias de Portugal em África, recentemente independentes (anos de 1970), com uma longa história de relacionamento comum com o Brasil, marcado, particularmente, pela presença portuguesa. No contexto apresentado pela autora, o Brasil emerge como estado central na tese, enquanto Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, em conjunto, foram considerados “pequenos Palop” ou Estados periféricos na dinâmica da política externa.

Conceitualmente, a política externa foi assumida como resultado de uma combinação das necessidades internas com os interesses externos que definem uma configuração particular, onde os Estados promovem suas alianças e influem, de modo distinto, no sentido de preservar ou equilibrar seu status quo na arena internacional (pág. 15). Aqui, a unidade de análise foi a geopolítica do sistema-mundo, de acordo com a configuração das necessidades do sistema capitalista vivenciado pelos Estados em suas políticas externas. Foram configuradas três formas de uma política externa: a) a primeira forma é a cooperação; b) a segunda é a coerção; e a c) terceira é a integração ou intercâmbio entre Estados, com os quais um Estado central estabelece com outro Estado periférico.

A tese seguiu uma linha cronológica: anos de 1974 a 1990, marcado pela bipolaridade; anos 1990 a 2002, caracterizado por mudanças na conjuntura global e anos de 2003 a 2010, marcados por multilateralismo, reforçado no âmbito das relações do Sul.

Para coletado de dados, foram consultados o Arquivo Histórico do Centro de Documentação oficial do Itamaraty e da Embaixada de Cabo Verde, ambos em Brasília, no Brasil. Levou-se em consideração a identificação de discursos, acordos, tratados e visitas relacionados à rotina burocrática do serviço diplomático. Os dados foram ampliados com entrevistas ao representante brasileiro, em Praia, embaixador Vitor Candido Pain Gobato, e ao representante cabo-verdiano, em Brasília, embaixador Daniel Pereira e através de contatos por e-mail com os encarregados de negócios. Os quais, suponho, sejam os de Guiné-Bissau e de São Tomé e Príncipe que, por alguma razão, seus depoimentos não apareceram na tese.

Da bibliografia utilizada, periódicos, documentos oficiosos, acordos, tratados, discursos, visitas, comunicados, telegramas e entrevistas, resultou no corpus da tese, que serviu se de base para a análise a partir da identificação de pautas diplomáticas, demandas, exportações e importações que pareceram na análise da política externa entre esses países.

Análise da política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe

A análise de dados se iniciou no contexto do chamado “mundo lusófono”, cujo eixo articulador foi o comércio, aliado à escravização, à evangelização e à colonização,

no contexto do tráfico transatlântico de pessoas e migração forçada de africanos, tendo o Brasil como seu principal destino.

Cabo Verde e São Tomé e Príncipe emergiram como Estados a partir de um projeto colonial, baseado no discurso da mestiçagem e da criolização, com forte tendência cristã. Em Cabo Verde, à época, os principais produtos de exportação foram urzela, coros, algodão, aguardente, sebo e açúcar, sustentados por uma economia de exportação controlada por proprietários de terra, geralmente, portugueses e seus descendentes.

Em São Tomé e Príncipe se predominou a produção de cana-de-açúcar e cacau, introduzidos no país pelos portugueses. Já em Guiné-Bissau distinguiram-se os lançados e grumetes, grupos envolvidos no comércio e nos movimentos cívicos, além de grupos étnicos, cuja mão-de-obra foi introduzida no trabalho forçado e na produção do amendoim, arroz, algodão e a entrega coercitiva das colheitas e melhores terras ao Estado colonial.

A busca pelo “desenvolvimento” foi a base sobre a qual se assentou a política externa do Brasil para África. Em Cabo Verde (anos de 1974 a 1990) as relações com o Brasil acentuaram-se na formação de quadros da Administração Pública, cuja “falta de quadros qualificados nas instituições públicas eram um dos principais empecilhos para o fortalecimento de Cabo Verde” (pág. 181).

Outro setor priorizado foi o de transporte aéreo, tendo em conta as condições geográficas do país, constituído por dez ilhas. “Cabo Verde chegou a oferecer ao Brasil um entreposto no Aeroporto Internacional de Sal para a Embraer” (um conglomerado transnacional brasileiro), para a criação de uma linha área regular que recolhesse cargas no Brasil para vários destinos, incluindo destinos africanos, passando por Cabo Verde.

No campo do comércio exterior, nas relações entre o Brasil e Cabo Verde, destacou-se o refino de petróleo de Angola, por parte da empresa brasileira de combustíveis (Petrobras). Com a democratização (anos de 1990), a pauta de demanda se intensificou, na qual “a eficácia da gestão da ajuda pública e privada para o desenvolvimento permitiu que Cabo Verde figurasse entre os países que receberam mais ajuda per capita (pág. 159), reforçando, assim, sua inserção no mercado. “A valorização do mercado, presente no III Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), de Cabo Verde, foi o instrumento dessa dinamização de gestão de recursos para seu desenvolvimento”. Da parte brasileira, a pauta do Atlântico Sul sempre foi um ativo da política externa do Brasil para Cabo Verde. Houve que considerar a localização estratégica de Cabo Verde, como ponto nodal no comércio transatlântico.

Distintamente de Cabo Verde, a política externa do Brasil para Guiné-Bissau esteve diretamente vinculada à instabilidade política, em decorrência de sucessivos golpes de Estado. Enquanto Cabo Verde priorizou a formação dos seus funcionários da administração pública e investimento em transporte de navegação aérea, Guiné-Bissau, sob o risco de perpetuar a política de golpe de Estado, privilegiou, nas relações com o Brasil, a formação militar no âmbito das reformas das Forças Armadas e das Forças Polícias.

No campo de ensino superior, Guiné-Bissau compartilhou com Cabo Verde algumas similitudes. Suas demandas pelo Programa de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G) e Pós-Graduação (PEC-PG) nas relações de cooperação com o Brasil. Outro ponto comum entre Cabo Verde e Guiné-Bissau foram as linhas de créditos liberados por instituições financeiras brasileiras (a exemplo do Banco do Brasil), por intermédio da Agência Brasileira de Cooperação. Contudo, a política de cooperação externa com Brasil revelou problemas estruturais de dependência externa. Isso porque a política de linha de crédito beneficiava literalmente o Brasil, enquanto país central, reproduzindo, em outras formas, a cooperação tradicional.

Por exemplo, a empresa brasileira Yamaha se beneficiou do crédito para exportar quatrocentos motos RX-80 para a Guiné-Bissau”. No que se refere às relações comerciais guineenses, apenas nos anos de 1990, houve as primeiras importações por parte do Brasil, num “valor muito simbólico”. Contudo, anos 1990, ainda que residual, o comércio exterior da Guiné-Bissau para o Brasil era muito significativo, em comparação com o período atual. Os principais produtos importados de Guiné-Bissau pelo Brasil foram cerâmicos e derivados de alumínios, caldeiras e reatores para uso industrial, plásticos e, em menor grau, importação de produtos básicos, bem alimentícios, como açúcar, arroz, café e carnes (pág. 164).

Bastante semelhante foi a média de exportações do Brasil para África, também considerado residual do ponto de vista comercial: oscilou se de 4,9% (anos 1974 a 1979) para 6,7% (anos 1979 a 1985). Desse porcentual, depreendeu-se duas consequências da política externa brasileira: sua natureza precária, dada pela incipiente presença nas relações com África; e sua natureza contraditória, na medida em que, discursivamente, a política externa brasileira fundamentou-se, ao longo dos anos, nos pressupostos da cooperação do Sul, mas com pouco resultado em suas relações externas de cooperação.

Em Cabo Verde, a presença de Portugal foi mais significativa. Isso se deveu a experiência colonial no arquipélago e, mais recentemente, da diáspora cabo-verdiana em Portugal que fez com que o governo português usasse dessa presença como um instrumento de pressão política nas negociações com Cabo Verde, com mais de trinta mil cabo-verdianos em território português, cujas remessas financeiras contribuíram para o sustento de quase cem mil famílias cabo-verdianas que vivem nas diversas ilhas.

Em São Tomé e Príncipe (de 1975 a 1990) se privilegiou as relações com Brasil no setor da agricultura e pecuária, em especial na produção de cacau, centrada até então na monocultura de uma economia de plantation, em que o Estado se assumiu como empresário. A questão militar aproximaria São Tomé e Príncipe de Guiné-Bissau, mais acentuada no caso guineense, marcado por sucessivos golpes de Estado. Outra característica foi a centralização do poder na figura do presidente Manuel Pinto da Costa e tentativas de golpes de estado na construção de sua nacionalidade e no processo de transição política para a democracia, em que a África reassumiu a importância para a defesa e segurança do Atlântico Sul.

Também foi um período no qual se verificou uma forte retração econômica, na América Latina, no governo Sarney e Collor (no Brasil), anos de 1980. Com a crise dos anos de 1980, na América Latina, com implicações em África, o Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP, hoje partido) reorientou, gradualmente, sua política externa, deslocando-a do antigo bloco soviético para Ocidente (p.195). Isso resultou “em empréstimos com o Banco Mundial (BM) e com o Fundo Monetário Internacional (FMI), principalmente para reabilitação das plantações de cacau santomense, através de gestão estrangeira por créditos multilaterais de financiamento”.

O Estado brasileiro, em função da crise, foi obrigado a redirecionar a base de sua política externa para o setor de educação para África, por meio de concessão de vagas e bolsas de estudos de ensino superior para formação de uma elite nativa africana que pudesse ser favorável às relações com o Brasil.

A análise que se possa fazer dessa política externa brasileira teve duas implicações substantivas. Em primeiro lugar, foi com base na política educacional de ensino superior que o Brasil encontrou justificativas para reforçar sua influência político, através de discurso do “destino comum” e “fundamentos históricos”, em detrimento de relações comerciais e políticas efetivas.  Em segundo lugar, foi através da política de cooperação de ensino superior que o Brasil encontrou os “fundamentos ideológicos” de sua política externa na arena internacional e no âmbito da cooperação do Sul, em que o discurso de “solidariedade” e da “horizontalidade com a África ganhou centralidade nesse período.

Houve um elemento contraditório introduzido nessa política externa, que tem a ver com o descompasso entre o discurso de “horizontalidade” e de “responsabilidade” pelos fracassos de acordos de cooperação. Isso porque na documentação diplomática da representação brasileira, em São Tomé e Príncipe, aliada aos fracassos, foram frequentes expressões como “desorganização do governo santomense” e “inexistência de profissionais aptos para finalizar os projetos”, que nunca saíram do papel. Entendeu-se, então, que a responsabilidade pelo fracasso da política externa brasileira foi estritamente do governo santomense, pela ausência de condições técnicas, não do governo brasileiro.

