A GUINÉ-BISSAU, COM REALISMO! (4)

Toda e qualquer afirmação com carácter de denúncia deve ser tida em linha de conta para o apuramento da verdade, independentemente do passado ou do presente do seu autor, seja ele governante, político, militar ou simples cidadão guineense!

 

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

14.04.2009

Fernando Casimiro (Didinho)A Mudança que se quer para a Guiné-Bissau não passa pela substituição de uns ditadores por outros, mas sim, pela dignificação do país e pela consciencialização do povo guineense!

A Mudança que se quer para a Guiné-Bissau passa pela salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos!

Antes de entrar propriamente na abordagem de hoje, quero insistir na necessidade de se apurar em que condições físicas e de saúde se encontram os detidos e alegados implicados na colocação da bomba que vitimou o General Tagme Na Waie.

Faço este  apelo para que se exija a apresentação pública desses indivíduos, como garantia de estarem vivos, ou que não foram torturados.

O medo foi desde sempre o primeiro factor de inibição dos guineenses. O medo foi desde sempre o primeiro factor de privação da liberdade dos guineenses.

Medo de falar, de escrever, de cantar, de agir, para não cair no exagero de dizer medo de pensar! Dos poucos que se atreveram a desafiar os regimes, alguns foram assassinados, outros feitos prisioneiros, torturados e continuamente perseguidos, mesmo após as suas libertações das prisões.

Alguns que ainda hoje se encontram vivos e que foram vítimas dos vários regimes governativos da Guiné-Bissau vivem marcados pelo trauma de terem visto os seus próprios irmãos massacrando outros, sem nunca terem percebido realmente em nome de que poder, em nome de que ideologia, em nome de que religião ou fundamento étnico, se usaram métodos tão bárbaros contra eles, e sem que alguma vez tivessem tido alguma possibilidade de defesa jurídica, pois sempre lhes foi recusado qualquer direito enquanto cidadãos!

Todos os regimes que governaram a Guiné-Bissau impuseram a força como meio de privação da liberdade dos guineenses nas suas mais variadas vertentes.

Nos dias de hoje, e face aos acontecimentos marcantes de Março passado, tenta-se reforçar a cultura do medo, não fosse o povo pensar que tinha chegado a verdadeira liberdade com as mortes de Tagme Na Waie e de Nino Vieira.

O primeiro indício dessa realidade surgiu através da penalização de cidadãos por se terem expressado livremente em relação ao desenrolar dos acontecimentos de 1 e 2 de Março.

Perseguições, detenções, intimidações, algumas em forma de ameaça de morte e espancamentos.

Foi assim que se soube da detenção e espancamento do advogado Pedro Infanda.

"O bastonário da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, Armando Mango, disse hoje que militares das Forças Armadas guineenses espancaram o advogado Pedro Infanda, que se encontra em tratamento médico no hospital Simão Mendes, em Bissau".

Contactado pela Lusa, um oficial superior das actuais chefias militares guineenses escusou-se a confirmar as acusações de maus-tratos, feita por Armando Mango: "Só posso confirmar que o Dr. Pedro Infanda foi detido como medida preventiva, aliás como disse ontem (quinta-feira) o Chefe de Estado Maior (referindo-se a Zamora Induta, indigitado para o cargo pelo Governo), mas não posso confirmar se foi espancado ou não."

Em carta dirigida ao procurador-geral da República, Luís Manuel Cabral, a que a Lusa teve acesso, as chefias militares acusam Infanda de ter incorrido num "incitamento à desordem e desobediência do pessoal militar, o que poderia criar anarquia e desestabilização" nas Forças Armadas.

"O cidadão Pedro Infanda indevidamente, por não estar autorizado a fazê-lo e por desconhecimento total da lei e das circunstâncias, pronunciou-se sobre as nomeações a cargos militares de uma forma a provocar desmandos nas Forças Armadas", lê-se na carta.

Seria necessário deter, espancar e humilhar o Dr. Pedro Infanda, por ter questionado a indicação dos nomes propostos para as chefias militares?

