ILHA DO SAL, NOVEMBRO DE 1981 A HUMILHAÇÃO CABO-VERDIANA...

 

Fernando Casimiro (Didinho)

didinhocasimiro@gmail.com

22.08.2013

Hoje sinto que devo partilhar algo que aconteceu comigo há muitos anos. Estávamos em 1981, um ano depois do golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980 na Guiné-Bissau, o tal golpe contra os "burmedjus".

No meu percurso para Luanda, Angola, via aeroporto do Sal, e por motivos de atraso de 1 dia do voo da TAAG proveniente de Havana, Cuba, com destino a Luanda e trânsito na Ilha do Sal, Cabo-Verde, decidi, por iniciativa própria, hospedar-me no principal Hotel da Ilha do Sal, na altura. Não levava muito dinheiro comigo. Era dinheiro que os meus pais me tinham dado em mãos, para me "desenrascar" no que fosse preciso e, de facto, foi preciso, pois nunca tinha dormido algures na rua e, muito menos, num banco/cadeira/chão de um aeroporto.

Apesar da responsabilidade do atraso ser da companhia aérea angolana, nenhum passageiro beneficiou de qualquer compensação ou benevolência de quem de direito. Ou se tinha dinheiro para comer e dormir num espaço próprio para o efeito, ou, passava-se fome e ficava-se ao relento.

Lembro-me de ter encontrado no aeroporto, nessa manhã, quando cheguei ao Sal, um senhor conhecido dos meus pais dos tempos em que esteve na Guiné. O senhor Alberto Salazar, que trabalhou na casa Ultramarina, que depois passou a ser conhecida como SOCOMIN.

Também me lembro de ter encontrado o casal "Marta" que estava à espera do mesmo voo para regressar a Luanda.

Ora bem, depois de uma noite de muitos pensamentos Marcas da vida, ainda que bem acomodado, levantei-me de manhã cedo, fiz a minha higiene pessoal, usando depois do banho, uma toalha minha, que levava na mala, visto que nos aposentos, não havia simplesmente toalhas. Não incomodei ninguém e decidi  utilizar o que era meu.

Despachado, fui fazer contas e paguei o que tinha a pagar pela noite passada no Hotel.

Ia a caminho para apanhar um táxi, quando várias pessoas assobiavam e gritavam atrás de mim, dando a entender que queriam falar comigo. Parei, olhei para trás, esperando que se chegassem ao pé de mim e me dissessem o que queriam.

Não pude acreditar e não me contive, de tão revoltado que fiquei. Sim, estava em Cabo-Verde e, sabia-se que eu era portador de um passaporte da Guiné-Bissau. Represálias pelo golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980?

Ao que vinham essas pessoas perguntei aos meus botões?

Fui acusado de ter roubado a toalha do quarto do Hotel onde tinha pago para dormir...

Como...?

Perguntei, revoltado até às tripas!

Toalha, roubo...?

Deixe ver a sua bagagem, disse alguém...

Abram tudo, façam o que quiserem, respondi.

Conclusão, a minha toalha, a que me servi para me limpar depois do banho, ainda estava húmida...

Pegaram nela e reviraram a mala de toda a forma, para de seguida começarem a virar as costas em jeito de fuga...

Então? Perguntei...

Onde está a toalha que vinham procurar?

Quem assume a responsabilidade por esta humilhação?

Já estava a falar para "ninguém"...

Sim... estava em Cabo-Verde, de passagem, um ano depois do golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980 e por ser cidadão guineense, sofri como represália, uma humilhação que jamais esquecerei!

Ai se o meu bisavô Viriato Gomes da Fonseca soubesse como o seu bisneto foi maltratado em Cabo Verde...


A Guiné-Bissau é a soma dos interesses de todos os guineenses E NÃO DOS INTERESSES DE UM GRUPO OU DE GRUPOS DE GUINEENSES! Didinho


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