Essa responsabilização, unilateral, tem algumas consequências: a primeira se houvesse sucesso da cooperação seria atribuído a liderança brasileira no âmbito da cooperação do Sul, mas, como houve fracasso, a responsabilização pendeu-se sobre os ombros de “um estado disfuncional santomense”; já a segunda implicação é o fato de que o discurso da desresponsabilização tentou negar o próprio fundamento da “cooperação solidária” a partir da qual o Brasil baseou discursivamente sua política externa para África em geral e São Tomé e Príncipe, em particular. Observou-se, aqui, uma outra contradição: a “horizontalidade” foi utilizada para depois negá-la, sobretudo, em casos em que ações externas da cooperação brasileira se fracassaram.

Nesta ótica, o discurso de uma comunidade de sangue, da cultura e da história, supostamente compartilhada pela presença portuguesa, passou a ser um significante vazio, sem correspondência em ações concretas no encaminhamento de soluções adequadas, efetivas e urgentes nas relações entre o Brasil e a África para resolução de problemas. Caberia perguntar até que ponto a fraca presença brasileira em ações substantivas de sua política externa nos “pequenos Palop” dificultou sua inserção na arena internacional. Isto porque a redução de cooperação Sul-Sul com os países africanos acabou por reforçar a dependência do Brasil da cooperação Norte-Sul.

Entendo que a justificativa que o Brasil pode ter encontrado para se afastar da África e aprofundar relações Norte-Sul se justificaria por razões políticas e econômicas, nesse período. No primeiro caso – razões políticas – tem a ver com a visão hegemônica que se tinha/tem da África no Brasil, marcado pela lógica escravista, ditada por um contexto de marginalização. No segundo caso – razões econômicas – a crise de 1980 na América-latina, com repercussões mundiais, resultou na diminuição de exportações e importações do Brasil com países objetos de analise nessa tese. A saída encontrada pelo Estado brasileiro foi a de reforçar a política de solidariedade com África e de cooperação com os países de Norte para tentar superar a crise.

No caso da política externa de São Tomé e Príncipe para o Brasil, houve que realçar o centralismo em que o poder político e administrativo foi aglutinado na figura do ex-presidente santomense Manuel Pinto da Costa, que liderou seu país de 1975 até 1991 e de 2011 até 2016. Embora São Tomé e Príncipe tenha sido o primeiro país ex-colônia de Portugal em África a iniciar o processo de transição política para a democracia, com a realização de suas primeiras eleições multipartidárias em 1991, o processo de democratização ficou solapado pela ingerência militar na política doméstica, através de sucessivos tentativas de golpes de Estado registrados no país: as de 1995, 1998, 2003 e 2009, o que distanciaria São Tomé Príncipe de Cabo Verde, sem experiência de intervenção militar no seu processo de transição política.

Uma análise da postura centralizadora adotada pelo então presidente santomense Manuel Pinto da Costa aproximaria da postura assumida pelo então presidente guineense, João Bernaldo Vieira, tanto no regime de partido único oficioso, quanto no processo de transição política para a democracia.

Também o Estado de Cabo Verde procurou redimensionar sua política externa de cooperação internacional para dar respostas imediatas a crise financeira, através de promoção de investimento da China na construção de infraestruturas: construção da Assembleia Nacional Popular, barragens, pontes, estradas, promoção de turismo e desenvolvimento marítimo e, recentemente, construção da Universidade Pública de Cabo Verde. A Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, um importante entreposto comercial chinês, tem servido de ponto nodal da presença chinesa em África, cujos países contaram, há décadas, com o apoio da China para suas independências. Relações com a China não foram objeto da tese, mas me pareceu oportuno aponta-las, para se demarcar da presença brasileira.

A recuperação econômica, nos anos 1990, tanto no Brasil, quanto nos países africanos, beneficiou uma retomada gradativa nas relações entre o Brasil e a África, também no que se refere a política externa, em que o Brasil procurou se adaptar à nova geopolítica internacional, em nome daquilo que se convencionou chamar de “multilateralismo” da política externa brasileira.

Anos de 2003 a 2010 ficaram marcadas por uma nova guinada na política externa do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, em um contexto internacional de democratização dos Estados nacionais, altamente competitivo do ponto de vista político e econômico. Outro dado ausente na tese, no caso africano, entre 2000 e 2016, houve forte crescimento econômico no Continente, em média 4,6% ao ano, superior à América Latina e Caraíbas, em média 2,9% (base de dados de UNDESA, 2017). Isto possibilitou novas reconfigurações da política externa brasileira, pois, foi à luz desse crescimento da África, que o Brasil renegociou sua posição e discurso com o Continente.

O governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva (de 2003 até 2010), em seus dois mandatos, imprimiu, sem dúvida, um novo conteúdo à política externa do Brasil, diferentemente dos governos antecedentes e precedentes. Considerado pragmático, carismático e nacionalista (pág. 260), suas ações basearam-se no entendimento de uma ordem mundial multipolar, fazendo alianças no nível dos países do Sul e contestando a hegemonia dos países centrais desenvolvidos. Segundo Kamilla Raquel Rizzi (pág. 209), em política externa, Lula reintroduziu o Estado como negociador, incorporando, deste modo, alguns instrumentos introduzidos em segundo plano durante os dois mandatos do governo de Fenando Henrique Cardoso, tanto do ponto de vista econômico quanto político. Aqui, haveria uma aproximação com São Tomé e Príncipe, quando o Estado assumiu o papel de empresário, centrada na figura do presidente Manuel Pinto da Costa.

No campo econômico, houve um crescimento exponencial: um crescimento médio de 325% entre o início e o final dos dois mandatos do presidente Lula. A nível mundial, com 0,99% das exportações, em 2003, esse percentual aumentou para 1,35%, em 2010 (pág. 214). Um elemento importante aqui foi uma tentativa de diminuir a dependência externa do Brasil da cooperação Norte-Sul.

No campo da cooperação técnica, base da política brasileira para os países africanos, houve um visível crescimento em todas as áreas, com uma atuação mais concreta da agência Brasileira de Cooperação (ABC), coadjuvado pelo Ministério das Relações Exteriores. As principais áreas de cooperação com o Brasil foram educação, cultura, comércio exterior, agricultura, pecuária, ciência e tecnologia. A capacidade de Lula da Silva representar as diretrizes da política externa fez com que ele conseguisse transitar livremente em vários países africanos. Como destacou Kamilla Raquel Rizzi (215) “nenhum governo na história do Brasil tenha empreendido qualitativamente e quantitativamente sua ação externa dessa maneira para África, como ocorreu no governo do ex-presidente Lula, em questões multilaterais”.

No setor da educação de ensino superior, por exemplo, no final do ano de 2010, havia aproximadamente cinco mil alunos estrangeiros em instituições brasileiras, incluindo, principalmente, os estudantes da África e da América-Latina. No caso especifico dos países africanos, especialmente Palop, houve ampliação de formação de quadros nacionais, forjados no campo ideológico brasileiro. Um dos instrumentos dessa ampliação foi a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). “A Unilab caracterizou sua atuação na cooperação internacional e intercâmbio acadêmico e solidário com os Estados membros da Comunidade dos Países da Língua Oficial Portuguesa (pág. 209). Com a finalidade de realça-lo, aprofundou-se o discurso de “solidariedade”, um conceito de valor político que reforçou a inserção de Lula em África e no cenário internacional.

Embora possuísse presença em África em diversas esferas de sua política externa, o governo Lula manteve relações estreitas de cooperação com países centrais, como Estados Unidos, Europa e antiga metrópole, como foi indicado na tese.

Na atualidade, a posição brasileira no cenário internacional, no sentido de garantir sua autonomia, ficou comprometida com as mudanças de governo assumidas por Jair Bolsonaro, eleito presidente do Brasil em outubro de 2018. A marginalização do Brasil no exterior, a exemplo de sua política externa para África, recuou em todos os aspectos.

Embora, teoricamente, se tratasse de uma política externa de Estado, o distanciamento do Brasil nas relações diplomáticas com os países africanos foi condicionado pela dinâmica governamental e partidária, com implicações substantivas na mudança de governo. Houve, assim, condicionamentos políticos com implicações econômicas do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, vice-versa, que vão para além de questões meramente técnicas da cooperação internacional no âmbito da política externa do grande Brasil, mas de pequenas relações com os Palop.

A minha singela homenagem ao Professor Doutor Leopoldo Amado

Foi na madrugada do passado dia 25 de Janeiro que recebi a triste notícia do falecimento em Dacar-Senegal, do Ilustre Filho da Guiné-Bissau, nosso Brilhante Académico, Historiador; um dos melhores investigadores que a Guiné-Bissau gerou e que nos deixa um legado científico vasto e por explorar, não só na sua área de formação, mas numa diversidade complementar de tantas áreas Académicas das Ciências Sociais, sobretudo.

Do Brilhantismo de um Intelectual como tu, recordo-me das nossas divergências, em momentos distintos de conjunturas políticas na nossa Guiné-Bissau; as tais divergências que ajudam a amadurecer pessoas de mente aberta, e a elucidar consciências.

Sim, estivemos de costas voltadas várias vezes, porque cada um de nós fez sempre questão de sustentar, com teimosia, seus pontos de vista, entre evidências e, ou a falta delas, face à situação política da nossa Guiné-Bissau. Não importa, agora, de que lado estava a razão, face às disputas que tivemos, mas sim, reconhecer que as nossas confrontações intelectuais ajudaram-nos a conhecer melhor a realidade histórica, política, social e cultural da nossa Guiné-Bissau, capacitando-nos para melhores contributos ao nosso País.

Porém, foram mais e de maior registo, os momentos bons da nossa convivência patriótica, fraterna e de amizade!

Do que guardarei de ti, sempre, é a certeza de que foste, até ao teu falecimento, o único Académico Guineense a reconhecer, promover, e a valorizar todos os teus compatriotas, motivando-os a fazerem mais e melhor pela nossa Guiné-Bissau!