Esses militares que afirmam na carta enviada ao Procurador-Geral da República, que o cidadão Pedro Infanda não estava autorizado a fazer declarações e que o mesmo desconhece a lei, por acaso conhecem a lei melhor que o Dr. Pedro Infanda? Que lei proíbe o cidadão de se expressar livremente, quando a Constituição da República consagra esse direito a todos os cidadãos?

Do espancamento do Dr. Pedro Infanda ao espancamento do Dr. Francisco José Fadul não foi preciso esperar muito.

Bastou uma entrevista de Francisco José Fadul denunciando as contínuas práticas de saque ao tesouro público pelos militares, que nunca justificam os gastos com as verbas levantadas do tesouro público, entre outras acusações específicas ao governo de Carlos Gomes Jr. a quem exigiu a demissão, para que um grupo de indivíduos fardados e armados irrompesse pela sua residência, espancando-o e pilhando os seus haveres.

A Barbárie estava a ter continuidade, pese embora, não causar perdas de vidas humanas. A imposição da "lei da rolha" estava a ser transmitida a todos os que por ventura julgavam estar perante um percurso de mudança, que lhes permitisse pensar e falar alto e em bom som para todos ouvirem!

Dos espancamentos de Pedro Infanda e de Francisco Fadul e após a pronta e enérgica denúncia do Movimento Nacional da Sociedade Civil, e da Liga Guineense dos Direitos Humanos, eis que um indivíduo armado se dirige à sede da Liga Guineense dos Direitos Humanos, tudo apontando que, desesperadamente à procura do Presidente da Liga, o Dr. Luís Vaz Martins, no intuito de o assassinar.

De referir que o Presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos esteve durante vários dias refugiado algures em parte incerta, até que fossem tomadas diligências no sentido da salvaguarda da sua vida.

Sobre a agressão ao Dr. Francisco Fadul, o Estado-Maior limitou-se a refutar qualquer envolvimento de militares afectos às Forças Armadas, alegando que há no país muita gente armada e com uniformes militares...

Francisco José Fadul,  até então Presidente do Tribunal de Contas da Guiné-Bissau e Presidente do PADEC, foi evacuado para Portugal, onde se encontra a convalescer, após uma intervenção cirúrgica a uma das mãos, em resultado das agressões sofridas durante a invasão à sua residência.

Tive oportunidade de visitar o Dr. Francisco José Fadul no passado dia 5 de Abril, ou seja, no próprio dia em que teve alta hospitalar do Hospital de Santa Maria em Lisboa.

Fiz questão de visitá-lo, no hotel onde estava hospedado, afim de lhe manifestar a minha solidariedade pelo acto bárbaro da agressão de que foi vítima, depois de casualmente ter-me sido indicado o endereço desse hotel por uma pessoa amiga que o tinha ido visitar ao hospital nessa manhã. Casualmente porque, na tarde de Domingo, 5 de Abril, ao ligar o telemóvel, recebi o alerta de uma chamada não atendida. Liguei para o número que tinha ficado registado e dei-me com alguém que queria saber se eu tinha conhecimento de uma triste notícia. Perguntei que triste notícia era e a pessoa respondeu-me que tinha ouvido dizer que o Dr. Francisco Fadul tinha falecido.

Fiz questão de contactar de imediato alguém que me pudesse confirmar ou desmentir essa notícia e foi assim que fiquei a saber onde estava hospedado o Dr. Francisco José Fadul.

Fosse outra pessoa vítima do mesmo acto, quem me conhece sabe que teria certamente o mesmo gesto que foi a acção da visita ao Dr. Francisco José Fadul!

Obviamente que pude inteirar-me das informações dadas a conhecer pelo Fadul, pessoa que merece todo o meu respeito mas de quem há muito tenho opinião formada e registada nos artigos pontuais que escrevi e referentes à sua conduta política e de governante.

Não trilho a mesma rota de princípios do Dr. Francisco José Fadul e, aproveito para manifestar a minha total concordância em relação aos conteúdos dos diversos artigos e comentários publicados no nosso site por estes dias, sobre o perfil, a conduta e o percurso do Dr. Francisco José Fadul, ao longo dos anos.

É importante reforçar que se a Guiné-Bissau é hoje o que é, o Dr. Francisco José Fadul tem a sua quota parte de responsabilidade na matéria!

