O Direito, entre Juristas e não juristas…

Creio que não estarei a dar nenhuma novidade se disser que os juristas (nem todos, obviamente), guineenses e não guineenses, que abordam a temática constitucional e legal da Guiné-Bissau, sobretudo, nos momentos de crises políticas, e institucionais, são os principais promotores da descredibilização do conceito e do estatuto do jurista.

Ao longo dos anos, assistimos a posicionamentos de vários juristas em matéria de interpretação constitucional e legal, que, mesmo o comum do cidadão apenas com o conhecimento linguístico assente numa formação escolar média, que lhe permite analisar e interpretar um texto opinativo, que não assente em bases científicas, consegue perceber que o uso e o abuso do estatuto de jurista nem sempre é suportado pelos seus posicionamentos alegadamente, de jurista, mas sim, de simples opinante, focado numa perspectiva política e não, jurídica.

Quando assim é, o jurista deixa de ser “jurista” e passa a ser um opinante como qualquer outro, pois que, nos seus posicionamentos, não aborda a sustentação científica do Direito, para casos concretos da sua intervenção, deixando transparecer suas tendências, suas tentações, suas raízes, suas pertenças, enquanto ser humano, comum, como todos os demais.

Outrossim, convenhamos que, a confrontação jurídica é o pilar da sustentação do Direito, enquanto Ciência. Se repararmos bem, nos órgãos colectivos de decisão dos Tribunais, há sempre uma equipa ímpar, para que, qualquer decisão que seja votada, possa haver um voto de desempate, de validação de uma decisão vencedora, isto, porque a cada Juiz de Direito, a sua visão, o seu entendimento, a sua liberdade interpretativa dos casos em julgamento.

Assim sendo, não devemos pensar que todos os juristas devem analisar, interpretar e decidir da mesma forma, ainda que possam muitas vezes ser unânimes nas decisões colectivas.

Os não juristas, por sua vez, não deixam de ser seres humanos, com formação e conhecimento de leitura, análise e interpretação em diversos campos do conhecimento, incluindo o Direito, mesmo não tendo sido essa a sua área específica de formação, mas de complementaridade.

Usar e abusar do conceito e do estatuto de jurista para excluir ou menosprezar a participação cidadã nos debates de ideias sobre assuntos políticos e institucionais da Guiné-Bissau, levados aos Tribunais, de cujos Acórdãos e Despachos, nascem novos conflitos, desta feita, de natureza jurídica, quando a sustentação dos debates é opinativa, repito, opinativa, não é o melhor contributo dos juristas para a informação e o consequente esclarecimento dos cidadãos, não juristas.

Positiva e construtivamente, vamos continuar a trabalhar!

Didinho 01.03.2020

“Ubi lex voluit, dixit; ubi noluit, tacuit” isto é “o que a lei quer, diz; o que a lei não quer, não diz”.

“Ubi lex voluit, dixit; ubi noluit, tacuit” isto é “o que a lei quer, diz; o que a lei não quer, não diz”.
Por mais que, em sentido amplo da interpretação permitisse a “extra verbis legis” ou mesmo “contra verbis legis” que se baseia na ampliação do sentido possível das palavras, nunca fugiria do sentido possível a sua mínima correspondência verbal ainda que imperfeitamente expresso (cfr n° 2 do art° 9° CC)
A jurisprudência, porém, salvou uma válvula de escape no domínio de direito privado com o propósito de se legitimar os tribunais resolver um caso em concreto além dos limites possível ou mesmo contra esse sentido. Logo… numa interpretação contrassenso, ficou vedado este exercício ao direito público.
Na esteira da crítica de Castanheira Neves, a norma jurídica se identificaria com o seu texto e o significado jurídico a determinar como significação textual.
Portanto, direito (lei) é uma criação do poder político democraticamente legitimado que a interpretação deve ser encarada sobre o texto para separar o direito “que é” que foi querido pelo legislador do direito “que deve ser”.
Assim, o objeto da interpretação coincidir-se-á com o texto da lei porque é no texto da lei que se exprime o imperativo do legislador e se manifesta vinculativamente a sua autoridade legislativa, porque o texto da lei encontra o direito a objectivação que garante a segurança jurídica, e porque em referência ao texto da lei se poderá aferir o princípio da separação de poderes, à luz das quais cabe certamente ao legislador uma palavra a dizer sobre aquilo que é justo sob pena de se tornar num mero parceiro de diálogo dos tribunais. In Intr. ao Est. do Direito – Miguel Nogueira de Brito.
Ainda no entendimento do professor de direito israelita Aharon Barak: “actividade interpretativa dá forma ao conteúdo da norma presa dentro do texto”.
Por tudo que aqui ficou exposto no concernente a interpretações das normas numa “dialética triádica” envolvendo o sistema, o caso e a nova criação do sistema deve então o propósito da minha inquietação.
E, é nesta precisa inquietação que me questiono sobre a exteriorização dos atos do Supremo Tribunal de Justiça (S.T.J) em sucessivos acórdãos: n° 1, 2 e 3/2020 em como não passasse de vestes de um novo órgão legislador e não como a corte judiciária de caráter arbitrário na prossecução de um dos fins de Estado.
Kassumai!
TBV; 22/02/20
Pedro Semedo