Onde quer que estejas, sei que me autorizas a partilhar uma das nossas mensagens, para sustentar o reconhecimento, a admiração e a estima que sempre tive por ti.

de: Leopoldo Amado leopoldo.amado@gmail.com
para: Fernando Casimiro <didinhocasimiro@gmail.com>
data: 15/12/2016, 23:16

Caro Casimiro

Li com bastante atenção e deleite o admirável texto de apresentação do teu/nosso livro. Não podias ter melhor apresentação que, alias, remete-nos, a um tempo, para a literariedade subjacente e o realismo envolventes da obra. Que admirável assertividade! Para mais, o texto vem escrito numa linguagem simples, mas carregada de imagens, de afectos e de advertências, estas ultimas, curiosamente, bem calibradas. Bom, mais não digo sobre este quase divino texto, algo arrancado, esteticamente falando, das profundezas do nosso sentir patriótico (algo profundo, simultaneamente ontológico e complexo, ainda por se estudar), mas também das labirínticas circunvoluções mentais que a mítica e mística África (Guiné-Bissau, incluido) suscita no imaginário colectivo dos não-africanos. No caso em apreço, esta “approch”, quiçá involuntária, galgou os limites do belo da natureza e da magnificência do nosso profundo sentir. Dir-se-ia mesmo que este texto, simplório ate demais, mas profundo ate dizer chega (!), marcara de forma indelével o porvir de uma nova forma de literariedade política, de resto, muito em gestação galopante entre os guineenses, sobretudo da diáspora.
Tudo isso para te dizer, caro Didinho e primo (que o somos!, depois explico-te como, se bem que para o caso isso pouco importa) que esta obra, de três volumes,  interessa-me sobremaneira, pelo seu putativo potencial contributivo e, igualmente, pela substancia que encerra, independentemente dos juízos de valor do autor que aqui e acolá comporta,  e com o qual podemos ou não concordar (isso são outros quinhentos!).
Assim, convido-te a poderares comigo a possibilidade de o lançarmos a tua obra no INEP, na tua terra (Nha Tchon), com distinta e elevada solenidade, porque mereces, bastando para tal a evocação da tua entrega total à sua laboração, aliás, também confirmada pela autora de serviço do belíssimo texto de apresentação da mesma.
Parabéns Casimiro, bem-haja Didinho.
Melhores saudações.
Leopoldo Amado, Ph.D

Director-Geral do INEP –  Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
Tel. +245 95968410 ou +245966601731
e-mail: leopoldo.amado@gmail.com
Nome Skype: leopoldo.amado45
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Mesmo com tanto para fazer, lias tudo, de todos, ignorando que o dia tem 24 horas e que entre o dormir e o acordar, também precisavas de te dedicar a ti e à tua família.

A Academia preencheu a tua vida, enriquecendo-te com conhecimentos, que se transformaram igualmente em sabedorias, de uma vida vivida com encanto e sem arrependimentos, certamente, digo eu…

Pena que tenhas partido tão cedo, quando tinhas muito para dar à tua família, à nossa Guiné-Bissau, à nossa África, e ao nosso Mundo…

Parafraseando  Fréderic François,

“Il faut dire je t’aime
À tous ceux qu’on aime
Tant qu’ils sont vivants, vivants
Il faut dire je t’aime
À tous ceux qu’on aime
Tant qu’il en est temps, encore temps”

Professor Doutor Leopoldo Amado “Poio”, meu estimado primo e amigo, descansa em Paz!

Didinho 14.02.2021


UM TRABALHO DE EXCELÊNCIA – ENTREVISTA DO JORNAL O DEMOCRATA AO PROFESSOR DOUTOR LEOPOLDO AMADO

DA EMBRIOLOGIA NACIONALISTA À GUERRA DE LIBERTAÇÃO NA GUINÉ-BISSAU

Simbólica de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau

Elegia ao Professor Pinto Bull

OS G’s que decidiram o final do Império colonial

A HISTÓRIA DA VACINA DA POLIOMIELITE

A HISTÓRIA DA VACINA DA POLIOMIELITE

Com todo o interesse na discussão da investigação da vacina oral da pólio para prevenir a Covid 19, pensei que valia a pena fazer um resumo da história por detrás desta vacina que salvou milhões de vidas.

O vírus da poliomielite é um enterovírus da família do picornavírus, responsável pela lesão do neurónio motor inferior que, por seu turno, causa paralisia flácida assimétrica.

                 Dr. Jonas Salk

A primeira vacina da pólio – IPV (vacina inactivada da pólio), injectada via intramuscular, foi produzida pelo Dr. Jonas Salk, usando o vírus que cultivou nas células renais de chimpanzés e que inativou com formalina.

Em 1954 esta vacina foi testada simultaneamente no Canadá, Estados Unidos e Finlândia em 1.6 milhões de crianças e foi aprovada para uso nos Estados Unidos em Abril de 1955.

As estirpes do vírus usadas para a vacina foram: Mahoney (tipo 1), MEF-I (tipo 2), e Saukett (tipo 3).

                        Dr. Albert Sabin

Em 1960 o Dr. Albert Sabin descreveu no JAMA (revista da associação médica americana), os resultados de um estudo de investigação feito em 26,033 crianças numa cidade da América do Sul, usando uma vacina oral contra a pólio.

Esta vacina, contrariamente à vacina do Dr. Salk, é uma vacina que utiliza um vírus vivo, mas atenuado.

As estirpes usadas nesta vacina oral: P1, P2, P3.

A vacina oral foi usada em Cuba em 1962.

Como a vacina inativada do Dr. Salk já estava a ser usada, de início houve muita relutância em usar uma vacina oral com vírus vivo atenuado nos Estados Unidos.

O Dr. Sabin deu as amostras a um casal da então União Soviética (Dr. Mikhail Chumakov e Dra. Voroshilova) que administraram a vacina oral primeiro neles próprios, depois nos filhos e, depois, convenceram as autoridades soviéticas a usá-la em milhões de crianças na Estónia e na Lituânia.

Depois destas experiências, a vacina oral (viva, atenuada) da Pólio foi aprovada nos Estados Unidos e usada até 1979; agora, somente a vacina inativada é usada.

Devido ao custo e eficácia, a vacina viva atenuada oral (OPV) ainda é usada nos países em vias de desenvolvimento.

Entre 1968 e 1975 a Dra. Voroshilova, numa investigação envolvendo 320 pessoas observou que havia menos mortalidade resultante da Influenza em pessoas imunizadas com outras vacinas, incluindo a OPV.

Embora a OPV seja muito eficaz e quase sem efeitos nocivos, há 3 síndromas que podem resultar da sua aplicação:

1VAPP (poliomielite paralítica associada com a vacina) – somente 1 em 2.7 milhões de indivíduos. Acontece mais com a primeira dose.

2VDPV (vírus da poliomielite resultante da vacina oral).
Este vírus é uma  mutação da estirpe do vírus atenuado da OPV e pode causar paralisia em seres humanos.

3cVDPV (vírus da poliomielite resultante da vacina oral e que circula no ambiente).

Nos últimos 10 anos, 24 surtos de cVDPV ocorreram em 21 países, resultando em 750 casos de paralisia.

É deste pano de fundo que chegamos ao momento atual: USO DA VACINA ORAL DA PÓLIO (OPV) para prevenir ou reduzir o risco de mortalidade pelo coronavírus:

Por um lado, cientistas eminentes como o Dr. Robert Gallo (co-descobridor, juntamente com o Dr. Luc Montagnier – France – do vírus da SIDA), e o Dr. Peter Chumakov (sim, o filho do cientista russo que juntamente com a esposa fez a investigação da OPV na União Soviética) estão a puxar para a investigação da OPV contra o coronavírus, teorizando que redirecionar vacinas é o tópico mais quente no mundo da imunologia e mesmo que a OPV confira imunidade contra a Covid 19 por somente um mês, podia salvar muitas vidas.

Por outro lado, a maioria dos cientistas está muito relutante em começar esta investigação, por motivos que enumeramos em artigos anteriores e acima neste artigo.

No presente, o ponto da situação é este:

A Rússia (620,794 casos de coronavírus e 8,781 mortos), aprovou o estudo.

O Irão (217,724 casos e 10,239 mortos), e a Guiné-Bissau (1,556 casos e 19 mortos), planeiam, ou estão em vias de começar o estudo.

Como podem ver, a polémica, por motivos que podem elicitar neste e noutros textos anteriores, é válida e justificável.

A nossa apreciação por uma das investigadoras (Amabélia Rodrigues – desculpa por não pôr nenhum título associado ao nome, mas não o puseram no artigo que li – DW), por ouvir as nossas preocupações e prometer ir com a vontade da população…

Todos nós, guineenses por nacionalidade, ou guineenses por naturalidade, queremos o bem-estar da população guineense, e é muito bom ter esta plataforma para opinar e discutir assuntos importantes como este.

Agora, cabe às populações e ao governo, depois de se digerir todas as opiniões e informações, decidir se os benefícios ultrapassam /outweigh, os riscos da investigação.

Um pingo de sabedoria:

Tento, pelo menos uma vez por mês telefonar para os Senhores: Dr. Francisco Gaspar dos Santos (Chico Fos), um dos poucos médicos especializados em Imunologia; quase impossível de encontrar, mesmo aqui nos Estados Unidos; Dr. Pedro Cunha (Pipi Cunha) e Dr. João Procópio Landim Augusto  Pinhel (Gungo de Mana Chambu Tchutcha), não só por amizade e respeito que tenho por eles, mas para “pick their brain “- explorar os seus conhecimentos/sabedoria!

Porque, por mais que estudes, investigues, não há substituto para a experiência! Sempre saio mais sábio depois de cada conversa que tenho com eles. Temos que aproveitar a opinião destas raridades!

PARA OS JOVENS MÉDICOS E OUTROS PROFISSIONAIS DE SAÚDE GUINEENSES: HÁ MUITO QUE PODEMOS APRENDER COM ESTES SÁBIOS E EVITAR ERROS DO PASSADO.

É SÓ TELEFONAR OU ENVIAR UM EMAIL! NÃO CUSTA MUITO…

O que teria sido o futuro do mundo aquando da segunda guerra mundial, se não fosse por haver líderes maduros como o Roosevelt, Churchill ou Stalin?

Claro que quando metemos o Donald Trump na equação, toda esta teoria vai por água abaixo, mas fomos nós que o elegemos, agora estamos no purgatório da Divina Comédia de Dante Alighieri com ele …!

Desculpem por este longo artigo, mas hoje estou de folga, angariando forças para resumir as tarefas de lidar com doentes com Covid-19 nas unidades de cuidados intensivos – a infecção está outra vez a subir (nenhuma surpresa, com um presidente que se recusa a pôr uma máscara…!

Djoca

26.06.2020

AINDA MAIS CONFUSO…

AINDA MAIS CONFUSO…

Quando Um Homem Surdo Oferece para Ajudar um Homem Cego a encontrar o caminho Certo…

Parece que a cada dia que passa, quanto mais explicaçōes, mais confusão na minha mente…!

Acabei de ler uma notícia publicada pela DW sobre uma entrevista conduzida pela Agência LUSA, que um amigo meu me enviou, na qual um membro do Comité de Ética da Guiné-Bissau, teve a cortesia de nos explicar e clarificar sobre a investigação da vacina oral da Pólio!

1Um membro do Comité de Ética da Saúde na Guiné-Bissau diz que estudo não é para testar uma forma de prevenir a Covid-19. Investigação servirá para avaliar possível reforço da imunidade”!