Não vou entrar em detalhes para falar do Dr. Francisco José Fadul, até porque, vários colaboradores do nosso site têm-no feito, mas também, porque, apesar de compreender a necessidade de se fazer saber ao próprio Dr. Fadul, que ele também é parte do problema da Guiné-Bissau, ainda assim, acho que não devemos deixar de ouvir e analisar o que tem a dizer sobre o que viveu na primeira pessoa e, sobre a forma como ele, enquanto cidadão, político e governante, vê o actual cenário de crise na Guiné-Bissau.

Sei que não será pelos nossos escritos que o Dr. Fadul deixará de dizer o que pensa, mas também sei que, dando-lhe voz, ouvindo o que tem a dizer, sendo ele responsável pelas suas declarações, estaremos todos com mais argumentos para analisarmos, cada um à sua maneira, os diversos contornos dos acontecimentos de 1 e 2 de Março e, consequentemente, todos os demais apontamentos que desde sempre fizemos questão de referenciar aqui no nosso site e que muitos contestavam, exigindo provas contra este, ou contra aquele.

É curioso que agora, os que sempre ilibaram o falecido presidente Nino Vieira de actos criminosos a ele referenciados, estão perante o mesmo cenário sobre a própria morte de Nino Vieira. Ou seja, querem acusar, mas, e as provas...?! O certo é que Nino foi morto, tal como outros foram no passado, a mando de Nino, sem que se tivesse conseguido provar de forma documental ou factual!

É por estas e por outras que devemos ter princípios, ser imparciais, defensores da verdade e da justiça!

As declarações do Dr. Fadul, vão de encontro à nossa busca da verdade, ainda que, a postura do Dr. Fadul nunca tenha sido a favor dessa verdade, devido às suas conveniências de relacionamento e apetite pelo poder.

Hoje, quando alguém como o Dr. Fadul decide dizer o que sabe sobre o saque do tesouro público pelos militares, razão sempre tivemos nós, quando questionávamos os gastos das viagens do falecido presidente Nino Vieira e outras despesas certamente nunca declaradas ao Tribunal de Contas, pois o Dr. Fadul nunca falou de qualquer ilegalidade cometida pela Presidência da República, preferindo antes, manifestar apreço pela amizade pessoal que o ligava ao falecido presidente.

O Dr. Fadul nunca se insurgiu contra os atropelos dos militares; nunca se pronunciou contra assassinatos, agressões, intimidações, perseguições e detenções de pessoas e nunca se pronunciou contra o narcotráfico, durante todo o período em que João Bernardo Vieira esteve como presidente da República!

Claro que esta parcialidade, esta dualidade de critérios, a ausência de solidariedade e de humanismo, falam pelo carácter do político, governante e cidadão que é o Dr. Francisco José Fadul.

Mas tal como vos disse a propósito das declarações prestadas pelo Dr. Francisco José Fadul a vários órgãos de comunicação social portugueses sobre a actual situação na Guiné-Bissau, acho bem que se fique a saber por ele, ou por qualquer outra pessoa do sistema, o que realmente está a acontecer na Guiné-Bissau. Não devemos deixar de ouvir, ou de ler o que se passa na Guiné-Bissau, simplesmente porque a pessoa que fala ou escreve sobre o assunto, é ou foi isto ou aquilo, assim ou assado.

O Dr. Fadul será responsabilizado a seu devido tempo, aliás, tem sido responsabilizado e penalizado pelo eleitorado guineense. No entanto, há que reconhecer que é um indivíduo competente e se as pessoas não se deixarem manipular e instrumentalizar por ele, até podem aprender com ele, bem como, ajudá-lo a ultrapassar os desequilíbrios do mal de que padece, que é a ambição cega pelo poder.

O Dr. Francisco José Fadul, pode vir a ser uma voz importante, se na realidade quiser redimir-se das suas traições no passado.

Pode vir a ser uma voz muito útil na busca de esclarecimentos de inúmeros cenários de actos criminosos, quer a nível de crimes de sangue, quer nos relacionados com a corrupção, incluindo o narcotráfico!

Pode vir a ser uma voz muito útil estando no terreno, ou seja, na Guiné-Bissau, se quiser servir o país e os guineenses, até porque são poucos os políticos que ousam falar, dizer o que pensam e o que sabem, tal como o Dr. Fadul demonstrou ser capaz de fazer.