No dia 11 de Junho de 2020, no jornal do Instituto de Virologia Humana (da Universidade de Maryland, Escola de Medicina), peço a vossa atenção para a seguinte passagem:

– Estudos em países sub-desenvolvidos têm mostrado que a Vacina Oral contra a Polio (OPV) está associada a reduções enormes de mortalidade, mesmo sem a existência de vírus da Poliomielite circulando no sangue (Segundo Dr. Christine Benn e Dr. Peter Aaby-da Dinamarca). Na Dinamarca, concluímos que crianças vacinadas com OPV têm menos risco de hospitalização por infeçōes de vias respiratórias. PENSAMOS QUE A OPV TEM A POSSIBILIDADE DE TER OS MESMOS BENEFÍCIOS NÃO ESPECÍFICOS NOS ADULTOS. NÓS VAMOS INICIAR EM BREVE UMA INVESTIGAÇÃO RANDOMIZADA, INCLUINDO 3400 ADULTOS COM MAIS DE 50 ANOS DE IDADE NA GUINÉ-BISSAU PARA VER SE A OPV PODE REDUZIR O RISCO DE CONTRAIR O COVID-19 E OUTRAS INFEÇŌES!

O ESTUDO É PARA TESTAR UMA FORMA DE PREVENIR A COVID-19

– Se a observação foi feita em crianças na Dinamarca, porque não tentar provar o mesmo em adultos, na Dinamarca?

O que penso é que com esta corrida a ver quem descobre a vacina contra a Covid-19 em primeiro lugar beneficiando de muitas regalias, iria ser muito mais difícil encontrar 3400 “voluntários” num curto espaço de tempo e, para além disso, muitos obstáculos iriam ser criados por Comités de Ética na Dinamarca!

2 – “Vários ativistas sociais e médicos guineenses insurgiram-se contra o estudo, frisando estar a ser feito sem que os padrōes internacionais estejam a ser respeitados, nomeadamente a comunicação pública prévia. É uma polémica desnecessária, mas que não ocorre com outros ensaios clínicos, até recomendados pela OMS na busca de tratamentos contra o Covid-19”.

É uma polémica absolutamente necessária, sim, por razōes que, eu, o Dr. Jorge Herbert e outros enumeraram em artigos anteriores: Por mais inócuo que seja o produto investigado, há que explicar detalhadamente ao sujeito investigado as potenciais consequências: hiperestimulação do Sistema imunológico, superinfecção em indivíduos tomando imunossupressores ou com orgãos transplantados etc., existência de instalaçōes adequadas para emergências que podem ocorrer durante o estudo.

3 – “disse não compreender que as mesmas vozes não se levantem contra o uso da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 na Guiné-Bissau”.

– Esta é uma surpresa para mim! Depois de estudos na Europa e nos Estados Unidos mostrarem que os riscos associados ao uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 ultrapassam os benefícios do seu uso, ainda há colegas usando hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19 na Guiné-Bissau?
Se for esse o caso, então AQUI LEVANTO A MINHA VOZ CONTRA O SEU USO!

4 – Segundo o responsável, a vacina contra a poliomielite foi criada nos anos 1950 —– e aplicada em milhōes de pessoas SEM QUALQUER EFEITO COLATERAL.

– Respeitosamente discordo!

Casos de paralisia, convulsōes etc., embora raros, estão descritos!

5 – “Não é a primeira vez que o Projecto de Saúde de Bandim realiza um estudo do género!

– Gostaria que nos fornecessem uma lista desses estudos; acredito que foram publicados em jornais de investigação – seria um motivo de orgulho meu rever e partilhar esses estudos com colegas meus.

Estamos a discutir este estudo porque lemos o anúncio da sua publicação através de jornais estrangeiros…

Junto vai um artigo da Iniciativa Global para Erradicação da Pólio.

Use-of-OPV-and-COVID-20200421

Investigação ainda em discussão, por causa de todas as preocupaçōes acima referidas.

DE NOTAR QUE A OPV (VACINA ORAL VIVA ATENUADA) NÃO TEM SIDO USADA NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA DESDE 1979; SOMENTE A VACINA INATIVADA (IPV) ESTÁ DISPONÍVEL E USADA DESDE 1987 E CIENTISTAS ESTÃO PREOCUPADOS COM A REINTRODUÇÃO DO OPV SE INVESTIGAÇŌES FOREM APROVADAS NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, PARTICULARMENTE EM DOENTES IMUNODEFICIENTES.

COMO TEMOS VINDO A REALÇAR EM ARTIGOS ANTERIORES, A LÓGICA PARA O ESTUDO É PLAUSÍVEL, MAS O LUGAR E AS CONDIÇŌES ADEQUADAS PARA EMERGÊNCIAS E A POTENCIAL RAPIDEZ COM QUE O ESTUDO FOI APROVADO, NÃO!

Joaquim Tavares (Djoca)

24.06.2020

A TRANSPARÊNCIA DA INVESTIGAÇÃO

A Transparência da Investigação

Recebi hoje de manhã uma notícia relativamente à Guiné-Bissau, anunciando uma investigação do uso da vacina contra a Pólio para prevenir o Coronavírus.

Dias atrás, revi um artigo em que o Dr. Robert Gallo debruçou sobre este assunto: vacina oral contra a Poliomielite (Oral Poliovirus Vaccine-OPV) ajudou a reduzir a mortalidade pela infecção gripal Influenza e outras infecçōes virais: “porque não experimentar esta vacina no Coronavirus”?

Embora a teoria suportando esta investigação seja plausível, muitas questōes merecem respostas.

1 Porquê a Guiné-Bissau?

País com escassos recursos hospitalares, falta de oxigénio, carência de cuidados intensivos: se um dos investigados apanha uma reação adversa, vai ser transportado para a Dinamarca ou deixado morrer em casa?….

Por mais inócua que seja a vacina, o efeito desejado (objectivo da investigação) é aumentar a imunidade do sujeito investigado; O corpo humano reage diferentemente de pessoa para pessoa (em vez do esperado nível de imunidade, o que pode acontecer se o indivíduo desenvolve um excesso de imunidade, causando doenças como a hypersensitivity pneumonitis?

Temos capacidade para tratar estas consequências?

Investigaçōes deste tipo devem ser começadas (se não completamente conduzidas) em países com condiçōes para lidar com emergências ligadas aos produtos investigados.

A minha modesta opinião: comecem a investigação na Dinamarca (parece-me que os Lead investigadores são dinamarqueses) e depois de dados iniciais positivos, então podem “ajudar” o povo irmão da Guiné-Bissau!

2Atempadamente, ou seja, antes de iniciar esta investigação, houve anúncios nas rádios, nos jornais, na TV e outros canais de comunicação social, a informar o público sobre esta investigação?

3Sendo um estudo experimental, aos sujeitos do estudo foram fornecidos um formulário para consentir voluntariamente a investigação?

4Quando é que os líderes da investigação submeteram a proposta de estudo, e depois de aprovado, será que partilharam o resumo do estudo planeado com os potenciais sujeitos da investigação?

Em 1993 quando fui à Guiné para o funeral do meu pai, troquei impressões com alguns cientistas e estudantes dinamarqueses em Bissau, respeito muito a vontade de ajudar; o espírito de altruísmo que mostraram em relação ao povo guineense, mas estou muito preocupado com esta investigação: não com o objectivo da investigação em si, mas com o lugar da investigação, e se os sujeitos a ser investigados estarão devidamente informados antes de assinar o contrato.

É importante nunca esquecer o Código de Nuremberga:

1Consentimento Voluntário é essencial.

2Os resultados da investigação devem ser para o BEM da Sociedade.

3A Investigação em Humanos deve ser baseada em resultados de investigaçōes prévias em animais.

4As Investigaçōes devem ser conduzidas evitando sofrimento/lesão Física e Mental.

5Nenhuma Investigação deve ser conduzida se pensamos que pode causar morte/invalidez.

6Os riscos não podem exceder os benefícios.

7Facilidades adequadas (ex: Hospitais) devem ser usadas para proteger os sujeitos da investigação.

8As Investigaçōes devem ser conduzidas somente por cientistas qualificados.

9Os sujeitos da investigação podem optar por sair da investigação a qualquer momento.

10O Líder da Investigação deve estar preparado para terminar a investigação quando acontece uma lesão, Invalidez, ou morte do sujeito investigado.

Numa nota sobre o coronavirus, um trabalho de investigação foi divulgado nas últimas 24 horas (“oriundo da Inglaterra e feito em residentes na Inglaterra!!!): a dexametasona (um esteroide que andamos a usar por mais de 20 anos nos cuidados intensivos) na dose de 6mg/dia, pode reduzir a mortalidade nos doentes intubados (de 40% para 20%), ou doentes que necessitam de muito oxigénio (reduzindo o risco de morte de 25% para 20% – não tão impressivo neste caso).

Joaquim Tavares (Djoca)

16.06.2020

MD, FACP, FCCP, DABSM, FAASM, RPSGT, EDIC
EUROPEAN DIPLOMATE IN INTENSIVE CARE

DIDINHO – ANÁLISE POLÍTICA – 03.05.2020

SOBRE O RECONHECIMENTO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ELEITO DA GUINÉ-BISSAU PELOS CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA CEDEAO E, CONSEQUENTEMENTE, PELO MUNDO

Antes tarde do que nunca…

Entre o anúncio provisório e o definitivo, e a publicação oficial no Boletim Oficial da Guiné-Bissau dos resultados da segunda volta das eleições presidenciais realizadas na Guiné-Bissau a 29 de dezembro de 2019, ocorreram dois episódios caricatos por parte de um dos candidatos, concretamente, o candidato declarado derrotado pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau, único órgão competente à luz da Lei-Eleitoral do país para apurar e publicar os resultados das eleições.

O primeiro episódio foi o reconhecimento categórico do candidato, Eng.º Domingos Simões Pereira ao seu opositor e vencedor da segunda volta das presidenciais de 29 de Dezembro de 2019 General Umaro Sissoco Embaló a quem telefonou por iniciativa própria para lhe felicitar pela sua vitória eleitoral.

Domingos Simões Pereira foi desta forma, a primeira pessoa a felicitar o vencedor da segunda volta das eleições presidenciais guineenses!

O segundo episódio aconteceu quando, depois de ter sido pressionado pelos seus pares, para não aceitar os resultados eleitorais provisórios apurados e anunciados pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau no dia 01.01.2020, o candidato derrotado iniciou uma campanha de recusa em aceitar os resultados e, consequentemente, em não reconhecer o vencedor das presidenciais, a quem já tinha telefonado e felicitado, reconhecendo a vitória deste.

Dois episódios que não deixam de ser marcantes no conflito pós-eleitoral que Domingos Simões Pereira encetou desde então, com vários recursos ao Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau, enquanto entidade suprema do poder Judicial (na ausência de um Tribunal Constitucional), para dirimir litígios que tenham como objecto o contencioso eleitoral.

Entretanto, o candidato declarado vencedor pela Comissão Nacional de Eleições, General Umaro Sissoco Embaló, começou a receber felicitações de Estadistas e Organizações Internacionais. Do Presidente do Senegal, Macky Sall, do Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, do Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, do Presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, do Presidente de Angola, João Lourenço, do Embaixador dos Estados Unidos no Senegal e na Guiné-Bissau, em nome dos Estados Unidos da América, entre outros e de Organizações como a CEDEAO e a União Africana, isto, no mês de janeiro de 2020 com base no anúncio dos resultados eleitorais pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau.

Da sua agenda diplomática, Umaro Sissoco Embaló deslocou-se a vários países africanos, europeus e asiáticos, na qualidade de vencedor (anunciado pela Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau), da segunda volta das eleições presidenciais na Guiné-Bissau realizadas a 29 de dezembro de 2019.

Da candidatura derrotada e de forma maquiavélica, no sentido de manipular e desinformar a opinião pública nacional e internacional, bem como pressionar a Comunidade Internacional através dos seus lobbies, Domingos Simões Pereira, o candidato derrotado, nunca se referiu à Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau como única entidade competente para apurar e publicar os resultados eleitorais, tal como consta na alínea n) do Artigo 11.º (competência) da Lei N.º 12/2013 de 27 de Dezembro – Lei da Comissão Nacional de Eleições, preferindo intencionalmente atribuir essa competência ao Supremo Tribunal de Justiça, que na verdade não tem nada a ver com o apuramento ou com a publicação dos resultados eleitorais, mas apenas e só, com o contencioso eleitoral, na estrita observância do estabelecido na Lei-Eleitoral em matéria de contencioso eleitoral, tal como consta no Artigo 140.º da Lei Nº. 10/2013  de 25 de setembro – Lei Eleitoral para o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular: Todas as irregularidades verificadas durante a votação ou no momento de apuramento parcial ou nacional dos resultados do escrutínio podem ser impugnadas, por via de recurso contencioso, desde que tenha sido reclamado ou protestado no decurso dos actos em que tenham sido verificadas.

De recurso em recurso, o candidato derrotado que em nenhum momento do processo eleitoral apresentou qualquer reclamação, protesto ou contraprotesto a quem deveria ter apresentado, quis bloquear o processo de confirmação/publicação final e oficial dos resultados eleitorais pela Comissão Nacional de Eleições e, consequentemente impedir a investidura do candidato declarado vencedor pela CNE, o General Umaro Sissoco Embaló, como Presidente eleito da República da Guiné-Bissau, usando o supremo Tribunal de Justiça para esse fim, através da sua rede de influência.

De Acórdão em Acórdão o Supremo Tribunal de Justiça foi fugindo da sua função jurisdicional e da sua competência constitucional, chegando ao ridículo de, implicitamente, fazer parte de uma ampla e encenada orquestração política visando suspender ad aeternum a decisão final da Comissão Nacional de Eleições no concernente ao apuramento e à publicação dos resultados finais e oficiais da segunda volta das eleições presidenciais realizadas na Guiné-Bissau no dia 29 de dezembro de 2019.

A Comissão Nacional de Eleições face às decisões/exigências do Supremo Tribunal de Justiça cumpriu todos os procedimentos legais exigidos, tendo realizado um total de 3 sessões plenárias, uma delas a pedido excepcional da CEDEAO, para o Apuramento Nacional dos Resultados Eleitorais, que deram todos vitória eleitoral ao candidato Umaro Sissoco Embaló.

A Comissão Nacional de Eleições da Guiné-Bissau cumpriu com a recomendação emanada pela CEDEAO – Ponto 10 do Comunicado de 30 de janeiro

Foram tantas as iniciativas vazias visando a impugnação dos resultados eleitorais, a recontagem dos votos através de um apuramento de raiz, ou a anulação da segunda volta das eleições presidenciais, entre sustentações de alegadas irregularidades nunca provadas, incluindo a denúncia do sequestro do Presidente da Comissão Nacional de Eleições, por militares afectos à candidatura de Umaro Sissoco Embaló, denúncia refutada, desmentida, pelo Presidente da CNE; da célebre acusação que virou comédia, do envolvimento de piratas informáticos que teriam adulterado os resultados eleitorais a favor do candidato vencedor, apresentadas pelo candidato derrotado e sua equipa de advogados, que o descrédito público encarregou-se de os julgar e ao próprio Supremo Tribunal de Justiça.

A CEDEAO teve que entrar em cena quando pediu excecionalmente à Comissão Nacional de Eleições, a única entidade competente, autorizada, a apurar e a publicar os resultados eleitorais, para cumprir com mais uma das exigências do Supremo Tribunal de Justiça, solicitando igualmente, a estes dois órgãos para “cooperarem de maneira construtiva para salvaguardarem a integridade do processo eleitoral, uma condição e garantia para a paz e estabilidade no país”.

Entre o jogo político do Supremo Tribunal de Justiça e da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau, e depois do anúncio dos resultados definitivos da segunda volta das eleições presidenciais e da declaração da Comissão Nacional de Eleições sobre o cumprimento da recomendação do Comité Ministerial de Seguimento da CEDEAO, o candidato declarado vencedor, face ao bloqueio à sua investidura através da insuportável e vergonhosa actuação do Supremo Tribunal de Justiça, decide agendar a sua tomada de posse para 27 de fevereiro, a que designou de simbólica, mas que teve uma legitimidade parlamentar através do 1º. Vice-Presidente da Mesa da Assembleia Nacional Popular e de vários Deputados dos partidos da oposição, (pese embora a ausência dos Deputados do Grupo parlamentar do PAIGC e doutros partidos que suportaram a sua maioria parlamentar pós-eleições legislativas), ainda que não tenha sido realizada na Assembleia Nacional Popular, e sim num Hotel da capital, Bissau, culminando com a passagem presencial de testemunho, pelo Presidente da República cessante, Dr. José Mário Vaz, numa cerimónia oficial no Palácio da República.

Empossado e instalado no Palácio da República, Umaro Sissoco Embaló não perdeu tempo a demitir o Governo dirigido por Aristides Gomes, que antes das eleições legislativas tinha sido imposto como Primeiro-ministro da Guiné-Bissau pela CEDEAO, mas nessa altura, não houve nenhuma preocupação sobre a perda da nossa soberana, por parte daqueles que, nos dias de hoje, reivindicam essa perda de soberania…

A CEDEAO há muito que impõe o que deve ser feito na Guiné-Bissau, por culpa dos políticos e das Instituições da Guiné-Bissau e infelizmente, assim continuará a ser, enquanto não formos capazes de assumir o nosso Compromisso e as nossas Responsabilidades para com o nosso País, bem como, enquanto não formos capazes de nos Entendermos e nos Respeitarmos como Guineenses que somos, a bem da Afirmação e do Respeito da Guiné-Bissau no concerto das Nações!

O Acordo de Conacri imposto aos Guineenses pela CEDEAO, alegadamente numa perspectiva de mediação da crise política e institucional guineense iniciada em 2015 foi como que um rasgar da Constituição da República da Guiné-Bissau e uma usurpação da soberania nacional, tendo merecido a concordância de actores políticos e da sociedade civil do país, que ignoraram completamente que estavam a permitir à CEDEAO passar a decidir pelos Guineenses e em nome da Guiné-Bissau. Chamamos a atenção para essa realidade, por diversas vezes, mas, infelizmente, nunca fomos tidos em consideração, na nossa Missão em prol da Cidadania assente no nosso Compromisso para com a Guiné-Bissau, e em defesa do Interesse Nacional.

Assistimos a medidas de sancionamento impostas a Deputados, políticos, governantes, magistrados, militares e cidadãos comuns guineenses pela CEDEAO, e todos quantos beneficiaram com essas medidas, calaram-se ou até, rejubilaram com essas decisões.

Assistimos à imposição de Chefes de Governo da Guiné-Bissau, pela CEDEAO e ficamos calados, porque era da nossa conveniência.

Assistimos a um confinamento das nossas Forças Armadas face à sobreposição das Forças da ECOMIB na Guiné-Bissau, por imposição da CEDEAO e ficamos calados, porque havendo benefícios, conveniências, qual soberania, qual quê…!

Assistimos a desautorizações frequentes por parte da CEDEAO de um Presidente da República da Guiné-Bissau, Dr. José Mário Vaz, eleito pelo Povo Guineense, com as suas Competências elencadas na Constituição da República da Guiné-Bissau, à qual prestou juramento, e até aplaudimos, porque era da nossa conveniência… Não estava em causa a Soberania Nacional pelos vistos…

Hoje já há queixas contra a CEDEAO, porque só agora alguns deram conta que a Soberania Nacional da Guiné-Bissau está a ser ameaçada, face ao tardio, mas justo, merecido e decisivo reconhecimento oficial do Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco Embaló, pela CEDEAO e por via disso, pela União Africana, União Europeia, Nações Unidas, CPLP e várias outras organizações internacionais, bem como, por vários Países do Mundo…

Hoje há queixas de que a CEDEAO não pode substituir o Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau em matéria de contencioso pós-eleitoral, como se disso se tratasse…

E será que a CEDEAO deveria desautorizar , noutras circunstâncias, o Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, bem como decidir pelos Guineenses, quando a Organização do Poder Político do nosso Estado está devidamente estruturada e de forma detalhada, na nossa Constituição da República?

Onde estava o Eng.º Domingos Simões Pereira, o queixoso derrotado e mau perdedor, que nunca respeitou o Presidente José Mário Vaz, bem como o seu Partido, o PAIGC para defenderem a Soberania Nacional?

Quando lhes convinha, a CEDEAO era um Parceiro “porreiro”, agora, já é uma instituição que apoia golpes de Estado e golpistas, porque decidiu reconhecer oficialmente o Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, enquanto vencedor da segunda volta das eleições presidenciais de 29 de dezembro de 2019…

Vão ter que se insurgir também contra a União Africana, a ONU, a CPLP, a União Europeia, em suma, todas as Organizações Internacionais e todos os Países e Parceiros Internacionais da Guiné-Bissau que já reconheceram o General Umaro Sissoco Embaló como Presidente da República eleito da Guiné-Bissau.

Se isso é apoiar golpes de Estado, então, vamos admitir que disso se trata e arrumar a questão de uma vez por todas, afinal, fomos sempre golpistas em função das nossas conveniências reflectidas nos nossos posicionamentos.

Basta!

O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau, independentemente do reconhecimento do Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco, pela CEDEAO, pode, quando achar que está em condições de o fazer, decidir sobre o contencioso eleitoral pendente, interposto pelo candidato derrotado. Que o faça, pois a CEDEAO não substitui o Poder Judicial Guineense, contrariamente ao que se quis transmitir (face à sua tomada de posição política e institucional sobre um Estado-Membro), relativamente ao processo eleitoral da segunda volta das eleições presidenciais de 29 de Dezembro de 2019 na Guiné-Bissau.