Não devemos "dispensar" uma voz como esta, tal como não devemos esquecer que o Dr. Francisco José Fadul tem a sua quota parte de responsabilidade no estado em que está a Guiné-Bissau!

Nota: O próximo capítulo será o de conclusão desta série de 5 análises sobre a actual situação na Guiné-Bissau. Analisarei as reacções do governo guineense e do Estado-Maior às entrevistas concedidas por Francisco Fadul a diversos órgãos de comunicação social em Portugal e falarei do impacto desta crise e as suas consequências para o governo de Carlos Gomes Jr.

Vamos continuar a trabalhar!

A GUINÉ-BISSAU, COM REALISMO! (3) 13.04.2009

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Guiné-Bissau: Advogado detido por militares foi espancado - bastonário da Ordem

Bissau, 27 Mar (Lusa)

 

A agência Lusa viu Pedro Infanda, acompanhado da esposa, a caminhar pelos próprios pés, da unidade de Raio X do Simão Mendes para a unidade dos cuidados intensivos, denotando dificuldades a caminhar.

Dois elementos do gabinete das Nações Unidas, em Bissau, acompanharam o percurso de cerca de cem metros efectuado pelo advogado.

Infanda, advogado do ex-Chefe do Estado-Maior da Armada guineense, Bubo Na Tchuto, exilado na Gâmbia desde Agosto passado, após ter sido acusado de tentativa de golpe de Estado no dia 05 daquele mês, foi detido nas instalações da fortaleza d'Amura, em Bissau, no seguimento de críticas, numa rádio local, às actuais chefias militares.

Contactado pela Lusa, um oficial superior das actuais chefias militares guineenses escusou-se a confirmar as acusações de maus-tratos, feita por Armando Mango: "Só posso confirmar que o Dr. Pedro Infanda foi detido como medida preventiva, aliás como disse ontem (quinta-feira) o Chefe de Estado Maior (referindo-se a Zamora Induta, indigitado para o cargo pelo Governo), mas não posso confirmar se foi espancado ou não."

Segundo o bastonário da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau, Pedro Infanda "está tecnicamente ainda sob custódia judicial", já que foi entregue ao Ministério Público pelos militares, mas ainda não há nenhuma nota que o possa restituir a liberdade.

Pedro Infanda foi colocado sob custódia do Ministério Público hoje de manhã, mas ainda não foi ouvido nos autos para que se possa saber se fica detido ou se será posto em liberdade, disse Armando Mango, explicando que, por pressão da Ordem dos Advogados, o causídico foi levado ao hospital, "já que precisa de cuidados médicos".

De acordo com o bastonário dos advogados guineenses, Pedro Infanda poderá ser presente ao Ministério Público só na segunda-feira, caso o seu estado de saúde melhore.

Armando Mango disse à Lusa que ele própria fará a defesa de Pedro Infanda se houver um julgamento, já que os militares intentaram uma acção judicial contra o causídico.

Em carta dirigida ao procurador-geral da República, Luís Manuel Cabral, a que a Lusa teve acesso, as chefias militares acusam Infanda de ter incorrido num "incitamento à desordem e desobediência do pessoal militar, o que poderia criar anarquia e desestabilização" nas Forças Armadas.

"O cidadão Pedro Infanda indevidamente, por não estar autorizado a fazê-lo e por desconhecimento total da lei e das circunstâncias, pronunciou-se sobre as nomeações a cargos militares de uma forma a provocar desmandos nas Forças Armadas", lê-se na carta.

"Estes factos são extremamente perigosos nos momentos em que vivemos e vão contra os esforços que estão a ser feitos pela paz", lê-se ainda no documento assinado por Zamora Induta, chefe do comité militar que coordena o exército guineense desde a morte do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), Tagmé Na Waié, no dia 01 deste mês.

Em declarações a rádio privada de Bissau, Pedro Infanda criticou o facto de Zamora Induta ter sido indigitado pelos militares e pelo Governo para o cargo de CEMGFA, embora ainda aguarde pela decisão do Presidente da Republica interino, Raimundo Pereira.

MB.

Lusa/Fim

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