A 01 de março de 2020 questionamos através do artigo intitulado POR QUE SE CALARAM TODOS…?! face ao silêncio das Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau, dos Órgãos de Comunicação Social Nacionais e Internacionais, que fizeram cobertura de todo o processo eleitoral, e das Missões de Observadores Eleitorais Internacionais, que acompanhando todo o processo eleitoral, felicitaram a Comissão Nacional de Eleições, tendo considerado o processo da segunda volta das eleições presidenciais, de TRANSPARENTE e LIVRE.

A Comunidade Internacional finalmente despertou para o precedente grave de pôr em causa as Missões Internacionais de Observadores Eleitorais, face às conclusões dos seus Chefes de Missão, com base em equipas de trabalho compostas por gente capacitada, experimentada, e credível.

Usar os órgãos judiciais para descredibilizar a entidade competente para apurar e anunciar os resultados eleitorais, é promover uma tentativa de golpe de Estado Institucional, visando claramente criar um ambiente prolongado de saturação e desgaste político e institucional, no intuito de anular o processo eleitoral e com isso, negar a vitória justa ao candidato declarado vencedor, através de pronunciamentos sobre recursos que não se enquadram na Lei-Eleitoral da Guiné-Bissau, em matéria de recurso contencioso, foi certamente outra das conclusões a que a Comunidade Internacional chegou, tirando as devidas ilações, para que o ensaio ao bloqueio pós-eleitoral na Guiné-Bissau não reflicta noutros processos eleitorais doutros países que precisam de Observadores Internacionais para que seus processos eleitorais mereçam credibilidade e reconhecimento, internacionais, independentemente da Soberania dos Estados e da validação interna dos seus processos eleitorais pelas suas entidades competentes.


SOBRE O PONTO 7 DO COMUNICADO DA CEDEAO – NOMEAÇÃO DE UM PRIMEIRO-MINISTRO E DE UM NOVO GOVERNO DE FORMA CONSTITUCIONAL E TENDO EM CONTA AS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS

No Comunicado da CEDEAO no qual os Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO reconhecem o General Umaro Sissoco Embaló como Presidente eleito da República da Guiné-Bissau, há uma recomendação, no seu ponto 7 ao Presidente Umaro Sissoco Embaló, no sentido de proceder à nomeação de um primeiro-ministro e de um novo Governo até ao dia 22 de maio de 2020 de forma constitucional e tendo em conta as eleições legislativas realizadas na Guiné-Bissau no dia 10 de março de 2019.

Olhando para a Constituição da República da Guiné-Bissau, em matéria de Sistemas designatórios por via de Eleições, concluímos que não há eleições governativas mas sim, presidenciais, legislativas e autárquicas, sendo que as autárquicas, ainda que contempladas na Constituição da República, nunca foram realizadas.

Isto quer dizer que, na Guiné-Bissau, o Governo não é eleito!

O Governo, que constitucionalmente é um órgão de soberania, a exemplo do Presidente da República, da Assembleia Nacional Popular e dos Tribunais, emana da Assembleia Nacional Popular, tendo em conta os resultados eleitorais obtidos pelos partidos políticos e, ou, pelas coligações de partidos políticos concorrentes às eleições legislativas.

A referência aos “resultados eleitorais” obtidos pelos partidos políticos e, ou coligações de partidos políticos na nomeação de um Primeiro-ministro, e de um Governo, pode ter várias leituras, interpretações e impactos, em função da obtenção ou não, de uma maioria absoluta directa, ou negociada, visando uma configuração parlamentar maioritária, capaz de dar garantias de Estabilidade Política e Governativa, quer ao Presidente da República, numa questão de competência na nomeação do Primeiro-ministro e do Governo; quer à Assembleia Nacional Popular, enquanto órgão legislativo e de fiscalização política representativa de todos os cidadãos guineenses (em matérias como: aprovação do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado, do Plano Nacional de Desenvolvimento, da autorização legislativa ao Governo, entre outros), já que o Governo, enquanto órgão de soberania, é, ao abrigo do Artigo 103.º da Constituição da República da Guiné-Bissau: “politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.”

Ou seja, o Governo, responde perante estes dois órgãos de soberania: o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular, em conformidade com as competências de cada um dos referidos órgãos, nas suas relações com o Governo.

A Lei Nº 10/2013 – de 25 de setembro – Lei Eleitoral para o Presidente da República e Assembleia Nacional Popular estabelece no seu Artigo 120.º  o que a seguir transcrevemos:

Modo de eleição

1. Os deputados da Assembleia Nacional Popular são eleitos por listas plurinominais de Partidos ou Coligação de Partidos apresentada por cada colégio eleitoral, dispondo o eleitor um voto singular de lista.

2. As coligações poderão apresentar listas únicas de Coligação sendo, porém, permitido aos partidos coligados a apresentação de listas próprias, apenas naqueles em que a Coligação não concorrer.

3. As listas são apresentadas aos eleitores durante a campanha eleitoral para que estes tomem conhecimento dos nomes dos candidatos a deputados de cada partido ou coligação de Partidos.

Fim da transcrição.

Constatamos no ponto 3 do Artigo 120.º da Lei Nº 10/2013 que para a eleição dos Deputados, os Partidos ou coligações de partidos devem apresentar as suas listas aos eleitores durante a campanha eleitoral para que estes tomem conhecimento dos nomes dos candidatos a deputados de cada partido ou coligação de Partidos.

Nas eleições legislativas de 10 de março de 2019 concorreram 24 partidos políticos em separado e nenhuma coligação de Partidos.

Ou seja, ao Povo Eleitor, não foi dado a conhecer nenhuma lista dos candidatos a deputado, em nome de uma coligação de Partidos, porque simplesmente, não houve nenhuma coligação pré-eleitoral entre partidos políticos.

Num universo de 102 Mandatos em disputa para a Assembleia Nacional Popular, o PAIGC foi o vencedor com 47 mandatos, seguido do MADEM-G15 com 27, do PRS com 21, da APU-PDGB com 5, da UM com 1 e do PND com 1.

Face aos mandatos obtidos por estes 6 Partidos, que concorreram separadamente às eleições legislativas, nenhum deles conseguiu obter uma maioria absoluta ou qualificada, o que implicou que fossem promovidas estratégias negociadas visando Acordos de Incidência Parlamentar para a formação de uma Maioria Parlamentar, capaz de garantir a Estabilidade Política e Institucional da Assembleia Nacional Popular, por um lado e, por outro, e como reflexo dessa maioria parlamentar, garantir junto ao Presidente da República, a nomeação de um Primeiro-ministro e de um Governo.

O Povo eleitor não deu a nenhum Partido Político o direito de governar sozinho, com base na legitimidade popular, que teria que ser materializada através de uma maioria absoluta ou qualificada de votos do vencedor das eleições legislativas e convertidos em mandatos.

Não Governa apenas quem vence as eleições legislativas, sem ter maioria parlamentar, mas sim, quem consegue, depois da publicação dos resultados das eleições legislativas, na ausência de uma maioria absoluta ou qualificada, formar uma maioria parlamentar absoluta que seja, capaz de garantir a Estabilidade Política e Governativa ao Presidente da República e, à Assembleia Nacional Popular.

O PAIGC (47 mandatos) ciente dessa realidade, antecipou-se e conseguiu assinar Acordos de Incidência Parlamentar com a APU-PDGB (5 mandatos), com a UM (1 mandato) e com o PND (1 mandato), garantindo assim, uma maioria parlamentar assente em 54 mandatos de um total de 102 que compõem a Assembleia Nacional Popular, deixando o MADEM-G15 (27 mandatos) e o PRS (21 mandatos), na oposição.

Com base nessa maioria parlamentar conseguida pelo PAIGC através dos Acordos de Incidência Parlamentar que rubricou com outros 3 Partidos, estava garantida a Estabilidade Política e Governativa, o que permitiu a formação da Mesa da Assembleia Nacional Popular, bem como a indicação de um nome para o Primeiro-ministro.

É importante esclarecer que não havendo uma definição estatutária nos estatutos dos partidos políticos para que o candidato apontado como cabeça de lista para as eleições legislativas venha a ser o nome indicado para Primeiro-ministro, qualquer outro nome pode ser proposto ao Presidente da República para nomeação do Primeiro-ministro, em função de quem venceu as eleições com maioria absoluta, ou conseguiu arranjos parlamentares para garantir uma maioria absoluta no parlamento.

O PAIGC tem esse requisito nos seus estatutos, mas outros partidos não seguem a mesma via.

O Presidente da República, por sua vez, pode aceitar o nome proposto ou recusá-lo, solicitando outra proposta.

Normalmente, por uma questão de bom-senso e da promoção de um clima de bom relacionamento institucional, o Presidente da República deve aceitar o nome proposto logo à primeira, mas como vimos recentemente, face ao conflito político e institucional que se degenerou nos últimos 5 anos, o ex- Presidente da República, Dr. José Mário Vaz recusou o nome do Presidente do PAIGC e cabeça de lista do seu partido às eleições legislativas de 10 de Março de 2019 o Eng.º Domingos Simões Pereira, solicitando outro nome alternativo.

Pode fazê-lo sim, sem que isso signifique violar a Constituição da República.

Também pode dar-se o caso de, havendo concertação entre os partidos que detêm a maioria parlamentar, num processo negociado depois das eleições legislativas, ser indicado um nome para Primeiro-ministro, de um cidadão independente, ou seja, sem filiação partidária. Nunca aconteceu na Guiné-Bissau, mas não há nenhuma norma constitucional ou legal que o impeça. Caberia sempre ao Presidente da República aceitar ou recusar esse nome.

Temos portanto, que os resultados eleitorais obtidos na avaliação e viabilização da nomeação quer de um Primeiro-ministro, quer de um governo, no caso de não se traduzir numa vitória com maioria absoluta ou qualificada de um partido, ou de uma coligação de Partidos Políticos, nas Eleições Legislativas, por si só, não legitimam a formação de um governo minoritário.

É uma falsa argumentação constitucional aquela que alegadamente sustenta que basta ganhar as eleições legislativas, não importando o número de mandatos, para ter direito a indicar um nome para Primeiro-ministro e formar governo.

O número de mandatos é de capital importância no esclarecimento da configuração parlamentar e na definição de uma maioria directa (por via do processo eleitoral em si), ou negociada, quiçá, através de Acordos de Incidência Parlamentar entre Partidos (ou coligações de Partidos), com assentos parlamentares, por forma a garantirem uma maioria parlamentar, depois de conhecidos os resultados das eleições legislativas e na ausência de um vencedor com maioria absoluta ou qualificada.

Nenhum Governo pode ser nomeado ou mesmo, manter-se em funções, sem a confiança política da Assembleia Nacional Popular e essa Confiança, depende da Garantia de uma Maioria Parlamentar!

DAS RELAÇÕES ENTRE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E O GOVERNO

Olhando para o que diz a Constituição da República da Guiné-Bissau, relativamente às relações entre o Presidente da República e o Governo transcrevemos algumas alíneas do seu Artigo 68.º

ARTIGO 68.°

São atribuições do Presidente da República:

g) Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas representadas na Assembleia Nacional Popular;

h) Empossar o Primeiro-Ministro;

i) Nomear e exonerar os restantes membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro, e dar-lhes posse;

j) Criar e extinguir ministérios e secretarias de Estado, sob proposta do Primeiro-Ministro;

m) Presidir o Conselho de Ministros, quando entender;

o) Nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas;

p) Nomear e exonerar, ouvido o governo, o Procurador-Geral da República;

q) Nomear e exonerar os Embaixadores, ouvido o Governo;

s) Promulgar as leis, os decretos-leis e os decretos;

ARTIGO 69.°

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

b) Demitir o Governo, nos termos do nº 2 do artigo 104° da Constituição;

c) Promulgar ou exercer o direito de veto no prazo de 30 dias contados da recepção de qualquer diploma da Assembleia Nacional Popular ou do Governo para promulgação.

DAS RELAÇÕES ENTRE A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR E O GOVERNO

Olhando ainda para a Constituição da República da Guiné-Bissau relativamente às relações entre a Assembleia Nacional Popular e o Governo, encontramos os seguintes pontos, nos Artigos e nas alíneas correspondentes:

ARTIGO 81.º

O deputado tem direito de fazer interpelação ao Governo, oralmente ou por escrito, devendo-lhe ser dada a resposta na mesma sessão ou no prazo máximo de 15 dias, por escrito, caso haja necessidade de investigações.

ARTIGO 84.°

4 – O cargo de deputado à Assembleia Nacional Popular é incompatível com o de membro do Governo.

ARTIGO 85.°

1 – Compete à Assembleia Nacional Popular:

d) Aprovar o Programa do Governo;

g) Aprovar o Orçamento Geral do Estado e o Plano Nacional de Desenvolvimento, bem como as respectivas leis;

k) Conferir ao Governo a autorização legislativa;

l) Ratificar os decretos-lei aprovados pelo Governo no uso da competência legislativa delegada;

o) Zelar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração;

2 – Quando o Programa do Governo não tenha sido aprovado pela Assembleia Nacional Popular, terá lugar, no prazo de 15 dias, um novo debate.

3 – A questão de confiança perante a Assembleia Nacional é desencadeada pelo Primeiro-Ministro, precedendo à deliberação do Conselho de Ministros.

4 – A iniciativa da moção de censura cabe pelo menos a um terço de deputados em efectividade de funções.

5 – A não aprovação de uma moção de confiança ou a aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta implicam a demissão do Governo.

ARTIGO 89.°

2 –  A Assembleia Nacional Popular reunir-se-á extraordinariamente por iniciativa do Presidente da República, dos deputados, do Governo e da sua Comissão Permanente.

ARTIGO 90.°

Os membros do Governo podem tomar assento e usar da palavra nas reuniões da Assembleia Nacional Popular, nos termos do Regimento.

ARTIGO 91.º

1 – A iniciativa legislativa compete aos deputados e ao Governo.

ARTIGO 92.°

1 – A Assembleia Nacional Popular pode autorizar o Governo a legislar, por decreto-lei, sobre matérias previstas no artigo 87.º. A autorização deve estabelecer o seu objecto, a sua extensão e duração.

2 – O termo da legislatura e a mudança de Governo acarretam a caducidade das autorizações legislativas concedidas.

3 – Os decretos-leis aprovados pelo Governo no uso da competência legislativa delegada serão remetidos à Assembleia Nacional Popular para ratificação, dispondo esta de um prazo de 30 aias para o efeito, findo o qual o diploma será considerado ratificado.

DAS RELAÇÕES ENTRE O GOVERNO E O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Das relações entre o Governo e o Presidente da República a Constituição da República da Guiné-Bissau diz-nos:

ARTIGO 97.º

3 – Compete ainda ao Primeiro-Ministro, sem prejuízo de outras atribuições que lhe forem conferidas pela Constituição e pela lei, informar o Presidente da República acerca dos assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do País.

ARTIGO 98.º

1 – O Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidos os partidos políticos representados na Assembleia Nacional Popular.

2 – Os ministros e secretários de Estado são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro.

ARTIGO 103.°

O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 104.°

1 – Acarreta a demissão do Governo:

c) A aceitação pelo Presidente da República do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro;

2 –  O Presidente da República pode demitir o Governo em caso de grave crise política que ponha em causa o normal funcionamento das instituições da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos políticos com assento parlamentar.

DAS RELAÇÕES ENTRE O GOVERNO E A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR

De igual modo, das relações entre o Governo e a Assembleia Nacional Popular, a Constituição da República da Guiné-Bissau dá-nos a conhecer os seguintes:

ARTIGO 96.°

2 –  O Governo conduz a política geral do País de acordo com o seu Programa, aprovado pela Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 100.º

1 – No exercício das suas funções compete ao Governo:

d) Legislar por decretos-leis e decretos sobre matérias respeitantes à sua organização e funcionamento e sobre matérias não reservadas à Assembleia Nacional Popular;

e) Aprovar propostas de lei e submetê-las à Assembleia Nacional Popular;

ARTIGO 103.°

O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

ARTIGO 104.°

1 – Acarreta a demissão do Governo:

a) O início de nova legislatura:

b) A não aprovação pela segunda vez consecutiva do Programa do Governo;

d) A aprovação de uma moção, de censura ou não aprovação de uma moção de confiança por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções;

e) A morte ou impossibilidade física prolongada do Primeiro-Ministro.


Resumindo e concluindo, quisemos mostrar através das referências constitucionais versadas nas relações entre o Presidente da República e o Governo, e vice-versa; entre a Assembleia Nacional Popular e o Governo e vice-versa, a real dependência do Governo face ao Presidente da República, e à Assembleia Nacional Popular, na justa competência explanada no Artigo 103.º da Constituição da República da Guiné-Bissau: O Governo é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Nacional Popular.

Ao analisarmos como é nomeado o Governo na Guiné-Bissau, de forma constitucional, e tendo em conta os resultados eleitorais das eleições legislativas de 10 de Março de 2019, cujo vencedor foi o PAIGC sem no entanto ter conseguido uma vitória eleitoral com maioria absoluta ou qualificada, tendo posteriormente negociado e rubricado Acordos de Incidência Parlamentar com outros partidos representados na Assembleia Nacional Popular, no caso de uma denúncia, quiçá, rutura do Acordo de Incidência Parlamentar com a APU-PDGB, partido que tem 5 mandatos na Assembleia Nacional Popular, essa maioria parlamentar, fruto desse Acordo de Incidência Parlamentar pode ser posta em causa na própria Assembleia Nacional Popular, sendo que só mesmo na Assembleia Nacional Popular poderá ser confirmada, ou não, a manutenção desse Acordo ou a sua rutura, numa perspectiva de alinhamento dos posicionamentos em forma de votos, dos deputados, face a qualquer iniciativa nesse sentido, quer seja para aprovação do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado; ou da apresentação duma Moção de Censura ou duma Moção de Confiança ao Governo;

Importa, contudo, face aos mandatos obtidos pelos 6 partidos nas eleições legislativas de 10 de Março de 2019 e depois da demissão, pelo novo Presidente da República eleito da Guiné-Bissau, General Umaro Sissoco Embaló, do primeiro governo constitucional da décima legislatura (nomeado pelo então Presidente da República, Dr. José Mário Vaz), analisar o ponto 7 do Comunicado da CEDEAO numa recomendação ao Presidente Umaro Sissoco Embaló, no sentido de proceder à nomeação de um primeiro-ministro e de um novo Governo até ao dia 22 de maio de 2020 de forma constitucional e tendo em conta as eleições legislativas realizadas na Guiné-Bissau no dia 10 de março de 2019.

Um pormenor importante é que a recomendação da CEDEAO não fala de um novo Primeiro-ministro, mas sim, de um Primeiro-ministro e de um novo Governo. 

Até que ponto esses detalhes são importantes para a nossa análise?

São importantes porque visam em certa medida, legitimar a verdade pós -eleitoral, em matéria de existência duma maioria parlamentar sustentada e atualizada.

Ainda que o Presidente da República eleito, General Umaro Sissoco Embaló tenha demitido o primeiro governo constitucional da décima legislatura chefiado pelo Dr. Aristides Gomes, baseado numa maioria parlamentar obtida pelo PAIGC depois dos Acordos de Incidência Parlamentar com outros 3 partidos políticos com assentos no parlamento, e nomeado um segundo governo, pese embora a inobservância de procedimentos constitucionais e legais para o fazer, em nossa opinião, o certo é que o segundo governo desta décima legislatura também necessita da legitimidade parlamentar para se manter em funções e isso terá que passar necessariamente pela Assembleia Nacional Popular, através dos requisitos de aprovação, quer do Programa do Governo, do Orçamento-Geral do Estado ou, através de iniciativas directas por via de uma Moção de Confiança, ou de Censura das partes interessadas.

É aqui que o Ponto 7 da Recomendação dos Chefes de Estado da CEDEAO ao Presidente da República da Guiné-Bissau merece atenção especial do Presidente da República.

As disputas políticas na Assembleia Nacional Popular não devem merecer tomada de partido pelo Presidente da República.

O Presidente da República, segundo o ARTIGO 62° da Constituição da República da Guiné-Bissau, é: 1 – o Chefe do Estado, símbolo da unidade, garante da independência nacional e da Constituição e Comandante Supremo das Forças Armadas. 2 – O Presidente da República representa a República da Guiné-Bissau.

Face ao acima exposto, o Presidente da República deve contribuir para a Unidade e não para a Divisão dos Guineenses, assumindo ser Presidente de Todos os Guineenses e demarcando-se das simpatias político-partidárias e das influências consequentes capazes de condicionar e prejudicar o exercício do seu cargo a bem da Nação.

O Governo, segundo a constituição, é politicamente responsável perante o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular. Nas relações com a Assembleia Nacional Popular, o Governo só responde perante a Assembleia Nacional Popular e não perante o Presidente da República, isto deve ficar claro.

A configuração parlamentar da Assembleia Nacional Popular e, consequentemente, a nomeação de um Primeiro-ministro e um novo Governo, deve ser um assunto exclusivo da Assembleia Nacional Popular e não do Presidente da República.

É certo que o Presidente da República pode demitir o Governo ao abrigo do número 2 do Artigo 104.º da Constituição da República da Guiné-Bissau em caso de grave crise política que ponha em causa o normal funcionamento das instituições da República, ouvidos o Conselho de Estado e os partidos políticos com assento parlamentar.

Demitir o Governo, não implica, porém, a dissolução da Assembleia Nacional Popular, nem tão pouco, a usurpação das competências constitucionais da Assembleia Nacional Popular, no que tange às suas relações com o Governo.

Já a dissolução da Assembleia Nacional Popular acarreta automaticamente a demissão do Governo.

Assim sendo, o Presidente da República da Guiné-Bissau deve tentar conciliar com a Assembleia Nacional Popular, a verificação e confirmação de uma maioria parlamentar a fim de decidir sobre a continuidade do atual Primeiro-ministro e do seu Governo, ou, a sua demissão e nomeação de um Primeiro-ministro e um novo Governo, caso por exemplo, a anterior maioria parlamentar concertada do PAIGC e os partidos com os quais assinou Acordos de Incidência Parlamentar, se mantenha firme, mesmo depois do anúncio controverso da rutura do Acordo de Incidência Parlamentar pela APU-PDGB (5 mandatos), que já veio dar a conhecer ter rubricado um novo Acordo de Incidência Parlamentar com o PRS (21 mandatos), o que equivale dizer que, somando seus mandatos aos mandatos do MADEM-G15 (27 mandatos), configurariam uma nova maioria parlamentar.

Importa questionar a existência de uma maioria parlamentar absoluta ou qualificada entre o PAIGC e os seus parceiros, ou entre o MADEM-G15 e os seus parceiros, pois que, constatamos que muitos deputados eleitos solicitaram suspensão dos seus mandatos para ocuparem cargos ministeriais, o que equivale dizer que, em matéria de votação no parlamento, estando como governantes, não podem decidir, sendo as suas decisões tomadas por outros deputados, seus suplentes na linha de sucessão no parlamento, caso todo esse processo tenha sido realizado de forma legal, tendo em conta o que está regulado nos estatutos dos deputados.

Estatutos dos Deputados da Guiné-Bissau – ARTIGO 9.° – Substituição dos Deputados

1 – A substituição dos Deputados, em caso de vacatura ou suspensão do mandato, será feita nos termos do disposto nos artigos 123. ° e 124. ° da Lei n°4/ 93, de 24 de fevereiro.

Até ser confirmado um novo figurino parlamentar, na Assembleia Nacional Popular, o Governo em funções carece de legitimidade política, institucional e constitucional, daí a pertinência do Ponto 7 da Recomendação da Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO.

Caso se consiga calendarizar um debate no Parlamento para se tirar a limpo a questão da configuração de uma maioria parlamentar (antes da data sugerida, não necessariamente exigida em forma de ultimato, pela CEDEAO – 22 de maio), e na confirmação de uma maioria parlamentar que apoie o atual Governo em funções, a plataforma dessa maioria pode decidir por manter (ou não) o atual Primeiro-ministro na Chefia do Governo, de um novo Governo que seria reconhecido como constitucional e assente na legitimidade democrática, pela Assembleia Nacional Popular e não necessariamente, pelo Presidente da República.

É de capital importância que a CEDEAO saiba como funciona o sistema parlamentar maioritário que decide sobre a nomeação de um Primeiro-ministro e de um Governo na Guiné-Bissau.

Se não houver conciliação entre o Presidente da República e a Assembleia Nacional Popular, no sentido de se viabilizar na Assembleia Nacional Popular, o debate sobre a legitimidade do Governo em funções, por via da confirmação de uma maioria parlamentar atualizada, e tendo em conta a Recomendação da CEDEAO no seu Ponto 7, o Presidente da República, em nosso entender, não deve demitir o Governo, para nomear outro, por sua iniciativa. É inconstitucional e prolongará a crise política e institucional na Guiné-Bissau!

No caso de não haver condições de entendimento para a legitimação do governo, no parlamento, o Presidente da República pode alegar a existência de uma grave crise política e decidir pela dissolução da Assembleia Nacional Popular, conforme estabelece a alínea a) do número 1 do ARTIGO 69.° da Constituição da República da Guiné-Bissau.

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

a) Dissolver a Assembleia Nacional Popular, em caso de grave crise política, ouvidos o Presidente da Assembleia Nacional Popular e os partidos políticos nela representados e observados os limites impostos pela Constituição.

Sendo que, em nosso entender, o Presidente da República teria que considerar sempre os limites formais e temporais para dissolver a Assembleia Nacional Popular, como estabelece o número 1 do Artigo 94.º da Constituição da República da Guiné-Bissau. A Assembleia Nacional Popular não pode ser dissolvida nos 12 meses posteriores à eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou de emergência.

Dissolver o Parlamento não deve ser o primeiro, nem o segundo recurso de um Presidente da República face a uma grave crise política e institucional, mas sim, o último de todos os recursos possíveis, e esgotadas todas as possibilidades existentes, a bem da salvaguarda do Interesse Nacional.

Porém, na ausência de entendimentos/consensos, políticos, no seio da Assembleia Nacional Popular, e para impedir que o Interesse Nacional seja prejudicado, cabe ao Presidente da República decidir em consciência e em conformidade com a Constituição da República, face ao juramento prestado, que consta no seu Artigo 67.º  “Juro por minha honra defender a Constituição e as leis, a independência e a unidade nacionais, dedicar a minha inteligência e as minhas energias ao serviço do povo da Guiné-Bissau, cumprindo com total fidelidade os deveres da alta função para que fui eleito”.

Ouvimos recentemente o Presidente da República exigir o desbloqueio da Assembleia Nacional Popular para que o Programa do atual Governo fosse recebido, apresentado e debatido na Assembleia Nacional Popular, dependendo a sua aprovação ou não, da maioria absoluta de votos dos deputados presentes.

Temos acompanhado as recentes diligências do Presidente da República da Guiné-Bissau nas suas auscultações aos partidos políticos com assento parlamentar, aos demais órgãos de soberania, visando tomar conhecimento fatual das crispações no seio da Assembleia Nacional Popular e como deve proceder constitucionalmente, para encontrar a melhor solução para a Guiné-Bissau, sobretudo, para responder constitucionalmente ao Ponto 7 da Recomendação da CEDEAO sobre a nomeação de um Primeiro-ministro e de um novo Governo.

Em nosso entender, caso não se consiga um entendimento político institucional, após várias iniciativas nesse sentido, a melhor solução seria obviamente a dissolução da Assembleia Nacional Popular, que acarretaria automaticamente a demissão do actual governo, e a convocação de Eleições Legislativas antecipadas. Contudo e mesmo sendo uma decisão soberana e constitucional, o Presidente da República deveria comunicá-la antecipadamente aos seus pares da CEDEAO, justificando as razões constitucionais e legais que o moveram a essa decisão, salvaguardando sempre a defesa do Interesse Nacional e a satisfação das necessidades coletivas.

Pode-se questionar se a realização de novas eleições legislativas não poderia redundar numa nova crise caso não haja de novo um vencedor com maioria absoluta ou qualificada.

Sim, pode acontecer, mas será sempre um novo contexto, provavelmente com novas lideranças partidárias ou fusões entre partidos políticos e um novo desafio ao Povo eleitor, cada vez mais desgastado com as sucessivas crises políticas e institucionais que têm bloqueado a Guiné-Bissau.

Aproveitamos para lembrar ao Presidente da República a importância do Conselho de Estado, seu órgão político de consulta, segundo o Artigo 73.º da CRGB e sobretudo pelo fato de ainda não terem sido dados a conhecer oficialmente os nomes dos cinco cidadãos designados pelo Presidente da República pelo período correspondente à duração do seu mandato, conforme a alínea e) do ARTIGO 74.° da Constituição da República da Guiné-Bissau

ARTIGO 74.º

1 –  O Conselho de Estado é presidido pelo Presidente da República e composto pelos seguintes membros:

a) O Presidente da Assembleia Nacional;

b) O Primeiro-Ministro;

c) O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;

d) O representante de cada um dos partidos políticos com assento na Assembleia Nacional Popular;

e) Cinco cidadãos designados pelo Presidente da República pelo período correspondente à duração do seu mandato.

2 – O representante a que se refere a alínea d) do número anterior é escolhido por cooptação entre os deputados à Assembleia Nacional Popular.

3 – Os membros do Conselho de Estado são empossados pelo Presidente da República.

DAS RELAÇÕES ENTRE O PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR

ARTIGO 68.°

São atribuições do Presidente da República:

c) Dirigir mensagem à Nação e à Assembleia Nacional;

d) Convocar extraordinariamente a Assembleia Nacional Popular sempre que razões imperiosas de interesse público o justifiquem;

f) Fixar a data das eleições do Presidente da República, dos deputados à Assembleia Nacional Popular e dos titulares dos órgãos de poder local, nos termos da lei;

g) Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças políticas representadas na Assembleia Nacional Popular;

ARTIGO 69.°

1 – Compete ainda ao Presidente da República:

a) Dissolver a Assembleia Nacional Popular, em caso de grave crise política, ouvidos o Presidente da Assembleia Nacional Popular e os partidos políticos nela representados e observados os limites impostos pela Constituição;

c) Promulgar ou exercer o direito de veto no prazo de 30 dias contados da recepção de qualquer diploma da Assembleia Nacional Popular ou do Governo para promulgação.

2 – O veto do Presidente da República sobre as leis da Assembleia Nacional Popular pode ser superado por voto favorável da maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções.

ARTIGO 71.°

1 – Em caso de ausência para o estrangeiro ou impedimento temporário, o Presidente da República será substituído interinamente pelo Presidente da Assembleia Nacional Popular.

2 – Em caso de morte ou impedimento definitivo do Presidente da República, assumirá as funções o Presidente da Assembleia Nacional Popular ou, no impedimento deste, o seu substituto até tomada de posse do novo Presidente eleito.

ARTIGO 72.°

2 – Compete à Assembleia Nacional Popular requerer ao Procurador-Geral da República a promoção da acção penal contra o Presidente da República sob proposta de um terço e aprovação de dois terços dos deputados em efectividade de funções.

DAS RELAÇÕES ENTRE A ASSEMBLEIA NACIONAL POPULAR E O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ARTIGO 85.°

1 – Compete à Assembleia Nacional Popular:

e) Requerer ao Procurador-Geral da República o exercício da acção penal contra o Presidente da República, nos termos do artigo 72° da Constituição; Votar moções de confiança e de censura ao Governo;

j) Autorizar o Presidente da República a declarar a guerra e a fazer a paz;

ARTIGO 89.°

2 – A Assembleia Nacional Popular reunir-se-á extraordinariamente por iniciativa do Presidente da República, dos deputados, do Governo e da sua Comissão Permanente.

ARTIGO 94º

1 – A Assembleia Nacional Popular não pode ser dissolvida nos 12 meses posteriores à eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou de emergência.

2 – A dissolução da Assembleia Nacional Popular não impede a subsistência do mandato dos deputados até abertura da legislatura subsequente às novas eleições.

Positiva e construtivamente.

Didinho 03.05.2020

Fontes de consulta:

Assembleia Nacional Popular

Comissão Nacional de Eleições

CEDEAO